Acórdão nº 1231/14.1TBCSC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução13 de Setembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL I – Relatório 1. AA, solteiro, maior, com residência na Rua …, n.º …, 2º esquerdo, …, Loures, intentou a presente ação declarativa de condenação com processo comum contra Estado Português, representado pelo Ministério Público; BB, por si e em representação do seu filho menor, CC, com domicilio profissional na Av.ª …., n.º …, 6º-esq, Lisboa; e DD, com residência na Rua …, n.º …, 2º- esq, Lisboa, pedindo que seja declarada a nulidade da hipoteca registada sob a Apresentação 36 de 13-5-2008, incidente sobre a fracção autónoma designada pela letra H, do prédio com a ficha 3…0 da Freguesia do …, da 2ª Conservatória do Registo Civil de Cascais, e ordenado o cancelamento do respetivo registo.

Alegou, para tanto e em síntese, que a sentença homologatória do acordo efetuado entre os réus, BB e DD, no âmbito do respetivo processo de divórcio por mútuo consentimento e por via do qual ficou estabelecido que a pensão de alimentos devida ao filho menor de ambos, CC, pelo ora réu, DD, é de 750,00 euros mensais, ficando a mãe com a guarda e o exercício das responsabilidades parentais, não constitui título suficiente para fundamentar o registo da hipoteca para garantia dos alimentos devidos ao menor CC, porquanto dela não consta qualquer referência aos bens do pai do menor a hipotecar nem ao montante máximo a assegurar, não podendo a mãe do menor, a ré BB, sem intervenção do Conselho de Família, definir o objeto da hipoteca legal e o montante máximo garantido.

Concluiu pela nulidade do registo da hipoteca, nos termos do artigo. 16º, b) e c) do CRP.

  1. Citados os réus, só o Estado Português e a ré BB contestaram.

    O reú Estado Português arguiu a sua ilegitimidade e pugnou pela improcedência do pedido do autor, defendendo que a hipoteca legal em causa nos autos foi validamente registada por a sentença homologatória supra referida constituir título suficiente para o efeito, atento o disposto nos arts. 704º, 705º, d) e 708º, do C. Civil.

    Por sua vez, sustentou a ré BB que os argumentos invocados pelo autor foram já apreciados pelo Conselho Técnico do Instituto dos Registos e Notariado, que concluiu não lhe assistir razão.

    Mais alegou que o contrato promessa de compra e venda celebrado em 10.12.2010, entre o autor e o réu DD é posterior ao registo da hipoteca legal, pelo que o autor não podia desconhecer a sua existência e que o referido contrato constitui uma simulação absoluta com o único intuito de defraudar credores, do que é bem revelador o preço declarado de 40.000,00 euros quando é certo ter o imóvel em causa sido comprado pelo promitente vendedor pelo valor de 344.170,00 euros.

    Concluiu pela legalidade da constituição e registo da hipoteca, pugnando pela improcedência da ação e pela sua absolvição do pedido.

  2. Dispensada a audiência prévia, foi elaborado despacho saneador, que julgou procedente a exceção dilatória da ilegitimidade passiva do Réu Estado Português, absolvendo-o da instância.

  3. Entendendo-se ser possível conhecer imediatamente do mérito, sem necessidade de mais provas, nos termos do disposto no artigo 595º, 1, b) do CPC, foi proferida decisão que julgou a ação totalmente improcedente e, em consequência, absolveu os réus dos pedidos. 5. Inconformado com esta decisão, dela apelou o autor para o Tribunal da Relação de … que, por acórdão proferido em 13.12.2017, sem voto de vencido e fundamentação essencialmente diferente, confirmou a sentença recorrida.

  4. Mais uma vez inconformado, veio o autor interpor recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça, invocando, para o efeito, os pressupostos referidos nas alíneas a) e b) do nº 1 do art. 672º do CPC e terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem: «1 - Saber se uma sentença homologatória de divórcio por mútuo consentimento é título bastante para constituição e registo de hipoteca legal para garantia de alimentos devidos a menor por um dos progenitores, se a mãe, a quem cabe o exercício em exclusivo das responsabilidades parentais, pode suprir as insuficiências daquela sentença, no que respeita à determinação do valor da hipoteca, e se pode escolher os bens do pai a onerar, se a mãe, única representante legal do menor, pode, sem intervenção do Conselho de Família e sem intervenção de um tribunal, determinar o valor da hipoteca e os bens a hipotecar, e se os números 1 e 2 do artigo 706.° do Código Civil têm aplicação, ou não, ao caso de menor representado apenas pela mãe, sendo os imóveis a hipotecar propriedade do pai, constitui questão com relevância jurídica que merece ser dirimida para melhor aplicação do Direito, estando igualmente em causa interesses de particular relevância social, atenta a elevada importância do instituto dos alimentos devidos a menor pelos seus progenitores, no seio da comunidade.

    2 - A sentença homologatória de divórcio por mútuo consentimento, com o acordo de fixação de alimentos a favor de filho menor, não é título bastante para registo de hipoteca legal, dado que é omissa quanto à determinação do valor a assegurar, quanto à determinação do valor da hipoteca ou hipotecas, e determinação do imóvel ou imóveis a hipotecar.

    3 - As declarações complementares do progenitor, que exerce as responsabilidades parentais em exclusivo, quanto ao montante máximo a assegurar e determinação dos imóveis do outro progenitor, devedor dos alimentos, a onerar, não suprem aquela insuficiência da sentença homologatória nem constituem título bastante para registo e constituição de hipoteca legal.

    4 - O artigo 706.° n.° 1 do Código Civil estipula que a determinação do valor da hipoteca estabelecida a favor de menor, interdito ou inabilitado, para efeitos de registo, e a designação dos bens sobre que há-de recair, cabem ao Conselho de Família, e não distingue entre menor representado por progenitor, a quem cabe o exercício das responsabilidades parentais, e menor representado por tutor, se bem que esta distinção poderia resultar do seu número 2, que estipula que tem legitimidade para pedir o registo qualquer parente do menor (e não o progenitor, ou progenitores), podendo depreender-se que se refere aos menores representados (apenas) por tutor.

    5 - Se, pelo contrário, se retira do n.° 2 do artigo 706.° do CC que a mãe, única titular do exercício das responsabilidades parentais, por ser parente do menor, tem legitimidade para pedir o registo de hipoteca legal, então este número 2 não pode ser aplicado desconsiderando o estabelecido no número 1, havendo que concluir que o progenitor que representa o menor só tem legitimidade para requerer o registo de hipoteca legal, depois da referida determinação pelo Conselho de Família, em vista do n.° l do citado artigo 706.° do CC.

    6 - Inexiste razão ética ou legal para diferenciar entre credor de alimentos menor, representado por progenitor, e credor de alimentos menor, representado por tutor, pelo que tem que entender-se que o legislador no n.° 2 do artigo 706.°do C.C., quanto a legitimidade para requerer o registo, também quis referir-se ao progenitor que representa o menor, e, por consequência tem aplicação o número 1 do preceito.

    7 - Estando o menor representado apenas pela mãe, não se entendendo como acima, por não haver lugar à constituição de Conselho de Família, dado não ser caso de tutela obrigatória de incapaz menor de idade, então ela terá que suscitar a intervenção de um tribunal e obter decisão que constitua título bastante para a hipoteca legal, respectivo valor e quais os bens do progenitor devedor dos alimentos a hipotecar.

    8 - O espírito do sistema é não deixar ao livre arbítrio do representante legal do menor, trate-se de um progenitor ou de ambos os progenitores, ou trate-se de tutor...

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