Acórdão nº 97/12.0TBPV.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelFERNANDA ISABEL PEREIRA
Data da Resolução05 de Julho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório: AA - Sociedade de Construções, Lda, intentou, em 17.02.2012, no Tribunal Judicial de .. acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra BB e CC, pedindo que: - fosse reconhecido que o acordo celebrado entre a autora e a ré BB constituiu um negócio simulado com o intuito de esta ré poder pedir o pagamento antecipado de fundos comunitários à DD, devendo ser declarado nulo e de nenhum efeito quanto à emissão das facturas e pagamento do seu valor; - fosse a ré BB condenada a pagar à autora o montante de € 112.283,36 pelos trabalhos efectuados no âmbito da execução do aludido contrato de empreitada e os trabalhos a mais solicitados por aquela; - fosse reconhecido que a ré BB desistiu da empreitada, sendo, em consequência, condenada a pagar à autora o montante de €: 45.896,00 a titulo de indemnização pelo proveito que esta deixou de ter pelo facto da ré ter desistido da conclusão da obra; - fosse condenada no pagamento de juros legais sobre os montantes reclamados calculados desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Para tanto, alegou, em síntese, que no âmbito de um contrato de empreitada que celebrara com a ré BB, a autora emitiu facturas, no total de € 135 000,00, simulando ter recebido da 1.ª ré pagamentos por conta dessa empreitada, com o intuito de que a ré obtivesse fundos comunitários, sem que a autora tivesse ficado, efectivamente, com o dinheiro alegadamente pago por aquela, uma vez que a autora, após o levantamento dos cheques emitidos a seu favor pela ré, transferiu as quantias recebidas para uma conta bancária do 2.º réu, que para esse efeito lhe fora indicada pela 1.ª ré. Mais alegou que a ré desistiu da empreitada, não tendo pago à autora o valor dos trabalhos que esta executou, no valor de € 112 283,36, sendo certo que a autora auferiria um proveito de € 45 896,00, caso a empreitada fosse totalmente executada.

Apenas a ré BB contestou, impugnando a quase totalidade dos factos alegados pela autora e imputando defeitos aos trabalhos realizados por esta, concluindo pela improcedência da acção e sua consequente absolvição do pedido.

Na audiência prévia foi proferido saneador tabelar e identificado o objecto do litígio, tendo sido enunciados os temas da prova.

Realizou-se audiência final e, em 19.10.2016, foi proferida sentença, que julgou a acção totalmente procedente e, consequentemente, condenou a ré BB como peticionado e ambos os réus nas custas da acção.

Desta sentença apelou a ré.

O Tribunal da Relação, por acórdão de 6 de Julho de 2017, proferiu a seguinte decisão: «1.º - Julga-se a apelação improcedente e consequentemente mantém-se a sentença recorrida; 2.º - Nos termos dos artigos 443.º n.º 1 do CPC e 27.º n.ºs 1 e 4 do RCP, ordena-se o desentranhamento do documento junto com a alegação da apelante e condena-se a apelante em 1 UC de multa».

Ainda inconformada, interpôs a mesma ré recurso de revista, finalizando a sua alegação recursiva com as seguintes conclusões (sic): «1. No decurso dos presentes autos de processo comum a A., ora recorrida, apresentou-se à insolvência nos termos melhor esclarecidos no processo n° 478/12.0TYLSB do 3o juízo de Lisboa do tribunal de comércio de ….

2. Sendo certo que no referido processo foi publicado o "anúncio" nos termos da lei contendo as menções mais específicas dos ditos autos.

3. E tal sorte que a insolvência foi decretada em data anterior à da prolação da sentença em 1a Instância. Contudo, 4. E a despeito do teor da lei, nem a A. nem a R. ou sequer o tribunal Tiveram conhecimento oficial da pendência de tal processo. Todavia, 5. O ClRE que já estava em vigor, manteve-se nessa situação sendo certo que como já decorre do anteriormente referido não foi dada qualquer atenção a diversas normas desse acervo jurídico designadamente os arts. 17-E, 59°, 85°,161°-2 entre outros; 6. E designadamente o processo dos autos que nos termos da lei - art. 85°-1 CIRE não foi apensado a este último pela simples e elementar razão de que, a despeito da ora recorrida ter enviado para o processo, sobre a forma de uma procuração informação ou aviso este respeitante aos pontos que a lei refere, o que sucedeu em momento anterior ao da elaboração da sentença; 7. A mesma decisão judicial, por e simplesmente desconsiderou-a na totalidade, o que se admite que tenha ficado a dever-se ao facto desta informação ter sido transmitida de forma atípica e, nessa medida desusada; 8. Seguiu-se-lhe a sentença de 1ª instância, o recurso para o TRL e o demais processualmente côngruo, sendo ainda certo que o processo de insolvência se manteve relativamente ao dos autos, como res inter aliaos acta, isto é os presentes autos continuaram a cursar à inteira revelia daqueles outros aos quais deviam ter sido apensados.

