Acórdão nº 109/09.5TBACN.1.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Abril de 2018
Magistrado Responsável | FÁTIMA GOMES |
Data da Resolução | 17 de Abril de 2018 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.
AA fez entrar em juízo um requerimento executivo, em que figura como exequente, sendo executado BB; com o requerimento pretendia haver do executado a quantia de € 39.000,00, relativa às prestações alimentares desde Julho de 2010 até Dezembro de 2016 (78 prestações x 500,00). O requerimento executivo foi liminarmente indeferido. A requerente interpôs recurso do despacho de indeferimento.
O Tribunal da Relação de Évora veio a conhecer da apelação, confirmando o despacho de indeferimento, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente.
Inconformada com a decisão dela apresentou a requerente recurso de revista – excepcional.
O processo foi distribuído à formação a que alude o art.º672.º do CPC que, por acórdão de 22/2/2018, determinou que não havia fundamento de admissão de revista excepcional, devendo o processo ser distribuído como “revista normal”, a fim de se apurar da admissibilidade do recurso, atento o disposto no art.º 854.º do CPC: este preceito limita o recurso para o STJ das decisões proferidas em processo executivo, mas ressalva as situações em que o recurso é sempre admissível.
As situações em que o recurso é sempre admissível estão elencadas no art.º 629.º, n.º2 do CPC.
Não sendo aplicável ao caso nenhuma das situações a que se reportam as al. a), b) e c) do n.º2 do art.º 629.º CPC, não está excluída a possibilidade de ser aplicável a al. d) – oposição de julgados.
2.
A recorrente apresentou as seguintes conclusões de recurso (transcrição, expurgadas as conclusões exclusivamente aplicáveis à admissibilidade da revista excepcional): “5. Na acção executiva a exequente deu à execução a sentença de 17 de Abril de 2009, que homologou a acordo celebrado entre os seus progenitores no âmbito do processo de Regulação das Responsabilidades Parentais intentado quando era menor de idade; 6. A sentença proferida na 1ª instância veio a decidir que a exequente não tem título executivo uma vez que a obrigação de alimentos cessou com a sua maioridade, ocorrida antes da entrada em vigor do Lei 122/2015 de 1 de Setembro; 7. O acórdão da Relação de Évora confirmou o despacho recorrido, fundamentando a decisão no facto de a recorrente ter atingido a maioridade antes da entrada em vigor da Lei 122/2015, o que teria determinado a cessação da obrigação alimentícia; 8. (…) 9. (…) 10. O dever de assistência no qual se insere a obrigação de prestar alimentos está intimamente ligado ao direito à vida e à dignidade da pessoa humana; 11. A interpretação do art.º 1880.° do C. Civil deu aso a uma vasta querela na jurisprudência e na doutrina; 12. A Lei 12212015, de 1 de Setembro, veio pôr termo às diferentes interpretações do art.º 1880.° do C. Civil, deixando claramente dito que a prestação de alimentos fixada na menoridade se mantém até que o filho atinja os 25 anos de idade, verificados os demais pressupostos previstos no n.° 2 do art.° 1905.° do C. Civil; 13. A controvérsia persiste agora com a questão ligada à aplicação da Lei 122/2015 de 1 de Setembro; 14. Defendem algumas decisões que a Lei deve aplicar-se somente às situações que ocorrerem depois da respectiva entrada em vigor; 15. Outras decisões defendem que a Lei também se aplicará às relações jurídicas constituídas e subsistentes a essa data, 1 de Outubro de 2015; 16. Esta controvérsia provoca situações de diferença tal que gera nos cidadãos a dúvida sobre a credibilidade da eficácia do direito na sua aplicação aos casos concretos da vida das famílias; 17. O impacto que esta questão, ligada à dignidade da pessoa humana, provoca nas famílias de pais divorciados ou separados e na sociedade em geral tem relevância que justifica a submissão à apreciação pela mais alta instância, pelo Supremo Tribunal de Justiça; 18. O acórdão da Relação de que se recorre está em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no processo n° 69541l6.8T8LSB.Ll-/, de 14 de Junho de 2016, em que foi relatora a Senhora Desembargadora D.ª Rosa Ribeiro Coelho; 19. Ambos os acórdãos se pronunciam sobre a exequibilidade da sentença que homologou o acordo dos progenitores sobre os alimentos devidos ao filho menor, quando dada à execução depois da maioridade deste; 20. Em ambos os acórdãos a questão fundamental de direito é apreciada ao abrigo da mesma legislação; 21. O acórdão-fundamento defende a exequibilidade da sentença homologatória do acordo depois da maioridade de filho; 22. O acórdão ora recorrido contrariamente defende que a sentença não constitui título executivo por ter cessado a obrigação alimentícia em função da maioridade do filho; 23. (….) Do recurso de Revista Excepcional: 24. O douto acórdão do Tribunal da Relação de Évora confirmou a sentença proferida na 1ª instância, que indeferiu liminarmente a execução por inexistência do título executivo uma vez que a exequente havia atingido já a maioridade antes da entrada em vigor da Lei 122/2015 de 1 de Setembro; 25. Decorre dos efeitos jurídicos da filiação o dever de assistência dos pais aos filhos; 26. Com vista à formação profissional dos filhos, a obrigação de auxílio estende-se para depois da maioridade e durante o período necessário para completar aquela formação profissional; 27. O art.