Acórdão nº 1149/06.1TAOLH-A.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Junho de 2015

Magistrado ResponsávelJOÃO SILVA MIGUEL
Data da Resolução17 de Junho de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência na 3.ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1. No processo comum acima identificado, com intervenção de tribunal singular, que correu termos no 2.º Juízo, 2.ª Secção, do Tribunal Criminal de Lisboa, o arguido AA, invocando o disposto no artigo 625.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), requereu que fosse dada sem efeito a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, transitada em julgado em 24 de outubro de 2012, e que o condenou pela prática, em 7 de fevereiro de 2005, de um crime de usurpação de funções, p. e p. pelo artigo 358.°, alínea b), do Código Penal (CP), na pena de 120 dias de multa à taxa diária de 8€.

Desatendida a pretensão, dela interpôs recurso para o tribunal da relação de Lisboa que, por acórdão de 1 de julho de 2014, negou provimento ao recurso e confirmou o despacho recorrido.

Inconformado, voltou a recorrer, agora para este Supremo Tribunal, que, pelo acórdão de 22 de abril pp, rejeitou o recurso, por não ser admissível, nos termos dos artigos 414.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, alínea b), com referência aos artigos 432.º, n.º 1, alínea b), e 400.º, n.º 1, alínea c), todos do Código de Processo Penal (CPP).

Notificado do acórdão, veio, em tempo e invocando o disposto no artigo 616.º, n.º 2, alínea a), do CPC, aplicável por força do artigo 4.º do CPP, requerer a «reforma do acórdão de 22/04/2015 e, consequentemente, admitido o recurso de ofensa de caso julgado, com as legais consequência», ou, «[q]uando assim se não entenda, [d]eve o acórdão de 22/04/2015 ser considerado nulo por omissão de pronúncia e, consequentemente, admitido o recurso interposto, com as legais consequências», finalmente, «[q]uando assim não se entenda, [d]eve[m] julgar-se inconstitucionais as normas dos artigos 414.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, alínea b), com referência aos artigos 432.º, n.º 1, alínea b), e 400.º, n.º 1, alínea c), todos do Código de Processo Penal, na interpretação dada no acórdão que se pede reforma, ou seja, que não admite recurso o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que julgou improcedente a excepção de caso julgado, por violação do artigo 32.º, n.º 1 da Constituição da República e artigo 629.º, n.º 2, alínea a) do Código de Processo Civil.» Em abono dos seus pedidos argumenta, quanto à reforma do acórdão, nos termos que se transcrevem: «a) Proferida a decisão, e, em consequência, esgotado o poder jurisdicional do julgador é lícita - para além da aclaração, do suprimento de nulidades e da reforma quanto a custas e multa - a sua rectificação ou a sua reforma.

b) A rectificação pressupõe um erro material, a reforma um lapso manifesto, aquele não comprometendo o mérito e esta tendo o perfil substancial do recurso por implicar uma reapreciação do julgado.

c) Há erro material quando se verifica inexactidão na expressão da vontade do julgador, por lapso notório, sendo que a divergência entre a vontade real e a declarada não deve suscitar fundadas dúvidas, antes ser patente, através de outros elementos da decisão, ou, até, do processo. É o equivalente ao erro-obstáculo tratado no direito substantivo.

d) Não ocorrendo erro material mas lapso manifesto na determinação da norma aplicável ou na desconsideração de documentos ou de outros elementos constantes do processo, o incidente de reapreciação desse segmento do julgado é a reforma da decisão.

e) Como faculdade excepcional que é, deve conter-se nos apertados limites definidos pela expressão "manifesto lapso", reportada à determinação da norma aplicável, à qualificação jurídica dos factos ou à desconsideração de elementos de prova conducentes a solução diversa.

f) O lapso manifesto tem a ver com uma flagrantemente errada interpretação de preceitos legais (não por opção por discutível corrente doutrinária ou jurisprudencial) podendo, no limite, ter na base o desconhecimento.

