Acórdão nº 934/05.6TBMFR.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Julho de 2014
Magistrado Responsável | GRANJA DA FONSECA |
Data da Resolução | 09 de Julho de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.
A Administração do Condomínio do Prédio, sito na … … n.º …, …., n.º …, …, Concelho de Mafra, representada pelos seus Administradores AA e BB, demandou os Réus: 1 - CC e mulher DD; 2 - EE e mulher FF; 3 - Câmara Municipal de …, na pessoa do seu Presidente.
Pede que, na procedência da acção: a) – Sejam os 1.
os e 2.
os Réus condenados a demolirem a parede construída em alvenaria de tijolo, construída por ambos na garagem colectiva e a fecharem as escadas construídas que ligam internamente a sub - cave e a cave; b) – Sejam os 1.
os Réus condenados a absterem-se de utilizar os 5/25 avos de que são comproprietários na garagem colectiva como salão de móveis ou para qualquer outro fim que não seja o parqueamento de automóveis; c) – Seja a 3ª Ré condenada a indemnizar os proprietários do prédio em indemnização a liquidar em execução de sentença.
Fundamentando a sua pretensão, alega, em síntese, que, com o conluio dos segundos Réus, os primeiros Réus utilizam o espaço da garagem colectiva numa área que extravasa aquela que lhes compete segundo o título constitutivo de propriedade horizontal e para fim diverso daquele que consta do mesmo título, tendo mesmo construído parede e escadas sem correspondência com a planta do edifício. Com o seu comportamento, os Réus põem em causa a segurança do edifício e dificultam a circulação de veículos.
A terceira Ré, a quem compete o licenciamento de obras e a respectiva fiscalização, omitiu este dever de diligência, já que basta um simples olhar para verificar que as obras efectuadas não obedecem ao projecto de construção.
AA e outros, na qualidade de comproprietários da fracção “B” deduziram nos autos o incidente de intervenção principal espontânea, (fls. 567 a 574), admitida conforme despacho de fls. 674 a 676, formulando os seguintes pedidos: a) – Condenar todos os Réus individual e solidariamente a demolirem, à custa dos mesmos, a parede construída em alvenaria de tijolo na garagem correspondente à fracção “B”; b) – Condenar todos os Réus individual e solidariamente a demolirem, à custa dos mesmos, as escadas que ligam internamente a sub - cave (fracção A) à cave (fracção B) e a taparem o acesso que fizeram à fracção B, emparedando-o; c) – Condenar todos os Réus individual e solidariamente a tapar e emparedar, às custas dos mesmos, os vãos/montras que aqueles abriram para o hall da entrada do prédio que dá acesso às fracções e partes comuns; d) – Condenar os 1.
os Réus a absterem-se de utilizar a garagem, fracção B como extensão da fracção A, que ocupam com exposição e comércio de móveis, por tal fim não ser permitido pelo título constitutivo da propriedade horizontal e pela licença de utilização, devendo a sua ocupação limitar-se ao parqueamento de veículos automóveis e apenas na proporção de que são titulares inscritos no registo predial; e) – Condenar-se todos os Réus individual e solidariamente ao pagamento de uma indemnização global no valor de € 110.000,00, pelos prejuízos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, acrescida de juros à taxa legal, contados desde a data da citação dos Réus, até efectivo e integral pagamento.
Na parte que ora interessa, a Câmara Municipal de …, contestando a acção, suscitou, por excepção, a incompetência absoluta do tribunal em razão da matéria, peticionando a sua absolvição da instância.
O Autor e os intervenientes responderam, defendendo a improcedência das excepções deduzidas, concluindo que os pedidos formulados pelo Autor e pelos intervenientes devem ser julgados procedentes.
Findos os articulados, o Tribunal da 1ª Instância declarou-se materialmente incompetente para conhecer da acção, na parte em que a mesma corre contra a Câmara Municipal de …, sustentando a sua decisão nos critérios de atribuição positiva de competência e de competência residual, apurados também em função do tema a decidir, considerando competentes os tribunais administrativos e, considerando ainda existir uma causa prejudicial entre esta acção e a que venha a ser proferida, determinou que os autos aguardassem até desfecho daquela referenciada acção (vide fls. 722 a 729).
