Acórdão nº 5918/06.4TDPRT.P1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução26 de Março de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, veio interpor recurso extraordinário de revisão nos termos previstos nos artigos 449° a 466° do C.P.P., particularmente, no art. 449°, n.º 1, alínea g) do CPP, e art. 29°, n.º 6 da Constituição da República Portuguesa. As razões de discordância encontram-se expressas nas conclusões da respectiva motivação de recurso onde se refere que: 1. A condenação do Recorrente constituiu uma ingerência no seu direito de liberdade de expressão e, como tal, uma violação ao disposto no art. 10° da CEDH.

2. Face à condenação do Estado Português por violação do art. 10° da CEDH, terá de se concluir que decisão proferida pelo TEDH é manifestamente inconciliável com a condenação de que o Recorrente foi vítima.

3. Assim, deve o presente recurso de revisão proceder, concedendo-se a Revisão que se pede, com a absolvição do Recorrente, arguido no processo em apreço, sendo trancado e eliminado o respectivo registo e o arguido, ora Recorrente, restituído à situação jurídica anterior à condenação, anulando-se a respectiva decisão (art. 461°, n.º 1 do CPP).

4. Deve proceder-se à afixação da sentença absolutória e às publicações referidas no n.º 2 do art. 461 do CPP.

5. Deve ser restituído ao arguido, ora Recorrente, o que pagou de custas e multa no processo, e deve o mesmo ser indemnizado pelos danos sofridos (cfr. art. 462°, n.º 1 do CPP).

6. Nestes danos, incluem-se os seguintes valores (não integrados na compensação que o estado Português foi condenado a pagar ao ora Recorrente, cfr. decisão TEDH que se junta em anexo): a. Os valores que o arguido tem de suportar com a instauração do presente recurso de Revisão, sendo: I. € 306,00 - Taxa de justiça do recurso de revisão (VO. DUC e comprovativo de pagamento que junta em anexo); II. € 123,48 - Tradução da decisão do TEOH (Vd. DOC. N.º 5 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido); III. O valor devido pela emissão da certidão da decisão final proferida nos autos com nota de trânsito em julgado, cujo montante ainda se desconhece; b. O valor das custas finais do processo em primeira instância (Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia), a liquidar em execução de sentença; c. € 750,00 que o arguido pagou de indemnização cível ao assistente, por via de penhora ao seu vencimento realizada no âmbito de acção executiva instaurada pelo assistente para o efeito (Vd. DOC. N.º 6 que se protesta juntar); d. O valor das custas finais do processo em segunda instância (Tribunal da Relação do Porto), a liquidar em execução de sentença; e. O que o Supremo Tribunal de Justiça entender que deva fixar de compensação por danos não materiais que o Recorrente sofreu com a condenação, durante estes anos e até à pressente data, completando a indemnização fixada pelo TEOH (sendo que, se ao assistente foi fixada uma indemnização de € 5.000,00 com base naquilo que se considerou ser uma ofensa verbal, por quanto não deve o Recorrente ser compensado por tudo o que passou!).

Saliente-se que, só recebendo tudo aquilo que despendeu com o processo que lhe foi injustamente movido é que o recorrente é restituído à situação jurídica anterior à condenação (cfr. art. 461°, n.º 1 do CPP).

A restituição, pelo Estado Português, do que o Recorrente pagou a título de multa penal em que foi condenado (em cumprimento da decisão do TEDH) esvazia, evidentemente, a condenação neste ponto do TEDH, com excepção do que respeita aos juros vencidos até à data da efectiva restituição (se for anterior ao pagamento ordenado pelo TEDH).

O Estado Português, pagando a indemnização em que foi condenado pelo TEDH, fica sub-rogado nos termos previstos no art. 462°, n.º 2 do CPP, e espera-se que o Ministério Público seja tão diligente a agir contra o assistente como foi a apoiá-lo contra o Recorrente, ou a agir contra os Magistrados que intervieram no processo, se entender que houve culpa grave (art. 14°, n.º 2 da Lei 67/2007 de 31 de Dezembro).

Nos termos do art. 451º do CPP, este requerimento de recurso de revisão é apresentado no Tribunal da Relação do Porto, onde foi proferido o Acórdão cuja revisão se pede, sendo ele com efeito a decisão que transitou em julgado.

