Acórdão nº 437/11.0TTOAZ.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 29 de Julho de 2011, no Tribunal do Trabalho de Oliveira de Azeméis, entretanto, extinto, AA intentou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato de trabalho contra BB, Lda., pedindo a condenação da ré: a) a reconhecer o autor como «trabalhador dependente (subordinado)» e que o despediu ilicitamente; b) a pagar-lhe as remunerações devidas desde a data do despedimento e a indemnização de antiguidade, pelo valor máximo, até à data do trânsito em julgado da decisão; c) a pagar-lhe € 88.089,58, relativos a férias e subsídios de férias e de Natal, desde 2006; d) a pagar-lhe € 5.200,87, respeitantes a 35 horas de formação, vencidas em 01.01.07, 01.01.08, 01.01.09, 01.01.10 e 01.01.11; e) a pagar-lhe juros de mora, desde a data dos respectivos vencimentos; f) a pagar-lhe € 10.000, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescidos de juros desde a citação.

A acção, contestada pela ré, foi julgada parcialmente procedente, tendo sido decidido que vigorou um contrato de trabalho entre as partes e que o despedimento do autor foi ilícito, sendo a ré condenada a pagar-lhe (i) € 32.325,75, concernentes à compensação pelo despedimento, (ii) € 97.578,66, a título de retribuições vencidas e vincendas até 17 de Abril de 2013 e as demais vincendas desde então e até trânsito em julgado da sentença à razão de € 4.510,57 mensais, deduzido o valor que se prove o autor recebeu desde o despedimento como produto do trabalho, (iii) € 54.088,25, de retribuição por férias, subsídio de férias e de Natal vencidos à data de cessação do contrato de trabalho, (iv) € 3.000, relativos a indemnização por danos morais, (v) € 4.621,44, atinentes à compensação pelas horas de formação profissional devidas ao longo da execução do contrato de trabalho, tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento, desde 8 de Setembro de 2011.

  1. Irresignados, o autor e a ré apelaram para o Tribunal da Relação do Porto, que julgou improcedente o recurso da ré e procedente o recurso de apelação do autor, deliberando: (i) «revogar a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré a pagar ao A. a quantia de € 32.325,75, a título de “compensação pelo despedimento”, a qual é, nessa parte, substituída pelo presente acórdão a condenar a Ré a pagar ao A. a quantia de € 36.084,56, a título de indemnização pelo despedimento ilícito, acrescida do que se vencer até ao trânsito em julgado do presente acórdão»; (ii) «revogar a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré, Clínica Médica, BB, Lda., a pagar ao Autor a quantia de “97.578,66 €, a título de retribuições vencidas e vincendas até 17-04-2013”, a qual é substituída pelo presente acórdão condenando a Ré a pagar ao Autor a quantia global de € 171.116,75, a título de retribuições vencidas e vincendas desde 01.07.2011 até 31.01.2014 [incluindo subsídios de férias vencidos em 2011, 2012, 2013 e 2014 e subsídios de Natal vencidos em 2011, 2012 e 2013] e as demais vincendas desde esta data e até trânsito em julgado do presente acórdão, à razão de 4.510,57 € mensais», deduzindo-se a tal montante, «em sede de liquidação de sentença, o valor que se prove que o Autor auferiu desde o despedimento como produto do seu trabalho, tal como já decidido, e não impugnado, na sentença recorrida»; (iii) «reduzir para € 42.906,57, a título de retribuição por férias e subsídio de férias [vencidos em 2007, 2008, 2009 e 2010] e de Natal [vencidos em 2006, 2007, 2008, 2009 e 2010], a quantia de € 54.088,25 em que a ré havia sido condenada, na sentença recorrida, a pagar ao Autor ‘a título de retribuição por férias, subsídio de férias e de Natal vencidos à data de cessação do contrato de trabalho’»; (iv) «condenar a ré a pagar ao A. a quantia global de € 4.654,91, a título de remuneração correspondente às férias vencidas em 2006 (ano da admissão) e respectivo subsídio»; (v) «condenar a Ré a pagar ao Autor as férias e os subsídios de férias e de Natal proporcionais ao ano do trânsito em julgado do presente acórdão e tendo como referência a retribuição média mensal de € 4.510,57, a liquidar em sede de liquidação da sentença», mantendo, no mais, a dita sentença.

    A ré veio, então, interpor revista excepcional, ao abrigo do preceituado nas alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 672.º do Código de Processo Civil, tendo os juízes da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça que integram a formação de apreciação preliminar da revista excepcional deliberado que não era aplicável, no caso, o regime daquela revista e ordenado, atento o disposto no n.º 5 do artigo 672.º do Código de Processo Civil, a distribuição dos autos como revista nos termos gerais.

    Subsequentemente, a recorrente foi convidada a sintetizar as 109 conclusões da alegação do recurso, sendo igualmente notificada para se pronunciar sobre a questão prévia da inadmissibilidade da junção de documentos com a alegação do recurso, tendo a recorrente efectivado a redução do mencionado acervo conclusivo para 61 proposições e sustentado a improcedência da apontada questão prévia.

