Acórdão nº 415/12.1TBVV-A.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Novembro de 2014

Magistrado ResponsávelANA PAULA BOULAROT
Data da Resolução13 de Novembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I Nos autos de incumprimento do poder paternal em que é Requerente M e Requerido V, com vista à cobrança coerciva da quantia em dívida referente às prestações de alimentos devidas à menor C, filha de ambos, pelo respectivo progenitor, fixada em 100 € mensais nos autos de regulação das responsabilidades parentais, apurou-se que o Requerido não possui bens e aufere € 178,15 mensais de RSI.

Foi promovida pelo Ministério Público a declaração de incumprimento e que a pensão de alimentos fosse suportada pelo Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores (FGADM), em montante nunca inferior a € 150,00.

Proferiu-se sentença, na qual se decidiu: “1 – Julgar verificado o incumprimento do requerido no que concerne ao montante de € 800,00, respeitante ao montante já reconhecido de € 200,00 e aos meses de Abril a Setembro de 2013; 2 – Fixar em € 150,00 (cento e cinquenta euros), ao abrigo do disposto nos arts. 1º, 2º e 3º da Lei nº 75/98, de 19.11, e arts. 2º, 3º e 4º do DL nº 164/99, de 13.05, a prestação de alimentos a cargo do FUNDO DE GARANTIA DOS ALIMENTOS DEVIDOS A MENORES, sendo tal montante actualizado, anualmente, em 1 de Janeiro, de acordo com o índice dos preços para o consumidor verificado no ano anterior a tais actualizações, publicado pelo I. N. E.

” Desta decisão recorreu o FGADM, tendo a Apelação vindo a ser julgada improcedente.

Inconformado com este Aresto, dele interpôs recurso o Ministério Público, agora de Revista, com fundamento em oposição de Acórdãos, apresentando as seguintes conclusões: – O incidente de intervenção do FGADM tem como pressuposto o não pagamento da prestação judicialmente fixada e a impossibilidade de obter tal pagamento nos termos do artigo 189º da OTM, não podendo destinar-se a fixar uma nova pensão, superior à devida pelo progenitor incumpridor, mas podendo a mesma ser de valor inferior, se tal se justificar face à situação do menor e ao limite máximo fixado no artigo 3°, nº5 do DL 164/99 (se for o caso); – A previsão do artigo 5º, nº1 do DL 164/99 de que " O Fundo fica sub-rogado em todos os direitos do menor a quem sejam atribuídas prestações, com vista à garantia do respectivo reembolso", traduz a clara intenção do legislador de que o Fundo venha a poder ser ressarcido de tudo aquilo que pagou em substituição do devedor, o que só ocorrerá se não for obrigado a pagar para além do que já se encontrava fixado; – A prestação de alimentos a suportar pelo Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores em caso de incumprimento, pelo progenitor, da obrigação, previamente, fixada judicialmente não pode ser estabelecida em montante superior a esta; – Deverá o acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro em que seja seguido o entendimento constante do acórdão-fundamento, no sentido de que a prestação a pagar pelo FGADM seja fixada em montante não superior ao que se encontrava fixado para o progenitor devedor – no caso dos autos, a quantia de € 100,00 mensais.

– Não tendo assim decidido, violou o douto acórdão recorrido o disposto nos artigos 2º, nº2, 3º, nº5 e 5º, nº1 do DL 164/99, de 13.05, devendo interpretar-se tais normas no sentido de que as prestações atribuídas aos menores que caiba ao FGADM pagar não podem ser superiores às que se encontravam fixadas ao progenitor devedor.

Não foram apresentadas contra alegações.

II O aporema daqui consiste, apenas e tão só, em saber se o Tribunal, perante um incidente de incumprimento da prestação alimentar por banda do progenitor a ela obrigado, concluindo que aquele a não pode satisfazer e por isso atribuindo ao FGADM tal obrigação, poderá concomitantemente alterar o montante devido, aumentando-o, no caso.

As instâncias deram como assente a seguinte factualidade: – Do relatório realizado ao progenitor da criança resulta que o mesmo aufere RSI no valor de 178,15 euros, cuja alimentação é suportada pelo Centro Paroquial de …; – Por decisão proferida, nos autos principais, em 05.02.13, foi o pai da criança, V, condenado a pagar a quantia mensal de € 100,00, a título de alimentos devidos à criança C, nascida em 11.02.05; – O requerido não cumpriu com a prestação de alimentos a que estava obrigado, a partir de Fevereiro de 2013; – A criança vive com a mãe, M, formando com esta o respectivo agregado familiar; – Os rendimentos do agregado familiar são de € 261,60, resultante do RSI; – A capitação do agregado familiar é, assim, de € 154,40.

  1. Antes de começarmos a analisar a problemática recursiva, com apelo às divergentes correntes jurisprudenciais em confronto e que deram origem a esta impugnação, façamos um pequeno sobrevoo sobre a legislação aplicável.

    Vem consagrado no artigo 69º da CRPortuguesa o direito das crianças à protecção da sociedade e do Estado, visando-se a sua integral protecção, o que implica a se, os correlativos deveres por banda da sociedade e do Estado o que justificará a tomada de medidas especiais, maxime no que tange a prover o seu sustento: «1. As crianças têm direito à protecção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais instituições. 2. O Estado assegura especial protecção às crianças órfãs, abandonadas ou por qualquer forma privadas de um ambiente familiar normal. 3. É proibido, nos termos da lei, o trabalho de menores em idade escolar.

    » No prosseguimento destas politicas sociais, veio a ser publicada a Lei 75/98 de 19 de Novembro, onde se estabeleceu um regime de garantia da prestação de alimentos devidos a menores, em caso de incumprimento do correspondente dever judicialmente fixado por parte dos obrigados, através da criação para o efeito do Fundo de Garantia dos Alimentos Devidos a Menores.

    Resulta do artigo 1º daquele diploma o seguinte: «1 - Quando a pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos a menor residente em território nacional não satisfizer as quantias em dívida pelas formas previstas no artigo 189.º do Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de outubro, e o alimentado não tenha rendimento ilíquido superior ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS) nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, o Estado assegura as prestações previstas na presente lei até ao início do efetivo cumprimento da obrigação.

    2 - O pagamento das prestações a que o Estado se encontra obrigado, nos termos da presente lei, cessa no dia em que o menor atinja a idade de 18 anos.

    » Acrescenta o artigo 3º, nº1, no que à economia da...

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