Acórdão nº 3566/06.8TBVFX.L1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução12 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.

AA intentou acção de condenação, com processo comum, na forma ordinária, contra os réus, sócios de sociedade irregular, BB e CC, pedindo que se declare transmitida a seu favor a fracção autónoma referente ao R/C Dt° do prédio sito na Estrada de …, n.° 8, …, Alverca do Ribatejo, descrito na 2.a Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira sob o n.° … e, em consequência, seja inscrito em nome da A., cancelando-se o registo dos anteriores proprietários; ou, subsidiariamente, declarar-se a aquisição originária do direito de propriedade daquele imóvel pela A. por via da usucapião e, consequentemente, serem os RR. condenados a reconhecer tal direito de propriedade.

Para tanto, alegou que, os RR. constituíram uma sociedade irregular em 24.09.1981, a qual já vinha a laborar desde 1979 e tinha por objecto social a construção e reparação de edifícios, cabendo a gerência aos dois sócios, mas sendo exercida de facto e em regra pelo sócio CC, que a representava.

Na qualidade de representante legal da sociedade em apreço, o R. CC celebrou com a A. um contrato promessa de compra e venda da referida fracção autónoma, sendo o preço da venda de 925.000$00, tendo a A. entregue naquela data a quantia de 600.000$00, a título de sinal e princípio de pagamento, sendo o remanescente a pagar na data da escritura. O sócio BB recusou-se, porém, a estar presente no acto e a assinar a escritura de compra e venda.

Assim, desde a data da celebração do contrato promessa de compra e venda que a A. é possuidora daquela fracção autónoma, em consequência da tradição da mesma, feita com entrega da chave de entrada e uso e habitação da mesma.

Os RR. foram notificados, mediante notificação judicial avulsa, realizada em 06.01.2006 no Tribunal Judicial de Pombal, para marcarem a escritura de compra e venda, o que não aconteceu, não obstante a disponibilidade do R. CC.

O R. BB contestou, por impugnação e por excepção, alegando que a acção carece de causa de pedir e que é nela parte ilegítima.

Na verdade, os proprietários da dita fracção seriam os RR., e não a sociedade irregular, que apenas foi constituída para a construção e reparação do edifício e se extinguiu logo após a construção, não sendo proprietária do mesmo.

O R. BB é comproprietário da fracção em apreço e não a prometeu vender à A., nem recebeu qualquer preço ou sinal, e não quis tal negócio, tanto mais que não assinou o contrato promessa.

Não aceitou a ocupação que a A. fez da fracção, sendo que o uso da mesma foi feito em nome dos RR., e não em nome próprio, mantendo-se a A. na fracção ilegitimamente e sem qualquer contrapartida económica, sendo a sua posse precária, a que acresce que, desde 1997, a A. já não reside no imóvel.

O R. BB impugnou ainda o valor da causa e deduziu reconvenção contra a A., peticionando a condenação desta a: reconhecê-lo como legítimo dono e comproprietário da fracção em apreço; a indemnizá-lo na quantia de € 39.000,00, inerente à sua quota-parte a título de rendas; a restituir a fracção e a indemnizá-lo, em quantia a determinar na fase de liquidação, quanto aos prejuízos decorrentes da deterioração do imóvel.

Para tanto, alegou que é comproprietário da fracção em apreço nos autos, estando a A. a ocupar abusiva e legitimamente a mesma, sem qualquer contrapartida económica e contra a vontade do R, o que lhe causou prejuízos, que se consubstanciam na impossibilidade de rentabilizar o espaço, nomeadamente dando-a de arrendamento.

O R. CC também contestou, alegando que a petição inicial é inepta por falta de causa de pedir quanto ao primeiro pedido formulado pela A., sendo certo que a A. não tinha a posse da fracção, mas antes a mera detenção da mesma, pelo que não pode ocorrer a usucapião.

Foi a A. que não quis celebrar de imediato a escritura de compra e venda, sendo mera detentora - e não possuidora - da fracção e , por isso, somente titular de um direito de crédito, pelo que, para ser declarada proprietária, teria de pagar o remanescente do preço, devidamente actualizado, a que acresceria o valor do uso do prédio durante 25 anos, deduzidos os frutos civis pelo pagamento efectuado a título de sinal.

A A. apresentou resposta às contestações dos réus BB, pugnando pela improcedência das excepções e do pedido reconvencional; e requereu a intervenção principal provocada dos cônjuges dos RR., como associados destes, que foi admitida, sendo que as intervenientes não apresentaram contestação.

Foi proferido despacho saneador, julgando improcedentes as invocadas excepções de ineptidão da petição inicial e de ilegitimidade.

Prosseguiram os autos para julgamento, sendo proferida sentença a julgar procedente o pedido principal, formulado pela A, em consequência do decretamento da execução específica do contrato promessa.

  1. Inconformado, apelou o réu BB, tendo, porém, a Relação confirmado a sentença apelada.

    Interposta revista pelo mesmo recorrente, foi à mesma concedido parcial provimento pelo acórdão proferido pelo STJ a fls.670/689, em que se decidiu: - revogar o acórdão recorrido na parte em que julgou procedente o pedido principal da A.; e, em consequência, julga-se improcedente o pedido de execução específica do contrato promessa formulado prioritariamente pela A.; - confirmar o acórdão recorrido no segmento em que negou provimento aos pedidos indemnizatórios formulados pelo 1º R. em sede reconvencional; - determinar a remessa dos autos à Relação para apreciar o pedido subsidiário, formulado pela A. com base na figura da usucapião e, bem assim, do pedido de reconhecimento da propriedade, deduzido pelo R. em reconvenção.

    Remetidos os autos à Relação para apreciação da matéria do pedido subsidiário – formulado pela A. com vista à aquisição originária da propriedade do imóvel em litígio, em consequência da verificação a seu favor dos pressupostos da usucapião ( matéria que as instâncias não haviam apreciado, em consequência da solução dada ao litígio) – foi proferido acórdão a julgar procedente tal pretensão, declarando adquirida por usucapião a propriedade e determinando-se, consequentemente, o cancelamento do registo existente a favor dos RR., improcedendo, por isso, o pedido de reconhecimento da propriedade que o R./recorrente formulara em reconvenção.

  2. É o seguinte o quadro factual subjacente ao presente litígio: 1. - O lote de terreno em causa - Lote 17 - foi comprado pelos réus e por escritura pública celebrada em 13.09.1979 no segundo cartório notarial de Vila Nova de Ourém (Alínea A) dos Factos Assentes); 2. - Do registo predial constam os réus como sendo os proprietários da fracção A-rés do chão direito - do prédio sito na estrada de …, n.° 8, …, Alverca do Ribatejo, descrita na CRP sob o n.° … e sob o artigo matricial urbano 3194 da freguesia de Alverca (Alínea B) dos Factos Assentes); 3. - Desde 1979, data em que adquiriram o lote 17 no …, em Alverca, que BB e CC acordaram entre si contribuir ambos com bens e serviços para o desenvolvimento em comum da actividade de construção civil visando daí retirar proveitos e reparti-los entre si (Resposta ao artigo 1.° da Base Instrutória); 4. - Os réus constituíram uma sociedade para desenvolver a actividade descrita em 3. (Resposta ao artigo 15.° da Base instrutória); 5. - Na prossecução da sua actividade a sociedade constituída por ambos construiu um prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, designado por lote 17 descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira, sob o n.° … (Resposta ao artigo 2.° da Base Instrutória); 6. - Os réus deram de empreitada àquela sociedade a construção do dito edifício que logo se extinguiu com a conclusão das obras (Resposta ao artigo 16.° da Base Instrutória).

  3. - A gerência da sociedade, da responsabilidade dos dois sócios, foi exercida pelo sócio CC quando o sócio BB esteve ausente em França, onde desenvolveu a actividade de pintor, com o esclarecimento de que este esteve ausente em França durante a construção do prédio referido em 5., pelo menos urna vez durante cerca cie um mês (Resposta ao artigo 3.° da Base Instrutória); 8. - Quando o réu BB esteve ausente em França, referido em 7., o réu CC representava a sociedade, nomeadamente assinando os documentos necessários ao...

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