Acórdão nº 1289/08.2PHLRS.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelLOPES DA MOTA
Data da Resolução12 de Julho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.

Pelo Juízo Central Criminal de Loures, Comarca de Lisboa Norte, foi proferido acórdão no qual foi decidido:

  1. Condenar o arguido AA, como co-autor material de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelas disposições conjugadas constantes dos artigos 26.º, 131.º e 132.º, n.º 1 e 2, alíneas h), todos do Código Penal, na pena de 13 (treze) anos de prisão b) Condenar o arguido BB, como co-autor material de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelas disposições conjugadas constantes dos artigos 26.º, 131.º e 132.º, n.º 1 e 2, alíneas h), todos do Código Penal, na pena de 14 (catorze) anos e 9 (nove) meses de prisão; c) Condenar o arguido CC, como co-autor material de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelas disposições conjugadas constantes dos artigos 26.º, 131.º e 132.º, n.º 1 e 2, alíneas h), todos do Código Penal, na pena de 14 (catorze) anos de prisão; d) Condenar o arguido DD, como co-autor material de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelas disposições conjugadas constantes dos artigos 26.º, 131.º e 132.º, n.º 1 e 2, alíneas h), todos do Código Penal, na pena de 13 (treze) anos e 6 (seis) meses de prisão.

    1. Desse acórdão, recorreram os arguidos para o Tribunal da Relação do Lisboa, o qual, por acórdão de 26.9.2017, negou provimento aos recursos, confirmando o acórdão recorrido.

    2. Inconformados, vêm agora os arguidos recorrer desta decisão do tribunal da Relação para o Supremo Tribunal de Justiça.

  2. Recurso do arguido AA O recorrente AA identifica o objecto do recurso no ponto 7 da motivação, nos seguintes termos: «A) O presente recurso visa a análise do ilícito em que o arguido foi condenado, ou seja, num homicídio qualificado em co-autoria, e na primeira fase o presente recurso analisará se a prova produzida leva ou não à conclusão de que houve co-autoria.

    B) Numa segunda fase do presente recurso tentar-se-á demonstrar se houve, atenta a matéria de facto gravada, a mesma pode levar à decisão de imputar tal factualidade ao ora recorrente a título de homicídio qualificado, ou seja, pois que se assim não for, estaremos perante um erro na apreciação da matéria de facto.

    C) Na terceira fase do recurso que ora se apresenta demonstrar-se-á que houve um erro na aplicação do direito atenta a forma e a matéria provada, bem como a prova gravada.

    D) Igualmente, e caso houvesse, ilícito penal, nos presentes autos, o que se aceita apenas por mera cautela de patrocínio, a não aplicação do regime de jovens delinquentes ao caso concreto, é também um erro na aplicação do direito».

    Desenvolve, de seguida, a sua motivação, concluindo (transcrição): «

    1. O presente recurso tem a sua génese no acórdão do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Norte – Loures – JCriminal – J1 e que no que aos factos de que foi condenado por aquele acórdão, teve tal condenação confirmada por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa. (…) C) O presente recurso visa demonstrar que não poderia ter sido proferida decisão: • De que houve co-autoria na prática do ilícito.

      • Pois que a matéria e os testemunhos gravados e que alicerçam a matéria de facto provada, não permitem que tal possa acontecer e por outro lado não pode tal matéria levar à imputação ao arguido do crime de homicídio qualificado, estaremos perante um erro na apreciação da matéria de facto e um erro na aplicação do direito.

      D) Quanto a co-autoria que foi considerada provada no douto acórdão, a mesma necessita de elementos fulcrais para que a mesma possa ser dada como provada e elas são a intervenção directa na fase de execução do crime, o acordo para a realização conjunta do facto e o domínio funcional do facto.

      E) Ora, a co-autoria baseia-se na distribuição funcional dos papéis em que há uma resolução conjunta e as contribuições individuais completam-se num todo unitário, sendo o resultado imputado a todos os participantes.

      F) Já a cumplicidade pressupõe um mero auxílio material ou mural a facto doloso praticado por outrem, pelo que ao cúmplice fica a faltar um elemento fundamental da co-autoria, o domínio do facto típico. E tal situação é perfeitamente explicável no acórdão do STJ 148/10.3SCLSB.L1.S1., consultável em www.dgsi.pt.

      • “A exigência legal, no art.º 26.º, do CP, de o co-autor para ser punível ter que tomar parte directa na execução com os outros, torna manifestamente imprescindível a sua actuação durante a execução da acção típica, ou seja depois de alguns co-autores terem cometido actos de execução, não podendo limitar-se a actos preparatórios, o que não teria o mínimo de correspondência na lei, com cabimento só por aplicação analógica, que seria vedada pelo princípio “nullum criminem, nulla poena sine lege stricta “, que é um corolário do princípio da legalidade, segundo Maria da Conceição Valdágua, op. cit. 133.

      • Os actos preparatórios, salvo casos contados, não são puníveis precisamente porque não sendo na generalidade conhecidos não produzem, ainda, uma impressão juridicamente abaladora, mas já o são os actos de execução, aqueles que significam por em movimento um processo de tal natureza.

      • E estes têm a dimensão esclarecida no art.º 22.º do CP, para punibilidade da tentativa; enquanto preenchem um elemento constitutivo do tipo; forem idóneos a produzir o resultado típico, ou que, segundo a experiência comum, e salvo circunstâncias imprevisíveis forem de natureza a fazer esperar que se sigam actos das espécies indicadas nas alíneas anteriores – n.º 2 a), b) e c). Em concreto ao que ao recorrente diz respeito, a matéria de facto dada como provada sob os números 2, 3, 4, 10, 11,12,13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27 e 28, não têm qualquer sustentação, sendo meras suposições e deduções do Tribunal “a quo” que não tem matéria de facto a sustentá-las.

      • A única sustentação é referida pelo Tribunal “a quo” quando refere “A testemunha identifica – dando características físicas correctas - o --, o --, o --, o --, o -- e o -- como sendo pessoas que conhece e que entraram na casa da vítima, alguns com armas de fogo e que a abandonam a fugir.” • Aliás, veja-se que o douto acórdão refere sobre a arma que foi usada no homicídio o seguinte: “No entanto, mesmo esta arma não permite apontar os autores dos factos pois que existem cartuchos da mesma junto ao lote 2 mas os tiros no interior são de uma arma diferente, mormente uma 7,65 mm., arma esta nunca apreendida.” • Ora, no aspecto objectivo a contribuição de cada co-autor deve ter uma determinada importância funcional no papel que levou à realização de um plano conjunto, o domínio funcional do facto e a este respeito, veja-se o acórdão do STJ de 24/03/2011 Proc. 322/08.2TARGR.L1.S1 – 3, no qual se refere que é indispensável uma decisão conjunta e uma execução conjunta da decisão, o acordo entre os agentes pode ser expresso ou tácito, prévio ou não à execução do facto.

      • E tal situação levanta a questão se o AA não tivesse ido, o homicídio não teria ocorrido? Ou seja, a colaboração que o recorrente teve no estádio da execução era um pressuposto indispensável à realização do evento? • Julgamos que não, sendo que o acórdão jamais consegue revelar qual o grau de intervenção de AA, se é que tal ocorreu.

      • Jamais se sabe no douto acórdão se o AA esteve na cozinha, bem como se saiu antes dou depois dos identificados ou do conjunto dos não identificados.

      • Ou seja, o douto acórdão não demonstra o acordo sobre o plano comum da execução do facto, a execução conjunta e o domínio funcional do facto, o que como explica Maria da Conceição Santana Valdágua, são elementos constitutivos essenciais da co-autoria no Direito Penal Português.

      • O douto acórdão adoptou uma solução global, a qual é inadmissível no Direito Penal Português e o qual viola os artigos 29.º nr. 1 e 3 da CRP e o artigo 1.º nr. 3 do CP.

      • O douto acórdão não logrou provar o plano, a necessidade de intervenção do recorrente, a intenção de atingir aquele resultado e de toda a relevância para a decisão em causa que o ora recorrente tenha intervindo na execução do tipo legal de crime em análise.

      G) Não provou igualmente – embora tal nem fosse punível – que o recorrente fosse elemento participativo na quebra das janelas por onde viriam a entrar as pessoas que participaram nos factos em análise H) E tais factos teriam de ser factos típicos – aqui o homicídio – pois teriam que ser factos idóneos a causar a morte ou que a natureza de tal facto fizesse esperar a morte – artigo 22.º nr. 2 do CP.

      I)É que o co-autor tem que tomar parte directa na execução do facto ou dos factos de que resulte a acção global e assim sendo o resultado. A este respeito veja-se acórdão do STJ de 18/10/2006.

      J) E não podemos deixar de nestas conclusões referir mais uma vez a conclusão do acórdão do STJ 148/10.3SCLSB.L1.S1conclui que: • ”A exigência legal, no art.º 26.º, do CP, de o co-autor para ser punível ter que tomar parte directa na execução com os outros, torna manifestamente imprescindível a sua actuação durante a execução da acção típica, ou seja depois de alguns co-autores terem cometido actos de execução, não podendo limitar-se a actos preparatórios, o que não teria o mínimo de correspondência na lei, com cabimento só por aplicação analógica, que seria vedada pelo princípio “nullum criminem, nulla poena sine lege stricta“, que é um corolário do princípio da legalidade, segundo Maria da Conceição Valdágua, op. cit. 133. Os actos preparatórios, salvo casos contados, não são puníveis precisamente porque não sendo na generalidade conhecidos não produzem, ainda, uma impressão juridicamente abaladora, mas já o são os actos de execução, aqueles que significam por em movimento um processo de tal natureza.

      • E estes têm a dimensão esclarecida no art.º 22.º do CP, para punibilidade da tentativa; enquanto preenchem um elemento constitutivo do tipo; forem idóneos a produzir o resultado típico, ou que, segundo a experiência comum, e salvo...

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