Acórdão nº 480/11.9TBMCN.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Novembro de 2015

Magistrado ResponsávelJOSÉ RAINHO
Data da Resolução17 de Novembro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Tribunal recorrido: Tribunal da Relação do Porto + Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção): I - RELATÓRIO AA e mulher BB demandaram, pelo Tribunal Judicial de ... e em autos de ação declarativa na forma ordinária, CC, Lda. (doravante 1ª Ré) e DD, S.A.

, peticionando, no exercício do direito de preferência que alegaram assistir-lhes nos termos do 28.º do Regime do Arrendamento Rural, aprovado pelo DL n.º 385/88, de 25/10, que se proferisse sentença que os substituísse à 1ª Ré na compra e venda que indicam, e que se ordenasse o cancelamento da inscrição lavrada no seguimento da compra e venda a que se reportam.

Alegaram para o efeito, muito em síntese, que eram arrendatários rurais de parte do prédio misto sito em ..., freguesia de ..., concelho de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob a ficha número ... da referida da freguesia, e inscrito nas matrizes prediais urbanas sob os artigos números 65, 66, 68, 69 e 70, e nas matrizes prediais rústicas sob os artigos números 256 e 791. Sucede que tal prédio veio a ser vendido pela 2ª Ré à 1ª Ré, porém sem que aos Autores tenha sido oferecida a possibilidade de exercerem o seu direito de preferência, e daqui que pretendem agora por via judicial substituir-se à compradora na dita compra e venda, mediante o oportuno pagamento do correspetivo preço (€2.500.000,00).

Contestaram as Rés, concluindo, com argumentos vários, pela improcedência do pedido.

A título subsidiário, para o caso da ação proceder, a 1ª Ré mais deduziu reconvenção, peticionando a condenação dos Autores no pagamento da quantia de € 1.376.977,16, acrescido de juros de mora desde a data da notificação da contestação, bem como no pagamento da quantia que se viesse a liquidar a título de indemnização a pagar aos trabalhadores contratados para trabalhar no prédio objeto da preferência.

Alegou para o efeito, muito em síntese, que fez obras e suportou outras despesas no prédio em causa, que totalizam aquele valor, e outras mais despesas terá que suportar com indemnizações aos trabalhadores contratados. Concluiu que tinha direito ao correspetivo reembolso por via da acessão industrial imobiliária ou, se assim se não julgasse, por via do enriquecimento sem causa obtido pelos Autores.

Mais peticionou que fosse declarado ter a seu favor direito de retenção sobre o mesmo prédio até que se mostrem pagos ou garantidos os valores por si despendidos.

No decurso do processo as Rés confessaram o pedido dos Autores, confissão que foi homologada por sentença (fls. 1599). Na sequência, os Autores depositaram o preço da venda, que foi entretanto entregue à 1ª Ré.

Seguindo o processo seus devidos termos, agora unicamente para o efeito de apreciação do pedido reconvencional, veio, a final, a ser proferida sentença que julgou a reconvenção improcedente.

Inconformada com o assim decidido, apelou a 1ª Ré para o Tribunal da Relação do Porto, que, em procedência parcial da apelação, julgou parcialmente procedente a reconvenção, condenando os Autores a pagar à 1ª Ré a quantia de €1.106.625,02 a título de benfeitorias necessárias realizadas no imóvel, acrescida de juros de mora desde a notificação da reconvenção, bem como a pagar a quantia a liquidar ulteriormente em incidente de liquidação, esta relativa a despesas (benfeitorias úteis) com o restauro de lustres existentes na casa que integra o imóvel, acrescendo juros de mora desde essa liquidação. Mais foi declarado assistir à 1ª Ré o direito de retenção sobre o imóvel até que lhe fosse satisfeito ou garantido o pagamento dos referidos valores.

Inconformados com o assim decidido, pedem os Autores revista.

Da respetiva alegação extraem as seguintes conclusões: A. Na reapreciação da prova, o TRP violou os princípios da igualdade das partes, da aquisição processual, da imediação da prova e da oralidade, previstos nos art.s 4.º, 413.º, 604.º e 605.º do CPC, o que por si só explica a diferença abissal entre a matéria considerada provada nas alíneas E) e F) pelo Tribunal a quo e o Tribunal ad quem: - ao atender apenas aos meios de prova assinalados pela então Recorrente e ora Recorrida nas respetivas alegações de recurso, não tendo em momento algum confrontado tais meios de prova com os demais, designadamente com os meios de prova assinalados pelos ora Recorrentes nas suas contra-alegações de recurso; - ao concluir que “o piso superior do imóvel – que é mais sujeito aos problemas descritos – não era disponibilizado aos visitantes, que todos eram instalados nos pisos inferiores” para justificar a incompatibilidade do alegado estado de degradação do imóvel referido pelas testemunhas da Recorrida com o uso do mesmo nos últimos anos anteriores à venda para a realização de festas/casamentos, o que por vezes comportava a instalação de hóspedes na própria casa; - ao não ter ponderado a totalidade do depoimento de EE que, contrariamente ao referido no acórdão recorrido, visitou a casa duas vezes – a primeira vez visitou a totalidade do interior e do exterior do Solar de ...

e a segunda vez apenas o exterior; - ao não ter tido em consideração os depoimentos das testemunhas FF e GG, ambos engenheiros civis e que, pese embora apenas tenham visitado o exterior da casa, procederam à sua avaliação a partir da observação estrutural do prédio e concluíram que a cobertura não apresentava problemas estruturais que pusessem a causa a sua integridade, verificando-se pontuais situações de telhas partidas e/ou deslocadas.

