Acórdão nº 3309/08.1TJVNF.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução16 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. 3309/08.1TJVNF.G1.S1.

R-499[1] Revista Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, intentou, em 10.10.2008, nos Juízos de Competência Cível, da comarca de Vila Nova de Famalicão, acção declarativa de condenação com processo ordinário, contra: BB e mulher CC.

Pedindo que sejam os Réus condenados: a) A pagar ao autor a quantia de € 10.872,29 a título de lucros cessantes, a que acresce o respectivo IVA à taxa de 21%; b) A pagar ao autor a quantia de € 36.240,99 a título de remuneração pelos serviços prestados, a que acresce o respectivo IVA à taxa de 21%; c) A pagar ao autor a quantia de € 11.312,74 relativa à execução dos trabalhos a mais, a que acresce IVA à taxa de 21%; d) E a pagar ao autor a quantia de € 10.000,00 a título de danos morais; e) A pagar ao autor os juros legais à taxa de 11,07% ao ano, contados sobre as quantias acima mencionadas e desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

Para tanto alega que, no exercício da sua actividade e a solicitação dos réus, realizou trabalhos de construção civil que os réus não pagaram na sua totalidade. Além disso, proibiram a entrada dos trabalhadores do autor na obra, acabando por contratar outro empreiteiro.

Devidamente citados, os réus contestaram, impugnando a matéria invocada pelo autor, concluindo pelo incumprimento contratual deste.

Deduziram pedido reconvencional de condenação do autor a indemnizá-los pelos prejuízos decorrentes desse incumprimento, no montante de €115.644,44 e respectivos juros de mora.

Replicou o autor, impugnando a matéria invocada pelos réus, bem como a reconvenção e, terminando com uma ampliação do pedido, para que estes sejam ainda condenados no pagamento de € 39.300,00, respeitante a 393 dias de atraso entre a data em que a obra devia ter ficado concluída e a data em que os réus desistiram da empreitada.

Ainda treplicaram os réus, terminando como na contestação/reconvenção.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância de todos os formalismos legalmente prescritos, sendo que, no seu início, face à declaração de insolvência do autor, julgou-se extinta a instância reconvencional por inutilidade superveniente da lide.

*** A final, veio a ser proferida sentença que, julgando improcedente a acção, absolveu os Réus do pedido.

*** Inconformado, recorreu a Massa Insolvente do Autor, , para o Tribunal da Relação de Guimarães que, por Acórdão de 15.1.2015 – fls. 454 a 475 –, julgou improcedente a apelação e, embora por fundamento diverso, confirmou a sentença recorrida.

*** De novo inconformada a Massa Insolvente recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça, e alegando, formulou as seguintes conclusões: 1. Vem o presente Recurso interposto da douta decisão do Tribunal da Relação de Guimarães que julgou improcedente o recurso de apelação apresentado pelo ora Recorrente, ainda que por fundamentos diversos dos sufragados pela douta sentença do Tribunal da 1ª Instância, e, em consequência, absolveu os ora Recorridos de todos os pedidos contra si deduzidos.

2. O presente recurso é admissível uma vez que a fundamentação utilizada pelo Tribunal da Relação é essencialmente diferente da adoptada pelo Tribunal da 1ª Instância — cfr. artigo 671.°, n°3, a contrario do Código de Processo Civil.

3. Não pode o Recorrente conformar-se com o teor da douta decisão do Tribunal da Relação de Guimarães por ser sua firme convicção que com base na matéria de facto dada como provada entende o Recorrente que foi erroneamente aplicado o direito aos factos.

4. Entende o Recorrente que o acórdão recorrido viola a lei substantiva e aplica erradamente a lei de processo.

5. O acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães derrogou em parte a decisão preferida pelo tribunal da lª Instância, considerando que não se verificou qualquer abandono da obra por parte do ora Recorrente, mantendo, no entanto, o sentido da decisão proferida.

6. Sufragando o entendimento de que ao presente caso se aplica o instituto da excepção de não cumprimento.

7. Entende o Recorrente que o Tribunal da Relação não podia ter decidido como decidiu.

8. Desde logo, a excepção de não cumprimento é um instituto que carece de ser invocado e, nos presentes autos, os Réus/Recorridos em momento algum o fizeram, sendo que o próprio aresto recorrido apercebe-se de tal facto quando sente a necessidade de afirmar que “Parece resultar dos autos que os réus pretendem prevalecer-se deste instituto, para não pagar à Autora parte do preço por esta reclamado”.

9. A jurisprudência é unânime no sentido de que a excepção de não cumprimento não é de conhecimento oficioso e de que cabe à parte a quem seja exigido o cumprimento da obrigação o dever de a invocar — neste sentido cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.11.2009, proferido no âmbito do processo n°674/02.STJVNF.S1, Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28.02.2008, proferido no âmbito do processo n° 4820/2007-2, Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 29.01.2013, proferido no âmbito do processo n°17498/11.4YIPRT.Cl.

