Acórdão nº 125/05.6TBVFL.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelGRANJA DA FONSECA
Data da Resolução26 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça – 7ª Secção: 1.

“Sociedade AA, Lda” instaurou, sob a forma de processo ordinário, a presente acção declarativa contra “BB, Lda”, pedindo que seja declarado o seu direito de propriedade sobre os imóveis mencionados e descritos no artigo primeiro da petição, objecto do contrato promessa celebrado entre a autora e a ré em 29 de Junho de 2004 e que a ré seja condenada a reconhecer o direito de propriedade da autora e a restituir-lhe, em perfeito estado de conservação, esses mesmos imóveis e a pagar uma sanção pecuniária compulsória não inferior a € 2 000, (dois mil euros), por cada dia de atraso na entrega dos imóveis.

Convidada a aperfeiçoar a sua pretensão, a autora concluiu nos sobreditos termos e pediu que seja declarado validamente resolvido pela autora, por meio da mencionada carta de 11 de Abril de 2005, o referido contrato-promessa e seja reconhecido à autora o direito de fazer sua a quantia de € 250.000 (duzentos e cinquenta mil euros) paga pela ré a título de sinal.

Fundamentando a sua pretensão, alegou, em síntese, factos tendentes a demonstrar que, sendo proprietária dos ditos prédios, cuja compra e venda foi objecto de contrato-promessa celebrado entre a autora e a ré, esta ficou obrigada, nos termos do dito contrato-promessa, a diligenciar pela marcação da escritura, num prazo máximo de sessenta dias, mas não cumpriu o acordado, nem mesmo depois de lhe conceder o prazo de oito dias para o efeito.

A ré contestou, impugnando parcialmente os factos articulados pela autora.

Na réplica, a autora confirmou o que havia alegado na petição inicial.

Proferida a sentença, a acção foi julgada parcialmente procedente e, em consequência, foi declarado que a autora é titular do direito de propriedade sobre os imóveis mencionados e descritos no artigo primeiro da petição inicial, objecto do contrato – promessa celebrado entre a autora e a ré em 29 de Junho de 2004, sendo a ré condenada a reconhecê-lo.

A ré foi absolvida do demais peticionado.

Não se conformando com a decisão proferida, Autora recorreu, tendo o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 9/07/2014, julgado procedente a apelação e, em consequência, revogou a decisão recorrida no sentido de declarar validamente resolvido pela autora, por meio da carta de 11 de Abril de 2005, o contrato-promessa celebrado com a ré, reconhecendo à autora o direito de fazer sua a quantia de € 250.000 (duzentos e cinquenta mil euros) paga pela ré, a título de sinal.

E manteve, no demais, o decidido na 1ª Instância.

