Acórdão nº 294/2002.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Abril de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA SOTTOMAYOR
Data da Resolução14 de Abril de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório AA, em representação de sua filha menor, BB, intentou contra Seguros CC, a presente acção declarativa sob a forma ordinária, pedindo que seja a Ré condenada a reconhecer que se verificou o evento do qual emerge a obrigação de pagamento do capital seguro no montante de € 39.903,93 e, consequentemente, condenada a liquidar esse valor.

Cumulativamente peticiona ainda que a Ré seja condenada a pagar à Autora o remanescente do capital em dívida à data da morte do segurado, no montante de € 497,18.

Requereu ainda a intervenção principal provocada do Banco DD portugal, SA.

A Ré contestou nos termos de fls. 46 e segs., concluindo pela improcedência da acção.

Foi admitido o chamamento do Banco DD, SA, que fez seu o articulado da Autora.

A Autora apresentou réplica conforme fls. 86 e segs., concluindo como na petição inicial.

Após subsequente tramitação dos autos e realizada a audiência de julgamento, o Tribunal respondeu à matéria de facto pela forma constante de fls. 602/604, que não foi objecto de reclamação.

Foi, em seguida, proferida a sentença de fls. 610 e segs., que julgando a acção totalmente procedente, decidiu: «1 – Condenar a Ré CC a pagar ao Banco DD SA, a quantia de € 39.406,65, relativamente ao capital em dívida do empréstimo contraído pelo segurado EE, à data da sua morte, acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, calculados sobre o referido capital, à taxa legal, desde a data da citação, até efectivo e integral pagamento.

2 – Condenar a Ré CC a pagar à A. BB, aqui representada pela sua progenitora, AA, a quantia de € 497,18, correspondente ao valor remanescente do total do capital seguro (€ 39.903,93), acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, calculados sobre o referido valor, à taxa legal, desde a data da citação, até efectivo e integral pagamento.» Inconformada, apelou a Ré Seguros CC, tendo os Juízes da Relação de Évora acordado em julgar improcedente a apelação e, consequentemente, em confirmar a sentença recorrida.

Novamente inconformada, a Seguradora interpõe recurso de revista, em que formula as seguintes conclusões: «i. O presente recurso vem interposto do douto Acórdão proferido a fls. … que decidiu julgar improcedente o recurso de apelação interposto pela Recorrente da sentença proferida nos autos que correu termos no Tribunal Judicial de Almeirim, sob o nº de processo 294/2002.

ii. É fundamento do presente recurso a verificação do pressuposto referido na alínea c) do artigo 672º, n.º 1 do Código de Processo Civil.

iii. O douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora está, salvo douto entendimento diverso, em contradição com o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no âmbito do processo n.º 24/10.0TBVNG.P1.S1, cuja cópia se junta, (e que pode ser consultado in http://www.dgsi.pt/JSTJ.NSF/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/ed910c0a215dbe5380257b9e004648b5?OpenDocument).

iv. O Acórdão recorrido entendeu que incumbia, pois, à seguradora recorrente o dever de comunicação e esclarecimento das cláusulas contratuais gerais e em especial da cláusula em causa constante do ponto 6.1, sendo que não resulta da matéria de facto provada que tenham sido comunicadas ao segurado EE todas as cláusulas contratuais gerais que faziam parte integrante do contrato de seguro e em especial aquela que a recorrente invocou para recusar a sua obrigação contratual.

O Acórdão-fundamento proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça de 17 de Junho de 2010 no processo n.º 24/10.0TBETR.P1.S1, já transitado em julgado, julgou em sentido diverso, fundamentando que, não está vedado à seguradora opor ao aderente certa cláusula de exclusão de risco, por a omissão do dever de informação e esclarecimento ser exclusivamente imputável ao tomador de seguro, não se comunicando ou transmitindo os efeitos de tal omissão culposa à própria seguradora, em termos de amputar o contrato da cláusula não devidamente informada ao aderente.

v. O Acórdão recorrido e o Acórdão contraditório foram proferidos no âmbito da mesma legislação, aplicando-se in casu o Decreto-lei n.º 446/85, de 25 de Outubro e o Decreto-Lei 176/95, de 26 de Julho.

vi. Ambos os acórdãos são idênticos no que se refere ao caso apreciado e julgado versando sobre a mesma questão fundamental de direito, mais concretamente, sobre quem recai o ónus de comunicação das cláusulas contratuais do contrato de seguro de vida (Tomador de Seguro ou Seguradora) e vinculação (ou não) da Seguradora pela inobservância dos deveres de comunicação e informação das cláusulas contratuais gerais.

vii. Na análise da jurisprudência proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça não foi identificado qualquer Acórdão de Uniformização de Jurisprudência que verse sobre a questão em causa.

viii. Perante o estrito cumprimento por parte da Recorrente dos requisitos da alínea c) do n.º 1 e do n.º 2 do 672º do C.P.C., deverá ser admitida a a revista excepcional remetendo-se os autos à distribuição.

