Acórdão nº 181/12.0TBPTG.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelJOSÉ RAINHO
Data da Resolução18 de Setembro de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção): I - RELATÓRIO AA demandou, pelo Tribunal Judicial de Portalegre e em autos de ação declarativa com processo na forma ordinária, BB, S.A., peticionando a final (após liquidação de parte do pedido) a condenação desta no pagamento da quantia de €123.079,00, acrescendo juros de mora desde a citação.

Alegou para o efeito, em síntese, que quando, cumprindo todas as devidas regras de trânsito, conduzia o seu veículo automóvel matrícula -BX- foi vítima de acidente de viação causado pelo condutor do veículo automóvel matrícula -QF, que, circulando em sentido contrário, em excesso de velocidade de forma imprudente, foi invadir a hemifaixa por onde seguia o veículo do Autor, indo assim colidir violentamente contra este.

Por efeito do acidente o Autor sofreu os danos patrimoniais e não patrimoniais que descreve.

O dono do veículo matrícula -QF havia transferido para a Ré a responsabilidade civil inerente ao uso e circulação desse veículo, razão pela qual está esta obrigada a indemnizar o Autor pelo dano advindo.

Contestou a Ré, impugnando parte dos factos e concluindo pela improcedência parcial da ação.

Seguindo o processo seus termos, veio, a final a ser proferida sentença (Juízo Cível da Instância Central da Comarca de Portalegre) que, em procedência parcial da ação, condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia indemnizatória de €53.298,50 (sendo €45.000,00 a título de danos não patrimoniais e de €8.298,50 a título de danos patrimoniais), acrescida de juros desde a citação.

Inconformado com parte do decidido, apelou o Autor.

Fê-lo com êxito, pois que a Relação de Évora mais condenou a Ré a pagar ao Autor a quantia de €20.000,00 (acrescendo juros) a título de danos patrimoniais futuros.

É agora a vez da Ré, inconformada com esta acrescida condenação, pedir revista.

Da respetiva alegação extrai a Recorrente as seguintes conclusões:

  1. O presente recurso vem interposto do douto acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, que julgou a apelação do Autor procedente, alterando a decisão proferida em primeira instância quanto à matéria de direito e, em consequência, os termos da responsabilidade da ora Recorrente, tendo, ainda, alterado os montantes indemnizatórios atribuídos ao Autor.

  2. Com a apresentação do presente recurso, pretende a Recorrente impugnar a decisão proferida quanto à matéria de Direito, nos termos do disposto no artigo 674.°, n.º 1, alínea a) do CPC, pois, no seu entendimento, verificou-se uma errada interpretação e aplicação das normas de direito, o que impunha uma decisão diversa da proferida pelo Tribunal recorrido. A isto acresce que a Ré considera que o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, enferma de nulidade por excesso de pronúncia.

  3. Assim, na sua apelação, o Autor veio requerer a revogação da sentença proferida pelo Tribunal de primeira Instância, invocando a sua nulidade por omissão de pronúncia, uma vez que na sua opinião, o Tribunal a quo não se teria pronunciado quanto à peticionada indemnização pelos danos patrimoniais futuros.

  4. Relembre-se que a sentença em apreço, havia absolvido a Recorrida, ora Recorrente, do pagamento da quantia de € 20.000,00 peticionada a título de indemnização pelo dano futuro, tendo-a condenado ao pagamento da quantia de € 45.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais e de €8.298,50 a título de indemnização pelos danos patrimoniais, acrescido dos juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal de 4%, desde citação até efetivo e integral pagamento.

  5. Dando provimento ao recurso apresentado pelo Autor, o Tribunal da Relação considerou inexistir qualquer nulidade da sentença por omissão de pronúncia, tendo, contudo, concluído pela existência de erro de julgamento no que respeita à atribuição de indemnização quanto aos danos patrimoniais, na vertente de danos futuros.

  6. Em conformidade, revogou a decisão proferida em primeira instância, julgando totalmente procedente a apelação e condenando a Recorrente no pagamento da quantia de €20.000,00 a título de indemnização por danos patrimoniais futuros, mantendo a sentença proferida em tudo o restante, ascendendo assim, a condenação no pagamento de indemnização de danos patrimoniais, ao montante global de €28.298,50 (vinte e oito mil duzentos e noventa e oito euros e cinquenta cêntimos).

  7. Todavia, verifica-se que no recurso apresentado, o Autor invoca única e exclusivamente a nulidade da sentença, por alegada omissão de pronúncia quanto aos peticionados danos patrimoniais futuros, nos termos do artigo 615.°, n.º 1, alínea d) do CPC. Sendo indubitável que o Tribunal da Relação considerou que “não obstante as razões invocadas nas conclusões do recurso justificarem no entender do recorrente, uma decisão diferente e apesar de nem todos esses fundamentos terem sido, pelo menos expressamente, considerados na decisão recorrida, tal circunstância não faz com que a mesma padeça da nulidade que ora lhe é imputada.”.

