Acórdão nº 866/13.4GBGMR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 25 de Março de 2015

Magistrado ResponsávelMAIA COSTA
Data da Resolução25 de Março de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório AA, com os sinais dos autos, foi condenada na 2ª Secção Criminal da Instância Central de Guimarães, da comarca de Braga, por acórdão de 2.10.2014, como autora material de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 22°, nºs 1 e 2, b), 23°, 73°, 131° e 132°, nº 2, b), c), i) e j), todos do Código Penal (CP), na pena de 6 anos de prisão.

Dessa decisão interpôs a arguida recurso para o Tribunal da Relação de Guimarães, concluindo: Da Dosimetria da pena Quanto a este ponto somos a afirmar que a pena infligida a arguida ora recorrente, é naturalmente desproporcional e desadequada perante as necessidades de justiça que o caso de per si reclama.

Porquanto neste ponto temos por adquirido que a medida da pena há-de ser encontrada dentro de uma moldura de prevenção geral positiva, vindo a ser definida e estabelecida em concreto em função das exigências de prevenção especial, Nomeadamente de prevenção especial positiva ou de socialização (Anabela Miranda Rodrigues, in O modelo de prevenção na determinação da medida concreta da pena).

Assim, acompanhando de perto esta autora, mais se dirá que, será pois o próprio conceito de prevenção geral, enquanto protecção de bens jurídicos alcançada mediante a tutela das expectativas comunitárias na manutenção e reforço da validade da norma jurídica violada, que justifica que se fale de uma moldura de prevenção, pois que a prevenção, tendencialmente proporcional à gravidade do facto ilícito não pode ser alcançada numa medida exacta (ibidem).

E isso é verificável, uma vez que, a gravidade do facto ilícito é aferida em função do abalo daquelas expectativas sentido pela comunidade, pelo que a satisfação das exigências de prevenção terá certamente um limite máximo definido pela medida da pena que a comunidade entende necessária à tutela das suas expectativas na validade das normas jurídicas, e que constituirá do mesmo passo, o ponto óptimo de realização das necessidades preventivas a comunidade (ibidem).

Posto este enquadramento, e reportando-nos ao caso concreto, sustentamos que o limite do necessário para assegurar a protecção dessas expectativas será encontrado de um modo mais justo e equitativo de molde a saciar por um lado, o absolutamente imprescindível para realizar a necessidade de prevenção geral sob a forma de defesa da ordem jurídica, e por outro de modo a satisfazer as necessidades de prevenção especial.

E neste particular, começamos por salientar que a arguida, em juízo de auto-censura confessou os factos, assumindo particularmente um enorme arrependimento pelos actos praticados.

Cumpre também salientar, que a morte da vítima adveio de um estado de saúde bastante debilitado, nada tendo que ver com os factos praticados pela arguida.

Acresce que, a total ausência de antecedentes criminais, o imprescindível apoio familiar de que beneficia, o facto de por si mesmo e em reclusão ter compreendido o desvalor da sua conduta, aliado ao parecer favorável por parte dos técnicos do IRS, que afirmam na conclusão do relatório social que: “AA, possui os recursos essenciais à reintegração social no seu meio comunitário de residência, local onde é considerada pelos laços de cordialidade estabelecidos e onde ainda prevalece de um sentimento de aceitação”.

Donde, tudo cotejado, leva-nos a acreditar que seguramente outra pena em concreto, mais benévola logo mais justa, seria adequada a satisfazer as premissas de tutela acima indicadas, não se frustrando a justiça com isso, antes pelo contrário, sendo manifestamente a sua grande vencedora.

Donde não descortinamos a razão de ser de tão severa pena.

Razão pela qual também neste campo discordamos da dosimetria da pena aplicada, e pugnamos no essencial, por outra mais adequada aos critérios de justiça que o caso em concreto reclama, designadamente, uma pena suspensa na sua execução.

III CONCLUSÕES DO RECURSO Da Dosimetria da pena - Quanto a este ponto somos a afirmar que a pena infligida à arguida ora recorrente, é naturalmente desproporcional e desadequada perante as necessidades de justiça que o caso de per si reclama. Posto este enquadramento, e reportando-nos ao caso concreto, sustentamos que o limite do necessário para assegurar a protecção dessas expectativas será encontrado de um modo mais justo e equitativo de molde a saciar por um lado o absolutamente imprescindível para realizar a necessidade de prevenção geral sob a forma de defesa da ordem jurídica, e por outro de modo a satisfazer as necessidades de prevenção especial. E neste particular, salientamos, que a arguida, em juízo de auto-censura confessou os factos. Acresce que, a total ausência de antecedentes criminais, o imprescindível apoio familiar de que beneficia, o facto de por si mesmo ter compreendido o desvalor da sua conduta, aliado ao parecer favorável por parte dos técnicos do IRS, que afirmam na conclusão do relatório social que “AA, possui os recursos essenciais à reintegração social no seu meio comunitário de residência, local onde é considerada pelos laços de cordialidade estabelecidos e onde ainda prevalece de um sentimento de aceitação, tudo cotejado, leva-nos a acreditar que seguramente outra pena em concreto, mais benévola logo mais justa, seria adequada a satisfazer as premissas de tutela acima indicadas, não se frustrando a justiça com isso, antes pelo contrário, sendo manifestamente a sua grande vencedora. Razão pela qual também neste campo discordamos da dosimetria da pena aplicada, e pugnamos no essencial, por outra mais adequada aos critérios de justiça que o caso em concreto reclama, designadamente, uma pena suspensa na sua execução.

