Acórdão nº 5105/12.2TBXL.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Julho de 2015

Magistrado ResponsávelTOMÉ GOMES
Data da Resolução09 de Julho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA e marido BB (A.A.) instauraram, em 07/09/2012, junto dos Juízos Cíveis do Seixal, uma ação declarativa especial prevista no Dec.-Lei n.º 108/2006, de 08/06, contra CC (R.), advogado, a pedir a condenação deste a pagar-lhes, em conjunto, a quantia de € 60.000,00, acrescida de juros vincendos, a título de danos não patrimoniais, alegando, no essencial, que: .

O R. foi nomeado patrono dos aqui A.A. para deduzir oposição a uma execução para entrega de coisa certa (despejo), por falta de pagamento de rendas, movida contra estes; .

Embora os A.A. tenham entregue em mão, em 15/05/2010, o rol de testemunhas, este só entrou em juízo em 28/05/2010, quando já tinha decorrido o prazo para o efeito, motivo pelo qual não foi admitido; .

Assim, não tendo os A.A. produzido prova em julgamento, a oposição foi julgada improcedente, mesmo após recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, o que levou à execução do despejo em 15/07/2012; .

Com tal despejo, os A.A. ficaram muito abalados e aflitos, o que lhes causou uma profunda depressão, pois habitavam a casa há 12 anos e aí tinham o centro da sua vida familiar; .

Os A.A. encontram-se ambos desempregados, com dois filhos a cargo.

2.

O R., na contestação, além de impugnar a quantia peticionada, sustentou, em síntese, que: .

Não é verdade que o rol de testemunhas lhe tenha sido entregue em mão e em tempo, mas sim depositado na sua caixa do correio, sem aviso prévio ou posterior.

.

Não existe qualquer nexo entre a intempestividade da indicação das testemunhas e o despejo dos A.A.; .

Os A.A. deduzirem pretensão infundada, injustificadamente ofensiva da honra e bom nome do R..

Concluiu pela improcedência da ação e pediu a condenação dos A.A. como litigantes de má-fé, em multa e indemnização, incluindo o valor de € 642,60 pagos a título de taxa de justiça.

  1. Saneado o processo e realizada a audiência final, foi proferida sentença final, datada de 23/01/2013, a julgar improcedente a ação com a consequente absolvição do R. do pedido, denegando também a pretendida condenação dos A.A. como litigantes de má-fé.

  2. Inconformados com essa decisão, os A.A. apelaram dela para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo sido proferido o acórdão de fls. 219-234, datado de 10/02/2015, a julgar a apelação improcedente, confirmando a sentença recorrida, mas com um voto de vencimento no sentido da revogação daquela decisão e da condenação dos A.A. numa indemnização equitativa de € 10.000,00, a título de danos não patrimoniais.

  3. Novamente inconformados, vieram os A.A. interpor o presente recurso de revista, formulando as seguintes conclusões: 1.ª - Caso existam dúvidas quanto ao cariz "essencial" da fundamentação empregue numa e noutra decisão, e se o entendimento que vier a ser adotado pelo Exm.º Juiz Relator for o do recurso de revista excecional, por entender não estar excluída a dupla conforme, dá-se aqui como integralmente reproduzido o acórdão - fundamento, que contraria o decidido no acórdão recorrido, porquanto em ambos os Acórdãos à uma similitude da questão que se discute – omissão de apresentação do requerimento de prova pelo Advogado - sem que as decisões sejam uniformes, o que determina a discordância alegada pelos Autores quanto à aplicação do direito à luz do domínio da mesma legislação, por contradição de julgados. Termos em que, decidindo conforme o alegado e conforme o acórdão citado, será feita justiça. Cfr. Acórdão - fundamento com nota de trânsito em julgado; 2.ª - Contudo, a entender o Exm.º Juiz Relator que se trata de um recurso de revista normal, por considerar estar excluída a dupla conforme, por a confirmação da decisão da 1.ª Instância assentar numa fundamentação essencialmente idêntica, por o Acórdão recorrido conter a existência de voto de vencido, o que assinala uma importante divergência entre o coletivo, e ainda por estarem verificados os restantes pressupostos de admissibilidade da revista, o que justifica o desimpedimento do acesso ao recurso de revista normal, então os A.A. começam por afirmar que estabilizada que se mostra a matéria de facto, está provado que os recorrentes solicitaram a nomeação de patrono para a condução da oposição à execução para entrega de coisa certa; 3.ª – Estamos, pois, perante uma hipótese de responsabilidade contratual, visto que entre os A.A.

    e o R., este na qualidade de advogado, foi estabelecido um contrato de mandato – artigos 1157.º, 1158.º, n.º 1, e 1178.º do CC; 4.ª - A responsabilidade do advogado pelos danos causados ao seu cliente no âmbito e no exercício do mandato forense é contratual, uma vez que decorre da violação de deveres jurídicos emergentes desse contrato; 5.ª - No âmbito da responsabilidade contratual, compete ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o cumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua; 6.ª – A lei estabelece uma presunção de culpa neste tipo de responsabilidade (art.º 799.º, n.º 1, do CC); 7.ª - Ao credor bastará provar que a obrigação não foi cumprida ou que foi cumprida defeituosamente (facto ilícito contratual), não tendo, porém, de provar a culpa do devedor, já que é a ele que pertence o ónus de provar que não cumprimento ou cumprimento defeituoso não procedeu de culpa sua.

    8.ª - No caso dos autos, estamos perante uma obrigação de meios; 9.ª - Nas obrigações de meios, não basta alegar a perda da ação para se considerar em falta o advogado que patrocinou a causa, é necessário provar que o advogado não realizou os atos em que normalmente se traduziria um patrocínio diligente, de acordo com as normas deontológicas aplicáveis ao exercício da profissão; 10.ª - Uma vez provado pelo credor que o meio exigível não foi empregue pelo devedor ou que a diligência exigível de acordo com as regras da arte foi omitida, competirá ao devedor provar que não foi por sua culpa que não utilizou o meio devido, ou omitiu a diligência exigível; 11.ª - Neste sentido, é aplicável às obrigações de meios a presunção de culpa do art.º 799.º, n.º 1, do CC; 12.ª – Da factualidade provada resulta que o R. assumiu patrocinar os A.A., na qualidade de patrono nomeado dos oponentes na oposição à execução que correu termos pelo Tribunal de Família e Menores do Seixal (extinto) – 2.º Juízo Cível; 13.ª - Como mandatário forense dos AA., o R. estava obrigado a praticar os atos compreendidos no mandato judicial que aceitou; 14.ª - No exercício da profissão de advogado, constitui dever profissional deste estudar com cuidado e tratar com zelo a questão de que seja incumbido, utilizando para o efeito, todos os recursos da sua experiência, saber e atividade; 15.ª - O advogado deve atuar de forma mais conveniente para a defesa dos interesses do cliente, aconselhando-o, defendendo-o com prontidão, consciência e diligência, assumindo responsabilidade pessoal pelo desempenho da missão que lhe foi confiada (cf. artigo 92.º, n.º 1, e 93.º, n.º 2, da Lei n° 15/2005, de 26/01); 16.ª – O patrocínio jurídico dos A.A., na dita oposição à execução, que fora confiada ao R., passava, necessariamente, pela apresentação do requerimento probatório, o que é fundamental, no caso, visto que, perante a falta do rol de testemunhas e de outros meios de prova, inevitavelmente os factos alegados, nunca poderiam ser dado como provados; 17.ª - É de essencial importância a apresentação dos elementos de prova para demonstrar o alegado na peça processual apresentada; 18.ª - Da factualidade provada consta que, organizada que foi a base instrutória, o tribunal notificou o R. no dia 4/5/2010 para, em 15 dias, apresentar rol de testemunhas, requerer outras provas, bem como a gravação da audiência final ou a intervenção do coletivo, e alterar os requerimentos probatórios que houvesse feito, nos termos e para os efeitos do estipulado pelo artigo 512.º, do CPC; 19.ª - O R. apenas deu entrada, no Tribunal, ao requerimento de prova no dia 28 /05/2010; 20.ª - No seguimento, o juiz do processo julgou extemporâneo o requerimento com a indicação dos meios de prova e determinou o seu desentranhamento com fundamento na sua extemporaneidade, não tendo o R. interposto recurso dessa decisão; 21.ª - Está, pois, demonstrado nos autos, tal como alegaram os A.A., na ação de responsabilidade civil contra o R., que este apresentou o requerimento probatório em juízo fora do prazo legal, e não há dúvidas de que essa era uma diligência essencial a que estava obrigado por força do mandato forense que assumiu para com aqueles; 22.ª - Assim, está provado que o meio exigível, diligente e adequado, de acordo com as regras estatuárias e deontológicas da profissão de advogado, não foi cumprido pelo R., quando lhe competia demonstrar que tal omissão não tinha decorrido de culpa sua; 23.ª - Contudo tal prova não foi efetuada pelo R. na ação de responsabilidade civil contra si intentada, nem este alegou ou fez prova do justo impedimento, nem que tivesse interposto recurso do despacho de desentranhamento do requerimento probatório.

    24.ª - Era ainda sobre o R. que, na referida ação, impendia alegar e fazer a prova que à improcedência da oposição era indiferente o facto de não ter apresentado o rol de testemunhas, como determina o artigo 342.º, n.º 2, do CC, isto é, que a ação devido às vicissitudes, sempre seria julgada improcedente e o réu absolvido do pedido, o que o R. não alegou nem provou; 25.ª – O R., enquanto mandatário dos A.A., não cumpriu o mandato ou cumpriu-o defeituosamente, sendo-lhe imputável tal incumprimento, face à presunção referida, que não ilidiu, a título de negligência; 26.ª - A omissão, que se traduziu na falta de apresentação do rol de testemunhas em tempo devido, é imputável ao R. a título de culpa; 27.ª - Face à lei, esta omissão determinou, que se tivessem como não provados, os factos alegados pelos A.A. /Oponentes e a oposição à execução fosse julgada improcedente; 28.ª - Uma vez chegados à ilicitude contratual, será que o R. não incorre em responsabilidade civil para com os...

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