Acórdão nº 712/12.6TTPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Dezembro de 2014
Magistrado Responsável | MÁRIO BELO MORGADO |
Data da Resolução | 03 de Dezembro de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I.
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AA, intentou a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra BB, S.A.
, ambos com os sinais nos autos.
Pede que a ré seja condenada a pagar-lhe as quantias: a) de € 50.466,20, a título de indemnização pela resolução do contrato de trabalho a que procedeu, fundada em justa causa, acrescida de juros de mora, desde a citação; b) e de € 6.449,52, a título de créditos salariais vencidos, acrescida de juros de mora, desde 01.05.2012.
Para tanto, alega, em síntese, que a Ré alterou unilateralmente a sua retribuição e adotou diversos comportamentos que alteraram as suas condições de trabalho, em termos que considera indignos, com a intenção de o vexar e desesperar.
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A Ré contestou, por impugnação e excecionando a caducidade do direito de resolver o contrato, alegando que entre a ocorrência dos factos descritos pelo Autor e a resolução do contrato mediaram mais de 30 dias.
Por via reconvencional, pediu a condenação do autor a pagar-lhe a importância de € 5.427,28, por não se ter provado a justa causa da resolução do contrato, nos termos do art. 399.º, do CT.
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Foi proferida sentença, a julgar parcialmente procedente a ação e, assim, condenando a Ré a pagar ao Autor a quantia global de € 5.209,23 acrescida de juros de mora, e a julgar improcedente a reconvenção.
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Apelaram quer o A. (insurgindo-se contra a parte em que foi julgado que o contrato não foi resolvido com justa causa), quer a R. (pugnando pela procedência do pedido reconvencional).
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O Tribunal da Relação do Porto (TRP), julgou procedente o recurso do A.
(alterando em parte a matéria de facto e condenando a ré a pagar-lhe indemnização por resolução lícita do contrato de trabalho, no montante de € 33.115,81, acrescida de juros de mora, desde o trânsito em julgado do acórdão e até integral pagamento) e não tomar conhecimento da apelação da R.
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Foi interposto recurso de revista pela R., bem como, subordinadamente, pelo A.
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O Ex.m.º Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se no sentido de serem negadas as revistas, em parecer a que as partes não responderam.
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Inexistem quaisquer questões de que se deva conhecer oficiosamente (art. 660.º, n.º 2, in fine, do CPC[1]).
Em face das conclusões das alegações - e tendo em conta o nexo de precedência lógica e prático-jurídica existente entre elas - as questões a decidir serão conhecidas pela seguinte ordem:[2] · Se está indemonstrada uma situação de assédio moral, tendo o contrato de trabalho sido resolvido sem justa causa (recurso da R.) · A considerar-se licitamente resolvido o contrato pelo A., qual o número de dias de retribuição base a ter em conta no cômputo da indemnização? [Autor (no recurso subordinado) e ré pugnam pela sua marcação em 45 e 15 dias, respetivamente, tendo a decisão recorrida fixado 15 dias] · Ainda neste caso, se os juros de mora são calculados a partir da citação (como peticiona a autora no recurso subordinado), ou a partir do trânsito em julgado da decisão, como decidiu o acórdão recorrido.
· Não sendo reconhecida a justa causa para a resolução contratual, se procede a reconvenção deduzida pela R. (recurso da R. - cfr.
supra n.ºs 2, 4 e 5).
Cumpre decidir.
II.
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Foi fixada no acórdão recorrido a seguinte matéria de facto: 1. Por contrato de trabalho celebrado a 01.01.1999, o Autor foi admitido ao serviço da Ré, para desempenhar funções inerentes à categoria profissional de chefe de departamento de oficina, nas áreas de pós-venda, assistência, oficina e peças.
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Em Abril de 2010, o Autor auferia as quantias descritas nos documentos de fls. 20 e 21, constando de fls. 20 um recibo emitido pela ré do qual consta um salário ilíquido de € 2.183,46, sendo de € 545,18, os descontos para IRS e segurança social, e de fls. 21 uma nota de lançamento da ré, no valor de € 545,18. [aditado pelo TRP] 3. O valor de 545,18 € referido no n.º 2 era um “bónus”, assumido pessoalmente pelo administrador da Ré, Sr. CC. [redação do TRP] [3] 4. A administração da Ré, decidiu incluir no vencimento do Autor, a quantia referida no n.º 3. [redação do TRP] 5. Sobre esse montante passariam a ter que incidir os descontos respetivos para o IRS e Segurança Social.
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O vencimento ilíquido do A. era de 2.183,46 €, sendo que o montante que recebia a mais indicado no documento de fls. 21, se referia ao referido “bónus” específico dado pelo administrador, Sr. CC, que passou a estar incluído no recibo de vencimento, razão pela qual o vencimento líquido, a partir de Maio de 2010, passou a ser de € 1.965,49.
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O Autor reclamou sem sucesso junto da administração da Ré a reposição do vencimento líquido de 2.183,46€.
