Acórdão nº 1728/12.8TBBRR-A.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Julho de 2015
Magistrado Responsável | ANA PAULA BOULAROT |
Data da Resolução | 09 de Julho de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I D, nos autos de acção executiva que lhe move BANCO X, SA, deduziu oposição à execução, pedindo a extinção da execução no que a si respeita, com fundamento na nulidade da fiança prestada que determina a sua ilegitimidade, determinada pela falta de vontade ou vontade condicionada.
Para tanto, invoca, que foi forçada a assinar uns papéis, desconhecendo que estava assinar um contrato, e que o fazia na qualidade de fiadora.
Que não foi lido ou explicado à executada o sentido, alcance, significado jurídico e as consequências das expressões “fiadores”, “solidários”, “principais pagadores”, “benefício de excussão prévia”, assim como os efeitos da renúncia desses benefícios.
Expressões que diz só agora ter visto e só agora logrou o respectivo alcance pelo que o exequente violou o cumprimento do dever de informação do alcance ou sentido daquelas expressões inseridas no contrato.
Alega ainda, não ter sido notificada do incumprimento do crédito hipotecário quando o deveria ter sido, por ser uma prática instituída do Banco de Portugal, que se encontra vertida no ponto 4, alínea c) da instrução n.º 21/2008, que vincula todas as entidades financeiras. Não tendo a exequente cumprido o seu dever de comunicação violou o dever fundamental de boa-fé, donde resultou um prejuízo para os fiadores.
Por outro lado, atendendo a que o valor que falta pagar do imóvel é inferior ao valor do imóvel, deveria ter sido considerada a dação em cumprimento para extinção da dívida, ficando os fiadores exonerados da obrigação.
Que a perda do benefício do prazo, com vencimento antecipado de prestações não se estende aos fiadores.
O Exequente contestou, impugnando os fundamentos da oposição.
A final foi produzida sentença a julgar parcialmente procedente a oposição, tendo declarado que não verifica a perda do benefício do prazo, e, em consequência, determinou que a execução prosseguisse contra a Opoente apenas relativamente às prestações vencidas, e não pagas, até à data de entrada do requerimento executivo, e juros respectivos.
Inconformada recorreu a Embargante, tendo a final sido julgada procedente a sua Apelação e revogada a sentença apelada, tendo-se declarado nulo o contrato dos autos quanto a esta, por violação do disposto nos artigos 5º e 6º e 12º todos da L.C.C.G. com a consequente extinção da execução quanto à mesma.
Não aceitando esta decisão, recorre agora de Revista o Exequente, Embargado, apresentando as seguintes conclusões: - Não se pode o Recorrente conformar, particularmente, no que se refere à possibilidade de a Opoente Recorrida, enquanto fiadora, ver quanto a si o contrato dos autos nulo, por pretérita violação do disposto no artigo 5.° e 6.°, conforme artigo 12º da LCCG, com a consequente decisão de extinção da execução quanto à mesma.
- Atendendo ao exposto, não sendo aplicável à Opoente a LCCG, salvo melhor entendimento, andou mal o Tribunal a quo ao decidir pela aplicação do referido regime à relação entre o mutuante e a fiadora/Opoente.
- Pelo que, enferma de violação da lei substantiva por incorrecta interpretação da norma aplicável e consequentemente pela errónea determinação da norma aplicável, já que não o fiador não é devedor do mutuante, e logo não pode considerar-se aderente ou consumidor.
- Assim é plenamente válido, também quanto à Opoente, o contrato de mútuo dos autos, pelo que a execução deverá prosseguir quanto a esta igualmente, pelo que deverá a Oposição apresentada pela executada/fiadora ser julgada totalmente improcedente, com as demais consequências legais.
- A primeira questão a abordar no presente recurso prende-se, assim, com a aplicação da LCCG à Opoente Fiadora. - Conforme estipulado na alínea a) do n.º 1 do artigo 2.º do DL 133/2009, de 02 de Junho, o devedor fiador não é consumidor.
- O fiador não é devedor do mutuante, não assumindo os direitos e obrigações decorrentes desse negócio, sendo, antes, um mero garante do pagamento da dívida, que o incumprimento contratual do mutuário venha eventualmente a gerar. Como é sabido, a fiança consubstancia uma garantia pessoal das obrigações (art. 627 e segs CC), cujos elementos essenciais se reconduzem à identificação da dívida garantida, ao devedor, ao credor e tempo de vinculação.
Atendendo ao exposto, não sendo aplicável à Opoente a LCCG, salvo melhor entendimento, andou mal o Tribunal a quo ao decidir pela aplicação do referido regime à relação entre o mutuante e a fiadora/Opoente.
- Pelo que, enferma de violação da lei substantiva por incorrecta interpretação da norma aplicável e consequentemente pela errónea determinação da norma aplicável, já que não o fiador não é devedor do mutuante, e logo não pode considerar-se aderente ou consumidor.
- Assim é plenamente válido, também quanto à Opoente, o contrato de mútuo dos autos, pelo que a execução deverá prosseguir quanto a esta igualmente, pelo que deverá a Oposição apresentada pela executada/fiadora ser julgada totalmente improcedente, com as demais consequências legais.
- Ainda que assim não se entenda - o que apenas por mera hipótese de raciocínio se concede - sempre se dirá o seguinte, - As cláusulas contratuais gerais são um conjunto de proposições pré-elaboradas que proponentes ou destinatários indeterminados se limitam a propor ou aceitar. As cláusulas contratuais gerais destinam-se ou a ser propostas a destinatários indeterminados ou a ser subscritas por proponentes indeterminados; - No caso em apreço estamos perante um contrato de mútuo, que contem as cláusulas enunciadas nos factos provados, tendo a Opoente, assim como o demais fiador, aposto a sua assinatura no final do contrato, bem o documento complementar, rubricando cada uma das suas páginas.
- Face aos termos dos contratos e à experiência comum de qualquer cidadão que contrata com instituições de crédito, poder-se-á concluir que se está perante um contrato de mútuo, por adesão, ou seja, perante um contrato que contem cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual pelo banco exequente e que os executados, em que se inclui a ora Opoente, se limitaram a subscrever.
- A esses contratos aplica-se então o regime das cláusulas contratuais gerais, pois tal regime aplica-se igualmente às cláusulas inseridas em contratos individualizados, mas cujo conteúdo previamente elaborado o destinatário não pode influenciar (cf. DL 249/99, de 7 de Julho).
- Caso se entenda que o LCCG é aplicável à Opoente fiadora, a protecção legal conferida por este regime é estendida a esta, sendo considerada como efectiva aderente, pelo que haverá que analisar se foram cumpridos os deveres de comunicação e de informação consignados nos artigos 5.º e 6.º do LCCG.
- Assim, relativamente à comunicação à outra parte, especifica a lei que mesma deve ser integral (artigo 5.º, n.º 1 LCCG) e ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária, para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento efectivo por quem use de comum diligência (artigo 5°, n.º2 LCCG).
- O grau de diligência postulado por parte do aderente, e que releva para efeitos de calcular o esforço posto na comunicação, é o comum (artigo 5º, n.º 2, in fine LCCG).
- O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe à parte que utilize as cláusulas contratuais gerais (artigo 5º, n.º3 LCCG).
- Deste modo, o utilizador que alegue contratos celebrados na base de cláusulas contratuais gerais deve provar, para além da adesão em si, o efectivo cumprimento do dever de comunicar (cf. artigo 342º, n.º 1 CC), sendo que, caso esta exigência de comunicação não seja cumprida, as cláusulas contratuais gerais consideram-se excluídas do contrato singular (artigo 8°, alínea a) LCCG), considerando ainda a lei não terem sido adequada e efectivamente comunicadas as cláusulas que, pelo contexto em que surjam, pela epígrafe que as precede ou pela apresentação gráfica, passem despercebidas a um contratante normal, colocado na posição do contratante real (artigo 8°, alínea c) LCCG) e as cláusulas inseridas em formulários, depois da assinatura de uma das partes (artigo 8º, alínea d) LCCG).
- Para além da exigência de comunicação adequada e efectiva, surge ainda a exigência de informar a outra parte, de acordo com as circunstâncias, de todos os aspectos compreendidos nas cláusulas contratuais gerais cuja aclaração se justifique (artigo 6º, n.º 1 LCCG) e de prestar todos os esclarecimentos razoáveis solicitados (artigo 6º, n.º 2 LCCG).
- O utilizador das cláusulas contratuais gerais deve conceder a informação necessária ao aderido, prestando-lhe todos os esclarecimentos solicitados, desde que razoáveis.
- Caso não tenha sido cumprida a exigência de informação, em termos de não ser de esperar o conhecimento efectivo pelo aderente, as cláusulas contratuais gerais consideram-se excluídas dos contratos singulares (artigo 8°, alínea b) LCCG).
- O cumprimento desse dever...
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