Acórdão nº 1288/05.6TYLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Fevereiro de 2015

Magistrado ResponsávelFERNANDA ISABEL PEREIRA
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2015
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório: AA, S.A.

e BB instauraram acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra CC e Niceday – Sistemas de Informação, Lda., pedindo que: a) se anule o direito da ré à firma Niceday - Sistemas de Informação, Lda., e, em consequência, se ordene o cancelamento da referida firma junto do Registo Nacional de Pessoas Colectivas (RNPC), da Conservatória do Registo Comercial (CRC) e das entidades que o tribunal entenda necessárias a esse fim; b) se condene a ré a abster-se de utilizar a sua firma, ou por qualquer forma, a expressão niceday ou qualquer outra confundível com as marcas das autoras; c) se anule o registo da marca nacional da ré n.° 355.753 NICEDAY; d) se condene a ré a abster-se de utilizar o seu domínio niceday.pt, ou por qualquer forma, a expressão niceday ou qualquer outra confundível com as marcas das autoras; e) se ordene a remoção do nome de domínio da ré junto da Fundação para a Computação Científica Nacional (FCCN).

Para fundamentação do peticionado, as autoras alegaram, em síntese: - A 1.ª autora é uma sociedade luxemburguesa que se dedica à comercialização de artigos de papelaria, mobiliário de escritório, artigos informáticos e outros, sendo titular das marcas nacionais NICEDAY, n.°s 275.057, 275.058 e 275.059, para assinalar produtos das classes 9.ª, 16.ª e 20.ª, respectivamente, cujos despachos de concessão foram proferidos em 03-06-1993.

- A 2.ª autora é uma sociedade inglesa que se dedica à comercialização dos mesmos produtos e está espalhada por mais de 23 países de todo o mundo, sendo titular da marca nacional NICEDAY PREMIER, n.° 341.539, destinada a assinalar produtos da classe 9.ª, cujo despacho de concessão foi proferido em 31-10-2001, e da marca comunitária NICEDAY EVERYDAY, destinada a assinalar produtos das classes 9.ª, 16.ª e 20.ª, concedida em 19-02-2001.

- No exercício da sua actividade souberam as autoras granjear notoriedade e prestígio pela qualidade dos produtos que comercializam e dos serviços que prestam através das referidas marcas.

- A referida notoriedade tem originado inúmeras situações em que terceiros pretendem adoptar marcas iguais ou confundíveis para beneficiarem do seu prestígio, como é o caso da ré.

- Com efeito, a ré, no ano 2000, apresentou pedido de certificado de admissibilidade de denominação no RNPC, tendo-lhe sido deferido o pedido da firma Niceday - Sistemas de Informação, Lda.

- A adopção pela ré da referida firma viola o princípio da novidade e da exclusividade da firma sendo susceptível de causar confusão ou erro com as marcas das autoras caracterizadas pela expressão NICEDAY.

- O réu é titular da marca nacional NICEDAY, n.° 355.753, destinada a assinalar produtos da classe 35.ª, concedida em 11-11-2003, que reproduz as marcas, anteriores, das autoras, constituindo uma flagrante imitação destas e destinando-se a comercializar produtos afins, existindo risco de associação com as marcas das autoras, sendo o respectivo registo nulo.

- Acrescendo o facto das marcas das autoras deverem ser consideradas como notórias, desfrutando de uma especial protecção.

- O registo da firma pela ré da marca que constitui contrafacção das marcas das autoras e a existência de violação de firma implica concorrência desleal.

- A ré adoptou o nome de domínio niceday.pt, que viola as regras para a composição do domínio “.pt” estabelecidas pela FCCN por não ser claramente distintivo das marcas das autoras, sendo, por isso, ilícita a sua utilização pela ré na internet.

* Os réus contestaram – cf. fls. 129 a 158 –, pugnando pela improcedência da acção.

As autoras replicaram – cf. fls. 176 a 180 –, terminando como na petição inicial.

Dispensada a realização de audiência preliminar, foi proferido saneador-sentença, no Tribunal de Comércio de Lisboa, em 07-10-2013, que julgou a acção totalmente improcedente e absolveu os réus dos pedidos – cf. fls. 197 a 208.

Inconformadas, apelaram as autoras, tendo a Relação de Lisboa, por Acórdão de 18-03-2014, decidido manter a decisão recorrida – cfr. fls. 261 a 286.

Manifestando a sua discordância, vieram as autoras interpor recurso de revista, formulando as seguintes conclusões recursivas (sic): «

  1. O Tribunal de Comércio de Lisboa no recurso de marca com o n.° 450/06.9TYLSB interposto pelas oras recorrentes no confronto entre as marcas das ora recorrentes e a marca do recorrido “NICEDAY SYSTEMS” decidiu em sentido contrário ao do douto acórdão recorrido.

  2. Ora o “thema decidendum” nos presentes autos é semelhante ao dos autos de recurso atrás referido, tendo aí sido aplicada a lei num sentido que entra em contradição com o do acórdão recorrido.

  3. Com efeito, a sentença referida considerando o tipo de produtos em causa constatou que são vendidos e consumidos nos mesmos locais – lojas de informática e papelarias – coincidindo, portanto, os circuitos e meios de distribuição, e que existe manifesta relação de acessoriedade ou complementaridade, podendo frequentemente ser prestados em simultâneo ao mesmo cliente, concluindo pelo manifesto elo de afinidade.