Inconformada com a decisão, vem agora a Ré recorrer de revista, apresentando as seguintes conclusões: 1ª - Porque a legítima perda de interesse do credor na prestação sempre há- de ser analisada objectivamente, com base em elementos susceptíveis de valoração por qualquer pessoa e não segundo o juízo valorativo apenas do próprio credor; 2ª - Porque para a perda objectiva do interesse do credor na realização da prestação a cargo do devedor, na resolução do contrato só releva, só é atendível e constitui seu fundamento a mora deste que teve consequência relativamente importante sobre a economia da relação obrigacional entretanto estabelecida; 3ª - Porque não tendo as partes convencionado a resolução do contrato promessa, esta só pode operar no caso de impossibilidade definitiva da prestação ou decurso de um termo fixado como essencial já que numa situação de simples mora, não é lícito ao credor resolver o contrato promessa e não tendo as partes convencionado a resolução do contrato promessa, esta só pode operar no caso de impossibilidade definitiva da prestação ou decurso de um termo fixado como essencial já que numa situação de simples mora, não é lícito ao credor resolver o contrato promessa; 4ª - Porque só quando da concreta conduta do devedor em mora se puder legitima e prudentemente concluir que não pretende cumprir o contrato é que se pode concluir pelo seu incumprimento definitivo, comportamento esse que, necessariamente, há-de ser conjugado com o comportamento do próprio credor, nomeadamente no que tange à verificação do cumprimento do respectivo sinalagma contratual; 5ª - Porque para se concluir pela razoabilidade objectiva e mesmo quantificação do prazo fixado pelo credor para o cumprimento da obrigação, no caso dos autos, a outorga da escritura, sempre há que ponderar a patente complementaridade dos dois negócios que são objecto do mesmo contrato promessa; 6ª - Porque entre a ora Recorrente e a Recorrida foram sempre mantidas diversas negociações que se consubstanciaram no prévio integral pagamento do preço - dinheiro - que à vendedora competia receber, na e com a outorga da escritura, esta não integra no seu património qualquer valor, nomeadamente pecuniário; 7ª - Porque o recebimento da totalidade do preço que à Recorrente competia receber, resulta claramente reconhecido pela promitente vendedora nos documentos de fls. e juntos aos presentes autos em 18/09/2013; 8ª - Porque a Recorrida, em 3/11/2006, revelou, inequivocamente, manter o interesse na execução do contrato, declarando ter recebido a totalidade do preço que lhe competia receber já que o remanescente apenas ao credor hipotecário competia e lhe era devido; 9ª - Porque conforme o clausulado no contrato promessa de compra e venda, celebrado entre Recorrente e Recorrida, desde a sua celebração todas as amortizações e encargos do crédito hipotecário, nomeadamente com juros vincendos, são da exclusiva responsabilidade da ora Recorrente e nem sequer vem invocado pela demandante que tenha sido interpelada pelo credor hipotecário por eventual incumprimento das inerentes obrigações que, por isso, não existe; 10ª - Porque no presente caso, quer o contrato, quer os demais factos provados não revelam que as partes tenham fixado o prazo para a celebração da escritura de compra e venda dos imóveis, respectivamente, prometidos comprar e vender, sob os auspícios da inderrogabilidade absoluta e antes a própria autora reconheceu a necessidade de proceder a uma notificação admonitória, concedendo à demandada oito dias para promover a celebração do contrato definitivo; 11ª - Porque as partes, mesmo após o decurso do prazo, mantiveram negociações e concretização de avultados pagamentos efectuados pela ora Recorrente e recebidos pela Recorrida, é patente que, com a sua concreta conduta, a promitente vendedora exprimiu o seu reconhecimento não só da exiguidade do prazo que unilateralmente fixou, como que mantinha o interesse na manutenção do contrato; 12ª - Porque objectivamente todo o interesse na manutenção do contrato por banda da Recorrente permanece incólume, sendo certo que recebeu tudo quanto tinha a receber, tendo mesmo em 3/11/2006 fixado em € 50.000 a indemnização pelo atraso na outorga da escritura (Doc. junto a fls. em 18.9.2013); 13ª - Porque a resolução nunca poderia proceder, não só pela não verificação objectiva da perda de interesse, como por o prazo concedido ser insusceptível de poder ser cumprido, atenta a envergadura do negócio e condicionantes acordadas, como ainda por ulteriormente a Recorrida, até pela sua conduta, ter mantido as negociações e recebido tudo a quanto tinha direito e que economicamente lhe era relevante; 14ª - Porque a Recorrida nem sequer alegou, e como tal não foi submetido a prova, que a Recorrente alguma vez tenha tomado atitudes ou comportamentos que revelem e, muito menos, inequivocamente, não querer ou não poder cumprir a obrigação, antes sempre tendo tomado posição inversa, ou seja pugnar pelo seu cumprimento; 15ª - Porque os dois complementares negócios, incluídos no mesmo contrato promessa, tinham o preço global de € 1.799.150 e deles liquidou € 639.150; 16ª - Porque os imóveis prometidos vender pela Recorrida, promitente vendedora, mantiveram-se onerados por hipoteca a favor do BANCO CC - facto 17º - e sem que esta tenha invocado ou alegado e, muito menos, demonstrado ter procedido ao distrate de tais ónus pelo valor de € 1.160.000; 17ª - Porque a não outorga da escritura que titula o contrato definitivo de compra e venda não justifica, objectivamente, qualquer perda de interesse na execução do contrato; 18ª – Porque, como demonstrado documentalmente nos autos, até está depositado valor muito superior a 50% do crédito hipotecário e proveniente do processo de expropriação de parte dos imóveis, objecto do mesmo contrato promessa; 19ª - Porque a venda dos imóveis foi prometida livre de ónus e encargos e não tendo a Recorrida alguma vez referido que tinha assegurado ou providenciado o distrate, mesmo com a interpelação admonitória não estava assegurada a possibilidade de outorga do contrato definitivo; 20ª - Porque não tendo a Decisão recorrida ponderado a descrita valoração e factualidade, não é adequado, justo e equitativo o entendimento de, estando a Ré em mora há cerca de três meses, lhe ter sido concedido um prazo suplementar de mais de quatro meses; 21ª - Porque vem demonstrado que os contraentes tanto após a missiva da Recorrida de 21/12/2004, veio a manter o interesse no contrato, recebendo, por via dele € 86.550 - facto 26º - como após a carta de 11 de Abril de 2005, veio a receber a quantia de € 302.600 - facto 30º: 22ª - Porque a obrigação da Recorrida não tinha prazo certo em termos de limite absoluto mas antes de relativo; 23ª - Porque, no caso em apreço, estabelecendo os contraentes um limite temporal para o cumprimento, tal limite não traduz uma directa e consequente perda de interesse negocial; 24ª - Porque sem ofensa da boa-fé e mesmo do ilícito enriquecimento à custa alheia poderia a Recorrida arguir e esgrimir o direito de resolver o contrato; 25ª - Porque a decisão em apreço viola por erro de interpretação e de aplicação o disposto nos artigos 432º, 436º, 442º,760º,790º,793º,801º,802º, 804º,805º,808º todos do C. Civil; Deverá ser concedida a Revista, revogando-se o Acórdão recorrido A autora/recorrida contra – alegou, defendendo a confirmação do acórdão recorrido.

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