Acórdão nº 336/09.5GGSTB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 03 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelRAUL BORGES
Data da Resolução03 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal singular com o n.º 336/09.5GGSTB, proveniente do 1.º Juízo Criminal de Setúbal, foi realizado na Vara de Competência Mista de Setúbal, o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido AA, nascido em ..., natural de ..., ..., trabalhador agrícola, residente na Rua ..., ..., ..., actualmente (e desde 10 de Março de 2010, conforme consta de fls. 680), em cumprimento de pena, no Estabelecimento Prisional do Montijo – fls. 687 e 711.

******* Foi realizada na Vara de Competência Mista de Setúbal a audiência a que alude o artigo 472.º do Código de Processo Penal, em 25 de Fevereiro de 2014, ut acta de fls. 688 do 3.º volume, na qual não esteve presente o arguido, porque dispensado pelo tribunal, tendo-se em vista a elaboração do cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas ao referido arguido, com exclusão de penas suspensas na sua execução, conforme declarado pela Exma. Juíza Presidente do Colectivo desde logo no despacho intercalar de fls. 538/9, ponto 4, e confirmado depois aquando do despacho de marcação de audiência de fls. 682/3.

******* Por acórdão do Tribunal Colectivo da Vara de Competência Mista de Setúbal, datado de 7 de Março de 2014, constante de fls. 692 a 699, e depositado no dia 10 seguinte, ut fls. 701, foi deliberado: «Efectuar o cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas ao arguido nestes autos e naqueles outros correspondentes aos processos acima numerados como 6 a 9 condenando-o: Na pena única de 5 (cinco) anos e 9 (nove) meses de prisão e 350 dias de multa, à taxa diária de 5 euros».

******* Inconformada com o assim deliberado, a Exma. Magistrada do Ministério Público no Círculo Judicial de Setúbal interpôs recurso dirigido ao Supremo Tribunal de Justiça, apresentando a motivação de fls. 727 a 736, que remata com as conclusões, que se transcrevem, na íntegra: 1ª – O douto acórdão recorrido condenou o arguido AA na pena única de 5 (cinco) anos e 9 (nove) meses de prisão e 350 dias de multa, resultante do cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas no P.C.S. nº 336/09.5GGSTB do 1º Juízo Criminal de Setúbal, no Procº Sumário nº 26/10.6GGSTB do 2º Juízo Criminal de Setúbal, no Procº Abreviado nº 309/09.8GGSTB do 1º Juízo Criminal de Setúbal, no Procº Sumário nº 6/10.1GTSTR do 1º Juízo de Benavente e no P.C.C. nº 12/09.9GCGDL do Juízo de Instância Criminal de Grândola; 2ª – A razão da discordância do Ministério Público relativamente ao acórdão sob recurso prende-se com o entendimento nele perfilhado quanto às penas parcelares a cumular juridicamente no âmbito destes autos, afigurando-se que deveria ter sido excluída do cúmulo a pena aplicada no Procº Sumário nº 6/10.1GTSTR do 1º Juízo de Benavente, devendo, ao invés, nele terem sido abrangidas as penas cominadas no Procº Sumário nº 5/10.3GDMTJ do 1º Juízo do Montijo, no P.C.S. nº 243/09.1GELSB do 3º Juízo do Montijo e no P.C.C. nº 29/09.3GDARL de Arraiolos; 3ª – A pena aplicada no Procº Sumário nº 6/10.1GTSTR do 1º Juízo de Benavente corresponde a crime fora da relação de concurso balizada pela primeira condenação transitada em julgado, porque praticado depois desse trânsito, ocorrido em 12 de Fevereiro de 2010 no Procº Sumário nº 5/10.3GDMTJ do 1º Juízo do Montijo; 4ª – Deste modo, ao incluir no cúmulo jurídico realizado nestes autos a pena parcelar aplicada no Procº Sumário nº 6/10.1GTSTR do 1º Juízo de Benavente, o acórdão recorrido violou a norma constante do nº 1 do artº 77º do C.P. (aplicável por força do nº 1 do artº 78º do mesmo compêndio normativo), efectuando a operação que a jurisprudência e a doutrina têm vindo a apelidar – banindo-a – de “cúmulo por arrastamento”; 5ª – Ao excluir do cúmulo jurídico realizado as penas de prisão efectiva aplicadas no Procº Sumário nº 5/10.3GDMTJ do 1º Juízo do Montijo e no P.C.S. nº 243/09.1GELSB do 3º Juízo do Montijo com o fundamento de que tais penas se mostram extintas pelo cumprimento, o acórdão recorrido violou a norma constante do nº 1 do artº 78º do C.P.; 6ª – Tendo o tribunal a quo interpretado e aplicado esta norma no sentido de não serem juridicamente cumuláveis penas de prisão efectiva ainda não integralmente cumpridas e penas de prisão efectiva já cumpridas ou extintas pelo cumprimento; 7ª – Quando a deveria ter interpretado e aplicado no sentido oposto, o único consentido pela sua letra – que, aliás, manda que, uma vez operado o cúmulo, se proceda oportunamente ao desconto, na pena única que venha a ser fixada, da pena que já tiver sido cumprida; 8ª – Ao excluir do cúmulo jurídico a pena de prisão suspensa na execução aplicada no P.C.C. nº 29/09.3GDARL de Arraiolos – cujo prazo ainda não decorreu – com o fundamento de que a suspensão ainda não foi revogada, o acórdão recorrido violou as disposições conjugadas dos nºs 1 e 3 do artº 77º e nº 1 do artº 78º do C.P.; 9ª – Tendo o tribunal a quo interpretado e aplicado as referidas normas no sentido de as penas suspensas na sua execução deverem ser excluídas da pena única decorrente de conhecimento superveniente do concurso de crimes; 10ª – Quando as deveria ter interpretado e aplicado no sentido de que essa pena unitária deve englobar todas as penas parcelares de prisão aplicadas aos crimes em relação de concurso, incluindo as originariamente suspensas na execução, desde que ainda não declaradas extintas nos termos do artº 57º nº 1 do C.P. e desde que não se tenha esgotado o período da suspensão sem decisão sobre a sua extinção; 11ª – Pelo exposto, são de cumular juridicamente no âmbito destes autos as penas parcelares aplicadas ao arguido nos seguintes processos: P.C.S. nº 336/09.5GGSTB do 1º Juízo Criminal de Setúbal, Procº Sumário nº 5/10.3GDMTJ do 1º Juízo do Montijo, P.C.S. nº 243/09.1GELSB do 3º Juízo do Montijo, P.C.C. nº 29/09.3GDARL de Arraiolos, Procº Sumário nº 26/10.6GGSTB do 2º Juízo Criminal de Setúbal, Procº Abreviado nº 309/09.8GGSTB do 1º Juízo Criminal de Setúbal e P.C.C. nº 12/09.9GCGDL do Juízo de Instância Criminal de Grândola.

