Acórdão nº 585/09.6TDLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução18 de Junho de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, actualmente em cumprimento de pena no Estabelecimento Prisional da Carregueira, veio interpor recurso da decisão que, operando o respectivo cúmulo jurídico das penas aplicadas nos processos Comum Coletivo n.º 2094/06.6TDLSB e Comum Coletivo n.º 585/09.6TDLSB, o condenou na pena única de 5 (cinco) anos e 6 (seis) meses de prisão.

As razões de discordância encontram-se expressas nas conclusões da respectiva motivação de recurso onde se refere que Não foi levado em consideração o artigo 78° n° 1 e 2 do CP para apuramento dos "grupos" dos cúmulos; O Tribunal limitou-se a aplicar uma pena única relativamente aos processos nº 2094/06.6TDLSB e 585/09.6TDLSB por factos praticados em Novembro de 2005 e Setembro de 2007 Esquecendo-se assim de incluir no "grupo" os processos 11280/03.0TDLSB, que teve o seu trânsito em 30/10/2006, o Proc. 178/06.0TDLSB, que teve o seu trânsito em 23/06/2008, o Proc. 4903/03.2TDLSB, que teve o seu trânsito em 15/04/2009, o Proc. 91/03.2GHLRS, que teve o seu trânsito em 21/12/2009, o Proc, 3104/03.4TARLS, que teve o seu trânsito em 13/09/2010 e o Proc. 194/05.9PLLSB, que teve o seu trânsito em 22/09/2011.

Assim os factos praticados em Novembro de 2005 e Setembro de 2007 foram punidos de forma autónoma, com cumprimento sucessivo das várias penas.

Para tanto deve ser o acórdão considerado nulo nos termos do artigo 379°n 1 c) do CPP, pois como é do entendimento da jurisprudência, deveria ter 2 (duas) penas conjuntas, uma a corrigir a condenação anterior e outra relativa aos factos praticados depois daquela condenação.

O acórdão recorrido também padece de nulidade, por violação do disposto no art. 379°, nº 1, al. a) do CPP, por falta de fundamentação.

Isto porque o disposto no art. 77°, nº 1 do Código Penal exige que o tribunal "ad quo" faça um exame crítico de ponderação conjunta e que interligue todos os factos praticados com a personalidade do seu agente, de maneira a poder concluir se se está perante alguém com tendência para o crime ou se, por outro lado, o agente cometeu o crime sem que tal sirva para concluir por uma propensão para a prática de ilícitos típicos.

O tribunal "ad quo" nunca refere o relatório social, não compreendendo assim em que se baseia para apuramento da medida da pena.

O acórdão recorrido não pondera, nem interliga, quer os factos praticados, quer a personalidade do agente subjacente na prática daqueles mesmos factos. Assim sendo, nada mais pode resultar senão a nulidade do mesmo por falta de fundamentação, nos termos do já referido art. 379°, n° 1, al. a) do CPP.

O arguido se encontra numa fase de ressocialização, onde apenas visa a sua reintegração na sociedade, manifestando vontade de trabalhar tendo sido se mantido activo, podendo assim concluir que sobre ele já não impendem tão elevadas exigências de prevenção especial, não existindo motivos para acreditar que o ora recorrente, uma vez liberto, voltará a incorrer numa espiral de crimes.

O relatório é claro, o arguido com o apoio de alguns familiares, tudo leva a crer que uma vez fora da prisão irá encarretar por uma vida integrada em sociedade, de acordo com as regras da mesma, afastando-se de vez da prática de crimes.

A falta de interpretação que o tribunal "ad quo" faz do relatório apresentado só permite concluir que o tribunal fundou a sua convicção não neste, mas, muito provavelmente, noutra qualquer prova não especificada, desatendendo, por completo, ao conteúdo do relatório, o que leva o arguido a indagar se o mesmo foi objecto de análise por parte do tribunal recorrido.

Termina pedindo que seja declarada a nulidade do acórdão nos termos do artigo 379° n° 1 c) do CPP. ou, se assim não se entender, declarada a nulidade do acórdão nos termos do artigo 379º n° 1 a) do CPP.

Alternativamente, pede que seja declarada a nulidade do acórdão recorrido por insuficiência de fundamentação entre os factos e a personalidade do agente ou se tal não se verificar, reduzida a pena única aplicada ao limite mínimo.

Respondeu o Ministério Publico referindo que: - Podendo formar-se in casu os apontados três "grupos" de processos, para efeito de realização de cúmulos jurídicos, neste processo mostra-se correcto realizar apenas o cúmulo jurídico das penas aplicadas nos presentes autos e no processo nº 2094/06.6TDLSB.

- A decisão mostra-se correctamente fundamentada, analisando criticamente todos os elementos considerados relevantes para a boa decisão da causa e cuja apreciação se impunha.

- Não enferma o Acordão de qualquer vício, designadamente das nulidades invocadas pelo recorrente.

- A pena única de 5 anos e 6 meses de prisão mostra-se justa e alcançada com observância de todas as normas e princípios legais convocáveis.

- O recurso deverá improceder.

Neste Supremo Tribunal de Justiça a Exª Srª Procuradora Geral Adjunta em proficiente parecer pronunciou-se no sentido da nulidade da decisão recorrida.

Os autos tiveram os vistos legais * Cumpre decidir.

Em sede de decisão recorrida encontram-se provados os seguintes factos: O arguido foi condenado nos seguintes processos: Processo Comum Coletivo n.º 2094/06.6TDLSB: Data dos Factos: Novembro de 2005 Data da Sentença: 6.3.2009 Data do Trânsito em Julgado da Sentença: 5.6.2009 Pena aplicada: Penas parcelares de 3 anos de prisão por um crime de falsificação agravado e 3 anos por um crime de burla qualificada, e em cúmulo na pena única de 4 anos de prisão.

Crimes: um crime de falsificação agravado, p. e p. pelo art.º 256º, bn.º1, al. a) e 3 do Código Penal e um crime de burla qualificada, p. e p. pelo art.º 218º, n.º1 do Código Penal.

No Acórdão consta como provado: 1. Em Junho de 2005, o argui do, por razões de ordem profissional conheceu BB de quem ficou amigo; 2. Dentro desse relacionamento o arguido ofereceu à BB trabalho na agência funerária ... Funerária. Lda sita então no Largo ... em Lisboa, da qual o primeiro disse ser proprietário.

  1. Por a proposta lhe parecer aliciante a BB aceitou-a tendo então o arguido solicitado à mesma cópia de documentação sua constituída por bilhete de identidade, cartão de contribuinte, número de identificação bancária/NIB, comprovativo de morada e cartão da Segurança Social.

  2. Tal proposta de trabalho não teve sequência pelo que a BB nunca trabalhou naquela empresa.

  3. Porém, uma vez na posse daquelas cópias, o arguido formulou o propósito de obter para si um veículo automóvel sem que para tal tivesse que proceder ao respectivo pagamento.

  4. Assim em Novembro de 2005 em dia não apurado mas anterior a 8 desse mês, o arguido contactou com CC que na época como particular se dedicava à compra e venda de veículos automóveis e a quem manifestou o desejo de adquirir um veículo da marca Peugeot, com recurso ao crédito.

  5. Como o CC não trabalhava num stand, mas apenas como particular, este solicitou a uma sua conhecida, a DD, que na época trabalhava no Stand ..., na Amadora, que servisse de intermediária junto da S... , Instituição Financeira de Crédito, no financiamento que o arguido pretendia.

  6. O arguido disse ao CC que o contrato de crédito seria titulado por um terceiro. pessoa que afirmou ser sua amiga, alegando não o poder fazer em nome próprio.

  7. Assim, o CC entregou ao arguido os formulários de contrato de financiamento que a S... tinha posto à disposição do stand onde trabalhava a DD, incluindo um impresso de livrança, para que fossem assinados pelo titular do contrato, e indicou ao arguido quais os documentos de tal titular que deveriam ser juntos, por cópia, ao referido contrato.

  8. O CC informou o arguido de que deveria ser junta ao contrato cópia de um cheque da conta do titular, indicação do NIB, cópia do bilhete de identidade, cópia do cartão de contribuinte, cópia da declaração de IRS, cópia de uma factura de serviços (água. luz ou outro) para comprovar morada e cópia de um recibo de vencimento.

  9. Na posse daqueles impressos, no mesmo período temporal e em local que não foi possível determinar, o arguido ou alguém a seu pedido e com o seu conhecimento no campo destinado à assinatura do titular do contrato de financiamento com o n.º 548478 apôs o nome da BB como se da própria se tratasse.

  10. Este nome foi aposto no impresso de proposta de crédito, no contrato, no impresso de adesão ao seguro, na autorização permanente de débito bancário, na declaração de renúncia ao direito de revogação e na livrança de garantia.

  11. Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, o arguido ou alguém a seu pedido e com o seu conhecimento, alterou a cópia do bilhete de identidade da BB, nela fazendo constar outra assinatura semelhante à aposta naqueles impressos e outra data de nascimento.

  12. O arguido ou alguém a seu pedido e com o seu conhecimento alterou também uma cópia de declaração de IRS como se correspondesse à verdadeira declaração da BB, e uma cópia de recibo de água.

  13. Por fim, o arguido ou alguém a seu pedido e com o seu conhecimento forjou um recibo de vencimento, como se tivesse sido emitido pela ... Funerária. Lda. em nome da BB.

  14. O arguido entregou ao CC os impressos assim assinados, juntamente com aquelas cópias e ainda com cópia de um cheque relativo a conta bancária de que a BB era titular no Montepio.

  15. O CC tudo entregou à DD que, por seu turno, remeteu a documentação à S....

  16. A S... em função do teor da documentação, na convicção de que o financiamento se destinava à BB e de que a documentação tinha sido assinada pela mesma aprovou o financiamento em 08-11-2005, pelo valor de €13.000.00 (treze mil euros) para aquisição do veículo da marca Peugeot, modelo 406 2.0 HDI Executiv, com a matrícula ...-SI, a liquidar em 72 prestações mensais.

    19 Nesta sequência, a S... transferiu aquele montante para conta bancária da DD que, por seu turno, o entregou ao CC.

  17. O referido veículo foi entregue ao arguido, em 08-11-2005, tendo-o feito coisa sua.

  18. O arguido ou alguém a seu pedido e com o seu conhecimento assinou ainda, com o nome da BB, uma declaração para registo de propriedade do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
1 temas prácticos
1 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT