Acórdão nº 7347/04.5TBMTS.P2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Julho de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução09 de Julho de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA, Ldª. instaurou uma acção contra BB, Ldª., pedindo a sua condenação no pagamento de € 13.690,17, com os juros sobre a quantia de € 11.297,54, contados à taxa de 9,01% desde a propositura da acção até efectivo pagamento, correspondente aos serviços que lhe prestou na qualidade de agente transitário, “organizando e fazendo proceder ao transporte de várias remessas de mercadorias do comércio da ré”.

A ré contestou e deduziu reconvenção. Alegou que as duas sociedades, autora e ré, desenvolveram “laços comerciais” e estabeleceram “entre ambas uma conta corrente onde são anotados créditos e débitos e estes se vão compensando com aqueles”; que, à data da contestação, aquela conta-corrente apresentava um saldo de € 6.395,51 a seu favor, pois que tinha um crédito sobre a autora de € 37.396, 79, resultante “além do mais, do retorno de uma mercadoria do Togo, por via marítima, efectuado pela autora, tendo parte da mercadoria chegado danificada”, e um débito de € 31.001,28. Opôs a compensação na parte comum e, em reconvenção, pediu a condenação da autora no pagamento da diferença, com juros de mora, calculados à taxa de 12% até 16 de Outubro de 2004 e à taxa de 9,01% desta data até efectivo pagamento.

A autora replicou. Negou haver qualquer contrato de conta-corrente entre ambas e alegou ter pago ou não dever algumas das quantias que a ré contabilizou para chegar aos valores que indica; e suscitou a incompetência do tribunal cível de Matosinhos, onde a acção foi proposta, para julgar a reconvenção, por caber aos tribunais marítimos “conhecer das questões relacionadas com o transporte por via marítima”.

Invocou a prescrição do eventual direito da ré, nos termos do disposto no artigo 16º do Decreto-Lei nº 255/99, de 7 de Julho, a caducidade do direito de acção, com base na Convenção para a Unificação de Certas Regras em Matéria de Conhecimentos de Carga, assinada em Bruxelas em 25 de Agosto de 1924 (Decreto-Lei nº 37748, de 1 de Fevereiro de 1950) e a limitação de responsabilidade decorrente do nº 5 do artigo 4º da Convenção, da qual resultaria que o valor de eventual indemnização não poderia ser superior a € 498,79.

Requereu a intervenção acessória da agência marítima CC, Ldª, invocando direito de regresso, no caso de vir a ter de indemnizar a ré, bem como da Companhia de Seguros DD., com a qual celebrou um contrato de seguro, transferindo a sua eventual responsabilidade como transitária ou operadora de transportes.

Finalmente, impugnou diversos factos, sustentando ter cumprido “integral e escrupulosamente o acordado com a ré reconvinte, pelo que não é responsável por quaisquer danos na mercadoria”.

A ré treplicou. Confirmou nunca ter sido celebrado um contrato de conta-corrente, mas existir “uma conta-corrente: pagamentos e recebimentos”, tendo havido encontro de contas com a autora “já mais que uma vez”, manteve o alegado crédito sobre a autora e respondeu às excepções de incompetência, de prescrição e de limitação da responsabilidade.

Convidada pelo despacho de fls. 76 a concretizar, nomeadamente através de documentos, “quais os bens ou serviços prestados à A (e em que datas) a que se reportam cada uma das facturas/notas de crédito em causa” em que se funda a reconvenção, a ré veio juntar os documentos de fls. 84 e segs.

No despacho saneador, de fls. 105, o tribunal julgou-se materialmente incompetente para conhecer da reconvenção e julgou prejudicadas as intervenções acessórias requeridas, “deduzidas a título subsidiário”; e decidiu a acção, nestes termos: “Pelo exposto, julgo a excepção de compensação deduzida pela R. improcedente e, em consequência, julgo procedente a presente acção e condeno a R. a pagar à A. a quantia de € 13.690,17, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, contados às sucessivas taxas em vigor para os créditos de que são titulares as empresas comerciais, sobre o capital de € 11.297,54 desde 10/12/2004 e até efectivo e integral pagamento”.

A ré recorreu para o Tribunal da Relação do Porto, que, pelo acórdão de fls. 177, julgou parcialmente procedente a apelação e determinou o prosseguimento dos autos “para apuramento da matéria de facto controvertida, respeitante ao crédito da ré (factura …) e decisão sobre a excepção de compensação e das contra-excepções” da “prescrição, caducidade e limitação de responsabilidade”.

  1. A acção veio então a ser decidida pela sentença de fls.300, que a julgou integralmente procedente e condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 13.690,17 com juros vencidos e vincendos, “contados às sucessivas taxas em vigor para os créditos de que são titulares as empresas comerciais, sobre o capital de € 11.297,54, desde 10/12/2004 e até efectivo e integral pagamento”.

    Mas a sentença foi alterada pelo acórdão do Tribunal da Relação do Porto de fls. 362, por ser “a excepção de compensação parcialmente procedente, (…) declarando parcialmente compensado o crédito reconhecido à A. de € 13 690,17, com o crédito da Ré de € 10 973,38, pelo que esta terá a pagar àquela o remanescente, no mais se confirmando a decisão impugnada.” 3. A autora recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça. Nas alegações que apresentou, formulou as seguintes conclusões: 1. Ficou provado nos presentes autos, tendo já transitado em julgado, por não recurso de nenhuma das partes, que: a. A Autora é uma sociedade transitária dedicando-se a essa actividade.

    1. A solicitação da Ré, prestou a Autora os seus serviços, organizando e fazendo proceder ao transporte de mercadorias quer por via terrestre, que por via marítima, tendo emitido as respectivas facturas.

    2. Em Julho 2002, a pedido da Ré, a Autora organizou o transporte marítimo de 1 (um) contentor com 108 cartões, titulado pelo Conhecimento de Embarque n.º …/…/…/…/…/…/… desde o porto de Leixões até ao porto de Lomé, no Togo, através da CC.

    3. Em Março de 2013, por instruções da Ré, organizou a A. o transporte marítimo do contentor GATU …, com 86 cartões desde o porto de Lomé, até ao porto de Leixões, titulado pelo Conhecimento de embarque n.º LFLX … da Delmas.

    4. Entre os dois transportes realizados, a mercadoria ficou depositada no porto de Lomé, cerca de 7 meses, durante os quais desapareceram 22 cartões de mercadoria, após inspecção das autoridades aduaneiras do Togo.

    5. Ficou provado, que a mercadoria que chegou a Leixões no contentor DATU … é exactamente a mesma que saiu de Lomé, no referido contentor.

  2. Não foi provado nos autos que tivesse ocorrido o desaparecimento de mercadoria durante o transporte.

  3. A prova do não cumprimento contratual e desaparecimento da mercadoria competia à Ré, que não o fez.

  4. Apenas haveria inversão do ónus da prova quanto à responsabilidade pelo incumprimento, após verificado o incumprimento do contrato.

  5. Não foi feita pela R. qualquer prova do desaparecimento da mercadoria durante o transporte, pelo que não poderia haver uma inversão do ónus da prova quanto à responsabilidade da A. nesse desaparecimento.

  6. Pelo que, não competia à A. a prova da existência do crédito da Ré, mas a esta a prova do mesmo.

  7. Pelo que, deve ser revogado nesta parte o Acórdão proferido, e substituído pela inexistência do crédito da Ré, por falta de prova.

  8. Não obstante, e sem prescindir, sempre se dirá que a responsabilidade da ora Recorrente é enquanto agente transitária, porque foi nesta qualidade que a mesma” interveio “ no transporte e serviço prestado à Ré.

  9. Incorre o Acórdão recorrido numa nulidade, nos termos do artigo 616.º, n.º 1 al, d) por remissão do artigo 666.º CPC, por falta de pronúncia quanto ao chamamento do transportador marítimo, CC.

  10. Sem prescindir, importa referir que a A. prestou serviços à Ré, como transitária, e celebrado um contrato...

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