Acórdão nº 262/17.4T8STR.E1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelHENRIQUE ARAÚJO
Data da Resolução19 de Junho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

PROC. N.º 262/17.4T8STR.E1.S2 REVISTA EXCEPCIONAL REL. 37[1] * ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. RELATÓRIO AA, residente em …., … …, França, e BB, residente em …, .. …, em França, interpuseram recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Évora do despacho proferido em 15 de Março de 2017 na Secção Cível da Instância Local de ..., da Comarca de Santarém, que fixou o valor da acção em 150.000,00 € e julgou verificada a excepção dilatória inominada de inadequação do meio processo utilizado, absolvendo da instância os Réus CC, residente na ..., n.º …, ..., DD e EE, ele com residência no ..., em …, …, e ela na Rua …, lote …, n.º …, …., em ... (estes últimos na qualidade de legais representantes da menor FF, residente na ..., n.º …, ...), e o Ministério Público, em representação dessa menor, nesta acção declarativa comum, em que vem pedido que “a) seja declarada a nulidade da partilha realizada no processo de inventário, Processo n.º 923/11.1TBVNO, que corre termos na Comarca de Santarém, Juízo Local Cível de ... - J1, por óbito de GG, repondo a situação de indivisão hereditária; b) seja declarada a nulidade de qualquer venda judicial que venha a realizar-se ou transmissões subsequentes do bem adjudicado às AA., que se compõe de prédio urbano inscrito na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o nº … da freguesia de ... e inscrito na matriz predial sob o artigo ..º da mesma freguesia;, e c) seja declarado nulo qualquer registo predial de aquisição ou inscrição matricial realizado com base em venda judicial ou subsequentes transmissões”.

O acórdão da Relação de Évora negou provimento ao recurso e confirmou a decisão recorrida.

Inconformados, interpuseram as Autoras recurso de revista excepcional, com fundamento na oposição de julgados, ao abrigo do disposto nos artigos 671º e 672º, n.º 1, alínea c), do CPC.

Nas alegações de recurso, os recorrentes concluem do seguinte modo: A. O presente recurso de revista nasce da inconformidade das recorrentes com o acórdão de que se recorre e tem fundamento na revista excepcional prevista no artigo 672º , n.º 1, alínea c) do CPC, por estar em contradição com o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra, em 8 de Março de 2016, no âmbito do processo 1419/15.8T8FIG.C1, já transitado em julgado, indicado como acórdão-fundamento publicado em www.dgsi.pt de que se junta fotocópia.

  1. No caso dos autos estão reunidos os pressupostos gerais e específicos previstos nos artigos 671º e 672º, nºs 1 e 2, alínea c), do CPC, que permitem o presente recurso.

  2. Com referência aos pressupostos específicos, constata-se que: ambos os acórdãos incidem sobre a mesma questão fundamental de direito; verifica-se a contradição entre a resposta dada pelo acórdão-fundamento e o acórdão recorrido no qual se optou por uma resposta diversa; oposição frontal entre o acórdão fundamento e o acórdão recorrido; a questão de direito sobre a qual se verifica a controvérsia foi essencial para determinar o resultado numa e noutra das decisões; o quadro normativo é igual em ambos os acórdãos; não existe acórdão de uniformização sobre a questão jurídica em causa.

  3. A questão decidenda no acórdão-fundamento e no acórdão recorrido prende-se com o facto de se saber se a partilha homologada por sentença transitada em julgado, quando não se verifiquem os requisitos para a anulação, emenda da partilha ou recurso de revisão, pode ou não ser atacada com fundamento no vício de nulidade e mediante acção com processo comum.