Inconformados, apelaram a Administração do Condomínio e os Intervenientes devidamente identificados nos autos (vide fls. 567), pretendendo que o Tribunal recorrido fosse considerado competente em razão da matéria para julgar o pedido efectuado, também contra a Ré Câmara Municipal da …, ordenando-se o prosseguimento dos autos.
O Tribunal da Relação de Lisboa, em acórdão de 12/12/2013, sustenta que a competência em razão da matéria deve aferir-se com referência ao pedido formulado e, se o mesmo se fundar numa causa de pedir complexa, aquela aferição há-de ser feita (também) com referência à causa de pedir dominante.
Considerando, seguidamente, que a causa de pedir é complexa e apreciando a competência material em função dos aludidos critérios, concluiu que o tribunal judicial de 1ª instância é materialmente competente para apreciar a causa também na parte referente à Ré Câmara Municipal, admitindo, porém, que se está num terreno onde se cruzam o direito privado e o direito público.
E assim, na procedência da apelação, revogou a decisão recorrida, considerou o Tribunal comum o competente, determinando o prosseguimento dos autos (vide fls. 855 a 866).
Agora inconformada, recorre de revista a Ré Câmara Municipal de …, finalizando a alegação com as seguintes conclusões: 1ª - O Acórdão recorrido enferma de um erro de julgamento na interpretação e aplicação das normas aplicáveis, violando frontalmente a lei substantiva, ao considerar materialmente competente (o Tribunal a quo) para apreciar, nos presentes autos, o pedido de condenação na parte referente à ora recorrente; 2ª - Com efeito, os recorridos fundamentam o pedido de condenação da ora recorrente Câmara Municipal de …, (na petição inicial e no requerimento de intervenção principal espontânea), no facto da mesma ter emitido uma licença e um alvará de utilização sem verificar a conformidade da obra com o projecto aprovado, ter permitido alterações ao projecto inicial, nomeadamente a redução de 2 pisos de parqueamento para um só, sem fiscalizar a viabilidade de tal alteração, e ter negligenciado os seus poderes de fiscalização; 3ª - Acontece que o acto de licença e alvará de utilização, a decisão de alteração ao projecto inicial consubstanciam actos administrativos puros e que os poderes de fiscalização da recorrente se inserem na função administrativa prosseguida pela recorrente - pessoa colectiva de direito público, investida de poderes públicos; 4ª - A responsabilidade derivada dessa actuação terá de ser apreciada no quadro do exercício da actividade administrativa, tanto que os recorridos invocaram especificamente o artigo 23º do Regime Jurídico do Licenciamento Municipal de Obras Públicas; 5ª - Em relação aos 1.
os e 2.
os Réus, os Recorridos já fundamentaram a imputação da sua responsabilidade na violação dos artigos 1406º e 1422º do Código Civil; 6ª - Em 1ª instância o tribunal a quo declarou-se materialmente incompetente para conhecer da acção na parte em que a mesma corre contra a Câmara Municipal de …, na medida em que as regras de competência determinavam a incompetência material dos tribunais judiciais para conhecer desta questão, absolvendo-a da instância; 7ª - Os ora Recorridos apelaram para o Tribunal da Relação de Lisboa que revogou aquela decisão por entender que da aferição da competência em razão da matéria com referência ao pedido formulado e à causa de pedir dominante resultaria a competência dos “tribunais judiciais para apreciar a questão também na parte respeitante à ora recorrida”; 8ª - Entende a ora Recorrente que, conjugadas as normas sobre a competência material com os termos em que a acção foi proposta e pela forma como os recorridos estruturaram os fundamentos do seu pedido, se conclui em sentido diverso; 9ª - Com efeito, a causa de pedir, fundamento da responsabilidade civil extracontratual imputada à ora recorrente, é a alegada negligência na sua actuação enquanto entidade competente para emitir licenças e alvarás de utilização bem como para exercer poderes de fiscalização - todas respeitantes às suas competências no âmbito do exercício da actividade administrativa ao abrigo de normas de direito público; 10ª - Para efeitos de apuramento da responsabilidade civil extracontratual de pessoas colectivas de direito público por actos praticados no exercício da função administrativa existe um regime especial - o regulado pela Lei n.º 67/2007, de 31 de...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 178/15.9T8AMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Março de 2016
...Anselmo de Castro, in Lições de Processo Civil, II, 1970, 379. (2) Cfr., de entre muitos outros, o Ac. do STJ de 9/7/2014, Proc. Nº 934/05.6TBMFR.L1.S1, in (3) Cfr. José Alberto dos Reis, in “Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. I, Coimbra 1960, págs. 146 e segs.. (4) Cfr. José Albe......
