Acórdão nº 319/06.7TVLSB.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA VASCONCELOS
Data da Resolução04 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Em 2006.01.06, Na então 16ª Vara Cível de Lisboa, AA Laboratório Dental, Lda instaurou contra os réus BB e Banco CC, S.A.

, a presente ação declarativa de condenação com processo ordinário.

Pediu a condenação solidária dos réus a pagar-lhe a quantia de EUR 1.106.749,98, acrescida dos juros de mora vencidos desde a data da instauração da ação e até efetivo pagamento, bem como todos os montantes que a autora venha a suportar ou que lhe venham a ser imputados, na sequência da falta de pagamento das suas dívidas, quantitativo a ser liquidado posteriormente.

Alegou em resumo, que - em finais de 1992, o 1º réu (responsável pela contabilidade e gestão financeira da autora) sugeriu à autora que o pagamento das suas obrigações fiscais e também da segurança social fosse feito através de cheques emitidos à ordem da 2ª ré, sacados sobre a sua conta junto deste Banco, o qual, por sua vez, procederia ao pagamento daquelas dívidas, em nome da autora; - esta aceitou o esquema de pagamento proposto pelo 1ºréu; - desta forma, desde Janeiro de 1993 a Abril de 2004 a autora entregou ao 1º réu 266 cheques "cruzados", isto é, com a aposição de duas linhas paralelas na sua frente, sacados sobre o banco réu e emitidos diretamente à ordem deste banco, no montante global de EUR 1.364.586,23 (cf. doc. n° 7, junto com a p.i.].

- durante o mesmo período, a A. emitiu também cheques à ordem das entidades tributárias e à ordem do 1º réu; - em Abril de 2004, tomou conhecimento de que todos os cheques emitidos à ordem e sobre o banco réu foram depositados diretamente na conta bancária que o 1º réu tinha aberta no mesmo banco; - os referidos cheques têm aposta no verso a assinatura do 1º réu e o número da sua conta bancária; - a autora, porém, nunca autorizou nenhum dos réus a proceder da forma atrás descrita; - e se o 1º réu não podia ter-se apropriado de quantias que pertenciam à autora, também a 2ª ré não podia ter transferido as quantias tituladas pelos cheques para a conta do 1º réu, uma vez que o Banco era o beneficiário dos cheques; - além disso, e apesar de os cheques terem sido emitidos em seu nome, o Banco não podia ignorar que inexistia motivo justificado para receber e fazer suas as importâncias tituladas pelos cheques, pelo que, ao creditar diretamente na conta do 1º réu as quantias tituladas pelos cheque, sem previamente ter obtido esclarecimentos e/ou autorização da autora, violou não só a lei, mas também os mais elementares deveres de diligência e prudência a que, enquanto instituição bancária, estava obrigado; - o 1º réu assinou e entregou à autora um documento de confissão de dívida no montante de EUR 214.540,17; - com base nesse documento, a autora já instaurou contra o 1º réu ação executiva para ser ressarcida daquele montante; - a autora está, porém, convicta de que não vai conseguir obter o pagamento da totalidade da quantia exequenda, dado o valor do único bem nomeado à penhora; - por seu turno, os danos sofridos pela autora são muito superiores ao montante "confessado" pelo 1º réu, pelo que se justifica a propositura da presente ação também contra aquele; - efetivamente, em consequência da conduta dos réus, a autora sofreu danos que, à data da propositura da ação, discrimina e quantifica da seguinte forma: a) - EUR 513.712,80, correspondente à diferença entre a quantia global dos cheques emitidos à ordem de ambos os réus e das entidades tributárias, (ou seja, EUR l.642.612,64), desde 1993 a 2004, para pagamento de dívidas tributárias da autora e a quantia que, no aludido período, foi efetivamente paga (ou seja, EUR 1.128.983,30); b) - EUR 250.253,17, a titulo de juros de mora, sobre a quantia referida em a), calculados com referência a 31 de Dezembro de cada ano até à data da propositura da ação; c) - EUR 30.949,34, correspondente a juros de mora já vencidos, por falta de pagamento atempado de contribuições devidas à Segurança Social; d) - EUR 141.908,77, correspondente ao montante indemnizatório que a autora ficou obrigada a pagar aos seus trabalhadores, com os quais celebrou acordos de cessação dos contratos individuais de trabalho, por ter sido forçada a encerrar a sua atividade, por falta de capacidade financeira; e) - EUR 2.363,85, correspondente aos juros de mora que a autora vai ter que pagar aos seus trabalhadores por não ter conseguido cumprir o acordo com ele celebrado; f) - EUR 167.562,06, correspondente ao montante dos empréstimos feitos pelos sócios à sociedade autora, e que a autora terá que lhes pagar por ter sido obrigada a encerrar a sua atividade, pois devido à atuação dos réus não conseguiu vencer a conjuntura económica desfavorável, por falta de meios financeiros; g) - para além destes danos, a autora imputa ainda aos réus todos os demais que venha a sofrer, em consequência da conduta destes, designadamente, os derivados da falta de pagamento atempado das obrigações tributárias da autora que venham ainda a ser liquidadas pelas autoridades competentes.

