Acórdão nº 4/14.6YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Setembro de 2014

Magistrado ResponsávelRODRIGUES DA COSTA
Data da Resolução25 de Setembro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I. RELATÓRIO 1.

AA, Juíza de Direito na ...Vara..., veio, ao abrigo do disposto no art. 168.º e ss. do Estatuto dos Magistrados Judiciais (EMJ), interpor recurso contencioso da deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura (CSM), de 3 de Dezembro de 2013, que indeferiu a reclamação por si apresentada da deliberação tomada pelo Conselho Permanente que lhe atribuiu a classificação de serviço de Bom com distinção pelo serviço prestado naquela Vara Cível, no período compreendido entre 15 de Setembro de 2008 e 18 de Fevereiro de 2013.

Em síntese, a recorrente impugna tal deliberação, contrariando as conclusões a que chegou, a partir da deliberação do Conselho Permanente, em matéria de atrasos processuais justificativos de censura, imputando-lhe insuficiente avaliação das circunstâncias que rodearam o serviço inspeccionado e fundamentação em pressupostos de facto inexactos.

Por outro lado, contraria também as posturas processuais dilatórias que lhe foram imputadas na deliberação recorrida, considerando, além disso, que a deliberação recorrida não identifica suficientemente todos os casos em que essa deficiência terá sido encontrada, limitando-se a referir alguns exemplos e remetendo para outros casos de forma genérica e não concretizada.

A isso acrescenta a recorrente não se vislumbrar em que medida as correcções, especificações e justificações que forneceu tiveram influência na notação que lhe foi atribuída, não obstante se mencionar na deliberação recorrida terem os mesmos sido levados em conta nos factos enunciados, o que efectivamente sucedeu, mas não se divisando as consequências que dali tenham sido retiradas.

Aponta ainda incongruências entre a constatação de um afirmada postura dinâmica e o arrastamento processual.

Por fim, denuncia não terem sido devidamente relevadas as questões de saúde e a existência de contradições várias no relatório da inspecção quanto aos aspectos positivos e negativos da sua prestação, contradições essas que passaram para a deliberação recorrida.

Termina pedindo que, por erro nos pressupostos de facto e por não ter tido suficientemente em consideração as circunstâncias em que foi prestado o serviço inspeccionado, seja a deliberação impugnada declarada nula ou anulada.

  1. Na vista a que se refere o art. 173.º, n.º 1 do EMJ, a Ex.ma magistrada do Ministério Público consignou nada parecer, liminarmente, dever obstar ao normal prosseguimento do recurso.

    3.

    O CSM, notificado nos termos do art. 174.º, n.º 1 do EMJ, veio responder, contrariando as posições da recorrente.

    Em relação aos atrasos, afirmou que a deliberação recorrida escalpelizou toda a argumentação desenvolvida pela recorrente, por reporte a cada uma das circunstâncias por ela invocadas, quer de serviço, quer pessoais, tendo sido reafirmado especificamente o constante do relatório de inspecção e concluindo-se que nem este nem a deliberação reclamada deixaram de ter em conta os aspectos em questão.

    A análise e ponderação dessas circunstâncias foram efectuadas no todo e não isoladamente, como faz a recorrente, tendo sido considerado o conjunto das circunstâncias que contextualizaram o serviço por si desenvolvido, com base nos factos apurados no decurso da inspecção.

    Na deliberação recorrida concluiu-se que no contexto de um volume de serviço que não se poderá classificar como excessivo, embora assumindo diversidade e, em muitos casos, complexidade e volume, implicando estudo e tempo para a preparação e realização das diligências e para a prolação das respectivas decisões (com reflexos quer no próprio processo quer na tramitação dos demais), não se poderiam ter por justificados os atrasos detectados.

    Quanto às circunstâncias pessoais, foi-lhes dada uma correcta dimensão, por um lado, entendendo-as como não justificativas, de modo absoluto, dos atrasos verificados na prolação dos despachos saneadores e sentenças, atribuindo-lhes ao invés um peso relativo, mas, por outro, conferindo-lhes uma importância de muito relevo no que concerne à valoração global final efectuada.

    Relativamente às posturas processuais dilatórias e deficiência de gestão de agenda, foram as mesmas efectivamente exemplificadas, tendo ainda sido considerado na deliberação recorrida o constante da informação final do Inspector Judicial quanto ao facto destas posturas processuais terem sido generalizadas, o que sintomaticamente é explicitado como constituindo uma pequena parte dos exemplos especificados no relatório de inspecção.

    Quanto às correcções, especificações e justificações, contrapôs o CSM que todas as correcções, especificações e justificações invocadas (quanto aos atrasos na prolação de algumas decisões e às posturas dilatórias) foram consideradas nos factos enunciados na deliberação recorrida, sendo que, quer na informação final, quer na deliberação reclamada, foi admitido poderem existir lapsos, sem que, contudo, estes pudessem apagar o verificado pelo Inspector Judicial, quando realizou a inspecção e de que deu conta.

