Acórdão nº 27/12.0GAODM.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Julho de 2014
Magistrado Responsável | HELENA MONIZ |
Data da Resolução | 03 de Julho de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório 1.
Na Comarca do Alentejo Litoral foram julgados por tribunal coletivo, no âmbito do processo n.º 27/12.0GAODM, e condenados, por acórdão de 6 de novembro de 2013, os agora recorrentes, AA, pela prática, entre o verão de 2012 e 16.04.2013, como autor, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21.º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, com referência à tabela I-A, anexa àquele diploma, na pena de 6 (seis) anos de prisão, e BB, pela prática, entre abril de 2012 e 16.04.2013, como autor, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21.º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, com referência à tabela I-A, anexa àquele diploma, na pena de 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão.
Foi também julgado e condenado o arguido CC, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21.º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, com referência à tabela I-A, anexa àquele diploma, na pena de 4 anos e 10 meses de prisão, suspensa na sua execução, por idêntico período de tempo, sendo a suspensão acompanhada de regime de prova. Este arguido não é recorrente nos presentes autos.
2.
No mesmo acórdão - foram declaradas perdidas, a favor do Estado, as substâncias estupefacientes, apreendidas aos três arguidos no âmbito dos autos, e os respetivos invólucros ou recipientes contentores; - foram declarados perdidos, a favor do Estado, o telemóvel e cartão apreendidos ao arguido CC (identificados no auto de apreensão de fls. 194), os telemóveis, cartões e demais objetos apreendidos ao arguido AA (identificados no auto de apreensão de fls. 202), a nota de € 10 e demais objetos apreendidos na residência do arguido AA (identificados no auto de apreensão de fls. 217), o telemóvel, o cartão de telemóvel e o dinheiro apreendidos na residência do arguido BB (identificados no auto de apreensão de fls. 570 do apenso a que cabe o NUIPC 25/12.3GAODM), e a quantia de € 10 apreendida ao arguido CC (identificada no auto de apreensão de fls. 11 do apenso a que cabe o NUIPC 23/12.7GAODM).
2.
Inconformados, os arguidos interpuseram, separadamente, recurso.
2.a.
O arguido BB interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora, restrito à matéria de direito, com fundamento nos arts. 411.º, 406.º e 407.º, todos do Código de Processo Penal (doravante CPP). Entende, em síntese, que a pena que lhe foi aplicada é demasiado severa e desproporcionaada relativamente aos factos dados como provados; entende também que “sem prejuízo de se considerar o arguido com reincidente e nessa medida ser-lhe aplicada uma pena, será sempre em conformidade com o previsto no art. 76.º, n.º 1 do CP, ou seja ao limite mínimo do crime de tráfico de estupefacientes com previsão legal no art. 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22 de janeiro, de 4 anos poderá, quanto muito, ser-lhe acrescido um terço, o que perfazia a pena de prisão de 5 anos e 3 meses e não de 7 anos e 6 meses, que foi inadequadamente aplicada”; e concluindo que a não ser assim, e em última análise, deverá aquela pena ser reduzida em função do estabelecido no art. 76.º, n.º 1 do CP, ao considerarmos que o arguido é reincidente, devendo-lhe aplicar a pena pelo limite mínimo, acrescida de 1/3, o que perfazia a pena de 5 anos e 3 meses”. Para além disto, o arguido entende que o acórdão recorrido deve ser revogado na parte em que o montante de € 230 foi declarado perdido a favor do Estado, decidindo-se a restituição do mesmo ao recorrente.
2.b.
O arguido AA interpôs recurso per saltum, restrito à matéria de direito, com fundamento nos arts. 399.º, 401.º, n.º 1, al. b), 406.º, n.º 1, 407.º, n.º 2, al. a), 408.º, n.º 1, al. a), 411.º, 412.º e 432.º, n.º 1, al. c), todos do CPP. Entende este arguido que a pena de prisão efetiva que lhe foi aplicada é manifestamente excessiva, devendo ser sancionado com pena inferior àquela que foi decidida, balizada entre os 4 e os 5 anos de prisão, suspensa na sua execução, mediante regime de prova.
3.
Os recursos foram ambos admitidos por despacho proferido a fls. 1450 dos autos, a subir para o Tribunal da Relação de Évora.
O Ministério Público, junto do Tribunal da Relação de Évora, emitiu parecer no sentido de, versando os recursos daqueles arguidos unicamente sobre matéria de direito, ser o Tribunal da Relação de Évora incompetente para conhecer dos mesmos, devendo os autos ser remetidos ao Supremo Tribunal de Justiça, por a este caber, à luz do estatuído na al. c) do art. 432.º do CPP, a competência para o respetivo conhecimento. Mais respondeu considerando que “na resposta que ofereceu à motivação de tais recursos, a Magistrada do Ministério Público na instância recorrida pugna pela justeza do decidido, com a consequente improcedência das pretensões dos recorrentes, resposta cujo teor, conclusões e sentido decisório aqui se sufragam” (fls. 1510).
Notificados os arguidos daquele parecer, nada disseram.
