Acórdão nº 1584/13.9JAPRT.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelISABEL PAIS MARTINS
Data da Resolução29 de Outubro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça I 1.

No processo comum, com intervenção do tribunal do júri, n.º 1584/13.9JAPRT, da secção criminal, instância central, J 2, da Comarca de Viseu, por acórdão de 24/10/2014, foi decidido, no que respeita à acção penal, condenar o arguido AA, nascido a ...., ...., residente em ..., no mais devidamente identificado nos autos, actualmente preventivamente preso à ordem do processo, pela prática: – de um crime de homicídio agravado, previsto e punido pelos artigos 131.º, do Código Penal, e 86.º, n.º 3, por referência aos artigos 2.º, n.º 1, alínea x), 3.º, n.º 2, alínea l) e 3º, n.º 2, alínea q), do Regime Jurídico das Armas e Munições, aprovado pela Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de 15 anos de prisão; – de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artigo 86º, n.º 1, alínea c), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, por referência aos artigos 2º, n.º 1, alínea x), 3º, n.º 2, alínea l) e 3º, n.º 2, alínea q), do mesmo diploma legal, na pena de 2 anos de prisão.

E, em cúmulo jurídico dessas penas, na pena única de 15 anos e 6 meses de prisão.

  1. Na sequência de recurso interposto para a relação, veio o Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão de 15/04/2015, a conceder parcial provimento ao recurso e condenar o arguido: – pela prática de um crime de homicídio agravado, previsto e punido pelos artigos 131.º, do Código Penal, e 86.º, n.º 3, por referência aos artigos 2.º, n.º 1, alínea x), 3º, n.º 2, alínea l), e 3.º, n.º 2, alínea q), do Regime Jurídico das Armas e Munições, aprovado pela Lei 5/2006, de 23 de Fevereiro, na pena de 13 anos de prisão; – e, operando o cúmulo jurídico dessa pena, com a pena de 2 anos de prisão, em que o arguido foi condenado, pela prática de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punido pelo artigo 86.º, n.º 1, alínea c), da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, por referência aos artigos 2º, n.º 1, alínea x), 3.º, n.º 2, alínea l), e 3º, n.º 2, alínea q), do mesmo diploma legal, na pena única conjunta de 13 anos e 6 meses de prisão.

  2. Ainda inconformado, o arguido AA interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, formulando as seguintes conclusões: «1.º «Deve, nesta instância, reconhecer-se que não foram cumpridas as formalidades legais quer durante o inquérito e que na fase da instrução e, por isso, violados os arts. 61.º e 286 e ss do CPP; «2.º «Deve reconhecer-se que o arguido tem o direito de requerer diligências em todas as fases do processo e que, por lhe terem sido denegadas e não terem sido feitas se violou a letra e espírito dos arts. 20.º e 32.º da Constituição da Republica Portuguesa; «3.º «Deve o arguido ser absolvido do crime de homicídio agravado pelo qual foi condenado, pelo que se fez incorrecta leitura e interpretação dos artigos 131.º e 86.º, n.º 3, ambos do Código Penal; «4.º «Deve o autor ser condenado por homicídio simples p e p pelo artº.131.º e mesmo no seu nível mais baixo (oito anos) ser especialmente reduzido pelas circunstâncias atenuantes: álcool, ameaças de morte, crimes de ofensas corporais, furtos e insultos: corno, chulo, merda, sujo, porco e ameaças de morte com a barra de ferro, etc.

    «5.º «A matéria factual ou factos dados como provados implicam e justificam uma outra decisão ou sentença, pelo que se violaram as als. b) e c) do n.º 1 do art.º 615.º do Código do Processo Civil, pelo que a sentença é nula e ainda o art.º 70.º do Código Penal.» 4.

    Foi proferido despacho a admitir o recurso.

  3. O Ministério Público respondeu ao recurso, no sentido de o mesmo não merecer provimento.

  4. Remetidos os autos a esta instância, na oportunidade conferida pelo artigo 416.º, n.º 1, do Código de Processo Penal Daqui em diante abreviadamente designado pelas iniciais CPP., o Exm.º Procurador-geral-adjunta foi de parecer de que o recurso deve ser rejeitado quanto às questões da omissão de diligências em inquérito e em instrução e da agravação do homicídio e que não merece provimento quanto à questão da medida da pena.

  5. Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2, do CPP, nada chegou ao processo.

  6. Não tendo sido requerida a realização da audiência (artigo 411.º, n.º 5, do CPP) e não sendo caso de julgar o recurso por decisão sumária, foi o julgamento do recurso remetido para a conferência (artigo 419.º, n.º 3, alínea c), do CPP).

    Colhidos os vistos, com projecto de acórdão, realizou-se a conferência, da mesma procedendo o presente acórdão.

    II 1. Os factos que se devem ter por definitivamente assentes Pelo acórdão recorrido foi julgado improcedente o recurso do arguido, na vertente da impugnação da decisão proferida sobre matéria de facto, por erro de julgamento, em termos amplos, e em razão dos vícios do n.º 2 do artigo 410.º do CPP, dando-se como definitivamente assente a matéria de facto dada por provada na 1.ª instância, na qual não se detecta qualquer vício de que deva oficiosamente conhecer-se.

