Acórdão nº 2733/10.4TBLLE.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Abril de 2015
Magistrado Responsável | SEBASTIÃO PÓVOAS |
Data da Resolução | 14 de Abril de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA e sua mulher BB intentaram acção, com processo ordinário contra CC e sua mulher DD.
Pedem que, por incumprimento imputável aos Réus, seja declarado resolvido o contrato-promessa com eles celebrado com a sua consequente condenação a pagarem-lhes a quantia de 200.000,00 euros (correspondente ao dobro do sinal passado) acrescida de juros moratórios desde a citação.
Subsidiariamente, e para a hipótese deste pedido improceder pedem que seja declarada a condição resolutiva prevista na cláusula 7ª daquele contrato, declarando-se cessados os respectivos efeitos com a consequente condenação dos Réus a restituírem o sinal prestado com juros a contar da citação, até integral pagamento.
Alegaram, nuclearmente, terem celebrado com os Réus um contrato-promessa de compra e venda do imóvel identificado nos autos tendo os Autores entregue, no acto da celebração do contrato-promessa a quantia de 100.000,00 euros, a título de sinal ficando o remanescente do preço (700.000,00 euros) de ser pago no acto da escritura; que esta devia ser outorgada até 30 de Junho de 2008 tendo sido acordado que a outorga ficava dependente de aprovação de crédito bancário aos Autores, sendo que, caso o crédito não fosse concedido após 60 dias do contrato-promessa, este ficava sem efeito devendo ser devolvido tudo o que fosse prestado; que o crédito não foi concedido tendo os Réus sido informados das dificuldades do financiamento; que, entretanto, os Réus venderam o imóvel a terceiros pelo que lhes solicitaram a devolução do sinal, tendo os Autores prescindido do dobro do mesmo; que os Réus nunca devolveram a quantia recebida e, como o prazo da escritura era relativo a sua passagem implicava mora e não resolução; que a venda efectuada pelos Réus traduziu o incumprimento definitivo com culpa.
Os Réus impugnaram os factos tendo alegado que os Autores lhes comunicaram a impossibilidade de compra em Fevereiro de 2009; que, então lhes deram o prazo de 30 dias para outorgarem a escritura, sob pena de considerarem ter havido incumprimento definitivo; que, em Abril de 2009 comunicaram aos Autores o propósito de venda do imóvel o que fizeram em 20 de Abril de 2009.
Deduziram pedido reconvencional pedindo a condenação dos Autores a pagarem-lhes quantia que mutuaram.
Na primeira instância improcederam os pedidos principal e reconvencional.
Ao Autores apelaram para a Relação de Évora que, em procedência do recurso, condenou os Réus a restituírem o sinal em singelo, com juros à taxa legal, a contar da citação e até integral pagamento.
Vêm, agora, os Réus pedir revista, formulando as seguintes conclusões: “1 - O art. 647° n°l do N.C.P.C diz: “A apelação tem efeito meramente devolutivo excepto nos casos seguintes (...)” 2- O art. 676° do N.C.P.C. “O recurso de revista só tem efeito suspensivo em questões sobre o estado de pessoas (...)” 3- Nos presentes autos foi intentada uma acção de processo ordinário contra os ora recorrentes no valor de €200.000,00.
4- Decorridos que foram todos os procedimentos legais desde a apresentação da petição inicial, passando pela contestação, réplica, tréplica, audiência preliminar com factualidade assente, base instrutória, despacho saneador, junção de róis de testemunhas, designação de data de discussão e julgamento com inquirição e produção de toda a prova, resposta à matéria de facto e finalmente a sentença proferida foram os ora recorrentes absolvidos.
5- Acontece que, não se conformando com a sentença proferida decidiram os AA. interpor recuso da mesma e aquando do mesmo o efeito foi obviamente meramente devolutivo nos termos do art. 647° supra referido.
6- Decorridos que são 4 anos após a instauração da acção e dois de terem sido absolvidos da mesma vêm-se os recorrentes, por uma decisão condenatória do Tribunal da Relação de Évora, sujeitos a uma execução com penhora de bens e constas bancárias uma vez que, de acordo com as normas supra referidas, os presentes autos de recurso têm efeito meramente devolutivo.
7- Verifica-se pois que as normas referidas violam o disposto nos artigos 13° n°l da C.R.P na medida em que o mesmo refere que “todos os cidadão têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei”. Ora, o facto de os recorrentes estarem sujeitos a que lhe seja instaurada uma acção de execução com penhora de bens e constas viola o princípio de igualdade perante a lei uma vez que, foram absolvidos na primeira instância e em sede de recurso condenados.
8- O princípio da igualdade impõe a igualdade na aplicação do direito e garante aos cidadãos a devida protecção perante a lei.
9- Por outro lado, verifica-se violação do art. 18° n°3 da C.R.P uma vez que, vem restringir as suas liberdades e garantias com efeitos retroactivos.