Do exposto, bem demonstrado fica, que o douto Tribunal, por erro resultante de lapso manifesto, quer na determinação da norma, quer na subsunção dos factos, quer na preterição de elementos probatórios já constantes dos autos (certidões das sentenças transitadas em julgadas), decidiu rejeitar o recurso, ignorando a excepção à regra de que deverá ser sempre admitido para o STJ o recurso de decisão da Relação, quando o respectivo fundamento for a ofensa ou violação do caso julgado, por aplicação subsidiária das regras do processo civil (629.º, n.º 2, alínea a) do CPC) por força do artigo 4.º do Código de Processo Penal.» Sobre a alegada nulidade, advoga o seguinte: «O vício processual de omissão de pronúncia reconduz-se a uma ausência de emissão de um juízo apreciativo sobre uma questão processual ou de direito material¬substantivo que os sujeitos tenham, expressamente, suscitado ou posto em equação perante o tribunal e que este, em homenagem ao princípio do dever de cognoscibilidade, deva tomar conhecimento. O tribunal tem por obrigação emitir um juízo de apreciação e valoração sobre todas as questões que os sujeitos processuais reputem pertinentes para a decisão de um pleito que submetam à sua decisão.

Independentemente da bondade ou inocuidade das questões, sob o ponto de vista jurídico, e da sua atinência ou não para a solução do conflito que é mister o tribunal ter que decidir, exige a lei que o tribunal emita pronúncia sobre todas elas, formulando um juízo de apreciação jurídico e de valoração para o objecto do processo ou para a resolução da questão material controvertida […].

Como se lê no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.03.2007, proferido no processo n.º 06P3188, "A nulidade resultante de omissão de pronúncia, prevista na primeira parte da al. c) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP, verifica-se quando o tribunal deixa de pronunciar-se sobre questão que devia apreciar".

Ora, como se disse e os autos ilustram, o douto tribunal não se pronunciou sobre a questão da admissibilidade do recurso por ofensa de caso julgado, alegada pelo recorrente no seu requerimento de interposição de recurso.

Ou seja, o tribunal omitiu claramente os fundamentos de facto e de direito invocados pelo recorrente no seu requerimento de interposição de recurso e que suportavam a admissibilidade do recurso.

Assim sendo, e sem mais considerandos por desnecessários, é nulo o acórdão de 22/04/2015, por omissão de pronúncia, por violação da alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º do Código de Processo Penal.» Por último, sobre o pedido de inconstitucionalidade de normas, alega, em síntese, que: «O douto tribunal ao rejeitar o recurso interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, que julgou improcedente a excepção de caso julgado, com o fundamento que o mesmo é inadmissível, fez uma interpretação dos artigos 414.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, alínea b), com referência aos artigos 432.º, n.º 1, alínea b), e 400.º, n.º 1, alínea c), todos do Código de Processo Penal, contrária aos princípios consignados no artigo 32.º, n.º 1 da CRP, que assegura a todos as garantias de defesa, incluindo o recurso.» 4. Da resposta do Ministério Público, retiram-se os excertos seguintes da pronúncia da Senhora Procuradora-Geral Adjunta: «(…) o Acórdão reclamado não carece de qualquer reforma, porquanto o mesmo se mostra claro, sem obscuridades ou lacunas e rejeita liminarmente o recurso interposto pelo arguido recorrente por uma questão prévia, que, prévia como é, impede que se conheça do fundo da questão, como pretende o ora reclamante.

A argumentação não belisca, porque estranha à fundamentação, a decisão constantes do Acórdão do STJ, ora reclamada.

O recurso foi rejeitado liminarmente, por inadmissível nos termos dos arts. 414.º, n.º 2, e 420.º, n.º 1, aI. b) e 400.º, n.º 1, aI. c), todos do C.P.P.

Tendo sido...

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