Acórdão nº 1259/14.1T8VFR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelMANUEL AUGUSTO DE MATOS
Data da Resolução04 de Novembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – RELATÓRIO 1.

Em processo comum com intervenção do Tribunal Colectivo da Instância central Criminal de Santa Maria da Feira – Juiz 1, em que é arguido AA, com os sinais dos autos, actualmente detido no Estabelecimento Prisional do Porto, foi proferido acórdão, em 19 de Março de 2015, onde se decidiu: «

  1. Proceder aos seguintes cúmulos jurídicos das penas parcelares em que o arguido AA, foi condenado nos seguintes processos: 1.º cúmulo: considerando as penas parcelares aplicadas nos processos, proc. n.º 336/08.2PAESP, proc. n.º 110/09.9PAESP e proc. n.º 1411/08.9PAESP, condena-se o arguido na pena unitária de 420 (quatrocentos e vinte) dias de multa, à taxa diária de €5,00 (cinco euros), no total de €2.100,00 (dois mil e cem euros); 2° cúmulo: considerando as penas parcelares aplicadas nos processos, proc. n.º 852/07.3PAESP; proc. n.º 1240/07.7PAESP; proc. n.º 58/08.4PAESP; proc. n.º 885/08.2GAVFR, proc. n.º 627/09.5PAESP, condena-se o arguido na pena unitária de 8 (oito) anos de prisão efectiva; 3.° cúmulo: considerando as penas parcelares aplicadas nos processos, proc. n.º 78/10.9GCOVR; proc. n.º 50/10.9GAVFR; proc. n.º 811/10.9GAVFR; proc. n.º 574/10.8PAESP, condena-se o arguido na pena unitária de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão efectiva; 4.° cúmulo: considerando as penas parcelares aplicadas nos processos, proc. n.º 651/10.5PAESP, proc. n.º 56/10.8PEVNG, proc. n.º 761/10.9PAESP, proc. n.º 966/10.2PAESP e proc. n.º 1218/09.6PAESP, condenou o arguido na pena unitária de 7 (sete) anos e 8 (oito) meses de prisão efectiva.

  2. Determina-se o cumprimento sucessivo das penas supra correspondentes ao 2.°,3.° e 4.° cúmulo, referidos em A).» 2.

Deste acórdão recorreu o arguido directamente para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando as conclusões que se transcrevem: «CONCLUSÕES I - Vem o presente recurso interposto do despacho de fls. … dos autos, que condenou o arguido AA, em cúmulo jurídico, a uma quatro penas única de: 420 dias de multa à taxa diária de €5,00, no total de €. 2.100,00; 8 anos de prisão efectiva; 2 anos e a meses de prisão efectiva; 7 anos e 8 meses de prisão efectiva; a cumprir sucessivamente.

II - Ao decidir como decidiu, aplicando ao arguido a pena que aplicou, o tribunal a quo não observou os princípios plasmados nos artigos 77°, 78° e 79° nº 1 do Código Penal Português.

Isto é, não teve em linha de conta que a formulação do cúmulo jurídico de penas não se reconduz "a meras operações aritméticas, impondo-se a consideração, em conjunto, dos factos e da personalidade do arguido".

Isto significa que o apuro da operação de cúmulo jurídico só se assegura e atinge tom a ponderação e valorização fundamentadas do que, em geral, propiciem os factos que estejam em apreço e a personalidade de quem os praticou.

O tribunal a quo deveria ter-se servido de todos os instrumentos que a lei fornece e que se destinam a auxiliar o tribunal julgador no conhecimento, tanto quanto possível, aprofundado da personalidade do agente.

Como seja o disposto no artigo 370°, nº 1 e nº 2 do Código de Processo Penal. O que, no caso em apreço, não aconteceu.

Temos então que concluir que não é possível avalizar devidamente uma decisão de cúmulo jurídico, mesmo que duvidas não hajam quanto aos cálculos feitos e ao acerto das regras utilizadas, sem que se definida, como complemento daqueles cálculos e regras, a consideração conjunta dos factos e da personalidade do agente, vertente decisiva para a determinação concreta da pena (conjunta) a aplicar.

Pelo que, tal e tanto implica a anulação da decisão ora recorrida, devendo ordenar-se a realização da audiência para reformulação de cúmulo jurídico das penas, com observância das disposições ínsitas nos artigos 471.° e 472.º do Código de Processo Penal e artigos 77.°, 78.° e 79.º do Código Penal, ex vi dos artigos 40.º, n.º 1, 2 e 3e 71.°, n.º 1, 2 e 3 daquele mesmo diploma normativo, que foram violados.

III - Ao decidir como decidiu, o tribunal "a quo”, aplicando ao recorrente as penas que aplicou, atentas as circunstâncias já descritas, não valorou como deveria ter valorado as atenuantes derivadas do que vertido vai, aplicando penas que se mostram mais do que excessivas, pelo que violou os normativos do artigo 40.º, n.º1, 2, e 3 e 71.°, n.º 1, 2, e 3, todos do Código Penal Português.

IV - Mostra-se assim, ferido de nulidade o douto acórdão ora recorrido por falta de fundamentação no que diz respeito à análise da personalidade do recorrente.

