Acórdão nº 673/13.4TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Maio de 2018

Magistrado ResponsávelFERREIRA PINTO
Data da Resolução09 de Maio de 2018
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 673/13.4TTLSB.L1.S1[1] (Revista) – 4ª Secção Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I - Relatório[2]: A Autora “AA — AA, S.A. ("AA”)” instaurou, em 20.02.2013, na Comarca de Lisboa, no 5º Juízo, 2ª Secção, do Tribunal do Trabalho, a presente Ação Declarativa de Simples Apreciação, sob a forma de processo comum, contra “Federação Intersindical das Indústrias Metalúrgicas, Químicas, Eléctricas, Farmacêutica, Celulose, Papel, Gráfica, Imprensa, Energia e Minas ("FIEQUIMETAL")” e “Sindicato da Indústria e do Comércio Petrolífero ("SICOP")”, peticionando que seja proferida sentença: - Declarando ilícito o modelo adotado nas greves realizadas nas refinarias de Sines e Matosinhos, em abril de 2010, e em setembro e outubro de 2012, atenta a forma como as mesmas foram decretadas pelas RR. e postas em prática pelos trabalhadores a elas aderentes.

Alegou, em síntese, que tem legitimidade processual para propor esta ação dada a existência de um conflito atual, sério e concreto com os RR., derivado do modelo de greve por estes adotado nas Refinarias de Sines e de Matosinhos nos anos de 2010 e 2012, por haver uma incerteza objetiva e grave sobre a sua legalidade e por não se verificar a exceção da litispendência entre a presente ação e as outras ações propostas, contra si, pelos seus trabalhadores aderentes às greves, por causa de não lhes ter pago a retribuição referente aos dias em que as refinarias estiveram “sem lograr alcançar a atividade produtiva planeada”.

Alegou, ainda, que o modelo da greve convocada pelos réus, e executada pelos trabalhadores que a ela aderiram, nas refinarias de Sines e Matosinhos, nos dias 19, 20 e 21 de abril de 2010, 17, 18 e 19 de setembro e 18, 19, 20, 21 e 22 de outubro de 2012, é ilícito porque viola os princípios da proporcionalidade, boa-fé e sinalagma contratual e colide com outros bens e direitos constitucionalmente protegidos.

A Ré “FIEQUIMETAL” contestou a ação, pugnando pela licitude do modelo de greve e requereu a condenação da autora como litigante de má-fé.

Também, contestou o Réu “SICOP”, excecionando a litispendência e defendendo a licitude do modelo de greve.

A autora respondeu.

Proferiu-se despacho saneador tabelar, tendo-se apenas, em concreto, julgado improcedente a exceção de litispendência.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento e, em 08.09.2014, foi proferida sentença, que julgou a ação improcedente e que, consequentemente, não declarou ilícito o modelo de greve convocada pelos réus e executada pelos trabalhadores que a ela aderiram nas refinarias de Sines e Matosinhos, nos dias 19, 20 e 21 de abril de 2010, 17, 18 e 19 de setembro e 18, 19, 20, 21 e 22 de outubro de 2012.

Decidiu-se, também, inexistirem fundamentos para decretar a condenação da Autora como litigante de má-fé.

Como seu fundamento consta que “[t]endo os trabalhadores laborado no período subsequente ao período formal da greve, no seu local e horário de trabalho e no cumprimento de operações essenciais ao rearranque produtivo das refinarias, tarefas que fazem parte do seu descritivo funcional, cumpriu-se o sinalagma do contrato de trabalho referente à prestação laboral a cargo dos trabalhadores, que titula o correspondente direito à retribuição”.

Concluiu-se, assim, que “[o] modelo da greve convocada pelos réus e executada pelos trabalhadores que a ela aderiram nas refinarias de Sines e Matosinhos, nos dias 19, 20 e 21 de abril de 2010, 17, 18 e 19 de setembro e 18, 19, 20, 21 e 22 de outubro de 2012, não viola os princípios da proporcionalidade, do contrato e da boa-fé e não colide com outros bens e direitos constitucionalmente protegidos, designadamente, os direitos à integridade física, à iniciativa económica privada e ao ambiente e qualidade de vida”.

II Inconformada com esta decisão, a Autora “AA” dela interpôs recurso de apelação, impugnando a decisão da 1.ª instância quanto à matéria de facto, ínsita nos pontos 60º, 63º, 68º, 69º e 70º dos factos provados e 6º dos dados como não assentes, e pugnando pela ilicitude do modelo de greve convocado pelos RR.

Terminou a sua alegação e conclusões pedindo que a sentença recorrida fosse revogada em virtude de ter adotado “[…] uma interpretação normativa dos artigos 530º, 536º, 537º, n.º 3, 538º, 539º e 541º, todos do Código do Trabalho[3], que consente que o direito à greve possa afetar, de modo excessivo e desproporcionado outros direitos constitucionalmente protegidos, designadamente os direitos ínsitos nos artigos 25º, 61º e 66º, estes da Constituição da República Portuguesa[4], o que, “in casu”, acabou por, efetivamente, suceder”.

