Acórdão nº 1334/11.4TBBGC.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Outubro de 2018
Magistrado Responsável | HELDER ALMEIDA |
Data da Resolução | 18 de Outubro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça[1] I – RELATÓRIO 1. AA, BB, e mulher, CC, DD, e EE, intentaram a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo sumário, contra FF e mulher, GG, pedindo a condenação destes a reconhecerem que o prédio identificado em 3.° da p.i pertenceu ao casal formado pela primeira A. e seu falecido marido HH; a reconhecerem que o acesso ao dito prédio se fazia por uma rua de terra batida que tinha início na rua que passa a sul do seu prédio e do prédio pertencente aos RR., com cerca de 6 metros de largura e que continuava até às escadas de acesso ao primeiro andar do prédio da primeira A. e da herança representada por todos os AA; a destruir o portão e muro que colocaram e que impede os AA de aceder nas condições em que sempre o fizeram, utilizando a rua melhor descrita em 13 da p.i; e a destruir as escadas de acesso ao seu prédio que construíram na referida rua de acesso ao prédio da primeira A. e da herança representada por todos os AA. e a absterem-se da prática de quaisquer actos, que perturbem ou contendam com o direito dos AA.
Alegam para o efeito - e em síntese - que na freguesia de …, Bragança, existe o seguinte prédio: Casa em fraco estado com 3 divisões no R/ C e 3 no primeiro andar, afecto a habitação, sito em …, confrontando de Norte com Rua, Sul com Rua, Nascente com II e do Poente com Próprio, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de … sob o n° 88, o qual pertence à herança, aberta e ainda não partilhada, de HH.
O casal formado pela primeira A. e marido, HH, por mais de quinze, vinte, trinta, cinquenta e setenta anos habitou o dito prédio, nele confeccionou e tomou refeições, nele dormiu, recebeu a sua correspondência e amigos ou visitas, e do mesmo cuidou, limpando-o e consertando o que necessário fosse, ainda, do mesmo pagou os inerentes impostos, nele sempre praticando, pois, todos os actos apenas permitidos aos proprietários, continuamente, sempre à vista de toda a gente, sem oposição de ninguém, sem que ninguém, nunca, se lhe opusesse, portanto também de forma pacífica, convencidos e cientes de estarem a exercer um direito próprio e sem que lesassem interesses ou direitos de quem quer que fosse.
Mais alegam que o referido prédio confina pelo sul, também, com um prédio urbano pertencente aos RR. O acesso ao rés-do-chão e umas escadas que dão acesso ao primeiro andar daquele prédio – melhor identificado em 3º da p.i. -, sempre se fez por uma rua com a qual o mesmo confronta pelo sul e de igual modo, pela mesma rua se acedia ao prédio dos RR..
Sucede, porém, que estes, durante os anos de 2008 e 2009, procederam a obras de melhoramento/reconstrução do seu prédio, destruindo o muro e portão e toda a rua que dava acesso ao prédio da primeira A e da herança.
Os RR comprometeram-se a respeitar a configuração da rua e a fornecer uma chave do portão que iriam colocar, no entanto, procederam à colocação de outro portão embora em local ligeiramente diferente, tendo vedado o resto da rua com um muro de cimento e não fizeram a entrega da chave, impedindo a 1ª A. e a herança representada pelos restantes AA. de utilizarem o acesso ao r/c e 1.º andar do seu prédio, como sempre fizeram.
Concluíram, assim, pela procedência da acção.
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Regularmente citados, os RR. contestaram, invocando a ilegitimidade dos AA. e a ineptidão da p.i., impugnado quanto ao demais a factualidade vertida nesse articulado, alegando, em síntese, que não cortaram acesso algum aos AA., tanto mais que estes possuem acesso pela entrada principal da habitação na Rua da … e que a alegada rua ou caminho constitui o logradouro do prédio deles, RR..
Mais deduziram reconvenção, alegando que são donos e legítimos proprietários do prédio descrito no artigo 100.º da contestação, peticionando, em consequência, a condenação dos AA./Reconvindos a reconhecer a propriedade dos RR. sobre tal prédio nos precisos termos em que o respectivo registo o define.
Concluíram com a improcedência da acção e procedência da reconvenção.
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Os AA./Reconvindos apresentaram resposta à reconvenção, pugnando pela sua improcedência e concluindo como na inicial.