V - Atenta o grau de ilicitude dos factos praticados pelo arguido, a idade do arguido à data da prática dos factos, a ausência de consequências físicas para os ofendidos derivadas dos factos praticados pelos mesmo, o facto de o arguido ter estado envolvido na problemática da toxicodependência, de os factos terem decorrido num espaço temporal muito definido (entre maio de 2007 e Outubro de 2010). Atento o facto de o arguido, ora recorrente, estar bem integrado familiarmente, ter um bom percurso no Estabelecimento Prisional onde se encontra em reclusão e atento o facto do tempo de prisão já cumprido pelo mesmo, considera-se que ao mesmo nunca deveria ser aplicada penas tão gravosas como as que aqui estão em causa VI - Considera o arguido, ora recorrente, que não deveria ter sido englobado no 1.º cúmulo jurídico as penas aplicadas nos processos 336/08.2PAESP (100 dias de multa, à taxa diária de 5,00€) e 110/099.9PAESP (260 dias de multa, à taxa diária de 5,00€); E considera-se isto porque, foi julgada extinta pelo cumprimento a pena de prisão aplicada ao arguido ora recorrente, no processos aqui referenciados, não devendo, por isso, englobar-se no cúmulo jurídico aqui em questão, nos termos do disposto no artigo 57.°, n.º 1 do Código Penal.

Tudo conforme se expõe devidamente a fls ... do douto acórdão de que se recorre.

VII - Considera ainda o arguido, ora recorrente, que não deveria ter sido englobado no 3.º cúmulo jurídico as penas aplicadas nos processos 78/10.9GCOVR (1 ano de prisão suspensa por igual período, tendo posteriormente a suspensão sido revogada) e 50/10.9GAVFR (1 ano de prisão); E considera-se isto porque, quanto à pena aplicada no processo n.º 78/10.9GCOVR, 1 ano de prisão suspensa por igual período, esta foi, posteriormente revogada e cumprida, tendo sido, declarada extinta pelo cumprimento; Quanto à pena aplicada no processo n.º 50/10.9GAVFR, 1 ano de prisão, a mesma foi extinta pelo cumprimento.

Tudo conforme se expõe devidamente a fls ... do douto acórdão de que se recorre.

IX - O arguido, ora recorrente, considera que deverão ser englobadas as penas de prisão que foram suspensas na sua execução, dos processos n.º 665/08.5GCOVR, 262/09.8PAESP e 333/09.0PAESP, e que, até à elaboração do presente acórdão de que se recorre, ainda nenhuma decisão existia quanto à sua extinção ou à sua revogação.

Acontece que, se tal não for apurado e englobado no cúmulo jurídico a efectuar ao arguido, ora recorrente, a sua situação jurídica nunca mais se toma estável e definitiva e, este cúmulo jurídico, à posteriori, corria o risco de não produzir os seus efeitos. Assim, tais penas deverão ser englobadas e ser elaborado um cúmulo jurídico, com uma pena única e definitiva, a ser aplicada ao arguido, ora recorrente.» 3.

O Ministério Público junto da 1.ª instância, notificado do despacho de admissão de recurso a fls. 667, não apresentou resposta ao recurso apresentado.

4.

Neste Supremo Tribunal de Justiça, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta, emitiu o douto parecer, nos termos que melhor constam de fls. 697 a 728, pugnando no sentido de que não devem ser cumuladas penas de prisão suspensas na sua execução, atenta a sua natureza de pena de substituição enquanto não se encontre revogada a respectiva suspensão, por decisão transitada em julgado e no sentido de serem reformulados os cúmulos efectuados em três cúmulos de penas cujos processos identifica.

  1. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, o arguido nada disse.

  2. Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    II – FUNDAMENTAÇÃO 1. A competência do Supremo Tribunal de Justiça para apreciar o presente recurso A competência do Supremo Tribunal de Justiça para apreciar, directamente, em sede de recurso as decisões proferidas em 1.ª instância, tem como pressupostos serem condenatórias em prisão, emitidas por tribunal colectivo ou de júri, visarem o reexame exclusivamente de matéria de direito e a medida da pena efectivamente imposta exceder 5 anos de prisão, como se especifica nos artigos 432.º, n.º 1, alínea c), e 434.º, do Código de Processo Penal, doravante CPP.

    Por isso, não cabe recurso directo da decisão que condene em pena de multa, de decisão absolutória, de decisão condenatória em pena em pena de prisão de duração inferior a 5 anos.

    No presente processo, o tribunal a quo proferiu acórdão em que procedeu aos cúmulos jurídicos das penas parcelares aplicadas ao agora recorrente, a seguir indicadas, condenando-o nas seguintes penas unitárias: 1.º cúmulo: considerando as penas parcelares aplicadas nos processos, n.º 336/08.2PAESP, n.º 110/09.9PAESP e n.º 1411/08.9PAESP, condenou o arguido na pena unitária de 420 (quatrocentos e vinte) dias de multa, à taxa diária de €5,00 (cinco euros), no total de €2.100,00 (dois mil e cem euros).

    1. cúmulo: considerando as penas parcelares aplicadas nos processos: n.º 852/07.3PAESP; n.º 1240/07.7PAESP; n.º 58/08.4PAESP; n.º 885/08.2GAVFR, e n.º 627/09.5PAESP, condenou o arguido na pena unitária de 8 (oito) anos de prisão efectiva; 3.° cúmulo: considerando as penas parcelares aplicadas nos processos: n.º 78/10.9GCOVR; n.º 50/10.9GAVFR; n.º 811/10.9GAVFR; n.º 574/10.8PAESP, condenou o arguido na pena unitária de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão efectiva; 4.° cúmulo: considerando as penas parcelares aplicadas nos processos: n.º 651/10.5PAESP; n.º 56/10.8PEVNG; n.º 761/10.9PAESP; n.º 966/10.2PAESP e n.º 1218/09.6PAESP, condenou o arguido na pena unitária de 7 (sete) anos e 8 (oito) meses de...

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