Acórdão nº 3886/07.4TVLSB.L2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Outubro de 2015

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução22 de Outubro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA - Instituição Financeira de Crédito, S.A.. intentou contra BB - Comércio de Medeiras, Ldª acção declarativa, com processo comum ordinário, pedindo que a mesma seja julgada procedente por provada e, em consequência, decretada a resolução do contrato de locação financeira n.° 30018996 e determinado o cancelamento do registo de locação financeira junto da Conservatória do Registo de Automóveis de Lisboa que incide sobre o tractor John Deere, modelo 6620SE com a matrícula …-BC-....

Alega que, por contrato de locação financeira, deu em locação à ré, entre outros, o referido tractor, obrigando-se a adquiri-lo ao fornecedor escolhido e indicado pela ré.

O identificado tractor foi adquirido e pago pela autora ao fornecedor CC - Comércio de Peças e Reparações de Veículos, Ldª, assim como os restantes bens locados, pelo preço de € 55.938,00 acrescido de IVA -estando a propriedade do referido tractor registada, assim como a locação financeira do mesmo.

Adianta ainda que se obrigou a ceder à ré o gozo e a fruição de tal tractor, o que fez, enquanto a ré assumiu a obrigação de pagar à autora as rendas contratadas, mensal e sucessivamente, num total de 36, sendo a 1ª renda no valor de € 27.309,00 e as restantes de € 2.415,79 cada, acrescidas de IVA , Ora a ré deixou de pagar as rendas com datas de vencimento em 24.04.2006 e 24.05.2006, no valor cada de € 2.715,31.

Perante tal situação, sustenta a autora ter enviado à ré carta registada com a/r, interpelando-a para o cumprimento pontual das obrigações contratualmente assumidas – o que esta não fez, pelo que, por carta registada com a/r, datada de 03.08.2006, resolveu o contrato e reclamou o pagamento das prestações vencidas e não pagas e respectiva cláusula penal.

Finalmente, adianta que o tractor objecto do contrato já lhe foi entregue; no entanto, a ré não lhe entregou os documentos necessários ao cancelamento do registo do ónus de locação financeira.

A ré contestou, pugnando pela improcedência da acção e sua consequente absolvição dos pedidos formulados pela autora.

Deduziu também reconvenção, tendo formulado contra a autora os pedidos de declaração de nulidade de todos os contratos celebrados, condenando-se a autora a devolver à ré todas as quantias que recebeu desta, bem como a condenação da autora e da chamada intervenientes nesta acção - CC - Comércio e Reparação de Veículos, Lda. - a pagarem à ré a quantia de € 35.000,00, pelos prejuízos sofridos e demais despesas suportadas, suscitando ainda a condenação por litigância de má fé dos administradores de tal entidade.

Em sede reconvencional e, em síntese, alegou que não negociou com a autora o contrato de locação financeira, mas antes com um responsável da sociedade CC - Comércio e Reparação de Veículos, Lda.

Se bem que tenha acabado por acordar a compra do equipamento apresentado na proposta da autora, alega que não aceitou o equipamento entregue pela CC, Lda, pois este nunca funcionou nos termos acordados com esta sociedade.

Quando começou a testar o equipamento, este não fazia as funções acordadas entre o gerente da CC, Lda e o gerente da autora, nomeadamente: - nomeadamente, o tractor não tinha capacidade (força) para subir no terreno; - a grua só fazia uma articulação quando deveria fazer seis articulações ao mesmo tempo.

Logo que viu que o equipamento não servia para os fins pretendidos e acordados, a ré disse ao legal representante da CC, Lda que só aceitaria este equipamento se, até ao dia 08.02.2006, modificasse a grua de modo a fazer todas as seis articulações, mudasse os motores do reboque de forma a terem potência para subir inclinações dos terrenos e mudasse os pneus da forma acordada.

Desde de 07.04.2006 e até hoje, o tractor e o restante equipamento estão na posse da sociedade CC, Lda, ou na posse da autora, sem que nada tivessem feito para resolverem a situação à ré.

Sucedendo que, até hoje, a sociedade CC, Lda não cumpriu nenhum dos acordos celebrados com a ré, o inicial e o de 08.02.2006, como a autora também não entregou os bens que diz ter locado à ré pois estes bens não existem daquela forma e modo como estão descritos.

Alega ter a autora inventado a locação de um equipamento que não existia e ainda hoje não existe, dado que a sociedade CC, Lda não entregou esse equipamento à ré, nem quando o contrato de locação financeira foi efectuado pela autora, nem quando foi entregue ao responsável da sociedade CC, Lda.

Houve réplica, na qual a autora invoca que a negociação que decorreu entre a ré e a empresa fornecedora do bem locado é irrelevante, por não dizer respeito à sua pessoa, desconhecendo os factos que a reconvinte alega a esse propósito.

Mais alegou que, nos termos do contrato celebrado entre ambas, a ré a exonerou de qualquer responsabilidade relativa à entrega atempada do bem, à correspondência com as especificações contratadas ou possíveis a vícios que a coisa locada apresentasse.

A ré treplicou.

