Acórdão nº 94/07.8TBSCD.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Dezembro de 2014

Magistrado ResponsávelGARCIA CALEJO
Data da Resolução02 de Dezembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- Relatório: 1-1- AA, residente em ... instaurou contra BB e mulher CC, residentes no ...

e DD e EE, residentes em ..., a presente acção com processo ordinário pedindo que se declare que é dono e legítimo possuidor dos prédios identificados em a) e b) do artigo 1º da p.i e se condenem os RR. a reconhecer-lhe o direito de preferência na compra e venda referida no artigo 12º da p.i.

Fundamenta este pedido dizendo que é dono e legitimo possuidor de dois prédios rústicos. Os 2ºs RR foram donos de um outro prédio rústico que confronta com um dos seus prédios rústicos, sendo que estes RR. venderam aos 1ºs RR. tal prédio, sem lhe dar a possibilidade de exercer o seu direito de preferência. O seu prédio é dotado de área inferior à unidade de cultura.

Contestaram os RR. dizendo que a 1ª R. (CC), à data da escritura de compra e venda já era proprietária de 1/3 do prédio em causa, onde foram feitas obras que constituíram benfeitorias no valor de € 50.000, sendo que o valor dos restantes 2/3 não ultrapassa os € 9.000. Além disso, a 1ª R. é a possuidora do prédio rústico inscrito na matriz sobre o artigo …º, prédio esse que confina a nascente com o prédio em causa nos autos. No prédio vendido encontra-se ocupada por uma construção que é dominante em relação à restante parte. Um dos prédios do A. é passível de ónus de eventual redução, onde aliás já se encontra construído um prédio urbano e o outro prédio tem um ónus de não fraccionamento. Não foi efectuado o depósito do preço.

Terminam pedindo a improcedência da acção e, em reconvenção, a condenação do A. a reconhecer que a 1ª R. mulher, à data de 23.8.2006, era já há mais de 15 anos, e antes dela a sua mãe e padrasto, há mais de 20, 30 anos, comproprietários, em cerca de 1/3 do prédio vendido, pelo que a venda só teve por objecto 2/3 do prédio, que a parte vendida o foi por nove mil euros e que a 1ª R. mulher e antes dela a mãe realizaram obras de benfeitorias de 50 mil euros.

O processo seguiu os seus regulares termos posteriores, tendo-se proferido o despacho saneador, após o que se fixaram os factos assentes e se organizou a base instrutória, se realizou a audiência de discussão e julgamento, se respondeu à base instrutória e se proferiu a sentença.

Nesta julgou-se a acção procedente por provada e, consequentemente, declarou-se que o A. é dono e legítimo possuidor dos prédios identificados em 1 e 3, condenando-se os RR. a reconhecer ao A. o direito de preferência do A. na compra e venda referida em 4) e a substituir-se aos 1ºs RR. adquirentes na escritura mencionada em 4), bem como na titularidade e posse do prédio aí mencionado, posição que esta ocupará, mediante o pagamento do preço e demais despesas tidas com a aquisição, nomeadamente de escritura e registo.

Mais se julgou o pedido reconvencional totalmente improcedente e, como tal, absolveu-se o A. do mesmo.

1-2- Não se conformando com esta decisão, dela recorreram os RR. de apelação para o Tribunal da Relação de ... tendo-se aí, por acórdão de 13-5-2014, julgado parcialmente procedente o recurso, julgando-se improcedente o pedido do A. e parcialmente procedente o pedido reconvencional dos RR., declarando estes proprietários de (cerca de) 1/3 de tal prédio.

1-3- Irresignado com este acórdão, dele recorreu o A. AA para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como revista e com efeito devolutivo.

O recorrente alegou, tendo das suas alegações retirado as seguintes conclusões: 1ª- Está em causa no presente recurso e desde logo, saber em face dos factos provados se pode concluir, como se fez no douto Acórdão recorrido e com o que se não concorda, que a Ré CC adquiriu por usucapião o prédio inscrito sob o artigo ...° e o pedaço de terreno do prédio vendido (art. 7712°) por se encontrar cumprido, contrariamente ao entendido em 1ª instância, o prazo de 15 anos, sendo por isso comproprietária e proprietária de prédio confinante; 2ª- É que não obstante estar demonstrada a boa fé da Ré CC, sobre o prédio inscrito sob o artigo ...º e o pedaço de terreno do prédio vendido (art. 7725°), através da posse desde 1991 até à sua venda em Agosto de 2006, não se pode por aí concluir que esta adquiriu tal parcela e prédio por usucapião, por se encontrar cumprido o prazo de quinze anos à data de 23 de Agosto de 2006; 3ª- Tanto mais que demonstrada, como se refere no douto acórdão sob recurso, a boa fé da mãe e padrasto da Ré CC, sobre o prédio inscrito sob o artigo ...° e o pedaço de terreno do prédio vendido (art. …º), através da posse desde 1976 a 1991, daí resultaria a necessária conclusão, por aplicação de igual raciocínio ao usado pelo Tribunal da Relação de ... e sob pena de contradição, do terminus ad quem do prazo da posse destes às 24 horas do último dia do ano de 1991 e assim a inevitabilidade do terminus a quo da posse da Ré CC às O horas do primeiro dia do ano de 1992.