9. Acrescente-se ainda que a administradora da insolvência - por fas ou por nefas - não deu cumprimento aos ónus legais cujo cumprimento cabe às pessoas encarregadas das referidas funções. Logo, 10. Estes autos sempre correram como ainda correm à inteira revelia daqueles outros pendentes no tribunal de comércio de …. Por isso, 11. A actuação processual que se tem verificado nestes mesmos autos, desde a sentença de 1a instância inclusive, embora, aparentemente da competência genérica, a verdade é que os mesmos deviam ter sido praticados por magistrados judiciais dos tribunais do comércio, o que não sucedeu 12. Sendo esses actos inexistentes, por eivados de abuso de poder, isto é, por juízes funcional e materialmente incompetentes pelo que cabe a V.as Exas., salvo melhor opinião, ordenar que todo o processado que teve lugar perante juiz materialmente incompetente deve ser declarado inválido, com as legais consequências. Porém e por cautela, 13. Sempre se referirá ainda que as normas do processo penal referentes ao testemunho indirecto também conhecido por testemunho de ouvir dizer - hear say rule, como se lhe chama no direito anglo-saxónico -materializam verdadeiros princípios gerais respeitantes a toda a ordem adjectiva nacional e, por conseguinte, também pelo código de processo civil 14. Nessa medida a razão assistindo totalmente, salvo o devido respeito, à recorrente e à pretensão da mesma relativamente às testemunhas cujos depoimentos a Relação de … fez fé, pelo que os mesmos testemunhos devem considerar-se inválidos em tudo o mais, nos termos anteriormente preconizados pelo recorrente.

15. Aliás, a consideração de que a testemunha indicada por certo sujeito processual, não é mais, ao contrário do entendimento vetusto, do que um equívoco, pois o art. 32° n° 5, 1a parte CRP, aplicável directamente ex vi art 18°-1 do mesmo diploma aplica-se também, segundo entendimento generalizado, ao processo civil, ao querer que prevaleça a verdade judiciária, tal como foi possível determiná-la. Por isso, 16. Dando-se provimento ao presente recurso, devem V.as Ex.as ordenar o desentranhamento de todas as peças processuais espúrias, anulando e, na consequência disso fazer remeter os autos ao Tribunal competente, que é o do Comércio, de Lisboa, ou 17. Não se entendendo assim, julgarem que o TRL julgou erroneamente quanto às chamadas testemunhas de ouvir dizer, nessa medida considerando inválidos os respectivos depoimentos.

18. As normas que se consideram violadas são, além do mais, as dos artigos 32°-5 e 18° da CRP e as dos artigos 17°E, 36°, 59°, 154° e 161° do CIRE, e as dos artigos 7° e 411° do código de processo civil».

Juntou um documento para prova da alegada declaração de insolvência da autora.

A autora não contra-alegou.

A ré, ora recorrente, litiga com o benefício do apoio judiciário, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos, bem como de nomeação de patrono e de pagamento da compensação de patrono (fls. 600).

Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

  1. Fundamentos: De facto: 1.º A A. tem por objecto a execução de empreitadas de construção civil e obras públicas.

  1. A R. BB tem um projecto de construção civil aprovado pela Câmara Municipal de … para a construção de diversos equipamentos na sua propriedade, sita em S….

  2. Para a construção de todos os equipamentos integrantes do referido projecto a R. BB acordou com a A. um contrato de empreitada.

  3. O preço da empreitada, de €.526.682,38, foi acordado entre as partes no dia 4 de Março de 2011 e corresponde ao somatório de valores das empreitadas parcelares de: 1 - Montagem do estaleiro no valor de €:12.000,00 2 - Estabelecimento Comercial no valor de €:243.464,14 3 - Espaço Recreativo no valor de €:82.126,29 4 - Clínica no valor de €:99.877,13 5 - Animais no valor de €:20.361,96 6 - Box no valor de €: 68.852,86.

  4. O...

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