Acórdão nº 2909/10.4TBVCD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelMARIA DO ROSÁRIO MORGADO
Data da Resolução14 de Junho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório 1.

“AA, S.A..

[1] instaurou contra BB, S.A.

. (doravante 1ª ré) , CC - Seguros, S.A..

(doravante 2ª ré), DD - Companhia de Seguros, S.A..

(doravante 3ª ré), EE PLC (doravante 4ª ré), FF - Produtos Alimentares, S.A.

(doravante 5ª ré), GG - Construção e Manutenção, S.A.

(doravante 6ª ré), e HH, S.A..

(doravante 7ª ré) a presente ação declarativa de condenação, pedindo a condenação solidária das rés a pagar-lhe a quantia de EUR 818.360,53 acrescida de juros de mora vencidos desde 23/11/2010 e vincendos até integral pagamento, sobre o montante de EUR 749.743,59.

Para tanto, alegou, em síntese, que: A autora é uma sociedade de seguros, com sede em Espanha, tendo contratado com a sociedade II, S.A. um seguro multirriscos da atividade da segurada em Portugal, o que fizeram ao abrigo da apólice nº BG…3, emitida em 29.12.2006.

A II, S.A. dedica-se ao comércio por grosso de bens de consumo e utilizava, para o efeito, dois armazéns sitos nos pavilhões 7 e 8, da Zona Industrial de V….

No pavilhão 6 do mesmo loteamento industrial da V… exerce a ré BB, SA a atividade de serviços de limpeza de componentes mecânicos e de pintura, recolha e reutilização de resíduos.

No dia 8 de outubro de 2009, um veículo automóvel pertencente à 1ª ré, transportando produtos perigosos, ao efetuar uma manobra de marcha atrás para entrar no pavilhão 6, explodiu e pegou fogo ao dito armazém, que se propagou aos pavilhões 7 e 8 da segurada da autora, provocando a sua destruição.

À data do acidente, a 1ª ré tinha em vigor os seguintes seguros:

  1. Seguro de responsabilidade civil automóvel, abrangendo o veículo que explodiu, contratado com a ré CC - Seguros, SA; b) Seguro de responsabilidade civil geral contratado com a ré Lusitânia SA; c) Seguro titulado pela apólice denominada “Master Liability Policy” contratado com a ré EE PLC.

    O veículo transportava mercadoria pertencente às rés FF, GG e HH, as quais tinham incumbido a 1ª ré de recolher nas suas instalações.

    O acidente ocorreu por culpa da 1ª ré (e do seu motorista) que não observaram as regras de segurança, nem adotaram as medidas necessárias a evitar a explosão.

    Por sua vez, as 2ª, 3ª e 4ª rés assumiram, nos termos dos contratos celebrados com a 1ª ré, a responsabilidade pelos riscos da atividade desta.

    As 5ª, 6ª e 7ª rés, enquanto proprietárias e produtoras dos resíduos transportados, devem também responder solidariamente pelos danos causados.

    Em consequência do sinistro, a autora indemnizou a sua segurada, pelo montante de EUR 749.743,59, cujo reembolso, ao abrigo da declaração de «sub-rogação» constante do documento de fls. 77, do apenso C, veio agora, por esta via, peticionar.

    1. Regularmente citadas, as rés, com exceção da ré DD, contestaram.

      A 1ª ré alegou, em síntese, que[2]: Por contrato de seguro celebrado com a CC, SA, a contestante transferiu para aquela seguradora a responsabilidade que pudesse emergir de todo e qualquer evento danoso quanto a sinistros ocorridos com o veículo seguro.

      Ainda que assim não fosse, o evento estaria coberto pelo contrato de seguro celebrado com a 3ª ré, nos termos do qual se encontra garantida a responsabilidade civil geral emergente da atividade desenvolvida pela 1ª ré.

      Mesmo que se entenda que os danos não poderiam ser ressarcidos ao abrigo do contrato celebrado com a 3ª ré, recairia sobre a 4ª ré a responsabilidade pelo ressarcimento de eventuais danos, atendendo aos termos da apólice contratada entre a 1ª ré e a 3ª ré.

      Mais alegou que: O evento pode ter sido causado por vários fatores e atos de terceiro, quebrando o nexo de causalidade entre os riscos próprios do veículo e os danos alegadamente sofridos pela segurada da autora.

      Em todo o caso, nem a ré, nem o seu motorista agiram com culpa, pois foram cumpridos todos os procedimentos e exigências legais necessárias ao transporte de mercadorias perigosas.

      Concluiu, pedindo a sua absolvição do pedido.

      A 2ª ré alegou, em síntese, que:[3] O sinistro se ficou a dever única e exclusivamente à explosão da carga transportada, concretamente de peróxido orgânico, o qual foi transportado, em violação de regras de segurança que a 1ª ré não podia desconhecer.

      Por outro lado, o veículo, no momento do sinistro, não se encontrava em circulação, pelo que o sinistro se encontra excluído da garantia do contrato de seguro, celebrado com a 1ª ré.

      Conclui pela sua absolvição do pedido.

      A 3ª ré não contestou.

      A 4ª ré sustenta, fundamentalmente, que[4]: Estando em causa um sinistro automóvel, a responsabilidade civil pelos respectivos danos deve ser assumida pela seguradora que celebrou com a 1ª ré seguro de responsabilidade civil automóvel, ou, caso o evento seja imputado a conduta infratora de clientes da 1ª ré, pelas seguradoras para quem estes transferiram a responsabilidade pela ocorrência de tais danos.

