Acórdão nº 10/12.5TTTVD.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelGONÇALVES ROCHA
Data da Resolução29 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: 1--- AA, residente em ..., intentou uma acção com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra BB, Lda, com sede no A..., ..., pedindo que a R seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 126.585,19, acrescida dos juros moratórios à taxa legal a contar de 18.10.2011 e até integral pagamento.

Para tanto, alegou que: - a Ré se dedica ao transporte público rodoviário de mercadorias, tendo sido admitido ao seu serviço em 01.03.1997, para o desempenho das funções de motorista dos CC; - à relação laboral estabelecida aplica-se o contrato colectivo de trabalho vertical convencionado entre a ANTRAM e a FESTRU, publicado no BTE, 1ª Série, nº 9 de 09.03.1998 e nº 18 de 15.05.1981, de acordo com o qual o Autor tinha direito a que as refeições lhe fossem pagas à factura (cláusula 47-A); a receber uma retribuição mensal não inferior à remuneração correspondente a duas horas de trabalho extraordinário por dia, em relação a todos os dias do mês do calendário (cláusula 74, nº 7); e ainda a uma retribuição mensal, actualmente de 21.200$00, paga a título de ajudas de custo, conforme à nota publicada no final do anexo II da última alteração salarial; - os montantes relativos à cláusula 74ª, nº 7 e ao prémio TIR constituíam remunerações mensais certas, específicas, regulares e periódicas realizadas em dinheiro e independentes do trabalho extraordinário efectivamente prestado, não se destinando a suportar quaisquer despesas e criando no trabalhador a expectativa do seu recebimento e que só podiam ser passíveis de descontos em caso de faltas injustificadas; - o Autor no estrangeiro só gastava o necessário com as refeições, as quais têm no CCT outra forma de pagamento a cargo da empregadora, que não através do prémio TIR, o qual constitui uma retribuição que o Autor reserva para ser gasto apenas em Portugal; - os motoristas têm direito a receber o “Prémio TIR” nas férias e nos subsídios de férias e de Natal, por ter natureza de retribuição; - pela cláusula 41º, nº 1, o Autor ainda tinha direito a que o trabalho prestado em dias feriados ou de descanso semanal ou complementar, isto é, os sábados, domingos e feriados, lhe fosse pago com o acréscimo de 200%, calculados com base no vencimento base; - tendo ainda direito a gozar, em seguida a cada viagem, os sábados, domingos e feriados passados em serviço no estrangeiro, acrescidos dum dia de descanso imediatamente antes do início da viagem seguinte; - o facto desses dias de descanso não serem dados a gozar ao trabalhador, implica a obrigação da entidade empregadora lhos remunerar com o acréscimo de 200%; - a Ré não pagava ao Autor as refeições à factura, nem antes da saída para as viagens lhe fazia os adiantamentos previstos na dita cláusula 47ª-A para esse efeito e, em vez disso, pagava-lhe à parte, a título de “Ajudas de Custo” e de “Despesas” um montante variável mensal de cerca de 850 euros; - por isso, o Autor não pedia, não entregava nem guardava as facturas das refeições, devendo essas despesas ser aferidas pelos “respectivos montantes normais”, sendo que as quatro refeições diárias custam, nos vários países da Europa, uma média de € 40, sendo 15 por cada almoço, 15 para o jantar, 5 euros para o pequeno-almoço e 5 para a ceia; - o horário do Autor era de 40 horas semanais, 8 horas por dia útil, de 2ª a 6ª feira, sendo os sábados e domingos os dias de descanso complementar e obrigatório, respectivamente; - por carta registada datada de 18/10/2011, o Autor resolveu o contrato de trabalho com efeitos imediatos, invocando como fundamentos: - não lhe serem pagas as quantias legalmente devidas e relativas ao disposto no nº 7 da cláusula 74ª do CCT; - não lhe ser pago o montante mensal relativo ao Prémio TIR, no montante legal mínimo de € 105,75; - a Ré estar a pagar-lhe o montante mensal a título de quilómetros e diárias, bastante inferior ao que receberia se lhe fossem pagas as quantias correspondentes fixadas na lei; - não lhe serem dados a gozar, à chegada das viagens, os descansos compensatórios correspondentes aos dias de descanso passados nelas, acrescido do mínimo de 24 horas exigidos pela lei; - não lhe serem pagos os montantes relativos à Cláusula 74ª e ao Prémio TIR nos subsídios de férias e de Natal; - e porque a gravidade e reiteração e consequências dos referidos factos o impediam de continuar a trabalhar para a Ré, despediu-se com justa causa.

Por todas estas razões, vem reclamar da Ré o pagamento das quantias que entende serem-lhe devidas, no total de € 126.585,19.

Como a audiência de partes não redundou na sua conciliação, veio a Ré contestar. Por excepção, invocou a ineptidão da petição inicial, por manifesta falta ou deficiência da causa de pedir; a prescrição dos créditos salariais vencidos há mais de cinco anos; e a excepção de abuso de direito na sua formulação de “venire contra factum proprium”.