A ré - que tinha requerido a intervenção provocada da sociedade CC -Comércio e Reparação de Veículos Lda - viu a sua pretensão ser indeferida; agravou desse despacho de indeferimento, agravo que, apesar de admitido, foi julgado deserto por falta de alegações .

Também a autora requereu a intervenção provocada da sociedade CC -Comércio e Reparação de Veículos, Lda, que foi admitida Citada, a CC, Lda veio invocar o estatuto de assistente para exercitação oportuna de todas as faculdades, direitos e obrigações inerentes a esta sua posição processual .

Foi proferido saneador- sentença julgando: a) A acção procedente por provada, declarando-se a resolução do contrato celebrado entre a autora e a ré referente ao veículo com a matrícula …-BC-… e determinando-se o cancelamento do encargo de locação financeira (n.° de ordem …, de 6-3-2006), referente ao mesmo veículo; b) A reconvenção totalmente improcedente por não provada, absolvendo-se a autora deste pedido.

Inconformada com tal decisão, dela apelou a ré, tendo a Relação julgado procedente a apelação, revogando o saneador-sentença e ordenando o prosseguimento do processo.

Após audiência de discussão e julgamento proferiu-se sentença, decidindo: Julgar inteiramente procedentes os pedidos da A./ AA - Instituição Financeira de Crédito, S.A.. e, em consequência: - Declara-se validamente resolvido o contrato de locação financeira celebrado entre a autora e a ré BB - Comércio de Madeiras Lda, subscrito pela primeira em 29 de Dezembro de 2005, relativo ao tractor da marca John Deere, modelo 6620SE, com a matrícula …-BC-…, reboque Herculano com tracção, modelo HFT 14.000, com grua florestal modelo FC 80/1900 R 410.°.

- Determina-se o cancelamento do registo de locação financeira que incide sobre o tractor acima identificado.

Julgar integralmente improcedente o pedido reconvencionai deduzido pela ré BB - Comércio de Madeiras Lda e dele absolver a autora AA - Instituição Financeira de Crédito, S.A.. e a interveniente acessória CC - Comércio e Reparação de Veículos Lda.

- Julgar igualmente improcedente o pedido de condenação da autora como litigante de má-fé.

  1. Uma vez mais inconformada com tal decisão, a ré interpôs recurso de apelação, impugnando, desde logo, a decisão proferida quanto à matéria de facto; tal impugnação foi julgada improcedente, o que determinou a estabilização do seguinte quadro factual: 1 - A autora é proprietária do trator da marca John Deere, modelo 6620SE, com a matrícula …-BC-....

    2 - Por acordo subscrito pela autora em 29.12.2005 e pela ré, com efeitos a partir de 24.12.2005 para efeitos de registo, e durante 36 meses, a autora cedeu à ré o tractor da marca John Deere, modelo 6620SE, com a matrícula …-BC-…, reboque Herculano com tracção, modelo HFT 14.000 com grua florestal modelo FC80/1900 R 410.° mediante contrapartida monetária mensal, no que denominaram contrato de locação financeira.

    3 - Autora e ré acordaram nos termos da cláusula 1.» das condições gerais que "o contrato tem por objecto o bem descrito nas condições particulares, o que foi escolhido pelo locatário de sua livre vontade, tendo sido previamente acordados entre este e o fornecedor todos os aspectos referidos nas condições particulares, nomeadamente as suas especificações técnicas, preço, prazo de entrega e condições de pagamento".

    4 - Autora e ré acordaram nos termos da cláusula 5.a das condições gerais que "o locatário receberá o bem locado em nome da locadora, sendo considerada como data de entrega do mesmo a data mencionada no auto de recepção, assinado pelo fornecedor e pelo locatário, anexo ao presente contrato e no n.° 2 que o auto de recepção deverá certificar que o bem entregue ao locatário está de acordo com a encomenda e constitui uma autorização à locadora para pagamento do preço ao fornecedor 5 - Autora e ré acordaram nos termos da cláusula 7.a das condições gerais que "a locadora fica exonerada de qualquer responsabilidade inerente à entrega atempada do bem, no local convencionado, à sua correspondência com as especificações indicadas pelo locatário, a quaisquer vícios que apresente, bem como pela falta de registo, matrícula ou licenciamento no caso de o fornecedor não ter habilitado a locadora com a documentação necessária".

    6 - Autora e ré acordaram nos termos do n.° 2 da cláusula 7.° que "competirá ao locador usar os meios judiciais e/ou extrajudiciais para reagir a qualquer incumprimento do fornecedor".

    7 - Autora e ré acordaram nos termos do n.° 3 da cláusula 7.a que "a não entrega do bem pelo fornecedor, bem como da documentação necessária, a actos de registo, matrícula ou licenciamento, quando tal seja necessário, ou mesmo a falta de conformidade com as especificações convencionadas nas Condições Particulares, não exoneram o locatário das suas obrigações face à locadora, nem lhe conferem qualquer direito face a este".

    8 - A autora adquiriu o equipamento a CC - Comércio de Peças e Reparações de Veículos, Lda 9 - 0 fornecedor CC - Comércio de Peças e Reparações de Veículos, Lda, bem como o...

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