10. Outro entendimento seria intolerável para os princípios da certeza e segurança jurídicas, bem como para o princípio do contraditório.

11. Resulta da matéria de facto dada como provada (a contrario) que os Recorridos nunca interpelaram o Recorrente para o cumprimento.

12. Mas mesmo que tal interpelação tivesse ocorrido, sempre os Recorridos teriam de invocar e demonstrar nos presentes autos estarem preenchidos os demais pressupostos de que depende o instituto da excepção de não cumprimento, o que não fizeram.

13. Pelo que o douto Tribunal Recorrido não podia ter decidido como decidiu. Acresce que, 14. Como resulta da matéria provada, os Recorridos obrigaram-se a pagar o preço acordado nas datas indicadas na alínea i) da matéria assente.

15. As partes convencionaram que o preço seria pago naquelas datas, não fazendo qualquer referência ao estado em que a obra se deveria encontrar.

16. A exceptio non rite adimpleti contractus apenas pode exercida após o credor ter exigido o cumprimento, a substituição da prestação, a sua realização de novo, a redução do preço ou o pagamento de uma indemnização pelos danos circa rem.

17. Nada disto foi feito pelos Recorridos antes das datas em que os pagamentos deveriam ocorrer.

18. Ora, a excepção não pode ser invocada pelo contraente que primeiro deva cumprir — cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 10.12.2009, preferido no âmbito do processo no 163/O2.OTBVCD.S1.

19. Pelo que não se verificam os requisitos de que depende a aplicação deste instituto.

Mais, 20. Ficou também demonstrado que, sem interpelarem o ora Recorrente para o cumprimento do contrato, os Recorridos contrataram uma terceira entidade que levou a cabo a prestação contratada com o Recorrente.

21. Desse modo impossibilitando o Recorrente de cumprir com a sua obrigação.

22. E desse modo incumprindo definitivamente o contrato celebrado.

Por outro lado, 23. A consequência prática retirada da aplicação (errónea) daquele instituto foi, também ela, errada.

24. A excepção de não cumprimento não determina a extinção do direito, apenas o paralisa temporariamente.

25. Não destrói o vínculo contratual, apenas suspende temporariamente os seus efeitos — cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26.04.2009, proferido no âmbito do processo n° 09B0212.

26. Ora, nos presentes autos temos que o Recorrente não abandonou a obra e que a extinção do contrato de empreitada não ocorreu por sua iniciativa, não lhe tendo sido permitido terminar a sua prestação, como largamente se discorreu em sede de petição inicial e réplica — cfr. documentos juntos com a réplica e que constam das alíneas n), o) p) e q) da matéria assente.

27. Uma vez que os Recorridos não interpelaram o Recorrente para cumprir, uma eventual mora nunca se transformou em incumprimento definitivo.

28. Consequentemente, não se encontravam preenchidos os pressupostos para que os Recorridos procedessem à resolução do contrato de empreitada.

29. Inexistiu por parte dos Recorridos um acto de resolução do contrato de empreitada.

30. Dos dados que constam dos autos, verifica-se um reiterado incumprimento das obrigações a cargo dos Recorridos.

31. Não estando demonstrado o incumprimento definitivo por parte do Recorrente, não podia o Tribunal Recorrido legitimar o incumprimento dos Recorridos com o instituto da excepção de não cumprimento.

32. Nos presentes autos temos que o incumprimento definitivo e culposo ocorreu, isso sim, quando os Recorridos contrataram uma terceira entidade para terminar a prestação contratada com o Recorrente — cfr. quesitos 42°, 43° e 44°.

33. Desse modo impossibilitando definitivamente o Recorrente de cumprir com a sua prestação.

34. Pelo que estamos perante um incumprimento contratual culposo, imputável aos Recorridos.

35. Nestes termos, outra não poderia ser a decisão, que não a condenação dos Recorridos nos termos peticionados, 36. A decisão deverá, assim, ser revogada porque viola os artigos 342.°, 406.°,428.°, 801.°, 804.° e 808.° do Código Civil.

Nestes termos e nos melhores de direito deve o acórdão recorrido ser revogado, julgando-se procedente por provado o presente recurso.

Os recorridos contra-alegaram, pugnando pela confirmação do Acórdão.

*** Colhidos os vistos legais cumpre decidir, tendo em conta que a Relação considerou provados os seguintes factos: Dos factos assentes: a) O autor é empresário da construção civil.

b) Os réus são donos e legítimos possuidores de uma moradia sita na Travessa ..., freguesia ..., deste concelho e comarca.

c) No início do ano de 2003, o autor foi contactado pelo réu marido, como dono da obra, propondo-lhe a celebração de um contrato de empreitada para a construção da moradia referida no item anterior.

d) Pelo que em 14.08.2003 foi celebrado, entre autor e réu, o aludido contrato.

e) Consistia o objecto desse contrato na construção de uma casa de habitação na Travessa ..., freguesia ..., deste concelho e...

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