    Na deliberação recorrida entendeu-se que estes lapsos e justificações não assumiam o relevo que se lhes pretendeu dar, quando, como se impõe, são inseridos e analisados no universo mais vasto do que foi sinalizado pelo Inspector Judicial, isto é, referindo-se somente a parte dos muitos exemplos especificados no relatório de inspecção sobre a forma lenta e pouco operante como foi conduzida a grande maioria dos processos tramitados no período objecto de inspecção.

    Relativamente à compatibilização de uma postura dinâmica com o arrastamento de processos, na deliberação recorrida concedeu-se que pudesse haver contradição entre uma coisa e outra, mas o que é certo é que nem por isso deixaram de ser reais e pudessem ter coexistido.

    Quanto à morosidade na tramitação de processos, a recorrente invoca não existir base/fundamento para a morosidade na tramitação dos procedimentos cautelares que lhe é apontada, na medida em que descontados os lapsos reconhecidos quanto a processos identificados e que não foram tramitados por si, resta apenas o procedimento cautelar n.º 878/2.5TVLSB.

    Relativamente a este processo, a recorrente discorda do juízo de censura efectuado, reproduzindo as razões invocadas na sua reclamação. Porém, afirma o CSM que o constatado na deliberação recorrida e no relatório da inspecção não assenta apenas em exemplos de despachos não proferidos pela reclamante e, como tal, não poderia a deliberação reclamada concluir como alegado pela recorrente.

    Quanto às considerações da parte final, argumenta o CSM que, tanto a deliberação recorrida como a reclamada, como o relatório de inspecção e a informação final não poderiam deixar de encerrar considerações conclusivas e valorativas, visto que isto mesmo compõe também o processo de avaliação do desempenho.

    Muito embora a recorrente esgrima com as considerações incluídas nos quatro últimos parágrafos de págs. 30 e primeiro de p. 30 vº da deliberação reclamada, afirmando terem natureza conclusiva, designadamente quando aí é afirmado que «São múltiplos os exemplos apresentados pelo Exm.° Sr. Inspector Judicial desta forma de trabalhar.», sem identificar um único desses exemplos, afirma o CSM que a deliberação recorrida, à semelhança da deliberação reclamada, limitou-se a constatar que efectivamente foram múltiplos os exemplos apresentados pelo Inspector Judicial, mas que o relatório de inspecção contém todos os aspectos que a recorrente poderia ter levado em conta e eventualmente defender-se em relação a eles, se assim o entendesse, não se verificando qualquer omissão susceptível de lesar o direito de defesa da recorrente.

    Quanto à formulação de quesitos conclusivos e omissão de enunciação das questões a decidir, afirma o CSM que a situação a que se refere a recorrente não assumiu no relatório de inspecção, nem na deliberação do Conselho Permanente, relevo de destaque que postulasse a sua apreciação, constituindo um caso em que são formulados reparos pelo Inspector, em sentido estritamente pedagógico.

    Assim, não caberia analisar essa circunstância como obstáculo á atribuição de notação superior à recorrente pelo seu desempenho no período sob inspecção, tendo sido apenas tida em conta como constatação efectuada e que teria de ser registada, como foi.

    Relativamente às questões de saúde, diz o CSM que a questão aparece um pouco confusa e misturada com outra, mas que se entendeu na deliberação recorrida que, no relatório de inspecção, com o aprofundamento consignado na informação final, foi dada uma correcta dimensão às referidas circunstâncias pessoais, por um lado, entendendo-as como não justificativas, de modo absoluto, dos atrasos verificados na prolação dos despachos saneadores e sentenças, atribuindo-se-lhes, ao invés, um peso relativo, mas, por outro, conferindo-se-lhes uma importância de muito relevo no que concerne à valoração global final efectuada.

    Quanto à ponderação dos aspectos positivos e negativos, diz o CSM que não se deve nem pode isolar afirmações constantes do relatório de inspecção, para que desta forma, das mesmas se conclua, sem mais, existir contradição com outras também isoladas para o mesmo efeito e que, por outro lado, foi expressamente frisado na deliberação recorrida que a avaliação do desempenho da recorrente, nos diversos aspectos que foram analisados e ponderados (que não os atrasos e alguma prática dilatória) não foi negativa, sendo que bem pelo contrário foi tida como bastante positiva e meritória, como o revela a notação atribuída, sublinhando ainda que, numa mesma realidade complexa como a da avaliação do serviço prestado por um juiz, coexistem aspectos de diferente natureza, uns positivos, outros negativos, alguns em harmonia entre si, outros contraditórios, mas cada um com o...

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