Acórdão nº 1166/10.7TBVCD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução04 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça 1.

- AA instaurou uma acção contra BB - Seguros, S.A. (posteriormente incorporada, por fusão, em CC - Companhia de Seguros, S.A.), pedindo a sua condenação no pagamento de uma indemnização de € € 69.375,67, € 25.000,00 por danos não patrimoniais e € 44.375,67 por danos patrimoniais, decorrentes de um acidente de viação causado por culpa exclusiva do condutor de um veículo segurado na ré, que embateu naquele em que seguia a autora, como passageira.

A ré contestou, aceitando “a responsabilidade civil pelo acidente de viação que vem alegado”, afirmando no entanto o desconhecimento de vários factos e opondo serem exagerados os montantes indemnizatórios pedidos.

A fls. 287, a autora veio aumentar para € 40.000,00 o pedido de indemnização por danos não patrimoniais e para € 80.000,00 o pedido de indemnização por danos patrimoniais. Pelo despacho de fls. 299, a ampliação foi admitida.

A sentença de fls. 365 julgou a acção parcialmente procedente, condenando a ré no pagamento de € 65.000,00, € 25.000,00 por danos não patrimoniais e € 40.000,00 por danos patrimoniais, com juros de mora, contados à taxa legal desde a data da sentença, até integral e efectivo pagamento da indemnização. O tribunal considerou que o acidente se ficou a dever a culpa exclusiva da condutora do veículo segurado na ré e que os valores indemnizatórios equitativamente a fixar seriam aquelas, sendo certo que, segundo parece resultar do texto, não terá sido considerada a ampliação do pedido. Mas a sentença esclareceu que “o valor da indemnização foi aferido pelo valor da moeda à data” em que foi proferida.

A autora recorreu para o Tribunal da Relação do Porto, que aumentou a indemnização para € 95.000,00, € 55.000,00 por danos patrimoniais e € 40.000,00 por danos não patrimoniais, mantendo a data da sentença como início da contagem dos juros de mora.

  1. - CC - Companhia de Seguros, S.A. recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça. Nas alegações de recurso que apresentou, formulou as seguintes conclusões: «A) Os montantes indemnizatórios arbitrados na douta sentença da primeira instância, quer a título de perda de capacidade de ganho no futuro, quer para compensação dos danos não patrimoniais sofridos pela ora recorrida mostram-se inteiramente justos, porque proporcionais e equitativos; B) Tal como resulta do elenco dos factos assentes, a sinistrada não sofreu, por via directa ou sequer indirecta do acidente que a vitimou, qualquer incapacidade que realmente a incapacite de exercer no presente e no futuro a plenitude das funções e tarefas próprias da sua actividade profissional, seja ela qual for em concreto, sabendo-se até que, volvidos sete anos sobre o evento danoso se encontra a trabalhar, sem qualquer restrição, auferindo um salário mensal muito dentro da média salarial especifica do segmento etário e das habilitações técnico-profissionais em que se insere; C) Nada nos autos permite concluir pela previsibilidade de uma substancial restrição às oportunidades e ou possibilidades à disposição da recorrida, em função da sequela corporizada no défice á sua integridade físico-psíquica, avaliada como foi em perícia médico-legal em 16,90 pontos; D) Os esforços acrescidos, necessariamente proporcionais à dimensão daquele deficit físico-psíquico não constituem um dano futuro autónomo a reclamar uma indemnização especificamente adequada a superá-lo, como se de uma incapacidade laboral se tratasse; E) Ao invés, tais esforços, na justíssima medida em que constituem o reflexo directo da amputação parcial de um todo até então perfeito, com repercussões em todas as dimensões da vida da lesada deverão ser compensados como dano moral; F) O valor indemnizatório do dano biológico consistente numa IPG de 16,9 pontos reconhecida à recorrida deverá ser calculado de acordo com as previsões da Portaria 337/2008 de 26 de Maio, revista pela Portaria 679/2009 de 25 de Junho; G) O montante indemnizatório encontrado e sentenciado na primeira instância, e com o qual a ora recorrente se conformou, é largamente superior ao que resultaria da aplicação das tabelas constantes nos referidos diplomas legais, pelo que deverá o mesmo ser mantido; H) O douto acórdão recorrido ao reconhecer à sinistrada uma indemnização de € 55.000 apenas com base na ficcionada incapacidade laboral de 16,9 pontos, mantendo e aumentando até a compensação por danos não patrimoniais, violou o principio do indemnizatório que, como é consabido, proíbe a acumulação de indemnizações para os mesmos danos; I) A compensação arbitrada em primeira instância no tocante à compensação pelos danos não patrimoniais está igualmente em conformidade com os valores que se alcançaram em situações tão graves quanto a da aqui autora /recorrida em inúmeras decisões judiciais; J) Ao invés, a quantia fixada pelo Tribunal a quo corresponde a dois terços do valor que, em regra, vem sendo fixado pela supressão do direito à vida, o qual se cifra em importância que ronda os € 60.000 (valor este que acabaria por ser adoptado pelo legislador em 2008 para ser oferecido, em termos de proposta razoável – vide anexo C da Portaria n" 377/2008); K) Como flui do acervo de factos provados e acima enumerados, a recorrida sofreu dores, que de forma alguma se pretendem desvalorizar, mas não ficou definitivamente portadora de nenhuma enfermidade significativa; L) A obrigação de indemnização, qualquer que seja o título de imputação do qual emerge a específica relação creditória, tem por função e limite a supressão dos danos sofridos em consequência de determinado evento, não podendo assumir qualquer tipo de feição lucrativa para o credor da obrigação de indemnização: M) O Tribunal a quo fez, pois, uma errada aplicação do direito aos factos provados, tendo violado o disposto nos artigos 483°, 494°,496°, 562°, 563° e 566°, todos do Código Civil e ainda o disposto nos artigos 4° e 7° nº 1 da Portaria 377/2008 de 26/05 na sua redacção actual, para além de não ter respeitado os princípios basilares do direito civil português da equidade, adequação e igualdade.

