Acórdão nº 1634/07.8TBVNG-A.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelSOUSA LAMEIRA
Data da Resolução05 de Julho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO l.

Por apenso á execução para pagamento de quantia certa em que são exequentes AA e BB veio a executada CC deduzir oposição, alegando, além do mais, a inexistência dos títulos executivos, uma vez que estes não se encontram datados, nem foram apresentados a pagamento, não constituindo documentos que importem constituição ou reconhecimento de obrigações pecuniárias, sendo certo que os negócios subjacentes à emissão dos cheques são negócios cuja validade depende de observância escrita que não foi observada.

Conclui pela procedência da oposição e consequente extinção da execução. 2.

Contestaram os exequentes, impugnando os factos alegados pela executada/oponente.

  1. Procedeu-se a julgamento e, a final, foi proferida sentença, na qual a oposição foi julgada parcialmente procedente e, em consequência, julgada extinta a execução no que toca ao exequente BB determinando-se o prosseguimento da execução na parte respeitante ao exequente AA.

    4.

    Interposto recurso desta decisão pela executada/oponente e pelos herdeiros habilitados do primitivo exequente BB, veio a ser proferido pelo Tribunal da Relação do Porto o Acórdão de 21 de Fevereiro de 2018, a fls. 468 e seguintes, que decidiu «(…) em revogar parcialmente a sentença recorrida e, consequentemente, julgando improcedente o recurso da executada/oponente CC e procedente o recurso dos herdeiros habilitados do primitivo exequente BB, determinar o prosseguimento da execução no que toca aos pedidos formulados por ambos os exequentes».

  2. Inconformada, a executada/oponente CC recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou as seguintes conclusões: Da inexistência de título executivo 1 - Desde já se refira, sob pena de ilegalidade por violação de lei com valor reforçado (que se invoca, nomeadamente, para os efeitos previstos no artigo 70° n.º l alínea f) da Lei do Tribunal Constitucional), aos cheques dados à execução, o disposto nas normas aplicáveis do Código de Processo Civil, designadamente na da alínea c) do n.º l do respectivo artigo 46° (na redacção anterior à Lei n.°41/2013 de 26/06), só pode ser interpretado em conformidade com as disposições da LUCh.

    2 - Ou seja, excluindo da previsão de tal norma, e desconsiderando como títulos executivos os documentos que face àquela Lei não produzem efeitos como cheques (Cfr. artigos 1° e 2° da LUCh), os cheques relativamente aos quais se não verificarem os requisitos de que depende o direito de acção do portador enunciados no artigo 40° da LUCh (por referência aos artigos 29°, 41° e 42, nomeadamente) e, ainda, aqueles relativamente aos quais se tenha verificado o decurso do prazo de prescrição da acção cambiária previsto no artigo 52° da LUCh.

    3 - Releva ainda que a invalidade prescrita na LUCh para os títulos a que falte qualquer dos requisitos enumerados no artigo 1° da mesma Lei relativamente aos quais se não verifique qualquer das excepções enunciadas no seu artigo 2°.

    4 - Portanto, em suma, o cheque pagável no país onde foi passado deve ser apresentado apagamento no prazo de 8 dias (Cfr. artigo 29° da LUCh).

    5 - Nos termos do artigo 40 da LUCh o portador pode exercer os seus direitos de acção contra os endossantes, sacador e outros co-obrigados, se o cheque, apresentado em tempo útil, não for pago e se a recusa de pagamento for verificada".

    6 - Por sua vez, o artigo 41° da LUCh refere que o protesto ou declaração equivalente deve ser feito antes de expirar o prazo para a apresentação.

    7 - Por sua vez, nos termos do artigo 52° da mesma LUCh, toda a acção do portador contra os endossantes, contra o sacador ou contra os demais co-obrigados prescreve decorridos que sejam seis meses, contados do termo do prazo de apresentação.

    8 - Ora, os cheques a que se alude no requerimento executivo não se encontram datados e não foram apresentados a pagamento aos bancos sacados (Cfr. Facto n.º 22 do elenco dos Factos Provados).

    9 - Assim, os referidos documentos, em face das normas supra enunciadas não podem ser valorados como cheques e não reúnem os requisitos de que depende o direito de acção do portador.

    Do documento particular e da qualidade de mero quirógrafo 10 - Como tem entendido alguma jurisprudência, efectivamente, nada obsta a que o cheque (que cumpra os devidos requisitos enquanto tal) seja invocável no âmbito das RELAÇÕES IMEDIATAS como mero quirógrafo de uma relação obrigacional causal, não sujeita a particular forma legal, desde o exequente alegue no requerimento executivo factos constitutivos desse débito causal.