Perante normativo anterior semelhante, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05/07/1967, BMJ 169, página 179, decidiu muito bem, separando as águas, que nos processos de revisão de sentença o Juiz não tem jurisdição, cabendo esta apenas ao Supremo tribunal de Justiça, que julga em primeira instância. Àquele compete apenas, numa primeira fase, formular um juízo provisório e informar (como se sabe, a falta de jurisdição acarreta a inexistência da decisão que se profere, cfr. Cavaleiro Ferreira, Curso de Processo penal III, página 17 e reimpressão, volume único, edição da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, 1959, página 193).

Não se aplica neste caso o disposto nos artigos 453°, 458° ou 460°, n.º 2 do CPP, por não serem esses os fundamentos da revisão que ora se pede. De resto, quanto à realização de um novo julgamento, que neste caso seria absurdo, é ao Supremo Tribunal de Justiça que compete determiná-lo.

Aplica-se, sim, o disposto no art. 454º do mesmo CPP e, não se vendo que haja necessidade de diligências para completar o que quer que seja (quando este artigo se refere às diligências a completar está a referir-se às indispensáveis do artigo anterior), deve no prazo de oito dias após expirado o prazo de resposta, ser o processo remetido ao Supremo Tribunal de Justiça com informação sobre o mérito.

Nenhum motivo há para atrasar o recurso de revisão e assim atrasar ainda mais a justiça que o Recorrente espera, há anos, que lhe seja finalmente feita. Como se vê dos prazos apertados que o Código estabelece, o legislador pretendeu que fosse rápido o recurso e revisão.

Nestes termos, não havendo diligências necessárias à descoberta da verdade (art. 453º do CPP), deve o Tribunal da Relação do Porto enviar este processo ao Supremo Tribunal de Justiça no prazo de oito dias após expirado o prazo de resposta.

Respondeu o Ministério Público referindo que I - Do objecto do recurso Nos presentes autos foi o arguido - recorrente condenado, como autor imediato e sob a forma consumada, de um crime de difamação, previsto e punido pelos artigos 180°, nº 1 e 183°, n° 2, ambos do Código Penal, na pena de 200 dias de multa à taxa diária de € 13, bem como no pagamento de uma indemnização ao assistente no valor de € 5.000, decisão que foi parcialmente confirmada por acórdão do Tribunal da Relação do Porto, já transitado em julgado.

Nessa sequência, paga que foi pelo arguido a pena de multa em que foi aqui condenado e, bem assim, da quantia devida a título de indemnização, veio o mesmo a apresentar queixa junto do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (TEDH), a qual foi julgada procedente.

Na sequência de tal decisão e porque a mesma é inconciliável com a condenação proferida nestes autos, dela interpôs recurso extraordinário de revisão, alegando, para além do mais que, deverá ser trancado e eliminado o respectivo registo e o arguido, ora recorrente, ser restituído à situação jurídica anterior à condenação anulando-se a respectiva decisão e restituindo-se ao mesmo as quantias por si pagas a título de pena de multa e de custas (cfr. artigos 461º e 462, nº 1, ambos do Código de Processo Penal), mais requerendo lhe seja atribuída urna indemnização pelos danos sofridos.

Vejamos.

Sem prejuízo da validade da decisão proferida pelo TEDH, instância internacional, tanto mais que a mesma é vinculativa do Estado Português, com as consequências que daí advenham, sempre se dirá que a decisão que aqui foi proferida, o foi com base, não só na prova realizada em audiência de julgamento corno na prova documental constante dos autos, nomeadamente o livro escrito pelo arguido, ora recorrente que deu origem aos presentes autos. Na verdade, isso até resultou bem claro, não só da motivação de facto da decisão proferida na 1ª instância, como bem assim, da que resultou da proferida pela 2ª instância, para a qual o arguido veio a recorrer, tendo, apenas em parte tal recurso procedido.

Aliás, sempre se dirá também que os normativos invocados pelo arguido/recorrente da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e que viu providos na decisão proferida pelo TEDH foram analisados, ponderados e tidos em conta na decisão/acórdão que veio a ser proferida pelo Tribunal de 2ª instância para o qual aquele havia recorrido e que, ainda assim, entendeu, dar-se por verificado a prática do ilícito e confirmar a condenação e também o quantum indemnizatório primacialmente fixado ...

Termina...

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