Acórdão nº 443/12.7JABRG.G1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelSOUTO DE MOURA
Data da Resolução23 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

AA, ..., ..., nascido a ... em ..., ..., e morador em ..., foi julgado em processo comum e por tribunal coletivo, no então 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Barcelos, e condenado por acórdão de 29/10/2013, pela prática de um crime de homicídio simples, p. e p. pelo art. 131º do CP, com a agravação do artº. 86º, nº.3 da Lei 5/2006, de 23de fevereiro, na pena de 17 anos de prisão, bem como pelo cometimento de um crime de uso e detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º, n.º 1, al. c), daquela Lei 5/2006, na pena de 2 anos de prisão. Em cúmulo jurídico, foi condenado na pena conjunta de 18 anos de prisão.

Recorreu para o Tribunal da Relação, que concedeu parcial provimento ao recurso, e condenou o arguido pelo crime de homicídio na pena de 14 anos e 6 meses de prisão, e pelo crime de detenção de arma proibida na pena de 1 ano e 3 meses de prisão. Em cúmulo, condenou-o na pena conjunta de 15 anos de prisão.

Inconformado, o arguido interpôs recurso para o STJ, pelo que cumpre conhecer.

A – FACTOS Foram os seguintes os factos dados por provados na primeira instância e que a Relação manteve: “

  1. Da acusação 1. Em 22/08/2012, entre as 12,10 e as 12,30 horas, o arguido dirigiu-se a um armazém sito em ..., pertencente e utilizado por BB.

    1. O arguido transportava consigo uma arma de fogo de calibre 6,35 mm.

    2. O arguido mantinha com o aludido BB uma relação profissional, há já vários anos.

    3. O arguido e o dito BB haviam combinado previamente um encontro entre ambos à data e hora supra.

    4. Nas circunstâncias de tempo e lugar referidas em 1), o arguido, num momento em que o BB se encontrava de costas para si, empunhou a referida arma de fogo e apontou-a na direcção do corpo do BB.

    5. Acto contínuo, o arguido, que se encontrava a cerca de 75 cm do BB, atingiu este com um disparo nas costas.

    6. O referido disparo provocou, directa e necessariamente, a morte do BB.

    7. Em 21/02/2013 o arguido tinha consigo, no interior da sua residência, em Gondomar, uma arma de alarme adaptada a munições reais, de percussão anelar ou lateral, de calibre ". 22", marca “Redondo”, modelo “607”, sem número de série.

    8. O arguido agiu deliberada, livre e conscientemente.

    9. Com a intenção de tirar a vida ao BB.

    10. E de ter na sua posse arma de fogo que sabia ser proibida.

    11. Sabia que toda a sua conduta era proibida e punida por lei.

      Mais se provou que: 13. O arguido e o BB andavam desavindos há algum tempo, por motivo que não foi possível apurar.

    12. Nos momentos que antecederam o disparo efectuado pelo arguido, este e o BB discutiram acaloradamente.

  2. Das condições pessoais do arguido 15. O arguido é oriundo de agregado de estrato sócio-económico equilibrado, com uma dinâmica familiar normativa e funcional.

    1. Iniciou-se no mundo do trabalho com cerca de 16 anos.

    2. Mais tarde constituiu uma empresa com o seu pai, na área de componentes para electricidade, tendo experimentado situação financeira estável durante cerca de 11 anos.

    3. A empresa encerrou em 1991.

    4. Durante cerca de 3 anos trabalhou em empresa de segurança privada.

    5. Constitui nova sociedade, com o falecido, na área dos componentes / materiais eléctricos.

    6. A empresa encerrou em 2008.

    7. Passou a usufruir de subsídio de desemprego e a realizar trabalhos esporádicos.

    8. O arguido é casado.

    9. Tem uma filha maior de idade.

    10. Habita vivenda e o agregado é constituído também pelo sogro e filha.

    11. Mantém boas relações de vizinhança.

  3. Dos antecedentes criminais 28. O arguido tem averbada uma condenação, já transitada em julgado, pela prática de crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelo artº. 3º, nº.2, do DL 2/98, de 03/01, com pena de 80 dias de multa.

    e) Do Pedido Civil 29. BB tinha, à data da sua morte, 63 anos de idade.

    1. Era casado com a assistente CC.

    2. Os assistentes ... e ... eram filhos do casal.

    3. O falecido era forte, saudável e activo.

    4. Estimado e conceituado comunitariamente.

    5. Era empresário.

    6. Providenciava pelo sustento da mulher e da filha de ambos.

    7. Disponibilizando, para o efeito, cerca de 1000 Euros mensais.

    8. Com o decesso do BB, mormente a forma como ocorreu, os assistentes e demandantes sofreram choque, desgosto e tristeza.

    9. O falecido mantinha uma relação extra- conjugal há cerca de 20 anos." B – RECURSO Foram as seguintes as conclusões da motivação do recurso do arguido: "A) Insurge-se com a condenação do crime de Homicídio pelo qual condenado.

      A falta de prova impunha a sua absolvição.

      O tribunal na ausência de prova socorre-se do depoimento de um co arguido em inquérito, mas que adquire a condição de testemunha em julgamento.

      A fundamentação aduzida reporta-se a posições iguais em julgamento co arguidos, o que não resulta do caso "sub judice,", em julgamento a testemunha DD está sujeito ao estatuído nos arts. 128 a 132 do C:P.P. e não ao disposto no art°. 61.

