Acórdão nº 18331/16.6T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelSOUSA LAMEIRA
Data da Resolução05 de Junho de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO l.

AA instaurou acção declarativa comum contra Banco BB, S.A., actualmente designado Banco CC, S.A., alegando, em resumo, que: É … reformado e foi titular de uma conta de depósito à ordem no banco R., agência de …, na qual movimentava grande parte das suas poupanças.

Em 2004, dois trabalhadores daquela agência apresentaram-lhe um produto como não tendo risco, dado que o capital investido era garantido e não havia possibilidade de perda, que era uma modalidade de aplicação de poupanças que o R. estava a praticar e promover, com condições mais vantajosas que os correntes depósitos a prazo habituais e que o retorno do capital estaria garantido pelo R.

Simplificando, na prática, disseram ao A. que era um produto em tudo semelhante a um autêntico depósito a prazo.

O A. é pessoa conservadora e cautelosa na aplicação que faz das suas poupanças, nunca fazendo aplicações que possam pôr em risco o seu dinheiro e nunca havia feito outros depósitos e aplicações de poupanças que não se enquadrassem no tradicional depósito à ordem ou a prazo.

Sempre confiou no R. e nos seus trabalhadores daquela agência estando convicto de que se tratava de um produto do tipo depósito a prazo do próprio Banco R. e com capital garantido e que não envolvia risco, no ano de 2004 destinou a quantia de 150.000 € à subscrição daquele produto e posteriormente mais 250.000 €.

Subscreveu assim obrigações DD Rendimento Mais 2004 e obrigações DD 2006 convencido de que possuía um produto de poupança do Banco R. e sem desconfiar que corria o risco de perder o capital investido.

Em 10/11/2008 resgatou 150.000 C de parte dos depósitos aplicados.

Ficando titular de 2 obrigações DD RM2 - DD 2006 no valor total de 100.000 € e de 3 obrigações DD Rendimento Mais 2004 no valor total de 150.000 €, que estão depositadas no R. e das quais não foi reembolsado, recusando-se o R. a restituir a quantia que lhe foi confiada.

O A. não celebrou qualquer negócio com a DD, S.A., actualmente EE, SGPS, S.A..

O R. omitiu informação fundamental relativa às características dos títulos DD, violando os deveres boa-fé, informação, lealdade e respeito consciencioso dos interesses confiados.

Com a privação do valor em causa o A. tem sofrido psiquicamente, passando a recorrer a medicamentos para acalmar a sua ansiedade A informação que o R. sempre passou ao A. e que DD ou Banco BB era, no fundo, a mesma entidade, na medida em que tudo pertencia ao Banco R.

A responsabilidade do R. e da DD, S.A., actualmente EE, SGPS, S.A. é solidária.

Conclui pedindo que seja o réu condenado a pagar-lhe: a) a título de danos patrimoniais a quantia de 250.000 e, correspondente ao valor do capital depositado no réu e adstrito às obrigações em causa; b) juros de mora referentes ao valor de capital depositado no réu e adstrito às obrigações de 2004 vencidos desde 19/10/2014 (dia seguinte à data fixada para reembolso) e não pagos e que à data de 15/0//2016 se computam em 18.366,79 € bem como os juros vincendos, calculados à taxa supletiva para as operações comerciais, até efectivo e integral pagamento; c) juros de mora referentes ao valor de capital depositado no réu e adstrito às obrigações de 2006 vencidos desde 09/05/2016 (dia seguinte à data fixada para reembolso) e não pagos e que à data de 15/07/2016 se computam em 1.272,87 € bem como os juros vincendos, calculados à taxa supletiva para as operações comerciais, até efectivo e integral pagamento; d) juros remuneratórios à taxa acordada de 4,5% não pagos - respeitantes às obrigações de 2006 - aquando da última renovação a 5 de Novembro de 2015 e que na data de 15/07/2016 perfazem 3.119,18 €; e) a título de danos não patrimoniais a quantia de 2.000 € acrescida dos juros que se vencerem até efectivo e integral pagamento, à taxa legal dos juros civis de 4%.

2.

O R. contestou, alegando resumidamente, que: O alegado direito do A. já prescreveu pelo decurso do prazo de 2 anos a contar do conhecimento da conclusão da operação de subscrição das obrigações DD.

As obrigações DD foram emitidas pela DD, SGPS, SA, sociedade titular de 100% do capital do R. até à altura em que foi nacionalizada.

O produto dado à subscrição era seguro mas não garantido, como nenhuma aplicação financeira é.

A informação prestada ao A. foi verdadeira e suficiente.

O A. sabia que não tinha um depósito a prazo ou algo parecido e deu ordem para vender obrigações DDRM no valor de 150.000 e, o que demonstra conhecer que não tinha contratado um depósito a prazo ou algo semelhante.

Conclui pedindo a improcedência da acção.

3.

Elaborou-se despacho saneador no qual se relegou para final o conhecimento da excepção de prescrição. Definiu-se o objecto do litígio e enunciaram-se os temas de prova.