-
Acórdão nº 016/17 de Tribunal dos Conflitos, 01 de Fevereiro de 2018
...(v.g., n.º 01/04, de 29-06-2004, 15/04, de 15-03-2005 e 02/12, de 20-09-2012), mas também do Supremo Tribunal de Justiça (Proc. n.º 934/05.6TBMFR.L1.S1, de 09-07-2014), todos disponíveis Em conclusão, deverá, na resolução do presente conflito negativo de jurisdição, deferir-se à jurisdição ......
-
Acórdão nº 2871/19.8T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Março de 2021
...á viabilidade da ação, por se tratar de questão atinente com o mérito da pretensão” – cfr. Acórdão do STJ de 09/07/2014, proc. 934/05.6TBMFR.L1.S1, disponível em Entende-se que a regra da competência dos tribunais da ordem judicial tem natureza residual, no sentido de que são da sua competê......
-
Acórdão nº 1078/14.5T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2015
...Anselmo de Castro, in Lições de Processo Civil, II, 1970, 379. (7) Cfr., de entre muitos outros, o Ac. do STJ de 9/7/2014, Proc. Nº 934/05.6TBMFR.L1.S1, in (8) Cfr. José Alberto dos Reis, in “Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. I , Coimbra 1960 , págs. 146 e segs.. (9) Cfr. José Al......
-
Acórdão nº 178/15.9T8AMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Março de 2016
...Anselmo de Castro, in Lições de Processo Civil, II, 1970, 379. (2) Cfr., de entre muitos outros, o Ac. do STJ de 9/7/2014, Proc. Nº 934/05.6TBMFR.L1.S1, in (3) Cfr. José Alberto dos Reis, in “Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. I, Coimbra 1960, págs. 146 e segs.. (4) Cfr. José Albe......
-
Acórdão nº 016/17 de Tribunal dos Conflitos, 01 de Fevereiro de 2018
...(v.g., n.º 01/04, de 29-06-2004, 15/04, de 15-03-2005 e 02/12, de 20-09-2012), mas também do Supremo Tribunal de Justiça (Proc. n.º 934/05.6TBMFR.L1.S1, de 09-07-2014), todos disponíveis Em conclusão, deverá, na resolução do presente conflito negativo de jurisdição, deferir-se à jurisdição ......
-
Acórdão nº 2871/19.8T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Março de 2021
...á viabilidade da ação, por se tratar de questão atinente com o mérito da pretensão” – cfr. Acórdão do STJ de 09/07/2014, proc. 934/05.6TBMFR.L1.S1, disponível em Entende-se que a regra da competência dos tribunais da ordem judicial tem natureza residual, no sentido de que são da sua competê......
-
Acórdão nº 1078/14.5T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Dezembro de 2015
...Anselmo de Castro, in Lições de Processo Civil, II, 1970, 379. (7) Cfr., de entre muitos outros, o Ac. do STJ de 9/7/2014, Proc. Nº 934/05.6TBMFR.L1.S1, in (8) Cfr. José Alberto dos Reis, in “Comentário ao Código de Processo Civil, Vol. I , Coimbra 1960 , págs. 146 e segs.. (9) Cfr. José Al......