    É a seguinte: «1- O arguido AA e a vítima Vítor Alves Barreiros Pinto conheciam-se há cerca de dois anos e estavam à data dos factos desavindos em virtude de uma alegada dívida do arguido João para com o Vítor Pinto por trabalhos agrícolas por este realizados para o arguido e que não lhe foram pagos.

    «2- Assim, no dia 4 de Agosto de 2013, cerca das 21H30M, o arguido dirigiu-se na companhia de Camilo Cardoso ao café "Central", sito na Barragem de Vilar, Moimenta da Beira, sendo que naquele local também lá se encontrava Vítor Alves Barreiros Pinto.

    «3- Já no interior do café, Vítor Pinto abordou o arguido pedindo-lhe que lhe pagasse o que devia iniciando-se assim uma discussão entre ambos, na qual foi também interveniente Camilo Cardoso.

    «4- Depois de terem sido convidados a abandonar o local pelo proprietário, o Vítor Pinto deslocou-se para o exterior do estabelecimento e logo de seguida saíram também do café o arguido e o Camilo Cardoso, sendo estes encaminhados por Adão de Jesus Ferreira, dono do café, até ao veículo do arguido que se encontrava estacionado à porta.

    «5- Nessa altura, sem que nada o fizesse prever e quando se encontrava a menos de dois metros de Vítor Pinto, o arguido tirou do interior de uma bolsa azul que transportava à cintura uma pistola transformada de calibre 6,35mm e efectuou, de forma voluntária, dois disparos em direcção ao peito de Vítor Pinto.

    «6- Em consequência directa e necessária dos disparos acima mencionados, Vítor Alves Barreiros Pinto sofreu as lesões descritas no relatório de autópsia médico-legal junto aos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, designadamente: «- " duas feridas perfurantes no Tórax: o primeiro orifício arredondado / ovalado com 8 por 5 cm e orla de contusão com 17 por 10 cm, localizada abaixo do terço distal da clavícula esquerda com 13 cm e a 24 cm do apêndice xifoide e sobre o 3.º espaço intercostal e a 132 cm dos pés e a 6 cm da axila; o segundo orifício a 128 cm dos pés, a 14 cm do terço distal da clavícula e a 4,5 cm do anterior a 19 cm do apêndice xifóide, sobre o 4.º espaço intercostal esquerda a 8 cm da axila, com 0,8 por 0,6 cm arredondada/ovalada e com orla de contusão de 20 por 14 mm, a intercetar o terço anterior da 4.ª costela.

    «- duas feridas perfurantes do ventrículo esquerdo; «- perfuração da aorta torácica ao nível da D9; «- perfuração do lobo superior do pulmão esquerdo a dois níveis”.

    «8 Observa-se a numeração que consta do acórdão recorrido.- De acordo com o relatório de autópsia o trajecto seguido pelos projécteis foi da frente para trás, da esquerda para a direita e de cima para baixo e foram encontrados sinais de disparo a curta distância.

    «9- Após os disparos o arguido foi de imediato manietado e desarmado pelos populares que se encontravam no local, tendo sido entregue às autoridades.

    «10- Nas mesmas circunstâncias de tempo, modo e lugar, o arguido AA detinha na sua posse a referida arma de fogo transformada tendo por base uma arma de alarme da marca "Rech", 8 mm, posteriormente transformada em arma de fogo, capaz de disparar munições de calibre 6,35mm, com o respectivo carregador.

    «11- O arguido tinha ainda na sua posse três munições de arma de fogo, de calibre 6,35 mm, que continham todos os componentes e estavam em condições de serem disparadas em arma de fogo de calibre compatível.

    «12- Ao agir da forma descrita, o arguido José João Vieira de Azevedo actuou de forma livre, consciente e deliberada, movido pelo propósito e intenção, que realizou integralmente, de tirar a vida a Vítor Alves Barreiros Pinto. «13- O arguido tinha perfeito conhecimento e consciência de que, ao efectuar dois disparos à distância de menos de um metro, em direcção ao peito da vítima, obteria a morte daquele, como pretendia.

    «14- O arguido conhecia ainda as características da arma e das munições que detinha e bem assim que a sua detenção ou uso nessas condições eram proibidas e punidas por lei.

    «15- O arguido agiu livre, voluntaria e conscientemente, bem sabendo que todas as suas descritas condutas eram proibidas e punidas por lei e o faziam incorrer em responsabilidade criminal.

    «16- O falecido Vítor Pinto veio para Baldos para trabalhar nas propriedades de Lídia Sousa, da qual o arguido era procurador, designadamente com poderes para administrar os seus prédios.

    «17- O falecido Vítor Pinto era temido pela generalidade das pessoas em Baldos, onde era conflituoso e agressivo.

    «18- O falecido Vítor Pinto dirigia-se ao arguido como “cornudo”, porco”, “sujo”, “merda”, “chulo”, “palhaço de merda”, “cobarde”, “canalha”, “garoto”, “filho da puta”, “corno”, “ladrão”, “gatuno”, “doido”, “que devia estar num...

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