  8. Ou seja, no aresto em apreço decidiu-se pela inexistência de qualquer nulidade da sentença da primeira instância, pelo que, em conformidade, os poderes de recurso se esgotaram nessa mesma consideração, não se podendo proceder ao julgamento da interpretação das normas jurídicas invocadas, decidindo em sentido contrário ao da sentença primitiva, pois tal não foi em momento algum invocado pelo Autor nas suas conclusões de recurso.

  9. A lei processual civil é clara ao estabelecer a nulidade, do acórdão que se pronuncie e condene em "quantidade superior ou em objecto diferente do pedido", de acordo com a alínea d), do n.º 1 do artigo 615.° do CPC, ex vi artigo 666. ° do CPC. Sendo que, o Recorrente tem o ónus de alegar e formular conclusões, delimitando concretamente o objecto do seu recurso, limitando assim os poderes de decisão do tribunal de recurso, nos termos e para os efeitos dos artigos 639.°, n.º 1 e 635.°, n.º 4 do CPC.

  10. Neste sentido, “O excesso de pronúncia verifica-se quando o Tribunal conhece, isto é, aprecia e toma posição (emite pronúncia) sobre questões de que não deveria conhecer, designadamente porque não foram levantadas pelas partes e não eram de conhecimento oficioso. Por outras palavras (.) o excesso de pronúncia consiste numa apreciação ou decisão sobre questão que ultrapassa o quanto é submetido pelas partes ou imposto por lei à consideração do julgador.”- vide Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30/09/2010.

  11. Veja-se ainda o Acórdão deste douto tribunal, de 06/12/2012, que de forma sucinta descreve o excesso de pronúncia explicando o que são as questões que devem ser decididas pelo tribunal: “Ao que sejam “questões”, para estes efeitos, respondem Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto no Código de Processo Civil Anotado, 2.°, 2.ª edição, pág. 704: são “todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer", não significando "considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito (artigo 511-1) as partes tenham deduzido...

    “ (página 680). (...) há excesso de pronúncia para estes efeitos, se o tribunal conheceu de pedidos, causas de pedir ou exceções de que não podia tomar conhecimento”.

  12. Sem prescindir, sempre se refira que, quando o Autor limitou o objecto do seu recurso à questão da nulidade da sentença, tudo o resto julgado em primeira instância transitou em julgado, não podendo mais ser alterado o valor que lhe foi atribuído a esse título. Neste sentido, por exemplo, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 07/10/2003, considera que quanto ao “Na verdade, a parte não recorrida da sentença de la instância transitou em julgado, sendo que, por força do disposto no artigo 684°, n°. 4 do Código Processo Civil, os efeitos deste caso julgado formal formado na sequência da não impugnação parcial dessa decisão ou da não impugnação válida (...) não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo.

    Efectivamente, “e como tem sido entendido neste Supremo Tribunal, todas as questões e excepções suscitadas e solucionadas na sentença, por imperativo legal e conexas com o direito a que se refere a pretensão do autor, estão compreendidas na expressão "precisos limites e termos em que se julga", contida no artigo 673° do Código Processo Civil, ao definir o alcance do caso julgado material, pelo que também se incluem neste". Assim sendo, à Relação não era lícito decidir sobre questões definitivamente decididas, pelo que, tendo conhecido de questões não colocadas pelas partes nas conclusões das alegações de recurso respectivas, proferiu decisão contraditória sobre a mesma pretensão, devendo cumprir-se, pois, a decisão que passou em julgado em primeiro lugar e que, a final, se reiterará - artigo 675°, n.ºs. 1 e 2 do Código Processo Civil. Desta sorte, considerando verificada a invocada nulidade por excesso de pronúncia, este Supremo Tribunal suprirá tal nulidade, declarando que deve manter-se a decisão da 1ª instância”.

  13. Pelo que, em suma, não poderia o Tribunal da Relação de Évora ter conhecido, como fez, das questões relacionadas com o valor arbitrado a título de indemnização pelos danos patrimoniais futuros, fundando a sua decisão em erro de fundamentação, e alterando o caso julgado quanto a esta matéria, que, se ficou pela não atribuição de qualquer indemnização a este título ao Recorrido.

  14. Sem prescindir, e por mera cautela de patrocínio se admitindo, o aresto ora em escrutínio vem condenar a Recorrente no pagamento da quantia de €20.000,00 por danos patrimoniais futuros, a acrescer ao valor que já tinha sido arbitrado na 1. a instância. E, não obstante o devido respeito pela interpretação do Tribunal a quo, a decisão proferida fundamenta-se na errónea aplicação das normas concretamente aplicáveis à presente situação, uma vez que, partindo dos factos dados como provados e não provados no processo, jamais poderia ser arbitrada qualquer indemnização a...

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