Respondeu o Ministério Público, dizendo: Nos presentes autos, pelo douto acórdão de fls. 880 a 911, foi a arguida condenada pela prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 22.°, n.º 1 e n.º 2, al. b), 23.°, 73.°, 131.° e 132.°, n.º 2, als. b), c), i) e j), todos do Código Penal, na pena de 6 (seis) anos de prisão.

Inconformada com o decidido, vem a mesma interpor recurso - cfr. fls. 938 a 942 -, extraindo-se da única conclusão (sabido que as conclusões delimitam o objecto de recurso - cfr. art. 684.°, n.º 3 do CPC "ex vi" art. 4.° do Cód. Proc. Penal e ver, entre muitos, Acs. do STJ., de 23/1/91, BMJ. 403, pg. 192 e de 22/3/95, BMJ. 445, pg. 264) que pretende a mesma ver diminuída a pena e que esta venha a ser declarada suspensa na sua execução, ou seja, restringe a mesma o objecto do recurso a duas questões meramente de direito.

Ora, analisando-se a motivação de recurso, constata-se que a recorrente quer no texto da sua motivação, quer na única conclusão por si formulada não indica a(s) norma(s) jurídica(s) violada(s), o que lhe é exigido por força do disposto no art. n.º 412.°, n.º 2, al. a) do Cód. Proc. Penal.

Em tal conformidade, conforme a jurisprudência uniforme do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal de Justiça - v. g. Acs. TC, DR 1.ª série, de 21-07-2000 e DR 2.ª série, de 08-11-2000 e Acs do STJ n.º 337/00, de 14-03-01, Proc. n.º 3906/00; de 24-04-2001, proc. n.º 225/00, de 24-10-2001, Proc. n.º 2380/01; de 18-10-2001, Proc. n.º 2374/01 e de 14-11-2001, Proc. n.º 3001/01 -, não permitindo o aperfeiçoamento modificar o âmbito do recurso, na medida em que o texto da decisão é o limite do aperfeiçoamento, ou seja, o que da motivação propriamente dita não constar não pode ser levado às conclusões, nos termos do disposto no n.º 4 do art. 412.°, já referido, não há lugar ao aperfeiçoamento.

Nestes termos, deve o recurso ser rejeitado, conforme o disposto no art. 420.°, n.º 1, al. a) e no art. 417.°, n.º 3, ambos do Cód. Proc. Penal - cfr. neste sentido, entre muitos outros, o acórdão do STJ de 22 de Novembro de 1989; AJ n.º 3, pg. 7.

Não obstante, sempre se alinharão alguns apontamentos que conduzirão inexoravelmente ao decesso daquelas suas duas pretensões.

Em primeiro lugar, contrariamente ao alegado, não é verdade que a arguida tenha confessado os factos, pois só os confessou parcialmente, como se colhe da douta decisão recorrida.

Por outro lado, do confronto da decisão com a motivação de recurso, verifica-se que a factualidade convocada pela recorrente para a aplicação de uma pena inferior à aplicada foi já tida em consideração na decisão, na qual com muito acerto aplicou a supra referida pena, com a qual se concorda.

Com efeito, a pena aplicada à condenada (6 anos de prisão, que se situa abaixo do terço da pena aplicável: 2 anos, 4 meses e 24 dias de prisão a 16 anos e 8 meses) não ultrapassa o grau de culpa, que é elevado, sendo elevado também o grau de ilicitude.

Deve referir-se ainda que, não existindo circunstâncias que nos levem a afirmar a verificação de especiais necessidades da prevenção especial, já o contrário se deve dizer no que concerne à satisfação da afirmação de prevenção geral, atento o elevado número de situações configuradoras de crimes de diversa natureza praticados contra cônjuges, principalmente dentro ainda do casamento.

Nesta conformidade, tendo também as circunstâncias que depõem a favor da recorrente sido devidamente ponderadas na dosimetria da pena, nenhuma censura merece a decisão, nomeadamente no que concerne ao quantum da pena aplicada à recorrente Atento o que se deixa dito, por imperativo legal (art. 50.°, n.º 1 do Cód. Penal), não pode proceder a pretensão da suspensão da pena reclamada pela arguida.

Nesta conformidade, deve o recurso ser rejeitado e, não sucedendo tal, sempre deverá ser julgado improcedente.

Na Relação de Guimarães foi excecionada a incompetência desse Tribunal, nos termos do art. 432º, nº 1, c), do Código de Processo Penal (CPP), sendo os autos remetidos a este Supremo Tribunal.

Neste, o sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu o seguinte parecer: 1.1 – A arguida AA, com os demais sinais dos autos, foi condenada em 1.ª Instância – por Acórdão do Tribunal Colectivo da Instância Central – 2.ª Secção Criminal de Guimarães – da...

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