A fls. 1515 dos autos, o Exmo. Senhor Desembargador Relator proferiu despacho a declarar competente para o conhecimento de ambos os recursos o Supremo Tribunal de Justiça, para onde determinou que os autos fossem remetidos (em conformidade com o disposto no art. 432.º, n.º 2 do CPP).
Notificados dessa decisão, os arguidos nada disseram.
4.a.
O arguido BB, na interposição do recurso para este Tribunal, concluiu a sua motivação nos seguintes termos: «1. A pena de prisão aplicada ao arguido, ora recorrente de sete anos e seis meses é demasiado severa e desproporcional em face dos factos provados, atendendo à sua relevância social e económica de pouca saliência e circunstancialmente limitada.
2. A pena aplicada deverá ser reduzida para o limite mínimo estatuído para o tipo de crime tipificado e imputado ao arguido, “Tráfico de Estupefacientes”, previsto e punido pelo art.º 21, n. 1º, do Decreto-Lei n.º 15/93 de 22 de Janeiro, de quatro anos, em face da atenuação possível em consonância com os factores que a seguir se enumeram: . O arguido agiu motivado pelo consumo de produtos estupefacientes, que por forma a fazer face ao seu vício, acabou por diversas vezes dispensar heroína em troca de dinheiro para poder comprar mais produto, bem como foi, também, influenciado pelos consumidores que o procuravam e insistiam para que o mesmo lhe dispensasse produto; . Não resultou contrapartida economicamente relevante; . Não foi criado alarido social ou perturbação à ordem pública evidentes; . A área circunscrita era limitada a … e sempre aos mesmos consumidores, que aliás já são consumidores há largos anos; . O arguido confessou parcialmente os factos; . O arguido encontra-se a frequentar um programa de tratamento, no interior do Estabelecimento Prisional de Beja; . Não existem probabilidades de continuação da actividade criminosa; . Está inserido profissional, familiar e socialmente.
3. A não ser assim, e em última analise, deverá aquela pena ser reduzida em função do estabelecido no art.º 76.º, n. 1 do C.P., ao considerarmos que o arguido é reincidente, devendo-lhe aplicar a pena pelo limite mínimo, acrescida de 1/3, o que perfazia a pena de 5 anos e 3 meses.
Nunca, a pena aplicada pelo tribunal “a quo”.
4. O douto Acórdão deverá ser revogado na parte em que foi apreendido o montante de €230,00 a favor do Estado, decidindo-se a restituição do mesmo ao seu dono, aqui recorrente.
5. Foi assim violado o disposto no art.º 71.º do C.P. na determinação da medida da pena aplicada.» 4.b.
O arguido AA, na interposição do recurso para este Tribunal, concluiu a sua motivação nos seguintes termos: «I - O arguido AA, foi condenado pela prática, entre o verão de 2012 e 16/04/2013, como autor, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art.º 21º, n. 1 do D.L. n.º 15/93, na pena de 6 anos de prisão; II - A pena de prisão efectiva aplicada ao arguido é manifestamente excessiva, não tendo o Tribunal levado em linha de conta os factos dados como provados e enumerados sobre os pontos 50, 51, 52, 54, 58, 59 e 60 do acórdão, os quais depuseram a favor do arguido; III - Os factos apesar de serem graves, estão circunscritos apenas àquelas pessoas que são conhecidas como os consumidores da localidade de Vila … e … em número não superior a 13, não causando alarme social nem verificando-se grandes repercussões no tecido social; IV - Se atentarmos na comparação entre a dosimetria das penas aplicadas entre o arguido AA (6 anos) e o arguido BB (7 anos e 6 meses), este último com um passado criminal muito mais extenso que o arguido AA, e mais grave do ponto de vista da prática dos ilícitos em causa, nota-se em termos comparativos um sancionamento mais severo ao arguido AA, quando nada o justifica; V - O comportamento do arguido deverá ser sancionado com pena inferior aquela que foi decidida, devendo balizar-se entre os 4 e os 5 anos de prisão; VI - Os autos permitem até fazer um juízo de prognose favorável ao arguido no sentido de que a simples censura do facto e a ameaça da pena realizam de forma adequada e suficiente a finalidade da punição, se considerarmos que o mesmo tem já cumpridos 8 meses de prisão por força da medida de coacção a que vem estando sujeito; VII- Destarte seja qual for a pena de prisão encontrada como sendo a mais justa, deve a mesma ser-lhe suspensa na sua execução, sujeita a regime de prova, até porque o arguido nunca beneficiou da suspensão da pena de prisão, nem tem antecedentes criminais pelo mesmo tipo de crime; VIII - O douto acórdão proferido pelo Tribunal “a quo” violou, assim, o disposto nos arts.º 50º e 71º, todos do Código Penal.» 5.
Ao motivado e concluídos pelos recorrentes, o Senhor Procurador da República na Comarca do Alentejo Litoral concluiu que deve ser negado provimento aos recursos interpostos e confirmado o acórdão recorrido, porquanto: «(…) Ora, atendendo ao caso «sub judice», verifica-se que a ilicitude do facto é elevada, tendo em conta que as condutas dos arguidos se...
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