4ª- E teria que ser sempre por referência à data de 23 de Agosto de 2006 que a Ré CC, tinha de alegar, como alegou, para ser provada, a sua posse de boa fé, durante 15 anos, para efeitos de lhe ver reconhecida a alegada aquisição originária, por usucapião, do direito de propriedade sobre o prédio inscrito sob o artigo ...

0 e o pedaço de terreno do prédio vendido (art.

7725°) pertencendo-lhe o ónus da prova dos factos constitutivos da declaração desse direito nos termos do art. 342º do Código Civil, e ser assim reconhecida, em consequência, como proprietária confinante e também comproprietária por referência àquela data; 5ª- Só uma vez provado esse direito da Ré CC, que não se provou, poderia ser afastado, por não provado, o facto constitutivo/pressuposto do direito de preferência alegado pelo Autor preferente, concretamente o de não ser o adquirente (no caso os primeiros Réus) proprietários confinantes, resultando provado que, contrariamente ao por este alegado, de que nenhum dos confinantes pretendia exercer esse direito, a Ré CC é afinal proprietária confinante e também comproprietária do prédio objecto da preferência; 6ª- E tendo a posse da Ré CC tido início, sem mais concretização em termos do concreto dia e mês, no ano de 1991, sempre a mesma tem de ser contada com referência à data de 31 de Dezembro de 1991, por outra anterior ser desconhecida e assim sempre os quinze anos só se completariam a 31 de Dezembro de 2006 - cfr nesse sentido o Acórdão do STJ de 14/04/2011 processo n"4044/06.0TBAMD.L.l.SJ em www.dgsi.pt.

7ª- Está também em causa no presente recurso saber se a figura jurídica da acessão na posse não exige, como se refere no douto acórdão sob recurso e entendimento com que o Recorrente não concorda, que esta seja transmitida, necessária e inelutavelmente, através de um negócio jurídico formalmente válido.

8ª- E a este respeito, resulta do douto acórdão sob recurso que, ainda que se entendesse que não se completou o prazo de 15 anos para a Ré CC ter adquirido os prédios por usucapião, sempre a esta assiste jus à invocação da acessão da posse e assim juntar o lapso temporal usufruído pela progenitora e iniciado em 1976 ao período por si começado em 1991 e até 2006 e assim se concluindo que mais do que satisfeito o período de 20 anos, também por aí a Ré CC adquiriu a propriedade do prédio inscrito sob o art. ...° e também 1/3 do prédio vendido por usucapião.

9ª- Entendendo o douto acórdão da Relação de ... que a figura jurídico da acessão da posse não exige que esta seja transmitida, necessária e inelutavelmente, através de um negócio jurídico formalmente válido; 10ª- Contudo, na situação concreta a posse da Ré CC é não titulada, na medida em que a adquiriu por acto de partilha nulo, por falta de forma legal, uma vez que a partilha foi verbal, sendo que a partilha em vida mais não é que uma doação, a qual, em 91 tinha de ser feita por escritura pública (art. 947º do CC da redacção em vigor em 1991) e assim não pode esta, contrariamente ao decidido pela Tribunal da Relação de ..., suceder na posse da sua mãe, sendo a partilha feita em vida, nem juntar à sua posse a posse da sua mãe, pelo facto de não ser possível a acessão na posse quando a transmissão não é feita através de uma relação jurídica válida e no caso foi por um acto nulo.

11ª- No sentido do decidido em 1ª instância, entendimento pelo qual o Recorrente pugna por via do presente recurso, de que o título a que alude e exige o art.

1256° do Código Civil é o que a lei também exigir para que o negócio de transmissão seja formal e substancialmente válido, não relevando, para o efeito, como título legitimo de aquisição, um acta nulo, sendo que neste caso, só pode ser invocada a posse pessoalmente exercida e não a dos antepossuidores se decidiu no Acórdão do STJ de 27/11/2007 processo 07AJ815 em www.dgsi.pt; 12ª- E entres outros também nesse sentido se decidiu no Acórdão do STJ de 07/04/2011 processo 956/07. 2TBVCT. G1.S1, nos Acórdãos da Relação do Porto de 20/11/2012 processo 2229/11.7TBVNG.P1, de 26/01/2012 processo 5978/08.3TBMTS.Pl, de 06/05/2010, processo 829/06.6TBCHV.Pl, todos em www.dgsi.pt, lendo-se neste último: “Contudo, como é entendimento dominante na doutrina e jurisprudência, para que se verifique a acessão de posse, nos termos do citado artigo 1256º nº 1 do CC; é necessário que entre o transmitente e o adquirente haja um verdadeiro acto translativo da posse formalmente válida. Neste sentido Antunes Varela e Pires de Lima, no CC Anotado, Vol. II, 2Q edição, pág.14, Manuel Rodrigues, a Posse, págs.

252, 292 e 293, Moitinho de Almeida, Restituição de Posse e Ocupação de Imóveis, 2Q edição, pág. 80. Na jurisprudência são de referir entre outros os seguintes acórdãos: do STJ de 06.07.76, BMJ nº 259, 227 de 10.12.87, processo nº 075048, relator Cons. Eliseu Figueira, em www.djsi.pt.

onde se decidiu: "A acessão de posses, na aquisição derivada, pressupõe a validade dos respectivos negócios jurídicos, sem o que não pode ser considerada a continuidade de posses para contagem dos prazos de usucapião”. Desta...

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