Acórdão nº 2334/10.7TBGDM.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução18 de Setembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

AA intentou contra Caixa BB, SA, e CC – Companhia de Seguros, SA, acção declarativa comum de condenação, sob a forma ordinária, pedindo: a) – O reconhecimento pelas rés da validade do acordo (contrato de adesão) estabelecido com o autor aquando da formalização do contrato de mútuo, bem como a reconhecerem a invalidez do autor com efeitos desde Maio de 2006; b) – A condenação das rés a indemnizar o autor, nos termos contratuais, nomeadamente entregando à instituição de crédito beneficiária do seguro o capital em dívida, na quantia de € 53.683,03; c) – A condenação solidária das rés a reembolsarem o autor das importâncias que entretanto lhe foram (e venham a ser) debitadas, ao mesmo título, na respectiva conta bancária, com efeitos a partir de Maio de 2006; d) – A condenação solidária das rés a pagarem ao autor os juros moratórios calculados (a liquidar em execução de sentença), à taxa legal, sobre as prestações entretanto debitadas e acima referidas, (a partir de Maio de 2006), e contados até efectivo pagamento.

Fundamentando a sua pretensão, alegou, em síntese, haver, conjuntamente com sua mulher, contraído um empréstimo perante a 1ª ré, para aquisição de um prédio, com hipoteca deste, e, na mesma altura, como condição necessária à aprovação do referido mútuo, autor e mulher terem subscrito um seguro de vida (ramo Vida Grupo), com capital seguro igual ao do empréstimo, sendo o autor e a mulher os seus beneficiários, de modo a garantir, em caso de morte ou invalidez (total ou permanente por doença ou acidente) dos mutuários, a liquidação do montante em dívida, do capital e dos juros vencidos. Este seguro foi-lhes apresentado pela 1ª ré como uma proposta de adesão daqueles a uma apólice de seguro de vida de grupo.

Tendo o autor sido afectado por doença que o incapacitou total e definitivamente para o trabalho, viu todavia recusado pelas rés o accionamento do dito contrato, entendendo que, por força de cláusula do mesmo, para a verificação da situação de invalidez seria necessário que a pessoa segurada necessitasse de recorrer de modo contínuo à assistência de uma 3ª pessoa, por forma a realizar os actos normais da vida diária.

Regularmente citadas, contestaram ambas as rés.

A ré CC reconhece que celebrou com o Banco DD, ora Caixa BB, um contrato de seguro do ramo vida e explica que, de acordo com as condições gerais e especiais da apólice, ficaram cobertos os riscos de falecimento da pessoa segura, invalidez absoluta e definitiva por doença da pessoa segura e invalidez total e permanente por acidente da pessoa segura.

Explicita que, de acordo com o contratado e que ficou a constar das condições especiais da apólice, a pessoa segurada é considerada em estado de invalidez absoluta e definitiva por doença, quando, em consequência de doença susceptível de constatação médica objectiva, fique total e definitivamente incapacitada de exercer qualquer profissão e necessite de recorrer, de modo contínuo, à assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária”, sendo, portanto, necessário que se verifiquem cumulativamente aquelas três situações, para que se considere que existe uma situação de invalidez absoluta e definitiva.

Tal como consta das condições particulares da apólice, o beneficiário do seguro é o respectivo tomador do seguro, ou seja, a Caixa BB, considerando-se como pessoas seguras os clientes do segurado que recorram ao sistema do crédito à habitação e satisfaçam as condições exigidas pela Caixa para a concessão do crédito.

O autor aderiu, em 1 de Junho de 1998, tendo sido aceite pela ré, em 29/07/1998, data a partir da qual o seguro começou a vigorar em relação ao autor.

Não sendo responsável pela actuação dos funcionários da Caixa BB, mas tanto quanto chegou ao seu conhecimento os funcionários da Caixa deram a conhecer ao Autor o teor da apólice do contrato.

Reconhece que o Autor, em 17/07/2009, lhe enviou a participação de sinistro, a qual foi recebida em 6/08/2009, a fim de fazer funcionar a garantia de invalidez absoluta e definitiva do aludido contrato de seguro, mas nunca enviou à Ré qualquer documento, nomeadamente, declaração médica, comprovativa de que estava impedido de efectuar os actos normais da vida diária e que só os podia executar com a assistência de terceira pessoa, pelo que concluiu que, não integrando o estado clínico do Autor uma situação de invalidez absoluta e definitiva por doença, não tem obrigação de pagar qualquer quantia.

Impugna, ainda, alguns dos factos, alegando que não os conhece nem tem de conhecer por não serem pessoais.

A ré Caixa BB contestou, sustentando que na concessão do financiamento foi exigido que os mutuários subscrevessem seguro de vida, o qual garantisse o capital em dívida em caso de morte ou de invalidez total e permanente, tratando-se, consequentemente, de um contrato de seguro celebrado entre o autor e a seguradora CC, sendo a Caixa beneficiária irrevogável até ao capital máximo em dívida em cada anuidade.