      O tribunal olvidou no caso que a ora testemunha em inquérito e na condição de arguido não estava obrigada a responder com verdade, o que decorria do seu estatuto processual art°. 61 do C.P.P.

      Decorre ainda que o douto tribunal ordenou a extração de certidão contra a testemunha pelo crime de falsas declarações.

      Ora, só o inquérito a efectuar apura se mentiu e em que circunstâncias, ocorrendo versões contraditórias e em obediência ao princípio in dúbio pro reo, não poderia tal testemunho sustentar a incriminação, como decorre na sua essência na fundamentação aduzida.

      Até porque se presume inocente até prova em contrário.

      O douto tribunal olvidou que o mesmo era também ele suspeito de um crime, (que não estava obrigado a responder com verdade) que referiu em Audiência que foi "coagido" pelo O.P.C, e que explicou de forma detalhada o que não percepcionou, não ouviu tiros etc etc.

      Sem prejuízo, B) Olvida-se que a factualidade assente não permite a fundamentação aduzida: Nomeadamente, dos factos assentes, não se provou se o quadro elétrico estava aceso quando foi aceso, a que horas a vitima aí chegou e se em algum momento o ligou, não se vislumbra a origem de se fundamentar dizendo que é o arguido que só ele sabia ou podia saber a sua localização que o vem a desligar (!) duvidas para as quais não temos respostas por inexistentes, pelo que entendemos que se verifica o vicio da insuficiência da matéria de facto provada art°. 410 nº 2 alínea a).

      Verifica-se ainda vício do art°. 374 e 379 do CP.P.

      Fala-se que nada faltou, então e o que aconteceu ao anel que o "de cujus" habitualmente usava e que é referido pela família ouvida em Audiência. E que no elenco da prova se referem declarações dos assistentes DD e EE Verificando-se contradição entre o provado e o fundamentado, artº 410 nº 2 alínea b) do C.PP. aliás o douto tribunal socorrendo-se da então testemunha tão pouco adianta porque no que a esta matéria respeita não se pronuncia, ocorrendo vicio de fundamentação O mesmo se diga o que aconteceu ao telemóvel, não sabemos pois também nesta parte o douto tribunal é omisso na fundamentação aduzida.

      Entendemos que deverá haver lugar ao reenvio para conhecer as questões suscitadas, o que se requer ao abrigo do disposto no artº 426 do C.P.P C) Caso tal não se entenda, Sempre será de convolar o crime para o do Homicídio Privilegiado artº 133 do C.P.

      Porquanto: Ponto 14 de factos provados: Nos momentos que antecederam o disparo discutiram acaloradamente, denotando emoção exacerbada, perturbação emocional.

      O Tribunal sustenta que é na sequência de o falecido de viva voz afirmar que havia sido "roubado" pelo arguido que ocorre o homicídio.

      Ou seja: Conheciam-se desde longa data, Tinham negócios.

      Tinham comportamento social adequado.

      O arguido tem 55 anos.

      Primário, estimado e considerado, sentindo-se pessoa honrada e cumpridora dos seus compromissos e a ter ocorrido o sucedido nos termos assentes, viu-se vexado, "esbulhado" na sua dignidade, estando em causa princípios de relevo que determinaram alteração do seu estado " nervoso" ao ponto do sucedido.

      Das duas uma, ou se valora in Totum o declarado pela Armando Rocha, ou então também deveríamos perceber qual o critério/razão/motivo, o que não decorre do processado, pois foram essas declarações em inquérito e lidas em Audiência que sustentam a condenação do recorrente.

      D) Qualquer que seja o entendimento e ainda em obediência ao princípio da proporcionalidade adequação e ainda ao estatuído nos arts 40, 70, 71 e 72, tendo em conta a sua idade, e que o ocorrido sucede em circunstâncias anómalas da sua forma de ser e estar deve a pena ser reduzida no seu quantum e fixada dosimetria mais próxima do mínimo legal, o que se peticiona." O Mº Pº respondeu e disse, depois de se referir às conclusões da motivação do recurso do arguido: (…) 4.° Da análise destas conclusões, uma certeza nos fica, é que o arguido não interpõe recurso do douto acórdão proferido por este Tribunal da Relação de Guimarães, mas continua a interpor recurso do douto acórdão proferido pela Primeira Instância.

      1. O arguido insurgiu-se e continua a insurgir-se com a valoração dada, quer pelo Tribunal de Primeira Instância, quer pelo Tribunal da Relação de Guimarães, ao que foi referido pelo DD, quer na qualidade de arguido, quer na qualidade de testemunha, esquecendo-se do princípio da livre apreciação da prova, parecendo olvidar que o arguido através do seu representante teve a possibilidade de confrontar a testemunha, exercendo o seu direito ao contraditório, sendo certo que do confronto dessas declarações, da forma como foram prestadas, socorrendo-se das regras da experiência comum o Tribunal formou a sua livre convicção e considerou, por isso, como assentes os factos que considerou, não conseguindo o arguido, apesar de toda a sua argumentação, colocá-los em causa.

      2. Com efeito, o arguido continua a defender a inexistência de prova que permita a sua condenação pela prática do crime de homicídio, esquecendo-se de explicar como é que o telemóvel do falecido fez exactamente o mesmo percurso que o seu telemóvel, isto é, desde Barcelos até ao Porto, estando ele acompanhado do...

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