Termina pedindo a revogação do acórdão recorrido e sua substituição por outro que proceda ao cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas ao arguido nos processos identificados.

******* O recurso foi admitido por despacho de fls. 737 e verso, tendo sido entendido ser o Tribunal da Relação de Évora o competente para apreciação do recurso, sendo ordenada a remessa para tal Tribunal.

******* Não foi apresentada resposta pelo arguido.

******* No Tribunal da Relação de Évora, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, a fls. 750 a 752, do 4.º volume, suscitou a questão prévia da competência, opinando no sentido de a competência para a apreciação do presente recurso pertencer ao Supremo Tribunal de Justiça, e caso assim se não entendesse, sufragava por completo a fundamentação do recurso, devendo o acórdão recorrido ser revogado e substituído por outro que contemple as pretensões manifestadas no recurso.

Por decisão sumária do Exmo. Desembargador Relator de 28-10-2014, a fls.756/760, foi julgada verificada a excepção da incompetência material do Tribunal da Relação de Évora para conhecimento do recurso, cuja competência cabe exclusivamente ao Supremo Tribunal, ordenando-se a remessa dos autos para este Supremo Tribunal de Justiça, por ser o competente para dele conhecer.

******* A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo Tribunal, no visto a que alude o artigo 416.º do CPP, emitiu douto parecer, constante de fls. 765 a 788 verso, começando por defender a nulidade do acórdão recorrido.

“O acórdão recorrido revela-se omisso na descrição dos comportamentos do condenado integradores dos crimes em concurso, bem como das respectivas circunstâncias envolventes ¾ indispensáveis para permitir uma avaliação do “ilícito global”, essencial para uma correcta determinação da pena única.

Como é sabido, na determinação da medida da pena do concurso é essencial a consideração da globalidade dos factos, na sua interligação e tipo de conexão entre si, em ordem ao apuramento da gravidade do ilícito global, e da personalidade “estrutural” do agente naqueles revelada, para se poder concluir pela presença de uma personalidade propensa ao crime ou, inversamente, de pluriocasionalidade não radicada nessa personalidade.

Ora, sendo o acórdão recorrido omisso na descrição dos comportamentos do condenado integradores dos crimes em concurso, bem como das respectivas circunstâncias envolventes, não permite que se alcance um juízo sobre o “ilícito global”, sendo certo que, e como este Supremo Tribunal vem repetidamente afirmando, a decisão que imponha uma pena única «deve bastar-se a si mesma no que respeite aos elementos de facto relevantes para a integração dos pressupostos de determinação da pena única» (citando-se aqui o acórdão de 31/10/2012, processo n.º 207/12.8TCLSB).

Deste modo, o acórdão recorrido revela-se nulo, ao abrigo da norma do artigo 379.º, n.º 1, alínea a) do CPP”.

De seguida, afirma: “Pelos fundamentos que invoca, assiste razão ao Magistrado recorrente quando alega violação das normas dos artigos 77.º e 78.º do CP, insurgindo-se pelo facto de o Tribunal Colectivo ter incluído no cúmulo jurídico a pena aplicada no processo n.º 6/10.1GTSTR e não ter integrado no mesmo as penas impostas nos processos n.ºs 5/10.3GDMTJ e 243/09.1GELSB”.

Relativamente à não inclusão no presente cúmulo jurídico da pena não privativa de liberdade imposta no processo n.º 29/09.3GDARL, cuja execução não podia ainda ser efectivada por estar em execução a pena de substituição prevista no artigo 50.º, n.º 1, do CP, a Exma. PGA entende que bem andou o acórdão recorrido, espraiando longa fundamentação de fls. 766 a 788 verso, suscitando várias questões, inclusive, as colocadas pelas alterações legislativas verificadas em 1995 e 2007.

******* Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, o recorrente silenciou.

******* Não tendo sido requerida audiência de julgamento, o processo prossegue com julgamento em conferência, nos termos do artigo 411.º, n.º...

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