    Notificado da nova síntese conclusiva produzida pela recorrente, o recorrido respondeu, aditando que aquela não reduziu o acervo conclusivo, significativamente, pelo que se impunha o não conhecimento do recurso, vindo a recorrente, de imediato, requerer o desentranhamento da resposta àquela síntese conclusiva, por se afigurar extemporânea, tendo o relator decidido: (i) que «a ré/recorrente satisfez, ainda que minimamente, o convite que lhe foi endereçado, não se configurando, por via dessa circunstância, obstáculo ao conhecimento do recurso de revista interposto»; (ii) que carecia de fundamento legal o requerido desentranhamento da resposta oferecida às sintetizadas conclusões da alegação do recurso; e (iii) que os documentos n.

    os 2 e 3, juntos com a alegação do recurso de revista, fossem desentranhados e restituídos à recorrente, despacho que, notificado às partes, não foi objecto de impugnação.

    Registe-se que a recorrente, na sequência do convite que lhe foi dirigido, ao abrigo do disposto no artigo 639.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, para sintetizar as conclusões da alegação de recurso, produziu o acervo conclusivo seguinte: «1.ª No ponto n.º 56 da matéria dada como assente é referido que: “Em Janeiro de 2011, o A. comunicou à Ré ser empresário em nome individual e tendo, desde Fevereiro de 2011, passado a emitir-lhe recibos de prestação de serviços em nome da sociedade CC, Lda., com sede na Rua ..., Bloco ….º Direito, …”.

    2.ª Esta matéria, pesem embora as considerações tecidas no Acórdão da Relação, ora posto em crise, revela, desde logo, uma grave imprecisão relativamente à distinção entre o conceito de empresário em nome individual e o de sociedade unipessoal por quotas, as quais são figuras distintas.

    3.ª Tal significa que, uma vez constituída e registada uma sociedade unipessoal por quotas, no caso a “CC, Unipessoal, Lda.”, foi a mesma que passou a exercer a actividade de medicina dentária, através dos seus órgãos próprios, no caso, o Recorrido, a partir da data da sua constituição e registo, 03/02/2011, muito embora a Recorrente só viesse a ter conhecimento de tal situação em Fevereiro de 2011, data em que a dita sociedade assumiu tal posição perante a Recorrente ao emitir recibos de quitação referentes aos serviços prestados pelo seu gerente, aqui Recorrido, onde se inclui o de Janeiro de 2011, conforme resulta dos documentos juntos, fls. 117 a 119.

    4.ª Tendo iniciado o A., ora Recorrido, a prestação de serviços à Ré, ora Recorrente, em data anterior a 18/02/2006, estava em vigor o CT/2003, conforme resulta do art. 7.º, n.º 1, da Lei n.º 7/2009, de 12/02, seguindo a solução que dispunha o art. 8.º, n.º 1, da Lei n.º 99/2003, de 27/08 que aprovou o CT/2003.

    5.ª Assim, para qualificar o contrato em causa impõe-se atender à redacção do art. 10.º do CT/2003, bem como à redacção da presunção de contrato de trabalho contida no art. 12.º, antes de ser alterada pela Lei n.º 9/2006, de 20/03 (entre muitos outros, vejam-se os acórdãos do STJ de 02/05/2007, proc.º 06S4368; de 18/12/2008, proc.º 08S2572; de 18/12/2008, proc.º 08S2314; de 14/01/2009, Proc.º 08S2578; de 22/04/2009, proc.º 08S3045; de 22/09/2009, proc.º 4401/04.7TTLSB.S1; de 10/11/2010, proc.º 3074/07.0TTLSB.L1.S1 e de 16/12/2010, proc.º 996/07.1TTMTS.P1.S1, todos em www.dgsi.pt).

    6.ª A presunção aplicável aos factos em análise é a contida no art. 12.º do CT/2003, antes de ser alterado pela Lei n.º 9/2006, de 20/03, a qual, dado o carácter cumulativo dos requisitos elencados nas als.

    1. a e) é inaplicável ao caso sub iudice, desde logo, porque, de acordo com os itens 3.º, 17.º, 18.º e 20.º dos factos assentes, o tipo de remuneração acordada não foi fixada em função do tempo de trabalho, mas sim com base numa percentagem, inicialmente, 40% e, a partir de 09/02/2010, aumentada em 2% por cada acto praticado pelo A, ora Recorrido, como, aliás, é reconhecido no acórdão do Tribunal da Relação a fls. 72, ora posto em crise.

      7.ª A actividade a prestar no âmbito do contrato de trabalho é caracterizada como uma actividade humana, produtiva e exercida livremente para outrem de forma subordinada.

      8.ª O trabalhador é, assim, aquele que presta, de forma livre, uma actividade produtiva para outrem, estando subordinado a este último na realização dessa prestação.

      9.ª A noção juslaboral resultante do art. 10.º do CT/2003 permite-nos concluir que será considerado trabalhador aquele que presta uma actividade a outra pessoa ou outras pessoas, sob a autoridade e direcção desta.

      10.ª Pese embora a coerência em termos teóricos da posição que admite a celebração de contrato de trabalho com uma pessoa colectiva, a doutrina e a jurisprudência, consideram, de forma unânime, inadmissível a celebração de contrato de trabalho com uma pessoa colectiva.

      11.ª A inseparabilidade da actividade de trabalho da pessoa do...

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