Acórdão nº 952/12.8TVPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelTÁVORA VICTOR
Data da Resolução17 de Maio de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. RELATÓRIO.

    Acordam na 7ª secção cível do Supremo Tribunal de Justiça.

    AA veio intentar a presente acção com processo sumário contra BB Seguros, S.A.

    , pedindo a condenação desta no pagamento da quantia total de € 108.526,74, acrescida do montante referido no artigo 14.º da petição, bem como dos ordenados que, desde esta data, até ter alta, deixar de receber, a liquidar ulteriormente, tudo acrescido de juros desde a citação até efectivo e integral pagamento.

    Alegou, para tanto e em síntese, que no dia 13-03-2010, pelas 19h20, no cruzamento da Av. Marechal Gomes da Costa e da Rua de Serralves, no Porto, ocorreu um acidente de viação no qual foram intervenientes o veículo por si conduzido, de matrícula ...-...- UR e o veículo de matrícula ...-...- VB, seguro na Ré, em virtude do qual sofreu danos de natureza patrimonial e não patrimonial, cujo ressarcimento reclama da ré por o dito acidente ser exclusivamente imputável ao condutor do veículo aí seguro.

    Contestando, a Ré aceitou a culpa exclusiva do veículo seguro na produção do acidente, impugnando, no mais, a factualidade vertida na petição inicial.

    A Autora requereu, entretanto, a ampliação do pedido para o montante global de € 378.526,74, ampliação essa que foi admitida por decisão de 22-04-2016.

    Por sentença, proferida em 05-08-2016, a acção foi julgada parcialmente procedente e, em consequência, a Ré foi condenada a pagar à Autora a quantia de € 5.838,00 (deduzida das quantias já pagas), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento, tendo sido absolvida do demais peticionado.

    Inconformada com o assim decidido, recorreu a Autora, tendo o Tribunal da Relação do Porto decidido, por acórdão de 29-06-2017, julgar parcialmente procedente a apelação, com a alteração da sentença recorrida, condenando a ré no pagamento à Autora: a) Do montante correspondente aos acrescidos (para além dos que já tinha antes do acidente) tratamentos de fisiatria (fisioterapia cervical e lombar) e às acrescidas consultas médicas e medicamentos que a Autora, em consequência do acidente, terá de realizar no futuro, a liquidar em execução de sentença; b) Da quantia de € 17.838,00 (deduzida das quantias já pagas), acrescida dos juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a citação e vincendos até integral pagamento.

    Não se conformando com o decidido recorreu agora a Ré de revista, terminando por pedir que o Acórdão da Relação seja revogado nos termos em que expõe.

    Foram para tanto apresentadas as seguintes, Conclusões.

    1) Resultou como provado nos presentes autos que "A Autora carece de continuar a fazer tratamentos de fisiatria (fisioterapia cervical e lombar), em virtude das dores lombares e cervicais de que padece, e carece de consultas médicas e de medicamentos" (facto provado 15) e que "Do relatório da perícia médico-legal a que a Autora foi submetida no âmbito destes autos consta, em conclusões, o seguinte: "A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 01-04-2011; Período de Défice Funcional Temporário Parcial sendo assim fixável num período de 385 dias; Período de Repercussão Temporária na Actividade Profissional Total sendo assim fixável num período total de 385 dias; Quantum Doloris fixável no grau 3/7; Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica fixável em 3 pontos; As sequelas descritas são, em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, compatíveis com o exercício da actividade habitual, mas implicam esforços suplementares; Ajudas técnicas permanentes: assistência médica e ajudas medicamentosas" (facto provado 24).

    2) Nas alegações de recurso da Recorrida, a mesma alega que teria formulado este pedido, na petição inicial, de forma implícita.

    3) O Acórdão recorrido considera, de forma paternalista, que o pedido formulado na petição inicial não havia sido implícito, mas, isso sim, expresso sendo que não assiste qualquer razão aos Senhores Juízes Desembargadores quando decidem deste modo.

    4) A Autora, no art.° 14.° do petitório, alega que "Acresce que a Autora carece de continuar a fazer tratamentos de fisiatria (fisioterapia cervical e lombar), em virtude das dores lombares e cervicais de que padece, bem como de se deslocar em táxi, uma vez que não é indicado deslocar-se em transportes públicos e carece de consultas médicas e de medicamentos, até ter alta" (destaque nosso).

    5) No pedido a Recorrida peticiona o seguinte: "Termos em que deverá a acção proceder, condenando-se a Ré a pagar à Autora €108.526,74, acrescido do montante referido no artigo 14.° bem como os ordenados que desde esta data, até ter alta, deixar de receber, a liquidar ulteriormente, tudo acrescido de juros desde a citação até efectivo e integral cumprimentos".

    6) O art.° 14.° da petição inicial é muito claro no que diz respeito àquilo que a Recorrida pretende relegar para execução de sentença, ou seja, os tratamentos de fisiatria, as deslocações de táxi e as consultas médicas e medicamentosas até ter alta.

