Acórdão nº 25261/11.6T2SNT-D.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Setembro de 2018
Magistrado Responsável | GRAÇA AMARAL |
Data da Resolução | 11 de Setembro de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na 6ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça, I – relatório 1. Nos autos de reclamação e graduação de créditos referente a AA - Construções, Lda, declarada insolvente por sentença de 31-01-2012, a Administradora da Insolvência, em 03-05-2021, juntou lista dos créditos reconhecidos (fls. 3 dos autos), fazendo constar quanto à credora BB - Imóveis Unipessoal, Lda. o crédito no valor de 282.362,74€ (280.000€ de capital e o restante a título de juros vencidos) atribuindo-lhe a natureza de crédito privilegiado (direito de retenção) com fundamento em incumprimento do contrato promessa. 2. Impugou o referido crédito a Caixa económica CC(fls. 5/25) defendendo a ineptidão da reclamação apresentada pela BB - Imóveis Unipessoal, Lda., o não reconhecimento do respectivo crédito e, subsidiariamente, a sua qualificação como privilegiado.
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No saneador o tribunal reconheceu os créditos reclamados e não impugnados, julgou improcedente a impugnação na parte em que pugnava pela ineptidão da reclamação de créditos, determinou o objecto do litígio (caracterização e reconhecimento do crédito reclamados por BB - Imóveis Unipessoal, Lda.) e fixou os temas de prova (257/258).
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Realizado julgamento foi proferida sentença na qual foi decidido: “A) Absolver da instância de impugnação a impugnada BB - Imóveis Unipessoal, Lda. na parte relativa ao reconhecimento dos direitos de crédito e de retenção sobre os imóveis a que respeitam as verbas 8 e 9 do auto de apreensão.
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Julgar reconhecido o crédito reclamado por BB - Imóveis Unipessoal, Lda., no montante de € 280.000,00 de capital, acrescida da quantia de € 2.362,74, de juros de mora liquidados desde 08.01.2010 até à data da entrada da execução, em 26.03.2010.
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Julgar não reconhecido o direito de retenção invocado pelo reclamante BB- Imóveis Unipessoal, Lda. relativamente aos imóveis a que respeitam as verbas 5 e 6 do auto de apreensão, em consequência qualificando como comum o crédito no montante global de € 159.348,00, proveniente do incumprimento das respectivas promessas de venda.
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Consignar que o direito de retenção de que beneficia BB - Imóveis Unipessoal, Lda. relativamente aos imóveis a que respeitam as verbas 8 e 9 do auto de apreensão, garante o pagamento da quantia de €60.326,00, relativamente a cada um dos referidos imóveis.
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Graduar os créditos reconhecidos nos seguintes termos: 1. Pelo produto da venda do veículo automóvel a que respeita a verba 1 do auto de apreensão, bem assim como de outros bens móveis ou direitos eventualmente apreendidos dar-se-á pagamento pela ordem seguinte: 1.° Caixa Económica CC, até ao montante de € 51.000,00 (cinquenta e um mil euros); 2.° Os créditos comuns, se necessário em rateio, na proporção dos respectivos montantes; 2. Pelo produto da venda do imóvel a que respeita a verba 2 do auto de apreensão dar-se-á pagamento pela ordem seguinte: 1.° Autoridade Tributária, pelos montantes de IMI que corresponderem ao referido imóvel, de acordo com a especificação apresentada pelo Ministério Público em 25.11.2016, a fls. 197/198 do processo em papel.
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Banco DD, S.A.
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Os créditos comuns, se necessário em rateio, na proporção dos respectivos montantes; 3. Pelo produto da venda dos imóveis a que respeitam as verbas 3, 4, 5, 6 e 7 do auto de apreensão dar-se-á pagamento pela ordem seguinte: 1.° Autoridade Tributária, pelos montantes de IMI que corresponderem a cada um dos referidos imóveis, de acordo com a especificação apresentada pelo Ministério Público em 25.11.2016, a fls. 197/198 do processo em papel.
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Caixa Económica CC.
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Os créditos comuns, se necessário em rateio, na proporção dos respectivos montantes; 4. Pelo produto da venda dos imóveis a que respeitam as verbas 8 e 9 do auto de apreensão dar-se-á pagamento pela ordem seguinte: 1.º Autoridade Tributária, pelos montantes de IMI que corresponderem a cada um dos referidos imóveis, de acordo com a especificação apresentada pelo Ministério Público em 25.11.2016, a fls. 197/198 do processo em papel.
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BB - Imóveis Unipessoal, Lda., até ao montante de € 60.326,00 de capital, acrescido dos juros correspondentemente liquidados, relativamente a cada um dos dois imóveis.
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Banco DD, S.A.
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Os créditos comuns, se necessário em rateio, na proporção dos respectivos montantes; (…).