Por acórdão de 28 de junho de 2017, proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, foram eliminados os pontos 60º e 63º da matéria de facto assente, e, com um voto de vencido[5], julgou-se a apelação procedente e, em consequência, revogou-se a decisão recorrida, declarando-se ilícito o modelo adotado nas greves realizadas nas refinarias de Sines e Matosinhos, em Abril de 2010 e em Setembro e Outubro de 2012, por não permitirem o cumprimento do disposto no n.º 3, do artigo 537º do CT.

III Inconformados com o acórdão ficaram, agora, os RR. “SICOP” e “FIEQUIMETAL” que dele interpuseram recurso de revista, concluindo a respetiva alegação da seguinte forma: Recurso do “SICOP”: A.

“O presente recurso vem interposto do douto Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) que decidiu, revogando a decisão proferida na 1ª Instância, declarar ilícito o modelo de greve adotado nas greves realizadas nas refinarias de Sines e de Matosinhos da Autora, em abril de 2010 e em setembro e outubro de 2012, por não permitirem o cumprimento do disposto no n.º 3, do artigo 537º, do CT.

  1. No entender do TRL, a paralisação das refinarias decorrentes daquelas greves acarreta riscos acrescidos para a segurança e manutenção dos equipamentos e instalações, do meio ambiente e das pessoas, bastando que esses riscos sejam potenciais para se entender que o modelo de greve então utilizado não cumpre a obrigação que recai sobre os trabalhadores de garantir os serviços necessários à segurança e manutenção e equipamentos e instalações, prevista naquele n.º 3, do artigo 537º.

  2. Para o Acórdão recorrido tais serviços terão de ser os "mínimos técnicos", pretendidos pela Autora, situação em que os equipamentos se mantêm ligados e em funcionamento, por estes mínimos técnicos minimizarem os riscos de ocorrência de acidentes e avarias nos mesmos.

  3. Salvo o devido respeito, tal tese é incompatível com o disposto nos artigos 57º e 18º, da CRP, e faz uma incorreta aplicação dos artigos 530º, 531º, 537º e 538º, do CT.

  4. Com efeito, o direito à greve é um direito fundamental garantido aos trabalhadores pelo artigo 57º, da CRP.

  5. Embora direito fundamental, não é um direito absoluto, pelo que existindo a possibilidade de confronto ou colisão entre o direito de greve e outros direitos fundamentais, esse direito pode sofrer alguma sorte de restrição nas situações definidas por lei e com observância de determinados limites, como dispõe o artigo 18º da CRP.

  6. A lei, no artigo 537º, do CT, em sintonia com a CRP, permite que o direito de greve sofra limitação desde que estejam em causa, como é o caso dos autos, empresas ou estabelecimentos cujas atividades se desenvolvam em sectores vitais da vida em sociedade, que digam a bens constitucionais coletivos.

  7. Mas, como referem Gomes Canotilho e Vital Moreira, “in Obra citada, pág. 757 e 353”, as medidas definidoras dos serviços mínimos e dos serviços necessários à segurança e manutenção dos equipamentos e instalações, consubstanciando medidas restritivas do direito de greve devem pautar-se pelos princípios da necessidade, da adequação e proporcionalidade. O que significa que as mesmas devem situar-se numa "justa medida" impedindo-se a adoção de medidas desproporcionadas e excessivas em relação aos fins obtidos, sendo que, sempre, existe um limite absoluto a essas consentidas restrições que é o conteúdo essencial do respetivo direito, não podendo a definição dos serviços mínimos e dos serviços necessários à segurança e manutenção dos equipamentos e instalações, traduzir-se na anulação do direito de greve, ou reduzir substancialmente a sua eficácia, mas sim evitar prejuízos externos e injustificados, comprimindo-o por via do recurso à figura de conflito de direitos - cf.

    Ac. RL de 25/05/2011 (Desembargadora Albertina Pereira), www.dgsi.pt.\ I. Assim, não é possível afirmar que a greve deve ser proporcionada - limite que aliás não se mostra em lado algum da Constituição ou da lei - mas sim - por respeito aos outros direitos constitucionalmente protegidos - que não deve ser excessivamente desproporcionada e, por isso, existem legalmente serviços mínimos e a obrigação de assegurar os serviços necessários à segurança de equipamentos e instalações. E em relação a estes expressamente encontramos uma obrigação de proporcionalidade - artigo 538º, n.º 5 do CT - de par com a necessidade e adequação, de modo a que não se perca a eficácia da própria greve.

  8. Porém, salvo o devido respeito, entendemos que, tal como ficou exarado no voto de vencido da Exma. Senhora Juíza Desembargadora, "os riscos invocados pela recorrente, ponderados é certo, atendendo à atividade desenvolvida, não são de molde a pôr em causa o exercício do direito de greve, atenta a sua configuração constitucional.".

  9. Entre o mais, mostra-se provado nos autos que, i) Não houve consenso entre as associações sindicais e a Autora relativamente à fixação de serviços mínimos que, igualmente, não foram fixados administrativamente, tendo-se os sindicatos comprometido a assegurar a segurança e manutenção dos equipamentos e instalações, nos termos do artigo 537º, n.º 3, do CT.

    ii) As refinarias de Sines e de Matosinhos da Recorrida são empresas de laboração contínua, cuja complexidade técnica impede que os trabalhadores adotem uma forma de greve em que simplesmente eles não compareçam ao trabalho. Os...

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