ix. No douto Acórdão em revista, na parte que ao presente recurso interessa, considerou-se: o dever de comunicação assentando também no princípio da boa fé negocial já referido, constitui igualmente dever que incumbe a quem pretenda prevalecer-se dessa mesma cláusula contratual geral, pelo que não podia deixar de concordar-se com a sentença recorrida quando pondera que in casu, quem pretende fazer valer a cláusula de obrigação de comunicação de mudança de profissão, em caso de agravamento dos riscos é, indubitavelmente a seguradora ora recorrente, na medida em que desse agravamento pode resultar a necessidade de impor outras condições contratuais, tais como o agravamento do prémio, sucedendo o mesmo com as demais cláusulas gerais ínsitas naquele contrato de seguro; Não obstante, entendeu o douto Acórdão que incumbia, pois, à seguradora recorrente o dever de comunicação e esclarecimento das cláusulas contratuais gerais e em especial da cláusula em causa constante do ponto 6.1, sendo que não resulta da matéria de facto provada que tenham sido comunicadas ao segurado EE todas as cláusulas contratuais gerais que faziam parte integrante do contrato de seguro e em especial aquela que a recorrente invocou para recusar a sua obrigação contratual.

Ora, x. Os aspectos de identidade entre os dois Acórdãos agora em análise, mais concretamente o Acórdão recorrido proferido pelo Tribunal da Relação de Évora e o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça no âmbito do processo n.º 24/10.0TBVNG.P1.S1, datado de 25.06.2013, são os que infra se identificam e conforme melhor se poderá constatar pela análise integral dos mesmos: i. Tipologia do contrato de seguro associado a um crédito à habitação; ii. Causa do sinistro especificamente excluída dos riscos cobertos pelas Condições Gerais do Contrato de Seguro; iii. Não cumprimento do dever de comunicação e informação das cláusulas contratuais gerais; iv. Discussão sobre a identidade da entidade a quem compete a comunicação e informação de tais cláusulas e v. Eliminação do contrato de seguro da cláusula de exclusão.

xi. No Acórdão posto agora em crise estamos perante uma acção instaurada pelos Autores, ao abrigo de um contrato de seguro grupo vida que garantia o pagamento das importâncias devidas pelo Segurado em caso, nomeadamente, de morte.

xii. O segurado, falecido marido da Autora, faleceu quando se encontrava no exercício da sua profissão de auxiliar de desmontagem de estruturas, sendo que o Banco havia informado a Seguradora que o segurado era “operador de máquinas de jardinagem”.

xiii. Nos termos do disposto na cláusula 6.1.1 das Condições Gerais da Apólice de seguro o tomador de seguro obriga-se a comunicar à Seguradora as alterações que se produzem no grupo seguro e que consistam na mudança de profissão do segurado ou na prática de qualquer actividade que provoque alteração de alguma circunstância essencial e que tenha como consequência um agravamento dos riscos cobertos pela apólice.

Porém, xiv. Não se provou no acórdão ora posto em crise que tenham sido comunicadas ao segurado EE todas as cláusulas contratuais gerais que faziam parte integrante do contrato, pelo que considerou não poder a Ré Seguradora invocar o conteúdo da respectiva cláusula para se eximir ao pagamento da indemnização.

Por sua vez, xv. No douto Acórdão-fundamento proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Junho de 2013 no processo n.º 24/10.0TBVNG.P1.S1, já transitado em julgado, estamos, igualmente, perante uma acção instaurada contra a Companhia de Seguros pedindo que fosse condenada a indemnizar os AA. nos termos contratuais, nomeadamente entregando à Instituição de Crédito beneficiária do seguro, o capital em divida e ao segurado o remanescente se o houver, ao abrigo de dois contratos de seguro de vida que garantiam a cobertura dos riscos por morte e invalidez total e permanente por doença ou acidente dos segurados.

xvi. Nem antes nem aquando da subscrição do seguro, o Autor foi informado das condições gerais do produto subscrito e dos riscos excluídos.

xvii. O sinistro encontrava-se abrangido pela cobertura da apólice em virtude da exclusão do contrato da cláusula que o afastava, mantendo-se o contrato válido e eficaz na parte não afectada, como consequência do incumprimento do dever de comunicação dessa cláusula ao Autor-aderente.

xviii. Eis a pergunta que se colocava no Acórdão-fundamento: “A questão debatida no presente recurso tem, pois, a ver com a definição das consequências jurídicas a atribuir ao incumprimento do dever de informação e esclarecimento aos aderentes do teor da referida cláusula de exclusão do risco, no caso de a causa de incapacidade do segurado ser – como foi no caso dos autos - devida a doença do foro neurológico – identificando qual o sujeito sobre que incidia tal obrigação de esclarecimento e determinando se o respectivo incumprimento é susceptível de se repercutir na esfera jurídica do outro contraente, apesar de sobre ele não incidir uma obrigação de explicitação e...

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