Acórdão nº 1329/15.9T8BGC.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 24 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelSOUSA LAMEIRA
Data da Resolução24 de Maio de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO l.

AA, Lda, instaurou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma comum, contra, BB, Lda, alegando, em resumo, que: Celebrou com a Ré, em 26/11/2012, um contrato de prestação de serviços de consultoria e assessoria financeira para a elaboração de uma candidatura, por parte da mesma, a um programa de incentivos financeiros do Fundo de Turismo (FT), no âmbito do QREN, para um empreendimento hoteleiro.

Por essa sua actividade, receberia uma contrapartida financeira, com uma componente fixa e outra variável.

Assinado o contrato, preparou, elaborou e submeteu à competente aprovação a dita candidatura, tal como prestou os esclarecimentos complementares que lhe foram solicitados. E também a Ré prestou outras informações, embora à sua revelia. Aliás, à sua revelia também, acabou por desistir da candidatura em causa.

Em Fevereiro de 2013, no entanto, a Ré, apresentou outra candidatura, através de uma outra consultora, mas baseou-se, essencialmente, na sua proposta, tendo logrado obter um incentivo de 3.854.187,15 €, sem nada lhe ter pago, a título de remuneração variável.

Conclui pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe:

  1. A quantia de 57.812,81 €, mais IVA à taxa em vigor de 23%, no total de 71.109,76 € a título de preço devido pelos serviços prestados pela A. à Ré e não pagos, acrescida de juros desde 17/09/2013 até integral pagamento, à taxa supletiva de juros comerciais a todo o tempo em vigor, que se calculam em 10.154,18 €, à data de 01/09/2015, perfazendo o montante total de 81.263,94 €; b) Subsidiariamente, por violação dos direitos autorais da A., a pagar-lhe o mesmo montante, ou seja, 71.109,76 € acrescido de juros desde 18/02/2013 até integral pagamento, à taxa supletiva de juros comerciais a todo o tempo em vigor, que se calculam em 13.423,77 €, à data de 01/09/2015, perfazendo o montante total de 84.533,53 €.

  2. Ainda subsidiariamente, na medida do enriquecimento sem causa, no mesmo valor de 71.109,76 €, acrescida de juros à taxa supletiva de juros comerciais desde a data da citação até integral pagamento.

    1. A Ré contestou refutando a pretensão da A., porquanto, em suma, a A. não levou a cabo nenhum dos serviços a que se obrigara para consigo, sendo certo que já lhe pagou todos os valores que lhe devia.

      Além disso, nega ter utilizado conteúdos produzidos pela Ré, protegidos por direitos de autor.

      Conclui pedindo a improcedência da acção e a condenação da A. como litigante de má-fé.

    2. Na resposta a A. reafirmou a sua tese inicial e pede também a condenação da Ré como litigante de má-fé.

      4 - Dispensada que foi a realização da audiência prévia, foram seleccionados os temas da prova.

      Realizou-se a audiência de julgamento com observância do legal formalismo, e, a final, foi proferida sentença que julgou a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a Ré a pagar à A. a quantia de 28.906,00 €, acrescida de juros de mora à taxa de 4%, desde a data da sentença e até efectivo e integral pagamento.

      5.

      Inconformada, apelou a Ré para o Tribunal da Relação de …, que, por Acórdão de 12 de Outubro de 2017, decidiu «em conceder provimento ao presente recurso e, consequentemente, revoga-se a sentença recorrida e absolve-se a Ré de todos os pedidos contra ela deduzidos pela A».

    3. Inconformada, a Autora AA, Lda, interpôs Recurso de Revista para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou as seguintes conclusões: 1.

      A recorrente contra-alegou em tempo, conforme peça que consta do Citius (24/03/2017, ref8 836493).

    4. A sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar (art. 615°, n° 1, al. d), ex vi art. 666° do CPC).

    5. A desconsideração das contra-alegações da recorrente integra aquela previsão legal, pois, de facto, houve omissão de pronúncia, sendo o douto acórdão recorrido nulo nos termos daquela disposição, aplicável por força do art. 666°, n° 1 do CPC.

    6. Mesmo que assim não se entenda, o lapso da secretaria constitui irregularidade que influi no exame e na decisão da causa, pelo que, também por esse motivo, o douto acórdão recorrido é nulo.

    7. A interpretação que a A. fez dos factos conduziu-a ao pedido principal: o pagamento do preço acordado. Porém, o Mmo. Juiz não está condicionado pelas alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.

    8. Sendo a pretensão principal da A. o pagamento de quantia certa, tanto é lícito ao Mmo. Juiz condenar a Ré em quantia determinada a título de preço como a título de indemnização, conforme a interpretação que faça dos factos provados e aplicação das regras de direito que considere mais adequadas -art. 5o, n° 3 do CPC.

    9. Não se verifica qualquer nulidade da sentença da primeira instância nos termos do art. 615°, n° 1, al. d) do CPC.

    10. O contrato deve ser interpretado e integrada a declaração negocial das partes, no sentido de que a desistência da candidatura por banda da Ré e a aprovação do projecto com base em nova candidatura alicerçada no trabalho da A. produz os mesmos efeitos que a denúncia pela Ré operada após a conclusão dos trabalhos e entrega dos dossiês de candidatura ao QREN e os apoios sejam aprovados, ou seja, a obrigatoriedade do pagamento da componente variável - arts. 236°. 237° e 239° do C. Civil.

    11. Perante o vazio da inexistência de denúncia, terá que se considerar que a Ré não fica desobrigada do pagamento da componente variável porque o projecto prosseguiu e os apoios foram aprovados, com base no trabalho da A., pelo que o pedido principal deve proceder caso se mantenha a nulidade da sentença da primeira instância.

    12. Está provada a violação por banda da Ré dos direitos de autor de que a A. é titular e as perdas e danos da A. que correspondem ao valor que deixou de receber por via da componente variável.

    13. Na impossibilidade de se fixar o montante do prejuízo efectivamente sofrido pela parte lesada, pode o tribunal estabelecer uma quantia fixa com recurso à equidade - art. 211º, n° 5 do DL n.º 63/85 12.

      A Ré enriqueceu na exacta medida do empobrecimento da A., ou seja, o valor da componente variável.

    14. Em sede de enriquecimento sem causa, é lícito ao tribunal fixar o quantum indemnizatório com recurso à equidade nos termos do art. 566°, n° 3 do CC.

    15. O douto acórdão recorrido viola os princípios da economia processual e da garantia de acesso aos tribunais (na parte em que se pugna por decisão em prazo razoável (art. 2º do CPC)), pretendendo remeter a A. a uma nova acção quando estão já reunidos todos os elementos suficientes para se julgar definitivamente o litígio que opõe a A. à Ré.

      7.

      A Ré não apresentou contra-alegações.

    16. O Tribunal da Relação conheceu das invocadas nulidade e irregularidade, desatendendo a arguição das mesmas (fls. 659 e 660).

      A fls. 666 admitiu o recurso.

      Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

      II – FUNDAMENTAÇÃO Foram dados como provados os seguintes factos: 1) A A., anteriormente denominada CC, Lda, é uma sociedade por quotas que tem por objecto a consultoria económica e financeira de apoio à gestão e ao investimento, investigação de mercados, formação profissional, auditoria, contabilidade, acções de promoção e marketing, cooperação e assessoria técnica em actividades conexas, investimento imobiliário incluindo a aquisição de imóveis para revenda, e a comercialização, importação, exportação, distribuição, armazenagem, promoção e registo comerciais de produtos alimentares e não alimentares.

      2) A Ré é uma sociedade por quotas constituída em 21.01.2010, que tem por objecto estatutário a exploração de estabelecimentos hoteleiros com restaurante e a gestão e exploração de parques aquáticos; originariamente constituída com vista á construção e exploração de um parque aquático e de um hotel, posteriormente, com a constituição da “BB Animações”, passou a promover apenas os projectos relativos ao hotel, sendo que esta passou a promover os projectos do parque aquático.

      Tal constituição foi feita a conselho do Turismo.

      3) Entre A. e Ré foi celebrado, em 26 de Novembro de 2012, o acordo, reduzido a escrito, denominado “Contrato de Prestação de Serviços”.

      4) Por via daquele acordo, a Ré contratou à A. “serviços de consultoria turística e assessoria económico-financeira para a elaboração da candidatura ao QREN e/ou Linha de Apoio à Qualificação da Oferta para um empreendimento para alojamento turístico de tipologia unidade hoteleira a realizar na freguesia de …...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT