Acórdão nº 1202/11.0TTMTS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Outubro de 2014

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução01 de Outubro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 5 de Dezembro de 2011, no Tribunal do Trabalho de Matosinhos, 1.º Juízo, AA instaurou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato de trabalho contra BANCO BB, S. A. (EM LIQUIDAÇÃO), pedindo a condenação da ré a pagar-lhe a importância global de € 106.889,97, acrescida de juros legais vincendos até integral pagamento, computados sobre o montante de € 102.406,83.

Para tanto, alegou, que foi admitido ao serviço da ré, em 1 de Julho de 2006, com a categoria de Private Banker, mediante contrato de trabalho sem termo, e que as partes ajustaram que a sua antiguidade se contava desde 23 de Abril de 1991, data em que ingressou no sector bancário. Em 18 de Outubro de 2010, a ré comunicou-lhe o início de procedimento para despedimento colectivo e, em 29 de Novembro de 2010, a decisão de o despedir no âmbito desse procedimento, pelo que, atendendo ao prazo legal de aviso prévio, o contrato de trabalho cessou em 15 de Fevereiro de 2011; porém, a ré não pagou, na íntegra, a retribuição correspondente e não cumpriu a obrigação de o compensar com um mês de retribuição por cada ano completo de antiguidade, donde tem direito a receber € 7.200,48, a título de remunerações até ao termo da vigência do contrato, e € 95.206,35, como compensação pelo despedimento colectivo efectivado, sendo devidos juros, à taxa legal, que, contados desde a data do despedimento até à instauração da acção, perfaziam a quantia de € 4.483,14.

A ré contestou, excepcionando a caducidade do direito de propor a acção e impugnando o documento n.º 1 junto à petição inicial, por não existir no seu arquivo, aditando que, mesmo que esse documento fosse verdadeiro e verdadeira a assinatura nele aposta, a correspectiva declaração não a vinculava, pois a Comissão Executiva, obrigava-se, em 2006, com duas e não uma assinatura (a menos que fosse outorgada procuração ad hoc, o que não ocorreu), facto que era do conhecimento do autor, logo tal documento apenas traduz a vontade do seu subscritor; por outro lado, sustentou que nunca existiu, na ré, qualquer prática tendente a negociar com quadros de outros bancos a portabilidade da antiguidade que tivessem nessas instituições e, bem assim, que a declaração junta à petição inicial é nula, por violar lei imperativa, mormente o artigo 24.º do actual Código do Trabalho (direito à igualdade), sendo que os valores e os critérios indemnizatórios por cessação do contrato de trabalho por despedimento não estão na livre disposição das partes, o que obstava a que se ficcionassem 20 anos de antiguidade, quando esta era de 5 anos, alterando-se os critérios indemnizatórios, porquanto se modifica um dos factores de multiplicação cujo produto determinará o quantum compensatório final, carecendo de fundamento as peticionadas retribuições atinentes a um período de aviso prévio a que o autor não tem direito; mais defende que caso se entenda que o autor tem direito a ser compensado por uma antiguidade ficcionada, tal invocação, com base na declaração junta à petição inicial, configuraria manifesto abuso do direito que tornaria ilegítima aquela invocação e o seu exercício.

O autor respondeu, sustentando a improcedência das excepções deduzidas.

No despacho saneador, foi julgada improcedente a excepção de caducidade invocada, decisão objecto de recurso de apelação, mas que o Tribunal da Relação confirmou, e, após o julgamento, exarou-se sentença que julgou a acção procedente, condenando a ré a pagar ao autor a quantia global de € 102.351,56, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde 16 de Fevereiro de 2011 e até integral pagamento.

  1. Irresignada, a ré apelou, defendendo (i) que a declaração junta à petição inicial como documento n.º 1 não a vinculava, por ter sido subscrita apenas por um administrador, quando a Comissão Executiva se obrigava com duas assinaturas, (ii) que tal declaração, a ser vinculativa, integrava o contrato individual de trabalho e seria inevitavelmente nula à luz dos artigos 5.º e 383.º do Código do Trabalho de 2003, então em vigor, e (iii) que a invocação da nulidade da referida declaração não consubstanciava abuso do direito, antes materializando abuso do direito a actuação do autor, peticionando a compensação do despedimento com base numa antiguidade ficcionada, tendo o Tribunal da Relação do Porto deliberado que aquela declaração não podia produzir efeitos «seja em sede de fixação de montante de compensação, seja em sede de fixação de aviso prévio», por ofender lei imperativa, sendo, nessa parte, nula e que a invocação da nulidade da mesma declaração, pela ré/recorrente, não configurava abuso do direito, termos em que julgou o recurso procedente, assim revogando a sentença recorrida e absolvendo a ré dos pedidos deduzidos pelo autor.

    É contra esta deliberação que o autor, agora, se insurge, mediante recurso de revista, no qual formula o subsequente núcleo conclusivo: «I. Improcede a arguição de nulidade de uma cláusula contratual quando esta arguição configura um abuso do direito, como sucederá nos casos em que a nulidade é arguida pelo contraente que a provocou ou levou dolosamente o outro a aceitar o contrato ou procedeu de modo a criar nesse outro contraente a convicção de que não seria invocada a nulidade, procedendo, assim, de modo iníquo e escandaloso.

    II. O Réu apenas pagou ao Autor a quantia de € 4.800,32, a título de compensação referente ao período de aviso prévio.

    III. Pelo que, ainda que parcialmente, sempre terá que proceder o pedido do Autor de receber do Réu uma compensação pelo despedimento de que foi alvo, compensação que o Réu até hoje não pagou.

    IV. Como se fixou no acórdão recorrido e na sentença de l.ª instância (dupla conforme) a declaração de antiguidade junta pelo Autor com a petição inicial constitui acto validamente praticado pelo Réu, pelo que esse acto é eficaz e efectivamente repercute-se no Réu, vinculando-o.

    V. Confirmou, também, o Tribunal da Relação que “... provindo o A. doutra instituição bancária concorrente, acordaram as partes em reportar o início da sua carreira profissional de bancário a 23/04/1991. // E resulta provado dos autos que a salvaguarda da antiguidade na actividade bancária foi um elemento essencial que norteou as negociações das partes tendentes ao ingresso do A. no Réu, a tal ponto que, a não ter sido garantida tal salvaguarda, aquele não teria aceitado celebrar o referido contrato de trabalho com o R.” VI. Confirmou, ainda, o Tribunal da Relação que “A mencionada cláusula não enferma de qualquer nulidade, nem o seu objecto está subtraído à livre disponibilidade das partes, aliás corresponde ao teor da cl.ª 17.ª do ACT para o sector bancário...” VII. Não é de afastar a aplicação de qualquer IRCT nos casos em que as partes, apesar de não estarem filiados em qualquer entidade subscritora do mesmo e não haver Portaria de Extensão a determiná-lo, expressa ou tacitamente quiseram adoptar o seu clausulado, no tocante à sua aplicação em bloco ou tão só no que diz respeito a uma das suas cláusulas, em termos de o fazerem incluir, assim se vinculando, no âmbito do contrato individual de trabalho, prevalecendo, desta forma, o princípio da liberdade contratual.

    VIII. Não se descurando que não existe uma definição concreta de antiguidade — as múltiplas referências legais à antiguidade nem sempre têm o mesmo sentido — é forçoso reconhecer que os efeitos da antiguidade se reportam especialmente à cessação do contrato de trabalho.

    IX. No caso vertente, e ao contrário das situações versadas nos dois Acórdãos mencionados no Aresto recorrido (nos quais o Exmo. Relator interveio como adjunto), o contrato de trabalho sub judice não afasta a aplicação do ACT do sector bancário, bem pelo contrário, adopta de forma clara o estipulado na cláusula 17.ª daquele instrumento de regulamentação colectiva de trabalho.

    X. O Código de Trabalho não nos dá nem regula, ele próprio, o conceito de antiguidade do trabalhador, contudo, há que ter presente que coloca em primeiro lugar os instrumentos de regulamentação colectiva como as fontes do direito donde promanam, em primeira linha, as normas aplicáveis ao contrato de trabalho.

    XI. Assim, socorrendo-nos do instrumento de regulamentação colectiva aplicável no sector bancário, aqui em causa, onde se define e consagra no direito laboral o termo antiguidade do trabalhador do sector bancário, verifica-se que tal antiguidade se mostra definida como sendo a correspondente àquela que o trabalhador detenha por todo o tempo de serviço prestado em Portugal nas instituições de crédito com actividade em território português (cl.ª 17.ª do ACT do sector bancário).

    XII. Sendo forçoso reconhecer que os efeitos da antiguidade se reportam especialmente à cessação do contrato de trabalho, a verdade é que, em bom rigor, aquela cláusula não altera o critério da fixação da indemnização — que continua a ser a antiguidade — e que, para os trabalhadores do sector bancário, se computa nos termos da referida cl.ª 17.ª do seu ACT.

    XIII. Antiguidade que, assim, é ali reconhecida aos trabalhadores em toda a sua plenitude de efeitos e sem qualquer restrição ou limitação em sede de despedimento colectivo.

    XIV. Na verdade, em lugar algum se afasta a antiguidade reconhecida aos trabalhadores ao abrigo [da] cláusula 17.ª do referido ACT do sector bancário para efeitos de determinação da compensação prevista no artigo 366.º do Código do Trabalho.

    XV. Não se encontrando em nenhum instrumento legal ou de contratação colectiva qualquer norma que autorize a interpretação de que a antiguidade reconhecida pelos ACT's é restrita ou sofre limitações em sede de despedimento colectivo, bem pelo contrário, tem ali cabal aplicação.

    SEM CONCEDER XVI. No que toca ao tema da nulidade, na ponderação de saber se houve abuso do direito o Julgador deve actuar com prudência quando se está perante uma relação laboral, onde é patente a desigualdade de meios entre o empregador e o...

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