    Termos em que, e nos do douto suprimento de V. Exas, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se o douto acórdão recorrido e substituindo-se por outro que, na procedência das conclusões supra enunciadas, mantenha a decisão proferida pela primeira instância, como é de direito e de JUSTIÇA.» A autora contra-alegou, sustentando a manutenção dos valores arbitrados, nestes termos: «1. Embora, peque por defeito, a indemnização atribuída à ora Recorrida a título de dano patrimonial deve manter-se nos € 55.000,00, 2. Sendo, de igual modo, a indemnização pelo dano não patrimonial no valor de € 40.000,00.

  2. Já que, ao contrário do que pretende e defende a Recorrente, o dano biológico, que é funcional, sofrido com gravidade pela ora Recorrida é autónomo do dano não patrimonial.

  3. No cálculo da indemnização por danos patrimoniais futuros, em que intervém necessariamente a equidade, não deve ficcionar-se que a vida física do dano corresponde à sua vida activa.

  4. E, os tribunais não estão vinculados, na fixação equitativa dos montantes indemnizatórios a atribuir aos lesados em acidentes de viação, à aplicação das tabelas plasmadas na Portaria nº 377/2008, alterada pela Portaria 679/2000 de 25 de Junho, estes estabelecendo padrões mínimos, a cumprir pelas seguradoras, na apresentação a tais lesados de propostas sérias e razoáveis de regularização de sinistros, indemnizando o dano corporal» A autora recorreu subordinadamente, restringindo o recurso a duas questões – omissão de pronúncia e início da contagem dos juros moratórios – , concluindo assim as alegações: «1. A ora Recorrida aquando da apresentação do requerimento de ampliação do pedido de fls. 287 a 289, requereu no seu ponto 2 que fossem relegados para execução de Sentença o que refere o Relatório pericial elaborada pelo IML (e, cujo conteúdo não foi posto em causa pelo relatório de perícia colegial) que se traduz no seguinte: "Na situação em apreço é de perspectivar a existência de Dano Futuro (considerando exclusivamente como tal o agravamento das sequelas que constitui uma previsão fisiopatologicamente certa e segura, por corresponder à evolução lógica, habitual e inexorável do quadro clínico), o que pode obrigar a uma futura revisão do caso. Poderá no futuro não ser possível um parto por via vaginal, caso não existam as condições ditas ideais, face às condicionantes pélvicas pós-sinistro, podendo ser necessária(s) cesariana(s). É uma situação de muito difícil quantificação (face a eventual necessidade de valoração em pontos, pelo que tal deve ser relegado para execução o eventual dano que venha a obrigar a uma futura revisão do caso.

  5. E no ponto 4 do mesmo requerimento de ampliação do pedido e, ainda tendo em conta o referido relatório pericial do IML, nesta consta que o défice funcional permanente da integridade físico psíquica: fixável em 19 pontos, sendo de admitir a existência de Dano futuro, mas de muito difícil valoração em pontos, bem como de "Ajudas técnicas permanentes: ajudas medicamentosas", que por não serem...

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