Acórdão nº 3194/08.3TBPTM.E1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA instaurou uma acção contra BB, pedindo que fosse declarado nulo, por falta de forma, um contrato de mútuo mediante o qual lhe emprestara a quantia de €30.000,00 e, consequentemente, que o réu fosse condenado na restituição do capital, com juros de mora contados à taxa legal desde 2 de Fevereiro de 2008 até integral pagamento. Subsidiariamente, invocou enriquecimento sem causa.

Na contestação, o réu opôs nada dever ao autor, sendo que os €30.000,00 correspondiam à diferença entre o preço real (€ 95.000,00) e o preço declarado (€ 65.000,00) num contrato-promessa de compra e venda de um determinado lote de terreno (“para não onerar, neste caso o autor, a nível de IMT e IS”), pago por cheque. Invocou abuso de direito e pediu a condenação do autor como litigante de má fé, em multa e indemnização.

Na réplica, o autor disse ser falso o que o réu alega, já que o preço realmente convencionado foi de € 65.000,00.

A acção foi julgada parcialmente procedente pela sentença de fls. 339, que, tendo em conta os resultados da prova, declarou a nulidade do contrato de mútuo alegado pelo autor e condenou o ré a pagar-lhe € 30.000,00 com juros de mora, contados à taxa em vigor, desde a citação para esta acção até integral pagamento; e condenou o réu numa multa de 10 Ucs, por litigar de mé fé.

O réu recorreu para o Tribunal da Relação de Évora. Pelo acórdão de fls. 424, a Relação de Évora alterou a decisão sobre a matéria de facto, considerando que o cheque entregue correspondia ao pagamento de parte do preço do imóvel, e julgou a acção improcedente: “Uma vez alterada a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo tribunal de 1ª instância, julgando-se não provado em lugar de provado que o autor entregou ao réu um cheque no valor de 30.000 euros, quantia que o réu se comprometeu a devolver, o que configurava o alegado contrato de mútuo, deve ser julgado improcedente o pedido deduzido pelo autor ora apelado, por não se mostrarem preenchidos os requisitos de que depende a constituição do contrato de mútuo causa de pedir desta acção.” Assim, a Relação absolveu o réu do pedido e da condenação como litigante de má fé.

  1. O autor recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça. Nas alegações de recurso, apresentou as seguintes conclusões: «I. (…) Das nulidades do Acórdão proferido pelo Tribunal a quo: II. Entende o recorrente que o acórdão recorrido é totalmente ausente de fundamentação da matéria de direito que levou o Tribunal recorrido a decidir em conformidade como o acórdão em análise, pois somente motivou de facto a decisão recorrida.

    1. A fundamentação de direito que motivou as decisões recorridas é inexistente, pelo que, entende o recorrente, ser nulo o acórdão recorrido por violação expressa ao disposto no art. 615.° nº 1, al. b) do CPC.

      Mais, IV. O tribunal a quo decidiu em conformidade com a posição firmada pelo Réu, no âmbito das suas conclusões de recurso de apelação.

    2. Porém, o tribunal a quo cometeu a nulidade prevista no art. 615° nº 1 al. d) do CPC.

      (…) VI. O autor após o réu ter apresentado as suas alegações de recurso dirigidas ao Tribunal da Relação de Évora, apresentou, tempestivamente, o seu requerimento de resposta às mesmas.

    3. No entanto, o tribunal a quo em momento algum considerou na decisão sub-judice que o autor haja apresentado resposta ao recurso de apelação interposto na segunda instância, ou sequer tomou posição sobre as posições de defesa firmadas pelo recorrente no seu requerimento de resposta ao recurso de apelação feito pelo R.

    4. Sendo que o recorrente nas presentes alegações indica meios de prova que conflituam com a decisão recorrida, e que se fossem apreciados podiam motivar decisão diferente.

    5. Porém, entende o recorrente que violou o Tribunal a quo o disposto nos arts. 608.° n° 2,615°, n° 1, al. d), e 638° do CPC, e bem assim o principio processual do contraditório, porquanto: X. Incumbia ao tribunal a quo tomar posição sobre todas as questões suscitadas pelas partes - in casu tanto a parte recorrente como a parte recorrida -, vide a propósito o disposto no art. 608° n° 2 do CPC.

    6. O tribunal ao decidir deve tomar posição sobre as posições apresentadas pelas partes e não somente por uma ou algumas delas.

    7. ln casu, a total convicção do tribunal a quo foi tomada e provada atento somente a matéria testemunhal apresentada pelo R, na segunda instância, que foi totalmente distinta daquela efectivamente prestada em lª instância onde a prova foi apreciada na sua globalidade.

    8. Cumpria pois ao Tribunal a quo, desde logo atento o disposto no art. 615° n° 1 alo d) do CPC tomar em consideração as questões suscitadas pelo recorrente no requerimento de resposta aduzida aos autos na sequência do recurso de apelação junto daquele tribunal, o que não fez, daí que o Acórdão recorrido padece de vício de nulidade.

      Dos Fundamentos do Recurso de Revista: O Erro na aplicação e determinação da norma aplicável: XIV. Considerou o Tribunal a quo, enquanto tribunal de segunda instância, dar como provado, contrariamente à posição tomada em lª Instância, os seguintes factos: (…) XV. Posto isto, no entender do Tribunal a quo, os factos por este entendidos como provados tiveram por base o pagamento parcial do preço de um imóvel, cuja fundamentação da matéria de facto pelo tribunal recorrido assenta em: (…) XVI. O Tribunal a quo decidiu concluir pela alteração da matéria de facto provada, em conformidade com a posição supra manifestada no ponto antecedente, pelo que o facto provado n" 1 dado como provado pelo tribunal recorrido tem por base um negócio jurídico titulado por documento autêntico, in casu, a escritura pública (doc. n° 10 junto com a contestação) celebrada entre as partes referente à aquisição pelo autor ao réu e à testemunha Narcisa Ponte de um imóvel referente ao prédio urbano inscrito na freguesia 080301 (Aljezur), sob o art. 4429°, sendo o pelo valor declarado de € 65.000,00.

    9. Com efeito os negócios jurídicos titulados por escritura pública são documentos autênticos atento o disposto no art. 363° n° 2 do Código Civil, fazendo estes "prova plena" dos factos e teor que os mesmos representam (cfr. art. 371° n" 1 do CC).

    10. A força probatória de um documento autêntico só pode ser afastada através da invocação da sua falsidade (art. 372° do CC), facto que as partes nunca colocaram em questão.

    11. Ou, então através da sua declaração de nulidade, nomeadamente, a prevista no art. 240° do Código Civil.

    12. No entanto, o tribunal recorrido entendeu pois que o valor de € 30.000 referente ao facto provado n" 1 da matéria de facto dada como provada por aquele órgão judicial, é motivado no pagamento parcial do preço do imóvel acima descrito, porquanto, Autor e Réu acordaram que o preço real do negócio jurídico titulado por escritura pública, onde foi declarado o preço de aquisição de € 65.000,00 afinal foi pelo preço de € 95.000,00...

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