- ao não atender à totalidade da prova documental junta aos autos; - ao colocar em crise a credibilidade dos depoimentos das testemunhas HH e EE; - ao não ter ouvido diretamente o depoimento das testemunhas de ambas; B. Caso o TRP tivesse atendido à totalidade da prova produzida nos presentes autos, ou sequer se tivesse atendido aos meios de prova assinalados nos pontos 79 a 151 das contra-alegações de recurso dos ora Recorrentes (o que claramente não fez) teria verificado que: - o Solar de ... era visitado e utilizado na sua totalidade e não apenas o piso inferior, até porque em ambos os pisos há quartos para os hóspedes dormirem e uma vez que no piso superior ficam situadas as divisões sociais da casa – sala de estar, sala de jantar, biblioteca e a própria entrada principal da casa – os visitantes teriam sempre de percorrer quase toda a casa, conforme resulta do depoimento da testemunha HH(ficheiro 20140707113736_70043_64756 de 07/07/2014, de 00:05:23 a 00:18:05, conforme Ata da Sessão da Audiência de Julgamento do dia 07/07/2014) e da transcrição do mesmo assinalada no ponto 137 das contra-alegações de recurso dos ora Recorrentes; - a testemunha EE visitou não só o exterior, mas também o interior do Solar de ..., e por certo, de aferido de forma diferente a sua credibilidade, conforme resulta do depoimento da referida testemunha (ficheiro 20140707105805_70043_64756 de 07/07/2014, de 00:01:08 a 00:01:38, de 00:11:00 a 00:11:54, de 00:03:20 a 00:11:55, conforme Ata da Sessão da Audiência de Julgamento do dia 07/07/2014) e da transcrição do mesmo assinalada nos pontos 106 e 137 das contra-alegações de recurso dos ora Recorrentes; - que o Solar que integra a ... apresentava à data da aquisição alguns estragos ao nível dos telhados, mormente telhas partidas e deslocadas e da caixilharia/janelas, nomeadamente alguma caixilharia do denominado claustro achava-se semi-apodrecida, como havia e bem sido considerado como provado pelo Tribunal de 1.ª Instância na alínea E), conforme resulta dos depoimentos das testemunhas HH, EE, FF e GG, conjugados não só com a Memória Descritiva e Justificativa [documento n.º 9 junto com o requerimento de 27/02/2012 com a ref.ª 9483454 (e também com o requerimento de 15/03/2013 com a referência 9658580)], mas também com as fotografias juntas aos autos pelos Recorrentes durante a audiência de julgamento do dia 04/06/2014, bem como com as cerca de 400 fotografias juntas nessa mesma audiência pela Recorrida; - à data da venda o Solar que integra ..., verificavam-se infiltrações de água no interior de algumas divisões, conforme havia sido inicialmente e bem considerado como provado na alínea F) pelo Tribunal da 1ª instância, infiltrações essas pontuais e localizadas, que de modo algum punham em risco a integridade estrutural e a salubridade do imóvel, pois a casa estava habitável, conforme foi referido com total com conhecimento do imóvel e isenção pelas testemunhas EE, HH, II, e pelas testemunhas FF e GG (com igual isenção e rigor que demonstraram nos respetivos depoimentos, mas apenas no que respeita ao exterior do imóvel), mas também porque assim resulta da Memória Descritiva e Justificativa [documento n.º 9 junto com o requerimento de 27/02/2012 com a ref.ª 9483454 (e também com o requerimento de 15/03/2013 com a referência 9658580)]; - as testemunhas da Recorrida de algum modo estão ligadas à Recorrida: i) umas por serem familiares da gerente Dra. JJ; ii) outras por serem funcionários da Recorrida; iii) outras ainda por terem sido contratadas pela Recorrida por serem amigas da referida gerente e pendentes dos trabalhos que, mal ou bem, lhe cobraram; - do lado dos Recorrentes testemunharam uma diversidade de pessoas: algumas que conhecem os Recorrentes e outras que não, mas todas tiveram em momentos e em circunstâncias diferentes contacto com Casa de ....

  1. O TRP violou o disposto nos art.º 342.º do CC e o princípio do contraditório previsto no art.º 3.º do CPC, bem o disposto no art.º 5.º do CPC, ao considerar, por um lado, que os factos cujo aditamento foi requerido à matéria de facto provada, não foram alegados na causa, e por outro, não assumiram em sede de qualquer alegação, a natureza de exceção e nem podem ser qualificados como instrumentais ou complementares de outros que os recorridos tenham alegado para esse efeito, quando na realidade i) tais factos foram alegados e assumem a natureza de exceção das obras de restauro realizadas na Casa de ..., embora estas nunca tivesse sido qualificadas como benfeitorias...

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