Assim, as pretensões deduzidas não têm qualquer fundamento em relação a si, não obstante reconhecer a celebração dos contratos de mútuo com hipoteca e de seguro. Na verdade, em caso de procedência desta acção, apenas a 2ª ré deveria ser condenada a pagar à 1ª ré o montante necessário para a amortização do empréstimo, desobrigando dessa forma o autor e a esposa.

Impugna ainda alguns dos factos articulados na petição inicial, pugnando pela improcedência da acção no que lhe diz respeito.

Tendo sido dispensada a realização da audiência preliminar, proferiu-se então despacho saneador e organizou-se a base instrutória, a qual mereceu uma reclamação por parte da ré “CC”, parcialmente deferida (Fls. 145/146).

Foi produzida prova pericial (vide fls. 160 e seguintes e 231 e seguintes) e indeferiu-se a realização de uma 2ª perícia.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, onde, além do mais, se alterou a redacção do quesito 30º, despacho do qual foi interposto recurso mas que não foi admitido, encontrando-se a matéria de facto controvertida respondida nos autos por despacho datado de 15/07/2013.

Foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, reconhecendo a validade e eficácia do contrato de seguro do ramo vida titulado pela apólice nº …, estabelecido com o autor (e mulher) aquando da formalização do contrato de mútuo a que se reportam os pontos 1º a 3º dos factos provados, mas considerando que, para que o núcleo essencial das pretensões aduzidas pelo autor pudessem ser acolhidas, teria sido necessário que, além do mais, da matéria de facto provada se pudesse concluir que a invalidez resultante de doença do autor era absoluta e definitiva, na acepção prevista no artigo 2º, n.º 3 das “Condições Especiais da Apólice”, isto é, que não só seja incapacitante para o autor do exercício de qualquer profissão, mas também que ele necessite de recorrer, de modo contínuo, à assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária, retirou a conclusão que se não verificavam todos os requisitos exigidos pelo n.º 3 do artigo 2º das referidas Condições Especiais.

Com efeito, continua a sentença, se é certo que “a incapacidade do autor resultante da doença do foro cardíaco de que padece o torna incapaz para o exercício de qualquer profissão”, não é menos certo que “a matéria de facto provada não é suficiente para que se possa concluir que ele está dependente de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária”, pelo que, “nessa medida, o sinistro não cai no âmbito de cobertura da apólice, de sorte que o núcleo essencial das pretensões deduzidas terá de ser julgado improcedente” e, desse modo, absolveu, no mais, as rés do pedido, com custas a cargo do autor.

Inconformado, o Autor interpôs recurso para o Tribunal da Relação do Porto, que, por acórdão de 27 de Fevereiro de 2014, na procedência da apelação, revogando a sentença recorrida, condenou as rés Caixa BB, SA, e CC – Companhia de Seguros, SA: 1º - A reconhecerem a validade do acordo (contrato de adesão) estabelecido com o autor AA, aquando da formalização do contrato de mútuo, reconhecendo a ocorrência de invalidez do autor como factor de caracterização de situação contemplada no seguro por aquele pactuado, com efeitos desde Maio de 2006; 2º - A que pela ré seguradora seja assegurada, nos termos contratuais, a restituição à primeira ré, instituição de crédito beneficiária do seguro, do capital em dívida do referido contrato, no montante de € 53.683,03; 3º - A, solidariamente, reembolsarem o autor das importâncias que entretanto lhe foram (e venham a ser) debitadas, ao mesmo título, na respectiva conta bancária, com efeitos a partir de Maio de 2006; 4º - A pagarem ao autor os juros moratórios calculados (a liquidar em execução de sentença), à taxa legal, sobre as prestações entretanto debitadas e acima referidas (a partir de Maio de 2006), e contados até efectivo pagamento.

  1. - Custas pelas rés e recorridas, nas duas instâncias - artigo 527º do Código de Processo Civil.

    Para a revogação da sentença e condenação das rés nos moldes supra - mencionados, o Tribunal da Relação considerou que, como condição necessária à aprovação do mútuo contraído junto da Caixa BB, o autor e a mulher subscreveram um seguro de vida (Ramo – Vida Grupo), com capital seguro igual ao do empréstimo, de modo a garantir, em caso de morte e invalidez (total ou permanente por doença ou acidente) dos mutuários, a liquidação do montante em dívida do capital e dos juros vencidos, de acordo com as condições gerias e especiais da apólice, ficando cobertos os riscos de falecimento da pessoa segura, bem como de invalidez absoluta e definitiva por doença da pessoa segura e de invalidez total e permanente por acidente da pessoa segura.

    E, depois de considerar o que, de acordo com as condições especiais da apólice desse seguro, se deve entender por estado de invalidez absoluta e definitiva em consequência de doença...

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