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A fls 247-248 foi proferido despacho convidando os AA. a especificar a natureza da rua em terra batida ali descrita e a identificar qual o direito da herança sobre a mesma rua, tendo os AA. apresentado requerimento onde vieram alegar tratar-se de uma rua pública, um caminho do domínio público e que sempre foi utilizado, há mais de quinze, vinte, trinta, cinquenta anos, quer pelos RR., quer pelos AA., quer pelas respectivas descendências e ascendências, caminho que era quase de utilização exclusiva dos AA. e RR. e que acabou por cair em desuso por parte das restantes pessoas de Parâmio, passando os RR. e os AA. a serem os únicos utilizadores.
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Realizou-se audiência prévia, foi proferido despacho saneador, identificado o objecto do litígio, enunciados os temas da prova e designada data para realização da audiência de julgamento.
No início desta audiência, foram de novo os AA. convidados a aperfeiçoar a p.i., por não haverem sido indicadas as confrontações exactas do prédio/caminho e respectivas configurações, tendo por referência os limites físicos existentes no local, devendo os mesmos ser descritos por referência a elementos materiais que os identificassem e delimitassem. Na sequência do referido convite, vieram os AA. apresentar novo articulado, ao qual os RR. responderam e onde requereram a condenação dos AA. como litigantes de má fé.
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Foi realizada a audiência de discussão e julgamento, tendo no decurso da mesma se procedido a inspecção judicial, após o que foi proferida sentença finda com o decisório que segue: - “Julgo a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência: 1) Declaro os autores donos e legítimos proprietários do prédio urbano sito em …, composto por casa em fraco estado com 3 divisões no R/C e 3 no primeiro andar, afecto a habitação, confrontando de Norte com Rua, Sul com Rua, Nascente com II e do Poente com Próprio, encontra-se inscrito na matriz predial urbana da freguesia de … sob o n.º 88, constando como titular inscrito, HH - cabeça de casal da herança, o qual pertence à herança aberta por óbito de HH e ainda não partilhada.
2) Condeno os Réus a reconhecerem que o acesso ao prédio descrito em 1) deste dispositivo se faz por uma rua de terra batida que tinha início na rua que passa a sul deste e do prédio pertencente aos réus, infra descrito em 6) deste dispositivo com as características descritas em 7) dos factos provados.
3) Condeno os Réus a absterem-se da prática de quaisquer actos, que perturbem ou contendam com o direito dos AA, em aceder ao rés-do-chão e escadas de acesso ao primeiro andar pelo caminho referido em 7), devendo para o efeito manter o portão aberto, ou fornecer uma chave do mesmo.
4) No mais, absolvo os réus do restante peticionado.
5) Custas da acção a cargo dos autores e réus, na proporção de ¼ para os primeiros e de ¾ para os segundos - art. 527.°, n.ºs 1 e 2 do NCPC.
Julgo a reconvenção procedente, por provada e, em consequência: 6) Declaro os réus/reconvintes donos e legítimos proprietários do prédio urbano sito na Rua da …, freguesia do …, concelho de Bragança, composto de dois pisos e logradouro, a confrontar do Norte com AA, do Sul com Rua Pública, do Nascente com JJ e do Poente com KK, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 4…2-P e descrito na Conservatória do Registo Predial de Bragança sob o número 9…2, inscrito a favor dos réus, através da Ap. 861 de 05/05/2010, por usucapião.
7) Custas da reconvenção, a cargo dos autores/reconvindos - art, 527.°, n.os 1 e 2 do NCPC .” 3.
Inconformados com o assim decidido, os AA. interpuseram recurso de apelação para a Relação de Guimarães, que, por acórdão de fls. 568 e ss., julgou procedente tal recurso, revogando a sentença recorrida no que diz respeito aos pontos 2) e 3).
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De novo inconformados, os AA. interpuseram o vertente recurso de revista, cujas alegações findam com as seguintes conclusões: I. O acórdão em crise ao assentar a decisão nos moldes em que o faz, violou a lei substantiva, fazendo uma incorrecta subsunção da lei aos factos dados como provados pelo tribunal de primeira instância, porquanto fez uma errónea interpretação e aplicação da norma aplicável (conforme art.674.2 do CPC); II. A ter feito a aplicação da lei, que se crê, salvo melhor opinião, ser a correcta, e com maior sentido de justiça, atento os factos dados por provados, tal decisão teria sido outra completamente distinta da assente no douto Acórdão proferido; III. Tal desiderato expresso no acórdão em crise viola as seguintes normas: artigo 1305.º, artigo 1311.º, 1287.º, 1293.º, al. a), 1297.º ss e 1300.º, n.º 1, 342.º e 1383.º do Código Civil; IV. A decisão proferida descura factos, dados por provados, pelo digníssimo tribunal de primeira instância, na subsunção do direito que faz, o que por via de...
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