Acórdão nº 315/11.2JELSB.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução01 de Julho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

* Acordam no Supremo Tribunal de Justiça.

No âmbito do processo supra referenciado da antiga comarca do Alentejo Litoral, e actual comarca de Beja, o arguido AA, com os sinais dos autos, foi condenado, entre outros, como co-autor material de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelo artigo 21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 9 anos de prisão.

Recorreu para o Tribunal da Relação de Évora, que confirmou integralmente o decidido.

Interpõe agora recurso para este Supremo Tribunal.

É do seguinte teor o segmento conclusivo da respectiva motivação[1]: 1. O recorrente foi condenado pela prática em coautoria material de um crime de tráfico de estupefacientes.

2. No caso vertente resulta provado que o recorrente se encontra inserido social e familiarmente.

3. Os factos dados como provados e as conclusões permitem efetuar um juízo de prognose favorável quanto ao recorrente.

4. Um tal quadro, na sua globalidade, aponta decididamente para uma situação de eventual diminuição da ilicitude, aliás nenhum do estupefaciente foi comercializado.

5. Importa não esquecer a forte presença e prova de inserção social e familiar, bem como de hábitos de trabalho.

6. A pena sofrida para o comportamento global do recorrente, são eventualmente desproporcionadas e desconformes com a jurisprudência e pecam por excessivas.

7. Deveria ter sido optada pela aplicação ao recorrente de pena de prisão pouco acima do limite mínimo legalmente considerado.

8. Com a escolha e determinação da pena no sentido referido, estariam alcançadas as finalidades da pena ao caso em apreço, bem como a prevenção geral e especial aqui exigida.

9. A fixar-se um juízo de censura jurídico-legal haverá que ser ponderado o futuro do agente numa perspectiva de contribuição para a sua recuperação como individuo dentro dos cânones da sociedade.

10. O recorrente tem atualmente 70 anos de idade.

11. Abonaram ainda a favor do recorrente o bom comportamento prisional, inserção familiar.

12. A escolha e determinação da pena no sentido referido, estariam alcançadas as finalidades da pena ao caso em apreço, bem como a prevenção geral e especial aqui exigida Normas violadas: 13. Artigo 127º do CPP e 70º, 71º, 40º, 50º, 51º, 53º, 54°, porquanto ao contrário do que sucedeu, o tribunal deveria ter condenado o recorrente em pena de prisão ligeiramente acima do limite mínimo legalmente considerado.

Na contra-motivação o Ministério Público formulou as seguintes conclusões: 1.

Nos termos do artigo 434º do CPP, o recurso para o STJ visa exclusivamente questões de direito, sem prejuízo do disposto no artigo 410° nºs 2 e 3 do mesmo diploma legal – detecção de vícios decisórios ao nível da matéria de facto emergente da simples leitura do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, referidos no artigo 410º nº 2 do Código de Processo Penal e/ou nulidade da decisão, nos termos do artigo 379° n°2 do CPP – cfr. art° 410, n°3 do CPP.

2.

O Tribunal da Relação encerrou o ciclo do conhecimento da matéria de facto, por um lado, e a decisão proferida não ostenta qualquer vício, ao nível dessa mesma matéria, que a torne uma decisão incorrecta, ao ponto de vista da lógica jurídica, a impor qualquer conhecimento oficioso de vícios elencados no artigo 410°nº 2 do CP.

3.

Estamos perante uma operação de tráfico internacional de estupefaciente, proporcionando avultada compensação económica, em que o arguido se envolveu com elevado nível de responsabilidade e liderança no apoio logístico. 4.

O grau de ilicitude é muito elevado, em função da grande quantidade e elevado grau de pureza, sendo de igual grau a culpa do arguido, que agiu com dolo directo, com persistência, considerando o longo período de preparação da acção; conta com uma condenação anterior, por crime homótropo, em pena de prisão que cumpriu.

5.

Assim, tendo em conta a moldura penal aplicável de 5 anos a 15 anos, mostra-se proporcional, adequada e necessária a fixação da pena, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelos arts. 21.º, n.º 1, e 24.º, al. c), f) e J) do DL 15/93, de 22-01, em 9 anos de prisão, medida que satisfaz plenamente as exigências de prevenção geral e especial que tal criminalidade reclama e a culpa do arguido consente.

6.

O acórdão recorrido deve ser confirmado, visto não padecer de qualquer vício que importe conhecer, nem violar nenhum dos normativos invocados pelo recorrente, antes comportando uma decisão que se nos afigura justa, equilibrada e proporcional, traduzindo a resposta que a comunidade tem por adequada aos factos cometidos, sua gravidade e consequências.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu o seguinte parecer: 1 - Do recurso: 1.1 – O arguido AA[2], com os demais sinais dos autos, foi condenado em 1.ª Instância – por Acórdão do Tribunal Coletivo da antiga Comarca do Alentejo Litoral, e atual Comarca de Beja, datado de 16-06-2014 –, como coautor material de um crime de “tráfico de estupefacientes”, da previsão do art. 21.º, n.º 1 do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de nove (9) anos de prisão.

1.2 – Deste veredicto recorreu para o Tribunal da Relação de Évora onde, por Acórdão de 03 de março de 2015, se decidiu negar-lhe provimento, confirmando na íntegra o decidido em 1.ª Instância.

1.3 – É esta última decisão que, ainda inconformado, o arguido traz agora à consideração deste Supremo Tribunal, limitado no entanto, como decorre da motivação oferecida, à medida concreta da pena aplicada, que considera excessiva e pugna ser de reduzir, atenta a sua idade, bom comportamento prisional e inserção social e familiar, para um limite ligeiramente acima do limite mínimo da respetiva moldura penal abstrata.

1.3.1 – Respondeu, tempestivamente, o Ministério Público junto da Relação, pugnando pela confirmação do decidido [fls. 9205/9209].

1.3.

2 – O recorrente não requereu audiência, nos termos do previsto no n.º 5 do art. 411.º do CPP, pelo que deve o recurso ser conhecido em conferência (art. 419.º, n.º 3/c), do CPP).

* 2 - Do mérito do recurso: 2.1 – Emitindo parecer, como nos cumpre, sobre a questão que vem colocada – circunscrita pois, como vimos, à medida concreta da pena –, cabe, liminarmente, dizer que, lida a motivação do recorrente, fica-nos a convicção de que, ele próprio, não depositará excessivas esperanças no triunfo da sua pretensão, posto que se tenha limitado, em bom rigor e no essencial, a retomar e a repetir, à saciedade, toda a argumentação que expendera ingloriamente na Relação.

Nos crimes de tráfico de estupefacientes as finalidades de prevenção geral impõem-se com particular acuidade, desde logo pela forte ressonância negativa, na consciência social, das actividades que, em geral, os consubstanciam. São conhecidas as muito graves consequências do consumo de estupefacientes, não só ao nível da saúde dos consumidores, como também no plano da desinserção social e familiar que lhe anda quase sempre associada.

É certo que à medida da tutela dos bens jurídicos não pode deixar alheia a dimensão da ilicitude das diversas modalidades de acção. O que significa que, como é bom de ver, as exigências de prevenção geral não têm a mesma medida em todos os casos.

Dito isto, e assim a esta luz, há que ponderar que mesmo estando em causa um produto classificado como “droga não dura”, ela não deixa de ser de reconhecido efeito danoso para a saúde dos potenciais consumidores. Pelo que, e no concreto contexto da ação empreendida pelo arguido e demais comparticipantes, é evidente que a ilicitude se mostra significativamente acentuada mesmo por aquele tipo de substância (haxixe), tendo sobretudo em conta os meios utilizados (transporte intercontinental marítimo dissimulado), bem como a quantidade de estupefaciente em causa (cerca de 2.800 quilos, ou seja quase 3 toneladas).

Ora, no exercício de fundamentação da medida da pena anotou, para além do mais, o aresto da 1.ª Instância que, citamos, «[…] De forma comum a todos os arguidos há assim que ponderar: - O grau de ilicitude do facto, que se afigura elevado atendendo a enorme quantidade de cannabis transportada e apreendida — quase 2.800 quilogramas — provindo de outro país, materializando assim uma atividade de tráfico transnacional; - O modo de execução, traduzido na colaboração e participação (embora de diferentes formas e níveis de responsabilidade, que se traduzirão em diferentes níveis de culpa) numa atividade de tráfico que envolve grande quantidade de droga que vem do estrangeiro por via marítima e com utilização de meios logísticos necessariamente dispendiosos (embarcação, combustíveis, camiões, galera, gruas) e com cuidada planificação, coordenação de condutas e atribuição de funções específicas como a seguir se pormenorizara relativamente aos vários arguidos; - A intensidade do dolo, traduzido em dolo direto por parte de todos os arguidos e por isso denotador de maior intensidade; - Os sentimentos manifestados no cometimento do crime, motivos e fins determinantes, que se traduzem em comportamentos egoísticos e socialmente desajustados, visando apenas a obtenção de benefício económico ilícito, sem olhar a meios e às consequências que adviriam da possível colocação em consumo de uma tão grande quantidade de estupefaciente; - A gravidade das consequências, não esquecendo que estamos perante um crime de perigo abstrato, e que através da conduta dos arguidos foi criado um perigo que se traduziu na possibilidade de colocação em circulação e consumo duma enormíssima quantidade de canábis (resina) que, mesmo não sendo considerada uma droga dura, tem efeitos nefastos na saúde das pessoas e na própria vivência comunitária; - A existência de fortes necessidades de prevenção geral, atendendo à frequência com que crimes desta natureza vêm ocorrendo e à elevada dimensão e repercussão social que assume uma operação de tráfico internacional de toneladas de estupefaciente como a dos autos.

Como antes referimos, no que respeita...

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