Acórdão nº 1826/08.2TABRG.G2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelJOÃO SILVA MIGUEL
Data da Resolução12 de Novembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência na 3.ª secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1. Nos autos de processo comum coletivo n.º 1826/08.2TABRG, que correram termos na Vara de Competência Mista de Braga, foi proferida decisão em 28 de fevereiro de 2014, nos termos da qual foi deliberado, quanto à parte crime[1]: «A) Condenar o arguido AA, como autor material, de um crime de infração de regras de construção p. e p. pelo art. 277.º, n.º 1 al. a) e n.º 3, agravado pelo resultado morte nos termos do art. 285.º, ambos do Código Penal, por referência ao art. 11.º, n.º 1 al. f) do DL n.º 273/2003, de 29 de Outubro e art. 67.º do DL 41 821 de 11.8.1958, na pena de 2 (dois) anos de prisão, que se suspende na sua execução, por igual período, com a condição de pagar, por conta da indemnização fixada pelo dano morte aos demandantes e no prazo máximo fixado para a suspensão da pena, 25.000,00 Eur. (vinte e cinco mil euros), a dividir equitativamente por todos os demandantes; B) Condenar o arguido BB, como autor material, de um crime de infração de regras de construção p. e p. pelo art. 277.º, n.º 1 al. a) e n.º 3, agravado pelo resultado morte nos termos do art. 285.º, ambos do Código Penal, por referência ao art. 11.º, n.º 1 al. f) do DL n.º 273/2003, de 29 de Outubro e art. 67.º do DL 41 821 de 11.8.1958, na pena de 2 (dois) anos de prisão, que se suspende na sua execução, por igual período, com a condição de pagar, por conta da indemnização fixada pelo dano morte aos demandantes e no prazo máximo fixado para a suspensão da pena, 25.000,00 Eur. (vinte e cinco mil euros), a dividir equitativamente por todos os demandantes; C) Condenar a sociedade “BB & Filhos, Lda.”, como autora de um crime de infração de regras de construção p. e p. pelo art. 277.º, n.º 1 al. a) e n.º 3, agravado pelo resultado morte nos termos do art. 285.º e 11.º, todos do Código Penal, por referência ao art. 11.º, n.º 1 al. f) do DL n.º 273/2003, de 29 de Outubro e art. 67.º do DL 41 821 de 11.8.1958, com a pena concreta de 300 (trezentos) dias de multa, à razão de 10,00 Eur. (dez euros), no total de 3.000,00 Eur. (três mil euros).» E quanto à parte cível: «D) Julgar parcialmente procedentes os pedidos de indemnização cíveis formulados, a fls. 849 ss, pelos demandantes CC, DD e EE, condenando todos os arguidos, solidariamente, no pagamento, de: i) € 26.666,67, € 25.000,00 num total de € 51.666,67 (cinquenta e um mil seiscentos e sessenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos), à ofendida CC; ii) € 26.666,67, € 25.000,00, num total de € 51.666,67 (cinquenta e um mil seiscentos e sessenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos), ao ofendido EE; iii) € 26.666,67, € 25.000,00 num total de € 51.666,67 (cinquenta e um mil seiscentos e sessenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos), ao ofendido DD; iv) € 123.736,10 (cento e vinte e três mil setecentos e trinta e seis euros e dez cêntimos), para os três, e ao qual terá de ser abatido o valor já recebido da seguradora “Axa”; Tudo acrescido de juros de mora contados à taxa legal, desde o trânsito em julgado da presente decisão, até efetivo e integral pagamento.

  1. Julgar procedentes os pedidos de indemnização cíveis formulados, a fls. 881 ss, pelas demandantes FF, GG e HH (considerando o principio da limitação do pedido), condenando todos os arguidos, solidariamente, no pagamento, de: i) € 16.666,67, € 25.000,00 num total de € 41.666,67 (quarenta e um mil, seiscentos e sessenta e seis euros e sessenta e sete cêntimos), à ofendida FF; ii) € 16.666,67, € 20.000,00 num total de € 36.666,67 (trinta e seis mil, seiscentos e sessenta e seus euros e sessenta e sete cêntimos), à ofendida GG; iii) € 16.666,67, € 20.000,00 num total de € 36.666,67 (trinta e seis mil, seiscentos e sessenta e seus euros e sessenta e sete cêntimos), à ofendida HH; Tudo acrescido de juros de mora contados à taxa legal, desde o trânsito em julgado da presente decisão, até efetivo e integral pagamento.