    11 - Acontece que, no caso dos autos, os cheques em causa não foram emitidos pela executada CC em consequência de qualquer negócio (relação fundamental) por ela celebrado com os exequentes, ou seja, não estamos perante o credor e devedor originário.

    12 - Como se referiu no Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 13/03/2014, Processo n.º 2146/13.6TBBCL-A.G1, publicado em www.dgsi.pt, em que foi relator o Ilustre Juiz Desembargador EDGAR GOUVEIA VALENTE, "entendemos que apenas no domínio das relações imediatas, o cheque, nas aludidas circunstâncias, pode valer como título executivo " - sublinhamos.

    13 - No mesmo sentido Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 08/01/2004, Processo n.º 0336130, publicado em www.dgsi.pt., em que foi relator o insigne Juiz Desembargador SALEIRO DE ABREU, onde refere igualmente que "um cheque prescrito só pode ser considerado título executivo nas relações imediatas e nunca nas relações mediatas" - sublinhamos.

    14 - Como ali se escreveu, na mesma esteiro do anterior, "aquele não pode socorrer-se do reconhecimento unilateral da dívida, reconhecimento que só é válido nas relações «credor originário/devedor originário»" - sublinhamos.

    15 - A lógica é simples: como se disse no Acórdão do STJ de 13/11/20128, Processo n.º 70S/09.5TBLSA-A.C1.S1, publicado em www.dgsi.pt., em que foi Relator o Ilustre Juiz Conselheiro GARCIA CALEJO, "encontrando-se as partes no domínio das relações imediatas, podem discutir relevantemente a obrigação subjacente'' - sublinhamos.

    16 - Daí que não se possa aceitar, salvo o devido respeito, quando se refere no Acórdão recorrido que "A apelante é executada na qualidade de herdeira do devedor falecido e, portanto, não foi ela que emitiu ou subscreveu os cheques em questão, mas tal não a coloca no âmbito das relações mediatas, uma vez que a sua intervenção nos autos deriva de ser sucessora desse devedor".

    17 - Ora, não tendo a aqui executada, como é pacífico, tido pessoalmente qualquer relação subjacente com os exequentes, como poderia ou poderá ela discutir relevantemente a obrigação subjacente? 18 - Não podia nem pode como é óbvio. A aqui exequente CC não tem forma de saber o que é que efectivamente se passou, se é que se passou alguma coisa, entre o seu falecido pai e os exequentes.

    19 - Ainda para mais quando a execução é intentada logo contra a mesma pois o seu pai já havia falecido.

    20 - Não teve pois a aqui Recorrente, como se diz no Acórdão recorrido, a possibilidade de discutir a relação fundamental nos precisos termos do seu pai falecido.

    Por outro lado, 21 - Os exequentes não podem limitar-se a invocar factos genéricos, limitando-se a juntar uns documentos que parecem, salvo o devido respeito, folhas de merceeiro, que não passam de meros apócrifos, feitos sabe-se lá por quem e com que intuito.

    22 - Mas mesmos os documentos que os exequentes juntam são contraditórios com o que afirmam no próprio requerimento executivo.

    23 - Para não falar no documento n.º 7 junto com o requerimento executivo (fls. 32), onde aparece a anotação "Pago 23/12/2004", falemos já do documento n.°6 junto com o mesmo requerimento executivo (fls. 31), documentos esses juntos pelos próprios exequentes.

    24 - Neste último, alegadamente será uma folha de cálculo do exequente AA, é feito referência a "um cheque 27.802,50"', que por coincidência ou não, é o valor exacto titulado pelo cheque dado à execução.

    25 - Mas na continuação dessa mesma folha de cálculo é possível ler que após a soma de "juros do cheque " e da dedução de 30 touros que "tenho a receber 14 614,84".

    26 - Então o exequente vem dar à execução um cheque no valor de 27 802,50 € quando admite, pelo menos, que só tem a receber 14 614,84 €????? 27 - Isto, como se disse, para não falar no documento seguinte onde se faz referência que já está "Pago 23/12/2004".

    28 - Não podia pois, nem pode o Tribunal, mesmo a entender o cheque como mero quirógrafo, o que não se admite, entender que os exequentes invocaram de forma devida os factos constitutivos da relação subjacente.

    29 -...

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