° 1880.° do Código Civil contempla uma extensão da obrigação de alimentos para além da menoridade, que obriga os pais, dentro das suas possibilidades económicas, a assegurar aos filhos uma formação profissional; 28. A interpretação do art.º 1880.° do Código Civil não era pacífica e gerou controvérsia no campo jurisprudencial e doutrinário; 29. Na jurisprudência advogavam uns que a prestação de alimentos fixada durante a menoridade cessava com a maioridade, passando a recair sobre o filho o ónus de propor acção contra o progenitor não convivente para suportar a sua formação profissional; 30. Outra corrente defende que a pensão de alimentos fixada na menoridade se mantinha depois de atingida a maioridade, não cessava automaticamente, uma vez que a maioridade como causa típica de cessação do dever de alimentos não constava expressamente das causas de cessação da obrigação de alimentos previstas no art.° 2013.° do Código Civil; 3 1. Com a entrada em vigor da Lei 122/2015 de 1 de Setembro o legislador pôs cobro à controvérsia; 32. A interpretação legal do art.° 1880.° fixada no n.º2 do art.° 1905.° do Código Civil é a de que se mantém para depois da maioridade, e até que o filho complete os 25 anos de idade, a pensão fixada durante a menoridade, salvo se o respectivo processo de educação ou formação profissional estiver concluído antes daquela data, se tiver sido livremente interrompido ou ainda se, em qualquer caso, o obrigado à prestação de alimentos fizer prova da irrazoabilidade da sua exigência; 33. A mencionada Lei não alterou a previsão do art.° 1880.° do Código Civil, não criou norma transitória para regular a sua aplicação, limitou-se a verter em letra de lei uma das interpretações jurisprudenciais possíveis; 34. A Lei n° 122/2015, na redacção que dá ao n.º2 do art.° 1905.° do Código Civil, deve ser considerada uma lei interpretativa. Assim sendo, integra-se na lei interpretada e aplica-se retroactivamente, como se dispõe no art.° 13.° do Código Civil; 35. O legislador na nova redacção do n.º2 do art.° 1905.° do Código Civil veio adequar a letra da lei à situação mais justa em face dos constrangimentos de tantos jovens em peticionar alimentos aos progenitores que lhes não querem pagar apesar da necessidade daqueles e das possibilidades destes e em face das diferenças de tratamento dos filhos de pais separados ou divorciados relativamente aos filhos dos pais casados ou unidos de facto; 36. As expectativas frustradas dos obrigados a alimentos que não vêem cessar automaticamente a prestação que pagavam durante a menoridade, derivavam não da lei mas da interpretação que dela se fazia; 37. Afigura-se serem tão legítimas e fundadas as expectativas dos progenitores como as dos filhos que contavam com a manutenção da pensão estabelecida na menoridade até que completassem a formação profissional; 38. A aplicação da lei aos casos de filhos que atingiram a maioridade antes da sua entrada em vigor e que peticionaram as prestações que se venceram nesse período não viola o disposto no n.º l do art.° 12.° do Código Civil; 39. Com a Lei n° 122/2015 a interpretar o art.° 1880.° nos termos fixados no n.º2 do art.° 1905.° todos do Código Civil o legislador veio consagrar a solução mais acertada optando por uma das interpretações da lei que vinha sendo feita por uma corrente jurisprudencial, ainda que minoritária; 40. Havendo uma pensão de alimentos fixada na menoridade por decisão judicial, esta constitui título executivo para reclamação das pensões devidas no âmbito do art.° 1880.° do Código Civil até que o alimentado complete os 25 anos de idade; 41. A Lei n° 122/2015 criou um novo título executivo e é de aplicação imediata; 42. Com a entrada em vigor da Lei n" 122/2015, em 1 de Outubro de 2015, a ora recorrente passou a ter na sentença homologatória que fixou a prestação de alimentos quando ainda era menor, um título executivo para executar as prestações vencidas; 43. Em 1 de Outubro de 2015 a recorrente tinha 23 anos de idade e continuava a estudar, o que acontece ainda agora; 44. A Lei n" 12212015 não excluiu do seu campo de aplicação os menores de 25 anos que atingiram a maioridade antes de 1 de Outubro de 2015; 45. A exequente executou as prestações vencidas entre Julho de 2010 e Dezembro de 2016; 46. Em 1 de Outubro de 2015, data da entrada em vigor da Lei n.º 122/2015, a exequente tinha 23 anos e até Dezembro de 2016, quando fez 25 anos, venceram-se 15 meses e outras tantas prestações, no valor de € 7.500,00; 47. A sentença dada à execução constitui título para executar as prestações que se venceram após a entrada em vigor da Lei nº 122/2015 e até que a exequente completou os 25 anos de idade; 48. E também constitui...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO