Acórdão nº 724/01.5SWLSB.L1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelPIRES DA GRAÇA
Data da Resolução12 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça - Nos autos de processo comum (com intervenção do Tribunal Colectivo) com o nº 724/01.5SWLSB. consta do acórdão recorrido proferido em conferência, em 18 de Setembro de 2014, pela 9ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação de Lisboa 1- “Relatório 1.1.Na 2ª Vara de competência mista do Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Loures, em processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, o Ministério Público acusa, AA, filho de ... e de ..., natural da ..., nascido em ..., ..., com residência no ....

Imputando-lhe a prática em autoria material, de um crime de homicídio qualificado, p. e p., pelos arts. 131°, 132°, n°1 e n° 2, ai. e) do Código Penal.

1.2.

Questão previa: Foi proferido o seguinte despacho: “A reabertura da audiência não foi determinada ao abrigo do disposto no artigo 371° do C.P.Penal, dado que decorre do requerimento formulado que a testemunha em causa terá conhecimento direto dos factos em causa nestes autos, sendo por isso a sua inquirição imprescindível para a descoberta da verdade.

Assim, a diligência ordenada tem em vista o apuramento dos factos e encontra cobertura legal não só nos princípios gerais que norteiam o processo penal, sendo certo que ainda não foi proferida qualquer decisão sobre os factos sobre o julgamento, como também no disposto no artigo 607° do C.P.Civil aplicável por via do disposto no artigo n°4° de C.P.Penal.

Assim, com os fundamentos expostos, o tribunal julga improcedente a arguição de nulidade e determina o prosseguimento da audiência com a audição da testemunha convocada para o efeito." 1.2.1.

Realizado o julgamento foi decidido o seguinte: Condenar o arguido AA, pela prática dum crime de homicídio simples, na pena de 10 anos de prisão.

1.3. Inconformado com a decisão interlocutória e com o acórdão final interpôs recursos o arguido que motivou, concluindo, nos seguintes termos: 1.3.1 Decisão interlocutória O presente recurso vem interposto de dois despachos proferidos nos autos e que decidiram por um lado reabrir a audiência de julgamento após o termo da produção da prova e a apresentação das alegações para ouvir uma testemunha e depois ouviu ainda uma segunda, e vem interposto por se entender que os mesmos estão feridos de nulidade e não encontram suporte nem nos princípios gerais do Direito Processual Penal, nem no citado art. 607º do Código de Processo Civil, aplicável por força do art. 4º do Código de Processo Penal, como foi invocado na sua sustentação; […] 1.3.1.

Do acórdão O arguido foi julgado pelo cometimento de um crime de homicídio qualificado p. e p. pelos arts. 131º e 132º, nº 1, do Código Penal, cometido alegadamente no dia 10 de Junho de 2001; No Acórdão recorrido deu – se razão ao invocado pelo Arguido na sua contestação sobre a inaplicabilidade aos factos constantes da acusação da tipologia do crime de homicídio qualificado mas condenou o Arguido pelo cometimento do crime de homicídio simples p. e p. pelo art. 131º, do Código Penal, na pena de 10 anos de prisão; Deste Acórdão vem interposto o presente recurso, por se considerar que existe: Nulidade no Acórdão recorrido porquanto o mesmo fez uso de meios de prova não consentidos pela legislação processual aplicável; Erro notório na apreciação da prova; Errada qualificação e quantificação da medida da pena aplicada;” […] 3.1.

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, a saber: A)- Da decisão interlocutória: Alega o arguido que o douto despacho recorrido é nulo. Pelo que, deve ser considerada nula a prova produzida em função daquele despacho.

B)- Do acórdão final: Alega o arguido que o douto acórdão recorrido é nulo, porque fez uso de meios de prova não permitidos e enferma do vício de erro notório na apreciação da prova. Para além disso, não foi feita prova de que tenha praticado o crime de homicídio simples, por que foi condenado, mas apenas um crime de ofensa à integridade física agravado pelo resultado. Consequentemente considera excessiva a pena de 10 anos de prisão em que foi condenado.

Cumpre apreciar e decidir.

A)- Decisão interlocutória: Compulsados os autos podemos desde já afirmar que nenhum reparo nos merece a decisão proferida pelo Tribunal.

Na verdade revemo-nos no despacho recorrido, quando refere que: “o arguido AA foi acusado da prática de um crime de homicídio qualificado p. e p. nos artigos 131° e 132° n°s 1 e 2 al. h) do C. Penal.

Logo após a prática do crime, o arguido ausentou-se para parte incerta do estrangeiro, nunca tendo sido ouvido nem prestado TIR. Pelo que, ainda em fase de Inquérito foram emitidos "mandados de detenção com eficácia internacional", em 22-5-2002 (fls. 181).

O arguido só veio a ser detido no Reino Unido, em 30-3-2013, e entregue às autoridades portuguesas em 24-10-2013.

Realizado o julgamento, foram ouvidas as testemunhas disponíveis, uma vez que parte delas, sendo estrangeiras, já não estavam em Portugal, tendo sido designado, para leitura do acórdão, o dia 3-2-2014.

Porém, antes desta data, no dia 30-1-2014, a testemunha de acusação BB, veio requerer que fosse permitida a sua inquirição (fls. 800), justificando a sua ausência à audiência de julgamento com o facto de se encontrar no estrangeiro, mais referindo ser irmão da vítima e ter estado presente no local e data do crime”.

Ora, de facto, como anota o MºPº e bem, quanto a nós, como não podia deixar de ser, o Tribunal "a quo" proferiu despacho ordenando a inquirição imediata desta testemunha, porquanto face à prova até aí produzida, o respectivo depoimento se afigurava imprescindível para a descoberta da verdade, o que veio a confirmar-se.

Foi, também, ouvida a testemunha CC, que também se apresentou na audiência de julgamento a fim de prestar depoimento.

De facto tratando-se de uma situação que não está expressamente contemplada na lei processual penal, o Tribunal "a quo" teria de proceder como procedeu, fazendo uso dos princípios gerais do Processo Penal, como sejam os princípios da investigação e da descoberta da verdade material e aplicar, por analogia, o disposto no art. 607° do CPCivil «ex vi» do disposto no art. 4° do CPP.

Ora, tendo ordenado a inquirição de uma testemunha de acusação, cujo depoimento se afigurava de primordial importância para a descoberta da verdade, o Tribunal "a quo" andou bem, tendo feito uma correcta interpretação da Lei e aplicação do Direito.

Assim sendo, não foram violados os artigos 328° n° 3, 340° n° 3, 361°, 369° n°2 e 371° do CPP nem qualquer outro preceito legal.

Neste sentido, consideramos que o despacho recorrido não enferma de qualquer nulidade ou irregularidade.

B)- Do acórdão final […] 4.

Decisão Nestes termos acordam os juízes que compõem esta Secção Criminal em julgar não providos os recursos Custas a cargo do arguido ora recorrente, fixando a taxa de justiça em 4 UCs.” - De novo inconformado, o arguido interpôs recurso para este Supremo Tribunal, (apresentado no terceiro dia após o termo do prazo, sendo paga a multa a que se refere o art. 107º - A, do Código de Processo Penal).

concluindo a motivação de recurso da seguinte forma: 1.

O Arguido foi julgado pelo cometimento de um crime de homicídio qualificado p. e p. pelos arts. 131º e 132º, nº 1, do Código Penal, cometido alegadamente no dia 10 de Junho de 2001; 2.

Nos autos foram proferidos dois despachos em 1ª instancia que decidiram por um lado reabrir a audiência de julgamento após o termo da produção da prova e a apresentação das alegações para ouvir uma testemunha e depois ouvir ainda uma segunda, despachos estes que, no entender do Recorrente, estão feridos de nulidade e não encontram suporte nem nos princípios gerais do Direito Processual Penal, nem no citado art. 607º do Código de Processo Civil, aplicável por força do art. 4º do Código de Processo Penal, como foi invocado na sua sustentação; 3.

Antes de mais não tem aplicação à situação o art. 4º do Código de Processo Penal, porquanto a aplicação deste normativo só pode ter lugar quando existe uma lacuna no Código de Processo Penal, e essa lacuna não existe porquanto o art. 361º, do Código de Processo Penal, é claro ao estatuir que findas as alegações finais e ouvido o Arguido sobre se tem algo a declarar em sua defesa, o Juiz Presidente declara encerrada a audiência ( como aliás consta expressamente da acta da audiência de julgamento que teve lugar no dia 23 de Janeiro de 2014 ), sem prejuízo do disposto no art. 371º; 4.

E os arts. 369º, nº 2, e 371º do Código de Processo Penal só permitem a reabertura da audiência para determinação da sanção e seguindo a tramitação especial prevista no citado art. 371º; 5.

O acto da reabertura da audiência para a produção de nova prova testemunhal sobre os factos que integram a acusação, não é assim admissível, não havendo lugar à aplicação do art. 4º do Código de Processo Penal ou aos princípios gerais do Direito Processual Penal, nele referidos; 6.

Mas, ainda que assim se pudesse não entender – o que não se concede – também à luz do estabelecido no art. 607º, do Código de Processo Civil, também não poderia proceder – se à reabertura da audiência, pois este normativo só permite ao Juiz a reabertura da audiência com o fundamento de que o Juiz não se julgar suficientemente esclarecido, e esse fundamento não foi invocado para a reabertura decidida e para a inquirição de novas testemunhas após ter sido deliberado o encerramento da audiência; 7.

E não se invoque para tal reabertura o principio da verdade material, porquanto tal principio não pode ser aplicado em manifesta colisão com normas processuais imperativas, como de modo claro decorre dos arts. 328º, nº 3, e 340º, nº 3, do Código de Processo Penal, normas que balizam claramente até onde o Tribunal pode levar a produção de prova sendo manifesto face à redacção do art. 340º, nº 3, que a inquirição de testemunhas não pode ser feita após o encerramento da audiência, porquanto os arts. 361º, 369º, nº 2, e 371º, a tornam legalmente inadmissíveis; 8.

O Acórdão recorrido que julgou...

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