      Atenta a natureza do sinistro, a ora contestante não pode ser responsabilizada pelo ressarcimento dos danos aqui em causa, por estar excluída da cobertura da apólice contratada, podendo, quando muito, a responsabilidade ser atribuída à ré DD.

      Conclui pela sua absolvição do pedido.

      A 5ª ré alega, em síntese, que[5]: A explosão invocada não foi causada pelo transporte em si mas pela indevida e incorreta disposição e mistura no camião dos diversos materiais perigosos transportados pela 1ª ré e ainda pelos efeitos da circulação rodoviária e da descrita manobra de estacionamento junto às instalações e, portanto, quando ocorreu a explosão, o camião já tinha concluído o transporte e chegado a destino e que a autora não invoca factos consubstanciadores do valor que diz ter pago.

      Conclui pela absolvição da instância, se assim se não entender, do pedido já no despacho saneador.

      Na sua contestação[6], a 6ª ré sustenta, em suma, que celebrou com a 1ª ré um contrato de prestação e serviços, pelo qual esta se comprometeu a recolher determinados resíduos, dando-lhes o destino adequado.

      No âmbito desse contrato, a 6ª ré entregou à 1ª ré determinada mercadoria, a qual foi devidamente acondicionada, sem fugas ou derrames, estando os resíduos líquidos e pastosos depositados em embalagens estanques e os sólidos nas respectivas embalagens, convenientemente cobertas e cintadas.

      A ré agiu em conformidade com todas as regras, pelo que nenhuma conduta da sua parte originou o sinistro.

      Além disso, a ré entregou os resíduos a um operador licenciado, o que acarreta a extinção de eventual responsabilidade do produtor dos resíduos.

      Conclui pela absolvição do pedido.

      A ré HH SA[7] alegou, fundamentalmente, que entregou à 1ª ré uma caixa de cartão com lâmpadas fluorescentes ao abrigo de um contrato de recolha de resíduos e que o malogrado motorista da 1ª ré rececionou as lâmpadas em recipiente pré-definido contratualmente, da escolha e propriedade da 1ª ré e que o mesmo acondicionou na viatura como entendeu.

      Uma vez que as lâmpadas não são inflamáveis, o incêndio e a explosão foram provocados por outros produtos transportados no camião, a ré em nada contribuiu para a produção do sinistro.

      Acresce que, nos termos da lei, a responsabilidade do produtor de resíduos se extingue pela sua transmissão a operador licenciado, como era o caso da 1ª ré.

      Conclui pela improcedência da ação.

    2. Houve réplica.

      [8] 4.

      O presente processo, instaurado em 24.11.2011 com o nº 3278/11.0TBVCD, bem como outros em que estava em causa o mesmo acidente e o apuramento das suas consequências, foi, entretanto, apensado ao processo nº 2909/10.4.TBVCD passando a constituir o seu Apenso C.

    3. Foi realizada transação sobre o objeto da lide, envolvendo a ação principal e todas as demais que lhe estão apensas, com exceção do suprarreferido apenso C, transação que foi homologada por sentença, transitada em julgado.

      [9] 6.

      Suscitada nos autos a questão da nulidade do contrato de seguro ao abrigo do qual a autora alegou ter ressarcido os danos sofridos pela sua segurada II, S.A. e da ineficácia do direito de sub-rogação,[10] foi proferida decisão[11] que “julgou verificada a exceção perentória de nulidade externa do contrato de seguro e ineficácia da sub-rogação nos termos da qual a autora assenta o exercício do direito que peticiona às rés, impondo-se, em sequência e por via disso, a improcedência da ação intentada, absolvendo-se as rés do pedido”.

    4. Inconformada com esta decisão, dela apelou a autora, tendo o Tribunal da Relação do Porto, proferido acórdão em que, julgando parcialmente procedente a apelação, revogou a sentença na parte em que declarou a ineficácia da sub-rogação, confirmando quanto ao mais a decisão da 1ª instância.

    5. Inconformadas com o assim decidido, as rés interpuseram recurso para este Supremo Tribunal.

      8.1.

      A ré FF, SA, nas suas alegações, em conclusão, disse: 1. É um facto incontornável - porque resulta dos autos - que a A. conformou a causa de pedir e o pedido, exclusivamente, em função do contrato de seguro e da sub-rogação com base nesse mesmo contrato.

    6. A declaração a que se refere o "Facto 18" decorre lógica, necessária e incindivelmente do invocado contrato de seguro e da respectiva cláusula transcrita no "Facto 17", tendo portanto de entender-se como declaração de sub-rogação nos termos e com fonte no próprio contrato e não como convenção autónoma de sub-rogação.

    7. O douto acórdão ora recorrido decidiu bem ao confirmar a nulidade do contrato de seguro, mas erradamente ao julgar a sub-rogação como um efeito desse contrato de seguro por ela anteriormente declarado nulo.

      3-A. A sub-rogação consiste na substituição do credor [neste caso a A.) na titularidade do direito a uma prestação fungível [nestes caso a exigir dos RR), pelo terceiro (neste caso a A.) que cumpre em lugar do devedor (neste caso, supostamente, os RR.].

    8. Por força do art. 289º, 1 do CCivil, a nulidade do contrato de seguro tem efeito retroativo, no sentido de que a produção dos seus efeitos tem-se por excluída ab initio, desde a origem do mesmo, ou seja, reporta-se à data da sua formação, em 29-12-2006, e faz com que o...

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