10- Isto é, os recorrentes foram absolvidos em primeira instância e com esta alteração de decisão ficam sujeitos a uma execução com penhoras a qual vem restringir direitos, liberdades e garantias com efeitos retroactivos nitidamente contrário ao expresso na C.R.P.
11- Acresce que, também, se verifica violação do art. 20° n°4 da C.R.P no sentido de não existir um processo equitativo relativamente aos recorrentes quanto à decisão e à execução da mesma uma vez que, todo o processo desde o momento de impulso da acção até ao momento da execução deve ser regulado pelo princípio da equitatividade através da exigência do processo equitativo.
12- Ora, neste caso e noutros semelhantes em que a sentença da primeira instância se trata de uma sentença absolutória e quando posteriormente o acórdão do Tribunal da Relação é condenatório deverá o recurso de revista, obrigatoriamente ter efeito suspensivo.
13- De outra forma, verifica-se violação grave de direitos constitucionalmente consagrados nos artigos 13° nº2, 18° n°3 e 20° n°4, devendo os artigos 647° e 676° do N.C.PC ser declarados inconstitucionais por violação dos artigos atrás referidos.
14- Dos factos, resulta claro que a escritura seria celebrada até 30.06.08, sendo o contrato promessa de 27.02.08, sendo que a celebração dependia da concessão de financiamento bancário aos AA, que tinha de estar garantido até 27.04.08 (60 dias).
15- Este financiamento não foi feito, ou seja, os AA não o obtiveram junto do ..., que foi a única circunstância que provaram.
16- Assim sendo, vigoraria a 2ª parte da cláusula 7ª, ou seja, acordaram as partes em que, após 27.04.08, ficaria o contrato sem efeito.
17- Apesar disso, ou mesmo assim, o contrato poderia se celebrado até 30.06.08, ou nos 30 dias posteriores, sendo inequívoco do contrato que as partes pretenderam estipular este como o prazo final, peremptório, para a celebração do contrato.
18- Nenhum destes prazos foi cumprido.
19- Como se disse, da interpretação desta cláusula 6ª resulta que, inequivocamente, o prazo fixado em benefício dos AA teria o seu termo final e absoluto até 30.07.08, sendo que aqui, ao contrário do que dizem os AA, não parece que o contrato deixe qualquer margem para dúvidas.
20- Mais do que isto, provou-se que os RR foram informados da impossibilidade dos AA em obter o crédito bancário (M), sendo que os AA lho comunicaram em Fevereiro de 2009 (T) e em Outubro de 2009 os AA informam os RR de que nessa data souberam da venda a terceiros do imóvel (N). Venda essa que se provou ter sido feita em 20.04.09 (S).
21- Não se percebe como pretendem os AA a devolução do sinal pago, uma vez que a esta devolução só estavam os RR obrigados até 27.04.08, sendo que, depois disso, o que resulta do contrato é que os RR tinham a faculdade de aceitar um cumprimento posterior, se quisessem e até 30.07.08 (ainda que sob condição da cláusula 11ª), uma vez que se vincularam a esperar apenas, obrigatoriamente até àquela data e não mais.
22- Os AA só comunicaram, fosse o que fosse, aos RR em Fevereiro de 2009, quando sabiam que, após 27.04.08, estariam verdadeiramente em mora, e em incumprimento a partir de 30.07.08 perdendo o sinal prestado, conforme resulta da cláusula 14ª, 2ª parte do mesmo contrato.
Porém, 23- Não se conformam os RR. com a decisão/interpretação do acórdão de que ora se recorre.
24- A decisão do acórdão ora recorrido vem assente na factualidade dos promitentes vendedores terem alegado que, em Fevereiro de 2009, concederam aos promitentes-compradores o prazo de trinta dias para cumprirem o contrato promessa.
25- Porém, ao terem os RR em Fevereiro de 2009, dado aos promitentes-compradores, prazo de 30 dias para o cumprimento do contrato promessa de compra e venda, com a expressa advertência de se considerar a obrigação como definitivamente incumprida caso não fosse cumprido o prazo, não poderá consubstanciar motivo para a restituição de tudo o que lhes foi prestado.
26- Isto porque, os promitentes-compradores já se encontravam em mora, e consequentemente, em incumprimento desde 27.04.2008, tendo ficado estipulado no contrato que os RR poderiam aceitar ou não um cumprimento posterior nomeadamente, até 30.07.2008.
27- O que se verifica efectivamente é que existiu a estipulação de um prazo certo para o cumprimento da obrigação (27.04.08) e a posteriori a concessão de um prazo facultativo (30.07.08 e Março de 2009) para o cumprimento da mesma obrigação.
28- Porém, na data de 27.04.2008 os AA. não interpelaram os RR. para a devolução do respectivo sinal pelo não cumprimento do contrato de acordo com a segunda parte da cláusula 7ª do mesmo.
29- Naquela data, as...
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