Apenas contestou o réu Banco CC que, também em resumo, alegou que - a autora e o 1º R. combinaram, entre si, que os cheques sacados sobre e à ordem do Banco réu se destinavam a ser creditados na conta do 1º R. para que este, a partir da sua conta, procedesse diretamente ao pagamento das obrigações tributárias da autora; - este procedimento (confessado pelo 1º réu, em documento junto aos autos) foi seguido durante anos e anos, com total conhecimento e assentimento da autora, sem que esta alguma vez o tenha contestado, tanto mais que recebia mensalmente os extratos de conta que refletiam explicitamente os movimentos de débito e crédito dos ditos cheques; - em todo o caso, ao abrigo do disposto no artigo 38º da LUCH, nada obstava a que a 2ª ré depositasse os cheques de que era beneficiária na sua conta, ou na conta de terceiro, desde que este fosse seu cliente, como era o caso do 1º réu, podendo ainda transmiti-los por endosso, já que o Banco era simultaneamente sacado e beneficiário.

Proferido despacho saneador, fixada a matéria assente e elaborada a base instrutória, foi realizada audiência de discussão e julgamento.

Em 2013.07.19, foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente e, assim: - condenou o réu BB a pagar à autora a quantia de EUR 513.834,06, acrescida de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, desde a citação até integral pagamento, bem como o montante correspondente a juros de mora e multas que a autora tenha pago e venha a pagar a título de impostos que deveriam ter sido pagos pela autora, e não foram, no período compreendido entre 2000 e Abril de 2004, a liquidar posteriormente; - absolveu o réu BB do demais peticionado; - absolveu o "Banco CC, SA" do pedido.

A autora apelou, com parcial êxito, tendo a Relação de Lisboa, por acórdão de 2014.11.25, proferido a seguinte decisão: - revogar a sentença recorrida na parte em que, relativamente ao montante de EUR, 214.540,17 e respetivos juros, absolveu da instância o réu BB (subsistindo, quanto a este réu, e nos seus precisos termos, a sentença proferida a fIs. 1576 e seguintes. por, nessa parte, ter transitado em julgado); - revogar a sentença recorrida, na parte em que absolveu a 2ª ré do pedido e, consequentemente, em condenar a ré Banco CC, SA, solidariamente com o 1º réu, a pagar à autora a quantia, a liquidar posteriormente, correspondente à diferença entre o montante global dos cheques emitidos à ordem da ré e creditados na conta do 1º réu, entre Janeiro de 1993 e Abril de 2004, e o montante que, no aludido período, e relativo a "dívidas tributárias" da autora, foi efetivamente pago, com o limite do pedido concretamente formulado nesta ação; - no mais confirmar a sentença recorrida.

Inconformados, quer a autora, quer o réu Banco CC, deduziram as presentes revistas, apresentando as respetivas alegações e conclusões.

Cumpre decidir.

As questões Tendo em conta que - o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões nelas insertas, salvo as questões de conhecimento oficioso - arts. 684º, nº3 e 690º do Código de Processo Civil; - nos recursos se apreciam questões e não razões; - os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido são os seguintes os temas das questões propostas para resolução: A) – Responsabilidade civil do réu Banco CC B) – Liquidação C) – Juros de mora.

Os factos São os seguintes os factos que foram dados como provados nas instâncias:

  1. A autora é uma sociedade comercial que se dedica à produção e comercialização de próteses dentárias e faciais e à comercialização de produtos, equipamentos e materiais dentários, tendo iniciado a sua atividade em 1990. Alínea A) dos Factos Assentes B) De 1991 em diante, a gerência da autora foi exercida pela Sra. D." DD, de nacionalidade alemã, com base numa procuração que lhe foi conferida em...

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