Acórdão nº 535//11.0TYVNG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Outubro de 2015
Magistrado Responsável | ABRANTES GERALDES |
Data da Resolução | 29 de Outubro de 2015 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
I - AA, na qualidade de sócio da Sociedade Comercial BB, Lda, instaurou acção declarativa contra CC, pedindo a sua condenação no pagamento à referida Sociedade da quantia de € 38.250,00, com juros de mora desde 2-4-09.
Requerendo simultaneamente a intervenção principal activa da aludida Sociedade, o A. alegou que a R., na condição de sócia-gerente da Sociedade, sacou um cheque de € 38.250,00, à ordem do A., o qual acabou por ser embolsado pela R. em violação das suas obrigações de gerente.
A R. contestou e alegou que o A. autorizou a entrega à R. da quantia de € 38.250,00 a título de rendas que eram devidas pela sociedade pela ocupação de imóveis que pertenciam a ambos, o que foi mutuamente ponderado no âmbito de partilha de bens comuns que o casal se encontrava a fazer no âmbito do processo de divórcio.
O R. replicou.
Procedeu-se ao julgamento e foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a R. do pedido.
O A. apelou e a Relação julgou a acção totalmente procedente, condenando a R. a pagar à sociedade interveniente a quantia de € 38.250,00, com juros de mora desde 2-4-09.
A R. interpôs recurso de revista, tendo sido ordenada a remessa dos autos à Relação para apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto.
A Relação manteve em novo acórdão o resultado anteriormente declarado.
Foi interposto novo recurso de revista em que a R. alegou essencialmente que não se verificam os pressupostos da responsabilidade civil e que, além disso, a acção é reflexo de uma actuação do A. em abuso de direito.
O A. contra-alegou.
Cumpre decidir.
II - Factos provados: 1. A Sociedade interveniente BB, Ldª, tem por objecto social a indústria, comércio, importação e exportação de móveis, decorações e similares, encontrando-se registada na CRC de Gondomar – A); 2. O capital social da mesma Sociedade é de € 498.797,89, dividido em duas quotas, estando a de € 374.098,42 registada a favor do A. e a de € 124.699,47 a favor da R. – B); 3. A gerência da Sociedade é actualmente composta pelo A. e pela R. e ainda por DD e EE – C); 4. Consta a fls. 19 cópia do cheque 53…, com data de 31-3-09, no valor de € 38.250,00, emitido à ordem do A. e sacado sobre a conta bancária …, do Banco FF, SA, da qual a Sociedade é titular – D); 5. O cheque referido em 4.
foi preenchido e assinado pela R. na qualidade de gerente da Soc. BB, Lda (1º) 6. Em 2-4-09 o cheque foi depositado pela R. na conta bancária 32…, domiciliada no Banco GG, S.A., conta essa titulada pela R. e por HH – E); 7. A R. apropriou-se da quantia inscrita no cheque (2º).
III – Decidindo: 1.
Está em causa apurar se a matéria de facto apurada revela todos os pressupostos da responsabilidade civil do sócio gerente, mais concretamente se nesta acção sub-rogatória instaurada por um dos sócios-gerentes da sociedade contra outro sócio-gerente se verificam os requisitos da ilicitude do comportamento da R. e do dano da esfera jurídica da Soc. BB, Ldª. Apenas em termos subsidiários importará reflectir sobre o comportamento do A. integrado na figura do abuso de direito, nos termos do art. 334º do CC.
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O A., na qualidade de sócio da Soc. BB, Ldª, demanda a R., como sócia-gerente da mesma Sociedade, a fim de obter a sua condenação no pagamento, a favor da Sociedade, de uma quantia de que alegadamente se apropriou de forma indevida.
Estamos perante uma acção de natureza sub-rogatória, na medida em que o interessado directo na sua procedência não é o próprio A., antes a Soc. BB, Ldª. A legitimidade do A. emerge do facto de ser titular de uma participação superior a 5% do respectivo capital social (art. 77º, nº 1, do CSC). Na eventualidade da procedência da acção, o interesse que daí advirá para o A. é de natureza reflexa ou mediata, na medida em que venha a ser efectivamente reintegrado o património da sociedade com a devolução do quantitativo de que a R. alegadamente se apropriou.
A lei prevê para tal acção de responsabilidade civil sub-rogatória diversas especificidades que encontram justificação na natureza e no modo de funcionamento das sociedades comerciais, nos termos previstos nos arts. 72º e 77º do CSC. Mas para o caso concreto apenas revela pertinência a que decorre do nº 1 do art. 72º, nos termos do qual, apurada a ilicitude da conduta do gerente, é de presumir a sua culpa.
Por conseguinte, para que a presente acção possa proceder é necessário que a matéria de facto revele todos os pressupostos da responsabilidade civil, com excepção da culpa.
Entre tais requisitos destaca-se, com interesse para o caso...
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