  2. Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização cível formulado, a fls. 951 ss, pela demandante II, condenando todos os arguidos, solidariamente, no pagamento, de € 80.000,00 € 25.000,00 e € 88.585,75 num total de € 193.585,75 (cento e noventa e três mil quinhentos e oitenta e cinco euros e setenta e cinco cêntimos), à ofendida II, sendo que ao valor de € 88.585,75 terá de ser abatido o valor já recebido da seguradora “Axa”; Tudo acrescido de juros de mora contados à taxa legal, desde o trânsito em julgado da presente decisão, até efetivo e integral pagamento.» 2. Inconformados com o decidido, dele recorreram os três condenados para o Tribunal da Relação de Guimarães, vindo, a final, a ser proferido acórdão, em 17 de novembro de 2014, nos termos do qual e em parcial procedência do recurso, os arguidos pessoas singulares viram a decisão impugnada ser alterada, apenas no segmento referente à condição imposta para a suspensão da execução das penas, sendo, quanto ao mais, confirmada a decisão recorrida, nos termos seguintes: «Condena-se o arguido AA, como autor material, de um crime de infração de regras de construção p. e p. pelo art. 277.º, n.º 1 al. a) e n.º 3, agravado pelo resultado morte nos termos do art. 285.º, ambos do Código Penal, por referência ao art. 11.º, n.º 1 al. f) do DL n.º 273/2003, de 29 de Outubro e art. 67.º do DL 41 821 de 11.8.1958, na pena de 2 (dois) anos de prisão, que se suspende na sua execução, por igual período Condena-se o arguido BB, como autor material, de um crime de infração de regras de construção p. e p. pelo art. 277.º, n.º 1 al. a) e n.º 3, agravado pelo resultado morte nos termos do art. 285.º, ambos do Código Penal, por referência ao art. 11.º, n.º 1 al. f) do DL n.º 273/2003, de 29 de Outubro e art. 67.º do DL 41 821 de 11.8.1958, na pena de 2 (dois) anos de prisão, que se suspende na sua execução, por igual período.

Na parte restante confirma-se a decisão recorrida.» 3. Para além de outras incidências processuais sobre este acórdão que não releva destacar atento o objeto da impugnação, dele foi interposto recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, por BB & Filhos, Lda e BB, «quanto às injustas indemnizações» em que foram condenados, os quais concluem a sua impugnação como segue: «1. O presente recurso visa essencialmente a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Guimarães, no acórdão que proferiu, em 27 de Janeiro de 2015, em sede de pedido de indemnização cível, com o fundamento fulcral de as Demandantes terem peticionado duas vezes o mesmo dano patrimonial: na ação laboral e no presente processo-crime.

  1. Constituindo, assim, o duplo ressarcimento pelo mesmo dano um enriquecimento sem causa.

  2. E não se diga, como o fez o acórdão recorrido, que se não pode atender à indemnização que já receberam em sede laboral, e que ainda se encontram a receber, com base na sentença proferida no Tribunal de Trabalho de Braga e de Viana do Castelo.

  3. E isto porque já há decisões transitadas em julgado, nesse sentido; tendo a Seguradora pago já as indemnizações ai arbitradas, e as Demandantes recebem também pensões de sobrevivência pela Segurança Social.

  4. De salientar, de igual modo, porque tem manifesto interesse nesta sede, que esse próprio Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão proferido no processo n.º 908/08.5TTBRG.G1.S1, 4ª Secção, transitado em julgado, 6. Decidiu no sentido de que: “não foi feita prova de que o facto praticado pelo agente - in casu o corte e a retirada das terras; a não adoção de medidas de contenção da parede; a falta de entivação da frente escada - em termos de fenomenologia deu origem ao dano e de que está pois por demonstrar se a conduta da Ré foi condição sem a qual o dano não se teria verificado e se foi adequada ao resultado, isto é se produziu a causa de onde resultou o dano”.

  5. O que significa, além do mais, que o acórdão de que se recorre adotou, sem qualquer justificação plausível um padrão completamente oposto ao exigido em processo penal contentando-se, de forma inusitada, com uma fraca exigência de prova e verificação dos fatos em sede criminal, onde a exigência de prova é muito mais forte. 8. Tudo isto com violação do disposto no Art. 127.º do Cód. Proc. Penal no sentido de que a convicção do tribunal não foi motivada e apreensível, não teve uma fundamentação racional e lógica, antes se revelando arbitrária, 9. Ou seja, em perfeito desacordo com as regras da experiência comum distanciando-se totalmente da realidade relacionada com a construção civil e suas legis artis.

  6. Para tal confronte-se também o n.º2 do Art. 410.º do Cód. Proc. Penal, que permite o presente recurso de revista para esse Supremo Tribunal de Justiça e que o liga, umbilicalmente, à finalidade processual penal de realização da Justiça e de obtenção da verdade material.

  7. Sendo de concluir, de igual modo, por um erro notório na apreciação da prova, com injustificadas consequências em sede indemnizatória que nunca teria lugar face à absolvição dos aqui Recorrentes, o que se impõe.

  8. E já que, como supra se alegou, no acórdão recorrido se faz referência à fenomenologia é momento de salientai o ensinamento do Professor José Faria e Costa, in “Noções Fundamentais de Direito Penal": "O intérprete do Direito busca o sentido na pré-compreensão que o caso lhe sugere e mediatiza-o pela norma que não é só texto gramatical, mas antes unidade que cristaliza valores e que fenomelogicamente se expõe como um dos modos de ser do direito.” 13. “Acrescentando que a interpretação que assim se pressupõe tem de ter um enquadramento em uma solução justa”.

  9. E a interpretação feita pelo Tribunal da Relação do constante do citado Art. 127.º do Cód. Proc. Penal leva ao afastamento da verdade material através de erro notório na apreciação da prova e vai ao arrepio de toda esta clara e fundada posição que o aqui Recorrente defende.

  10. Pelo que deve a decisão recorrida ser revogada, nesta sede, absolvendo-se os aqui Recorrentes, nessa conformidade.

  11. Sem prescindir se dirá que, a...

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