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Em mês não concretamente apurado do ano de 2011, a telefonista recebeu instruções do administrador da Ré para, antes de transferir ao A. chamadas do exterior dos clientes e dos parceiros comerciais, lhe dar conhecimento, autorizando ele depois a passagem da chamada ao A. [redação do TRP] 9. Em mês não concretamente apurado de 2011, a administração da Ré comunicou verbalmente ao Autor que este ia começar a “marcar ponto” e que não podia permanecer nas instalações depois das 18H00, hora de fecho do estabelecimento. [redação do TRP] 10.Em 15.06.2011, o Autor endereçou à Ré uma carta em que afirma o seguinte: (1) que ao ser admitido ao serviço da empresa lhe foi garantido que o vencimento líquido seria igual ao vencimento ilíquido, pagando a empresa através de notas de lançamento a diferença entre os valores ilíquido e líquido do recibo de remunerações; (2) que desde Maio de 2010 a empresa deixou de lhe pagar a diferença entre os valores ilíquido e líquido do vencimento, passando a receber um valor líquido inferior em 217,97€; (3) que não aceitava a alteração, como já manifestara verbalmente por diversas vezes; (4) que se verifica uma deterioração das suas condições de trabalho nos últimos meses, designadamente desde o início do mês anterior, coincidindo com a sua insistência na reposição do valor líquido da minha retribuição, dando como exemplos dessa deterioração, entre outros, os factos a que se reportam os §§ 11 e 12 da matéria provada; (5) que o ambiente criado não é resposta aceitável à sua reclamação respeitante à diferença salarial desde Maio de 2010 e é penoso e desgastante para o Autor. [redação do TRP] 11.A partir de Agosto de 2011, a administração ordenou que o Autor apresentasse relatórios semanais da sua atividade, a entregar até às 12 horas da 2ª feira da semana seguinte.
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A determinação de um prazo para apresentação dos relatórios semanais prende-se com a necessidade de indicar uma ordem que fizesse sentido no seu todo.
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Até então, nunca a administração lhe exigiu a apresentação desse tipo de relatórios, nem antes nem depois exige tais relatórios a outros trabalhadores da oficina e determinou que cada relatório lhe fosse entregue até às 12 horas da 2ª feira da semana seguinte.
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A administração da Ré não debateu com o Autor um só relatório semanal.
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Um relatório semanal é uma recapitulação detalhada por escrito do que se fez na semana anterior.
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Paralelamente, por incumbência da administração da Ré, e em acumulação com as suas demais funções, o Autor ainda procedeu a uma análise do inventário de peças no final de 2011 e apresentou o respectivo relatório.
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No Verão de 2011, o Autor gozou 25 dias de férias, conforme o mapa de férias do sector mecânico que entregou à Ré no início deste ano.
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Nos recibos de remunerações do ano de 2010, não constam descontos no vencimento do A. em resultado de faltas injustificadas ao trabalho nesse ano.
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No pagamento do vencimento de Outubro de 2011, a Ré subtraiu-lhe a retribuição correspondente a três dias por faltas injustificadas, invocando que só teria direito ao gozo de 22 dias de férias, sendo que o A. gozou 25 dias.
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O A. tem horário de trabalho.
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Após a difusão pelo Autor do mapa de férias, por e-mail enviado, a 01.06.2011, a chefes de diversas secções da oficina, com conhecimento ao administrador DD, este manifestou por e-mail ao Autor, a 02.06.2011, que no seu entender ele só tinha direito a 22 dias de férias úteis, anexando um mapa de faltas do Autor à mensagem. [redação do TRP] 22.Esta questão ficou resolvida entre as partes através do acordo alcançado na ação infra identificada.
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Na falta de reposição das diferenças reclamadas, a 02.12.2011, o Autor propôs uma ação de reclamação de créditos laborais no Tribunal de Trabalho do Porto, para a qual a Ré foi citada por via postal a 13.12.2011.
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No dia 16 de Dezembro, não foi possível ao Autor aceder, no programa informático de trabalho EE a fichas dos clientes e às tabelas de descontos, tendo sido informado pelo responsável pela área informática que tinha recebido ordens para desativar o acesso do Autor a essas funções.
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Em data não apurada, o Autor foi informado pelo Sr. FF, responsável da faturação, que tinha recebido ordens para não permitir a consulta direta de papéis da faturação pelo Autor, devendo este, caso necessitasse dos mesmos, solicitar àquele a respetiva entrega.
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O recepcionista Srs. GG comunicou ao Autor que recebeu ordens da administração para acompanhar o Autor quando este quisesse mexer em papéis ou tirar fotocópias.
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O Sr. CC, chefe da secção de peças, comunicou ao Autor que recebeu ordem da administração para que este lhe solicitasse a consulta de pastas aí existentes, ficando impedido de as consultar diretamente.
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O Sr. HH transmitiu ao Autor que, por ordem da administração, estava proibido de entrar no escritório a não ser por razões profissionais.
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O Sr. GG disse ao A. que tinha recebido ordens para não lhe entregar os plannings da oficina e para o Autor não fazer Inquéritos de Satisfação do Cliente uma vez que seria a telefonista a executar essa tarefa.
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O Autor remeteu à Ré a carta de 20/12/2011, junta a fls. 119/120, com o seguinte teor: [redação do TRP] No dia 16 de Dezembro, não me foi possível aceder ao programa informático de trabalho EE após introduzir a chave de utilizador e a...
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