    7) Se as despesas são aquelas em que a Recorrida incorrer até ter alta, a mesma já teria que as ter apresentado no processo uma vez que, segundo resulta dos factos provados, a Recorrida teve alta clínica no dia 01.04.2011 (facto provado 24).

    8) Não podem os Senhores Juízes Desembargadores ficcionar um qualquer pedido explícito ou implícito pois o que a Recorrida peticionou nos presentes autos não foi aquilo em que os Senhores Desembargadores decidiram ao condenar a Recorrente no pagamento de despesas relacionadas com fisioterapia e despesas médicas e medicamentosas.

    9) Pese embora os factos provados 15 e 24, só os factos constantes do ponto 24 é que têm nexo causal com o sinistro dos autos, conforme resulta do relatório pericial de fls...

    10) Os factos constantes do ponto 15 dos factos provados não têm relação com o evento discutido nos presentes autos mas, isso sim, com maleitas/doenças das quais a Recorrida já padecia antes do sinistro dos autos.

    11) A Recorrida peticiona tratamentos de fisiatra e de fisioterapia sendo certo que, resultante do sinistro dos autos, apenas decorrerá para a mesma necessidade de despesas médicas e medicamentosas até à data da alta.

    12) O facto provado 24 é totalmente explícito neste sentido: "Ajudas técnicas permanentes: assistência médica e ajudas medicamentosas".

    13) Como a Recorrida apenas peticiona despesas em que incorra até à data da sua alta (que ocorreu no dia 01.04.2011), nunca a Recorrente teria de liquidar qualquer quantia a este título uma vez que todas as despesas em que a Autora incorreu até à referida data foram apresentadas nos autos e, por conseguinte, já constam dos valores indemnizatórios atribuídos à Recorrida na sentença proferida pelo Tribunal da Comarca do ....

    14) Sem prescindir, sempre se dirá que os tratamentos de fisioterapia não são tratamentos médicos nem, sequer, tratamentos medicamentosos.

    15) O Acórdão, por erro de interpretação e de aplicação, violou o disposto no art.° 609.°, n.º 1 do CPC pelo que deverá ser revogado nos precisos termos vindos de referir.

    16) Os danos morais ou prejuízos de ordem não patrimonial são prejuízos insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens que não integram o património do lesado (como, por exemplo, a vida, a saúde, a liberdade, a beleza, etc.).

    17) Não devem confundir-se com os danos patrimoniais indirectos, isto é, aqueles danos morais que se repercutem no património do lesado, como o desgosto que se reflecte na capacidade de ganho diminuindo-a, pois esta constitui um bem redutível a uma soma pecuniária.

    18) Porque estes danos não atingem o património do lesado, a obrigação de os ressarcir tem mais uma natureza compensatória do que indemnizatória, sem esquecer, contudo, que não pode deixar de estar presente a vertente sancionatória 19) O julgador deve ter em conta todas as regras de boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida, em esquecer a natureza mista da reparação, pois visa-se reparar o dano e também punir a conduta.

    20) No tocante aos danos não patrimoniais, o Acórdão aumenta o valor atribuído pelo Tribunal da Comarca do Porto de € 10.000,00 para € 15.000,00.

    21) Esta "ampliação" é injustificada e não se estriba em nenhum critério minimamente objectivável.

    22) Considerando os parâmetros acabados de traçar e tendo presente a matéria de facto dada como provada, a Recorrente considera, como já salientou anteriormente, que a decisão do Tribunal da Relação do Porto merece censura, quando fixou a indemnização pelos danos não patrimoniais a serem arbitrados à Recorrida em € 15.000,00! 23) Tendo em consideração a idade da Recorrida à data da consolidação das sequelas de que fixou a padecer (45 anos de idade), a natureza dos danos físicos que resultaram para a mesma do sinistro, os períodos de convalescença, os tratamentos que teve de sofrer, a IPG de que fixou a padecer (3 pontos), o sofrimento/dores que padeceu (3 pontos), a quantia de € 10.000,00 afigura-se como completamente ajustada a indemnizar os danos não patrimoniais sofridos pela recorrida.

    24) A tarefa de determinação/fixação indemnizatória (rectius da compensação) devida por danos não patrimoniais, deverá sempre ser orientada segundo critérios de equidade.

    25) Todavia, devido à sempre delicada e complicada tarefa de fixar quais os danos relevantes e qual a indemnização que lhes corresponderá, o legislador sentiu a necessidade de recorrer a um conjunto de normativos específicos que evidenciem, com objectividade, a transparência e justiça do modelo no seu conjunto e que sejam aptos a facilitar a tarefa de quem está obrigado a decidir.

    26) É neste contexto que surge a Portaria n.º 377/2008, de 26 de Maio, a qual veio fixar "os critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel, de proposta razoável para indemnização do dano corporal".

    27) A Portaria n.° 377/2008 constitui um instrumento...

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