E por impugnação, alegou não serem devidas ao Autor as quantias que peticiona, pois exerceu, quase exclusivamente, as suas funções em território nacional, efectuando os descansos semanais na sua residência; que o sistema remuneratório em vigor na empresa, e acordado com o Autor, era mais vantajoso para este do que o que decorre do CCT, razão por que recebeu mais € 263,56, sem computar os valores referentes aos meses de Janeiro e Fevereiro de 2007, que irão acrescer àquela quantia.

Efectivamente, se tivesse recebido o que agora reclama, e do modo como reclama, tal montante estaria sujeito aos impostos legais, pelo que, e considerando uma taxa média de IRS de 15%, facilmente se conclui que os valores recebidos seriam drasticamente reduzidos após o pagamento dos impostos.

Por isso, e sendo o acordo válido, a Ré nada mais lhe tem a pagar.

Caso assim não seja entendido, deverá o Autor restituir à Ré todas as quantias que lhe foram entregues pelo sistema de pagamento que foi praticado.

Quanto às despesas com alimentação, a Ré também nada lhe deve, tanto mais que os valores indicados são excessivos.

Quanto ao prémio TIR, não tinha que ser integrado nos subsídios de férias e de Natal.

E quanto à invocada justa causa, não assiste razão ao Autor por não se verificar falta de pagamento de retribuições, pois nunca reclamou do que recebia; além disso, a forma de cálculo é incorrecta.

Por isso, conclui que não estava comprometida a relação laboral, pelo que se deve considerar que houve uma denúncia do contrato de trabalho sem aviso prévio.

Quanto às férias e subsídios de férias de 2010, com referência a 2009 e proporcionais de férias, subsídio de férias do ano da cessação do contrato em 2010, a Ré contactou o Autor, aquando da cessação do contrato, informando-o que tais quantias estavam à sua disposição. No entanto, este nunca mostrou interesse em recebê-las.

Conclui pedindo que: - seja considerada procedente a excepção dilatória da ineptidão da petição inicial por manifesta inexistência de causa de pedir e que, em consequência, seja a Ré absolvida da instância.

Caso assim não se entenda: - seja considerada procedente a excepção peremptória de prescrição dos créditos vencidos há mais de cinco anos, e em consequência seja a Ré absolvida do pedido no que concerne aos valores peticionados relativamente àquele período; - seja considerada procedente a excepção de abuso do direito por os pagamentos da Ré terem sido efectuados em razão do acordo celebrado com o A, nunca posto em causa, e que, em consequência, seja absolvida do pedido; - seja considerado improcedente a justa causa na resolução do contrato invocada pelo A, e que seja a cessação do contrato de trabalho qualificada como denúncia sem aviso prévio; - seja considerado nulo o acordo entre a empresa e o trabalhador no que concerne ao pagamento com base nos quilómetros percorridos, e que seja o Autor condenado na restituição à Ré das quantias referentes às “Ajudas de custo” por si auferidas desde 2007 a Outubro de 2011, no montante de € 43.966,06; - seja considerado procedente o pedido reconvencional e, em consequência, seja o Autor condenado no pagamento da quantia de 1.170,00 euros por falta de cumprimento do prazo de aviso prévio.

O Autor respondeu pugnando pela improcedência das excepções e da reconvenção, invocando que a Ré litiga de má-fé.

Esta respondeu, sustentando que isso não se verifica.

Foi proferido despacho saneador que admitiu o pedido reconvencional, fixou o valor da causa, julgou improcedentes as excepções de ineptidão da petição inicial e da prescrição, tendo ainda fixado os factos assentes e organizado a base instrutória.

Efectuada a audiência de discussão e julgamento, foi proferido despacho a decidir a matéria de facto provada, tendo a Ré requerido que fosse declarada a sua nulidade por o mesmo consubstanciar a prática de um acto que a lei de processo vigente não admite e que, influindo no exame de decisão da causa, integra a sua nulidade, nos termos do artigo 195º, nº 1 do CPC.

O Autor pronunciou-se no sentido do seu indeferimento.

Foi proferida a sentença que desatendendo a arguida nulidade do despacho que fixou a matéria de facto, decidiu a causa nos seguintes termos: “Termos em que, com a fundamentação de facto e de direito exposta, se decide: 1) Condenar a ré a pagar ao autor a quantia de 26 823,35 euros (vinte e seis mil oitocentos e vinte três euros e trinta e cinco cêntimos) referente a valores da cláusula 74ª, nº 7 do CCTV devida no período entre 1-3-2003 e 28-2-2009; 2) Condenar a ré a pagar ao autor a quantia de 6 136,18 euros (seis mil cento e trinta e seis euros e dezoito cêntimos) referente a valores de prémio TIR devido no período entre 1-3-2003 e 28-2-2009; 3) Condenar a ré a pagar ao autor a quantia de 7 288,80 euros (sete mil duzentos e oitenta e oito euros e oitenta cêntimos) referente a valores em dívida dos subsídios de Natal e de férias dos anos de 2003 a 2010; 4) Condenar a ré a pagar ao autor a quantia de 64,60 euros (sessenta e quatro euros e sessenta cêntimos) referente a valores de...

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