  4. O acórdão recorrido entendeu, perante os mesmos produtos e serviços que não existe semelhança ou afinidade.

  5. Assim o presente recurso de revista deve ser admitido pois está em causa uma questão que deve ser esclarecida sob pena de existirem na ordem jurídica decisões diferentes sobre situações idênticas pelo facto de terem sido apreciadas por Tribunais ou juízes diferentes (art.° 721.º-A do CPC).

  6. Entendem ainda as Recorrentes que se verifica no acórdão recorrido uma errada aplicação da lei do processo (art. 722.º, 1, alínea b) do CPC) e/ou uma omissão de pronúncia sobre a questão da notoriedade das marcas das Recorrentes, violando-se assim o art. 668.º, n° 1, alínea d) do CPC (art. 722°, 1, alínea c)).

  7. Com efeito, o acórdão recorrido limita-se a dizer que o alegado pelas Recorrentes nesta questão é meramente conclusivo, quer porque nenhuma prova foi indicada sobre esta matéria, quer documental quer testemunhal.

  8. Esta matéria – apreciação da notoriedade da marca – no entendimento das recorrentes deveria ter sido objecto de prova, por constituir matéria de facto controvertido necessitada de prova, designadamente em sede de audiência de discussão e julgamento.

  9. Com efeito, a produção de prova da notoriedade da marca tem de ser realizada como qualquer outro facto controvertido, apurando-se mediante prova documental, testemunhal ou outra se a marca em questão e no caso concreto é, ou não, conhecida pelo público e se as características que as titulares da marca mencionam correspondem, ou não, à realidade, etc...

  10. Ora as recorrentes alegaram que os produtos que as suas marcas assinalam são (i) muito conhecidos peio público consumidor que tem dos mesmos uma imagem de (ii) qualidade e (iii) confiança, estando as marcas da Recorrente fortemente divulgadas em diversos países (iv), nomeadamente em Portugal (v).

    I) Ora a alegação de tais factos, porque factos que permitem aferir da notoriedade da marca é matéria relevante para o exame e decisão da causa, pelo que devem considerar-se como factos necessitados de prova.

  11. Todavia, no processo em causa não teve lugar a fase de instrução do processo, tal como está estabelecida nos artigos 512.° 513.° e segts do CPC.

    Com efeito, as Recorrentes não tiveram oportunidade de vir apresentar prova testemunhal ou documental, ao abrigo dos artigos 512.° e 523.° do CPC.

  12. Foi feita pois uma errada aplicação da lei do processo no caso em apreço, ao decidir-se pela não realização da fase de instrução do processo, coarctando as Recorrentes o direito de produzirem prova sobre a notoriedade das marcas de que são titulares.

  13. Pode ainda entender-se que existe materialmente uma omissão de pronúncia dos tribunais anteriores quanto à questão da notoriedade das marcas das recorrentes, questão esta de importância fundamental na boa decisão da causa.

  14. Com efeito, a questão de saber se as marcas são notórias tem influência decisiva na apreciação das várias questões em apreço, designadamente quanto à protecção das marcas em confronto, na análise da questão da concorrência desleal bem como na apreciação das regras que regulamentam o registo do nome de domínio em Portugal.

  15. Deveria pois o Tribunal a quo ter decidido no sentido da necessidade da realização da audiência de discussão e julgamento para discussão de facto sobre esta matéria e ter-se pronunciado de direito sobre a mesma. Ao não o fazer violou os arts. 512.°, 513.° e 515.°, 523.° do CPC bem como o art. 668.°, 1 d) do mesmo diploma legal.

  16. Nos termos do Art. 34.° do C.P.I. poderá ser anulado o registo de uma marca se, nomeadamente, o direito não pertencer ao Requerente ou tiver havido, na concessão, preterição dos direitos de terceiro, fundados em prioridade ou outro título legal.

  17. Dispõe ainda o art. 266.° n.° 1 do C.P.I.: 1. Para além do que se dispõe no art. 34.°, o registo da marca é anulável: a) Quando, na sua concessão, tenha sido infringido o previsto nos artigos 239.° a 242.°; t) O art. 239.°, alínea m) do CPI actual, dispõe que será recusado o registo das marcas que contenham a reprodução ou imitação no todo ou em parte de marca anteriormente registada por outrem para produtos ou serviços idênticos ou afins, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor ou que compreenda o risco de associação com a marca registada.

  18. As Recorrentes são titulares das marcas nacionais n° 275 057 ”NICEDAY” para produtos da classe 9.ª, n° 275 058 “NICEDAY” para produtos da classe 16.ª, n.° 275 059 “NICEDAY” para produtos da classe 20.ª e n° 341 539 “NICEDAY premier” para produtos da classe 9.ª e 16.ª e da marca comunitária n.° 1.381.821 caracterizada pela expressão “NICEDAY EVERYDAY”, para produtos da classe 9.ª, 16.ª e 20.ª. Os despachos de concessão das marcas nacionais foram proferidos pelo I.N.P.I. em 3/6/1993 (NICEDAY) e 31/10/2001 (NICEDAY premier); o registo da marca comunitária foi obtido em 19/02/2001.

  19. O Recorrido é titular da...

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