  4. No que concerne à oposição exigida para a admissibilidade do presente recurso de revista excepcional, a mesma está verificada porquanto no acórdão recorrido entendeu-se que “a partilha que agora as autoras pretendem pôr em causa encontra-se coberta pelo caso julgado, o que significa, salvo os casos de recurso extraordinário de revisão, e das excepções previstas nos artigos 1386º a 1388º, goza de estabilidade na ordem jurídica, não podendo ser alterada. (…). Assim, tendo transitado em julgado a sentença que homologou a partilha, salvo recurso de revisão, apenas por dependência do processo de inventário será possível as Autoras virem pôr em causa os termos em que foi feita a partilha, nos termos previstos nos artigos 1386º a 1388º do CPC. Deste modo, conclui-se que a presente acção não é o meio processual próprio para o fim visado pelas Autoras”.

  5. Em sentido contrário, expendeu o acórdão-fundamento que “a partilha judicial homologada por sentença pode ser atingida pelos vícios aplicáveis aos negócios jurídicos (artigo 286º e seguintes do Código Civil), uma vez que incidindo a sentença homologatória da partilha sobre um encontro de vontades decorrente da conferência de interessados, releva e prevalece o acordo sobre a partilha entre todos os herdeiros, e não a autoridade do caso julgado (tal acordo deve ser considerado, juntamente com a sentença transitada homologatória de tal partilha, elemento estruturante do ato da partilha), sendo assim defensável a aplicação das regras de ineficácia e de invalidade próprios dos negócios jurídicos (v.g., as dos artigos 240º e seguintes do Código Civil), senão directamente, pelo menos por analogia do artigo 2121º do CC”.

  6. A matéria relevante no acórdão-fundamento apresenta indubitáveis traços de identidade com a do acórdão recorrido, sendo questão fulcral em ambos os acórdãos precisamente a mesma, embora com divergentes conclusões (o que, por si só, determina a pertinência do recurso apresentado).

  7. No acórdão-fundamento entende-se de forma absolutamente clara que “para obter a declaração da nulidade das partilhas judiciais a ação declarativa de simples apreciação, sob a forma comum, é a forma de processo própria/adequada”.

    I. No acórdão-fundamento considera-se que a acção com processo comum é o meio próprio porquanto a nulidade da partilha não se integra em nenhum dos fundamentos previstos que permita usar da acção de anulação ou emenda, nem do recurso de revisão; por outro lado, no acórdão recorrido consignou-se que a sentença homologatória de partilha goza de estabilidade na ordem jurídica apenas podendo ser atingida por um daqueles três meios.

  8. As recorrentes pretendem ver declarada a nulidade da partilha por violação de disposição legal imperativa, invocável a todo o tempo e não sanável, pelo que, conduzindo há sua ineficácia global.

  9. Atenta a realidade concreta dos autos, concluímos que o pedido formulado pelas recorrentes na acção é merecedor de tutela jurídica.

    L. A oposição existente entre o acórdão recorrido e o acórdão-fundamento é clara e evidente, aliada à inexistência de acórdão de uniformização de jurisprudência, uma vez que a questão jurídica em causa não encontra resposta estabilizada na jurisprudência.

  10. A interpretação feita no acórdão-fundamento afigura-se-nos doutamente fundamentada e com sustentação na doutrina, parecendo-nos ser a jurisprudência a aplicar ao caso dos autos.

  11. O dissentimento verificado não deve resolver-se do modo proposto pelo acórdão recorrido, mas antes do modo proposto no acórdão-fundamento, uma vez que a posição adoptada pelo acórdão recorrido afronta, de forma indelével, o princípio da verdade material e o princípio constitucional da tutela judicial efectiva, ínsito no artigo 20º da CRP.

  12. A douta opinião do Juiz Conselheiro do Supremo Tribunal de Justiça, António Santos Abrantes Geraldes, expressa in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2ª edição, páginas 333 e 334, adequa-se totalmente aos presentes autos quando escreve: “(…) o recurso de revista excecional pode constituir um bom pretexto para a promoção de uniformização de jurisprudência. Por um lado, porque assim o podem demandar os interesses em...

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