Observado o legal formalismo, realizou-se a audiência final - em que o A. respondeu à excepção de prescrição ao abrigo do disposto no art. 3° n° 4 do CPC -.

A final foi proferida sentença que julgou a acção improcedente, absolvendo o R. do pedido.

4.

Inconformado o Autor AA interpôs recurso de revista, para o Tribunal da Relação de …, que, por Acórdão de 16 de Novembro de 2017, decidiu julgar parcialmente procedente a apelação e alterando a sentença recorrida decidiu: «a) condenar o apelado a pagar ao apelante a quantia de 250.000 €, a título de indemnização por danos patrimoniais correspondente ao valor investido na subscrição das obrigações, acrescida dos juros de mora contados, respectivamente, desde o dia seguinte à data de vencimento das obrigações subscritas em 2004 e desde o dia seguinte à data de vencimento das obrigações subscritas em 2006, à taxa supletiva para as operações comerciais, até efectivo pagamento; b) condenar o apelado a pagar ao apelante a quantia de 2.000 € a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal, que está fixada em 4%, vencidos desde a data da citação e vincendos até integral pagamento; c) absolver o apelado do mais que era pedido».

3.

O réu Banco BB, S.A.

, actualmente designado Banco CC, S.A.

interpôs Recurso de Revista para o Supremo Tribunal de Justiça e, tendo alegado, formulou as seguintes conclusões: 1) A reapreciação da decisão sobre a matéria de facto não se deve reconduzir a um novo julgamento, mas à apreciação da coerência da decisão recorrida, sob pena de se formar um novo julgamento ab initio, com desconsideração da imediação e proximidade à produção de prova oferecida.

2) Independentemente da natureza da responsabilidade civil em causa na situação dos autos - pré-contratual ou contratual -, sempre será obrigatória a demonstração, sem prejuízo dos eventuais regimes especiais de inversão do ónus da prova que sejam aplicáveis, dos pressupostos gerais da responsabilidade civil: a. Facto (ou omissão) b. Ilicitude c. Culpa d. Causalidade e. Dano 3) Não se demonstra provado qualquer facto que permita sustentar um qualquer nexo de causalidade entre o Facto ilícito e o Dano, 4) Concretamente não está provado que o Autor não investiria em Obrigações DD acaso tivesse tido acesso a informação exaustiva e detalhada sobre o produto em causa, 5) E vale esta afirmação independentemente de estar provado ter o Autor feito o seu investimento pela confiança que depositava na palavra do seu gestor bancário, uma vez que esta manter-se-ia intocada com maior ou menor grau de informação.

6) O Tribunal a quo verificando a falta de um tal facto veio a invocar expressamente uma presunção judicial de que o A. não teria subscrito o mesmo produto financeiro acaso tivesse perfeito e exaustivo conhecimento das suas reais características.

7) A presunção judicial, nos termos do disposto no art.º 349, corresponde a uma ilação "que a lei ou o julgador fira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido".

8) A presunção judicial implica: (i) um facto conhecido, estabelecido no processo, (ii) um juízo de normalidade ou razoabilidade sindicável, (iii) a afirmação de um facto desconhecido com base na sequência dos pressupostos anteriores.

9) A decisão recorrida, aludindo, aliás, repetidamente, à razoabilidade do seu raciocínio, faz decorrer dos factos provados que "o apelante não teria aplicado as suas poupanças nas obrigações DD se conhecesse as suas verdadeiras características." Bem como que "não é plausível que (o A.) tivesse tomado a decisão de subscrever estas obrigações se lhe tivesse sido dito, pelos funcionários do apelante, que corria o risco de perder todo ou parte do seu dinheiro no caso de insolvência da sociedade emitente dessas obrigações".

10) A decisão recorrida, todavia, não identifica qual o facto concreto que lhe serve para deduzir ou inferir a dita presunção, não podendo, salva melhor opinião limitar-se a remeter para "toda a factualidade provada", sob pena de insindicabilidade ou incompreensão da decisão proferida.

11) Ficamos também sem perceber qual o raciocínio de razoabilidade que o Tribunal se socorreu para concluir que "não é plausível que (o A.) tivesse tomado a decisão de subscrever estas obrigações se lhe tivesse sido dito, pelos funcionários do apelante, que corria o risco de perder todo ou parte do seu dinheiro no caso de insolvência da sociedade emitente dessas obrigações".

12) Um tal raciocínio vai muito para além do mero perfil de investidor do Autor, obrigando mais a que se determinasse qual o nível de risco em causa, a probabilidade, ab initio, de incumprimento ou de insolvência da entidade emitente. E essencialmente obrigaria a que se determinasse de forma clara a diferença de risco entre a subscrição destas obrigações e de outros produtos bancários ou financeiros ditos conservadores - por exemplo de um Depósito a Prazo (porque também estes têm sempre um risco inerente)! 13) Não basta que esteja demonstrado o incumprimento actual do reembolso das obrigações, mas antes era essencial que o nível de risco destas obrigações, aquando da sua emissão, era substancialmente maior que o de qualquer aplicação conservadora.

14) Faltando estes passos da dita lógica...

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