” 5. Inconformadas, apelaram BB - Imóveis Unipessoal, Lda. e Banco EE, S.A.., tendo o Tribunal da Relação de Lisboa (por acórdão de 26-10-2017) julgado parcialmente procedente a apelação da credora BB - Imóveis Unipessoal Lda. e procedente a apelação do credor Banco EE, S.A., tendo alterado as alíneas B), D) e o ponto 4 da alínea E) pontos 2.º e 3.º, eliminando o 4.º, do dispositivo da sentença recorrida nos seguintes termos: «B) Julgar reconhecido o crédito reclamado por BB - Imóveis Unipessoal Lda no montante de 280.000 € de capital, acrescido de juros de mora vencidos desde 08/01/2010 e vincendos até integral pagamento, à taxa legal de 4% e dos juros compulsórios à taxa de 2,5% desde a data em que transitou em julgado o segmento da sentença recorrida que reconheceu o referido crédito de capital; D) Julgar não reconhecido o direito de retenção invocado pela reclamante BB - Imóveis Unipessoal Lda relativamente aos imóveis a que respeitam as verbas 5, 6, 8 e 9 do auto de apreensão, qualificando como comum os créditos de capital e juros de mora e compulsórios referidos em B).
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Graduar os créditos reconhecidos nos seguintes termos: 1.º (….) 4. Pelo produto da venda dos imóveis a que respeitam as verbas 8 e 9 do auto de apreensão dar-se-á pagamento pela ordem seguinte: 1.º (...) 2.º Banco EE, SA - anteriormente Banco DD, SA; 3.º Os créditos comuns, se necessário, em rateio, na proporção dos respectivos montantes.» 7. A BB - Imóveis Unipessoal Lda. veio interpor recurso de revista[1] formulando as seguintes conclusões: “a) O presente recurso de revista é admissível já que se verificam todos os três requisitos exigidos para tal no nº 2 do art.º 672º do C.P.C.: a relevância jurídica da questão que carece de outra apreciação para uma melhor aplicação do direito; os interesses de particular relevância social que estão em causa; a contradição do Acórdão recorrido com outros, já transitados em julgado, proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça no domínio da mesma legislação e sobre a mesma exata questão, sem que tivesse já sido proferido acórdão uniformizador da jurisprudência sobre tal matéria.
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Ao contrário do decidido no Acórdão recorrido, o AUJ nº 4/2014 não é aplicável à situação dos autos já que, nestes, e ao contrário do aí uniformizado, o não cumprimento dos contratos-promessa celebrados entre a ora recorrente e a ora insolvente é anterior à declaração de insolvência deste e não decorre, assim, de ato do administrador de insolvência.
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Ao contrário do decidido no Acórdão recorrido, qualquer interpretação da lei que coarcte o direito de retenção que serviu de suporte à decisão de contratar, para mais nas condições de pagamento de sinais inusuais, porque altos, da ora recorrente seria, naturalmente, uma enorme surpresa para a ora recorrente, que, como qualquer cidadão ou empresa média, não acompanha, nem tem de acompanhar, querelas doutrinais ou jurisprudenciais sobre confrontos «entre o direito de retenção e a hipoteca»: a ora recorrente apenas tem de conhecer o que diz a lei e, por esta, o direito de retenção é-lhe conferido.
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O elemento literal da norma em causa, o art.º 755º, nº 1, alínea f), do C. Civil, não permite distinguir entre consumidores e não consumidores para efeitos de atribuição do direito de retenção, verificados que estejam, como estão no caso dos presentes autos, os demais requisitos para tal enumerados na previsão normativa.
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O elemento teleológico também não permite distinguir nessa norma entre consumidores e não consumidores: sabido que é ter o legislador, no preâmbulo do diploma que introduziu tal disposição no C. Civil, referido expressamente a proteção dos consumidores sem que daí tenha retirado, conscientemente, qualquer consequência em termos de redação da lei.
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Ainda que o pensamento do legislador pudesse ter sido o de diferenciar entre consumidores e não consumidores, e não foi, nunca o mesmo poderia ser considerado por não ter «na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso», sendo que, se o intérprete há-de presumir «que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados», nunca poderia distinguir-se entre consumidores e não consumidores na norma em questão.
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Não podendo, tampouco, nos presentes autos reequacionar-se já o que ficou definitivamente fixado pelas instâncias: a verificação de tradição das frações objeto das promessas de compra e venda a favor da ora recorrente.
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O Acórdão recorrido violou as normas dos arts. 9º, 755º, nº 1, alínea f), e 759º, nº 2, do C. Civil.
” 6. Não foram apresentadas contra alegações.
II – APRECIAÇÃO DO RECURSO De acordo com o teor das conclusões das alegações (que delimitam o âmbito do conhecimento por parte do tribunal, na ausência de questões de conhecimento oficioso – artigos 608.º, n.º2, 635.º, n.4 e 639.º, todos do Código de Processo Civil – doravante CPC) mostram-se submetidas à apreciação deste tribunal as seguintes questões: ð Da admissibilidade da revista normal (questão prévia) ð Do reconhecimento à Recorrente do direito de retenção sobre os imóveis designados pelas verbas 5, 6, 8 e 9 apreendidos para a massa insolvente 1.1 Os factos provados 1. Foram apreendidos para a massa insolvente de AA - Construções, Lda, entre outros, os seguintes, bens imóveis: - Sob a verba 5 do auto de apreensão de 13.02.2012, fracção autónoma designada pela letra "F", primeiro andar B, do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de A... V… sob o número 2749, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo 5423, concelho e freguesia de A… V…; - Sob a verba 6 do auto de apreensão de 13.02.2012, fracção autónoma...
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